D.E. Publicado em 12/02/2019 |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. |
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0023648-33.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS
A parte autora ajuizou a presente ação, com pedido de tutela de urgência, em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando, em síntese, o reconhecimento atividade rural em regime de economia familiar e de atividade urbana especial para fins de obtenção de sua aposentadoria por tempo de contribuição.
Documentos acostados à petição inicial às fls. 11/44.
Após a contestação do feito e oferecida a réplica, determinou-se audiência de instrução, debates e julgamento, com a oitiva das testemunhas gravada em mídia digital.
Sobreveio sentença de improcedência do pedido aos fundamentos da insuficiência do conjunto probatório a amparar o pedido de reconhecimento de atividade rural, bem como da eficácia do uso do EPI, apto a neutralizar o agente agressivo biológico.
Custas e verba honorária arbitrada em R$ 500,00, observados os benefícios da justiça gratuita.
Apela a parte autora, aduzindo restar comprovada a atividade rural de modo que faz jus à benesse perseguida.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0023648-33.2018.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS
Observo que a controvérsia havida no presente feito foi limitada pela parte autora em seu recurso, cingindo-se somente às questões relativas à validade do conjunto probatório a amparar seu pedido de reconhecimento de atividade rural e a respectiva concessão da benesse, posto que não há insurgência com o não reconhecimento de atividade urbana nocente no período indicado na inicial.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
A concessão da aposentadoria por tempo de serviço está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei 8.213/91, in verbis:
"Artigo 52. A aposentadoria por tempo de serviço, cumprida a carência exigida nesta Lei, será devida ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos, se do sexo masculino."
"Artigo 53. A aposentadoria por tempo de serviço, observado o disposto na Seção III deste Capítulo, especialmente no artigo 33, consistirá numa renda mensal de:
I - para mulher: 70% (setenta por cento) do salário-de-benefício aos 25 (vinte e cinco) anos de serviço, mais 6% (seis por cento) deste, para cada novo ