D.E. Publicado em 18/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0003790-56.2012.4.03.6109/SP
RELATÓRIO
Trata-se de remessa oficial e apelação em ação de conhecimento, em que se pleiteia a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de trabalho prestado sob condições especiais no período de 20.07.98 até a data da propositura da ação.
O MM. Juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo o labor especial de 20.07.98 a 05.01.12, condenando o réu a conceder aposentadoria por tempo de contribuição desde o requerimento administrativo, com correção monetária e juros de mora, e honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação, observado o disposto na Súmula 111 do STJ, e isentando-a do pagamento de custas processuais. Antecipação dos efeitos da tutela deferida.
Apela o réu, alegando que os requisitos legais para a concessão do benefício não foram preenchidos, uma vez que não há comprovação de habitualidade e permanência da exposição ao agente nocivo.
Subiram os autos, com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Para a obtenção da aposentadoria integral exige-se o tempo mínimo de contribuição (35 anos para homem, e 30 anos para mulher) e será concedida levando-se em conta somente o tempo de serviço, sem exigência de idade ou pedágio, nos termos do Art. 201, § 7º, I, da CF.
Por sua vez, a Emenda Constitucional 20/98 assegura, em seu Art. 3º, a concessão de aposentadoria proporcional aos que tenham cumprido os requisitos até a data de sua publicação, em 16/12/98. Neste caso, o direito adquirido à aposentadoria proporcional, faz-se necessário apenas o requisito temporal, ou seja, 30 (trinta) anos de trabalho no caso do homem e 25 (vinte e cinco) no caso da mulher, requisitos que devem ser preenchidos até a data da publicação da referida emenda, independentemente de qualquer outra exigência.
Em relação aos segurados que se encontram filiados ao RGPS à época da publicação da EC 20/98, mas não contam com tempo suficiente para requerer a aposentadoria - proporcional ou integral - ficam sujeitos às normas de transição para o cômputo de tempo de serviço. Assim, as regras de transição só encontram aplicação se o segurado não preencher os requisitos necessários antes da publicação da emenda. O período posterior à Emenda Constitucional 20/98 poderá ser somado ao período anterior, com o intuito de se obter aposentadoria proporcional, se forem observados os requisitos da idade mínima (48 anos para mulher e 53 anos para homem) e período adicional (pedágio), conforme o Art. 9º, da EC 20/98.
A questão tratada nos autos também diz respeito ao reconhecimento do tempo trabalhado em condições especiais com a conversão em tempo comum.
Define-se como atividade especial aquela desempenhada sob certas condições peculiares - insalubridade, penosidade ou periculosidade - que, de alguma forma cause prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador.
A contagem do tempo de serviço rege-se pela legislação vigente à época da prestação do serviço.
Até 29/4/95, quando entrou em vigor a Lei 9.032/95, que deu nova redação ao Art. 57, § 3º, da Lei 8.213/91, a comprovação do tempo de serviço laborado em condições especiais era feita mediante o enquadramento da atividade no rol dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79, nos termos do Art. 295 do Decreto 357/91; a partir daquela data até a publicação da Lei 9.528/97, em 10.03.1997, por meio da apresentação de formulário que demonstre a efetiva exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais a saúde ou a integridade física; após 10.03.1997, tal formulário deve estar fundamentado em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho, consoante o Art. 58 da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.528/97. Quanto aos agentes ruído e calor, é de se salientar que o laudo pericial sempre foi exigido.
Nesse sentido:
Atualmente, no que tange à comprovação de atividade especial, dispõe o § 2º, do Art. 68, do Decreto 3.048/99, que:
Assim sendo, não é mais exigido que o segurado apresente o laudo técnico, para fins de comprovação de atividade especial, basta que forneça o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, assinado pela empresa ou seu preposto, o qual reúne, em um só documento, tanto o histórico profissional do trabalhador como os agentes nocivos apontados no laudo ambiental que foi produzido por médico ou engenheiro do trabalho.
Por fim, ressalte-se que o formulário extemporâneo não invalida as informações nele contidas. Seu valor probatório remanesce intacto, haja vista que a lei não impõe seja ele contemporâneo ao exercício das atividades. A empresa detém o conhecimento das condições insalubres a que estão sujeitos seus funcionários e por isso deve emitir os formulários ainda que a qualquer tempo, cabendo ao INSS o ônus probatório de invalidar seus dados.
Cabe ressaltar ainda que o Decreto 4.827 de 03/09/03 permitiu a conversão do tempo especial em comum ao serviço laborado em qualquer período, alterando os dispositivos que vedavam tal conversão.
Em relação ao agente ruído, os Decretos 53.831/64 e 83.080/79 consideravam nociva à saúde a exposição em nível superior a 80 decibéis. Com a alteração introduzida pelo Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, passou-se a considerar prejudicial aquele acima de 90 dB. Posteriormente, com o advento do Decreto 4.882, de 18.11.2003, o nível máximo tolerável foi reduzido para 85 dB (Art. 2º, do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Estabelecido esse contexto, esclareço que, anteriormente, manifestei-me no sentido de admitir como especial a atividade exercida até 05/03/1997, em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis, e a partir de tal data, aquela em que o nível de exposição foi superior a 85 decibéis, em face da aplicação do princípio da igualdade.
Contudo, em julgamento recente, a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a questão submetida ao rito do Art. 543-C do CPC, decidiu que no período compreendido entre 06.03.1997 e 18.11.2003, considera-se especial a atividade com exposição a ruído superior a 90 dB, nos termos do Anexo IV do Decreto 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto 3.048/1999, não sendo possível a aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o nível para 85 dB (REsp 1398260/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Por conseguinte, em consonância com o decidido pelo C. STJ, é de ser admitida como especial a atividade em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/1997, e 90 decibéis no período entre 06/03/1997 e 18/11/2003 e, a partir de então até os dias atuais, em nível acima de 85 decibéis.
No que diz respeito ao uso de equipamento de proteção individual, insta observar que este não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Nesse sentido: TRF3, AMS 2006.61.26.003803-1, Relator Desembargador Federal Sergio Nascimento, 10ª Turma, DJF3 04/03/2009, p. 990; APELREE 2009.61.26.009886-5, Relatora Desembargadora Federal Leide Pólo, 7ª Turma, DJF 29/05/09, p. 391.
Ainda que o laudo consigne a eliminação total dos agentes nocivos, é firme o entendimento desta Corte no sentido da impossibilidade de se garantir que tais equipamentos tenham sido utilizados durante todo o tempo em que executado o serviço, especialmente quando seu uso somente tornou-se obrigatório com a Lei 9732/98.
Igualmente nesse sentido:
Por demais, em recente julgamento proferido pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal, em tema com repercussão geral reconhecido pelo plenário virtual no ARE 664335/SC, restou decidido que o uso do equipamento de proteção individual - EPI pode ser insuficiente para neutralizar completamente a nocividade a que o trabalhador esteja submetido.
A propósito, transcrevo os seguintes tópicos da ementa:
Quanto à possibilidade de conversão de atividade especial em comum, após 28/05/98, tem-se que, na conversão da Medida Provisória 1663-15 na Lei 9.711/98 o legislador não revogou o Art. 57, § 5º, da Lei 8213/91, porquanto suprimida sua parte final que fazia alusão à revogação. A exclusão foi intencional, deixando-se claro na Emenda Constitucional n.º 20/98, em seu artigo 15, que devem permanecer inalterados os artigos 57 e 58 da Lei 8.213/91 até que lei complementar defina a matéria.
O E. STJ modificou sua jurisprudência e passou a adotar o posicionamento supra, conforme ementa in verbis:
Na conversão do tempo de atividade especial em tempo comum, para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, deve ser efetuado o fator de 1,4, para o homem, e 1,2, para a mulher (Decreto 611/92), vigente à época do implemento das condições para a aposentadoria.
Importa mencionar que a necessidade de comprovação de trabalho "não ocasional nem intermitente, em condições especiais" passou a ser exigida apenas a partir de 29/4/1995, data em que foi publicada a Lei 9.032/95, que alterou a redação do Art. 57, § 3º, da lei 8.213/91, não podendo, portanto, incidir sobre períodos pretéritos. Nesse sentido: TRF3, APELREE 2000.61.02.010393-2, Relator Desembargador Federal Walter do Amaral, 10ª Turma, DJF3 30/6/2010, p. 798 e APELREE 2003.61.83.004945-0, Relator Desembargador Federal Marianina Galante, 8ª Turma, DJF3 22/9/2010, p. 445.
No mesmo sentido colaciono recente julgado do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
O reconhecimento da contagem de tempo especial não destoa do entendimento adotado pela Corte Suprema, pois não determina que o benefício seja calculado de acordo com normas pertencentes a regimes jurídicos diversos, mas, apenas, que é dever do INSS conceder ao segurado o benefício que lhe for mais favorável, efetuando o cálculo da renda mensal inicial, desde que presentes todos os requisitos exigidos, de acordo com a legislação vigente até a data da EC 20/98, até a edição da Lei nº 9876/99 e até a DER (STF, RE 575089/RS, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, publicado em 24/10/2008).
Tecidas essas considerações gerais a respeito da matéria, passo a análise da documentação do caso em tela.
Assim fazendo, verifico que a autora comprovou que exerceu atividade especial no período de 20.07.98 a 06.10.11, data da emissão do PPP, na Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Limeira, nas funções de faxineira e auxiliar de enfermagem, sujeita a agentes nocivos biológicos tais como vírus e bactérias de modo habitual e permanente, previstos nos itens 1.3.2 do Decreto 53.831/64 e 1.3.4 do anexo I do Decreto 83.080/79, no item 2.1.3, do Decreto 83.080/79 e no item 3.0.1, do Decreto 3.048/99, conforme descrito no Perfil Profissiográfico Previdenciário fls. 51/52.
Os períodos de 02.10.78 a 18.08.80 e de 21.09.89 a 05.04.93 já foram reconhecidos administrativamente (fl. 71).
Portanto, somados os períodos de trabalho comum e trabalho especial convertido em tempo comum, perfaz a autora 28 (vinte e oito) anos, 02 (dois) meses e 11 (onze) dias de tempo de contribuição na data do requerimento administrativo (05.01.12 - fl. 22), insuficiente para a percepção do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Todavia, é certo que, se algum fato constitutivo, ocorrido no curso do processo autorizar a concessão do benefício, é de ser levado em conta, competindo ao Juiz ou à Corte atendê-lo no momento em que proferir a decisão e, de acordo com o extrato do CNIS, que ora determino seja juntado aos autos, a autora continuou trabalhando, completando, em 26/07/13, 30 anos de contribuição, suficiente para a concessão da aposentadoria integral.
Destarte, é de se reformar em parte a r. sentença, devendo o réu averbar como especial no cadastro da autora o período de 20/07/98 a 06/10/11 (data da emissão do PPP), concedendo-lhe a aposentadoria integral por tempo de contribuição a partir de 26/07/13, e pagar as prestações vencidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e, no que couber, observando-se o decidido pelo e. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da questão de ordem nas ADIs 4357 e 4425.
Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme entendimento consolidado na c. 3ª Seção desta Corte (AL em EI nº 0001940-31.2002.4.03.610). A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº 17.
Convém alertar que das prestações vencidas devem ser descontadas aquelas pagas administrativamente ou por força de liminar, e insuscetíveis de cumulação com o benefício concedido, na forma do Art. 124, da Lei nº 8.213/91.
Tendo a autoria decaído de parte do pedido, vez que implementados os requisitos somente no curso da ação, é de se aplicar a regra contida no Art. 86, do CPC. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93 e a parte autora, por ser beneficiária da assistência judiciária integral e gratuita, está isenta de custas, emolumentos e despesas processuais.
Posto isto, dou parcial provimento à remessa oficial e à apelação.
É o voto.
BAPTISTA PEREIRA
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 09/08/2016 18:20:57 |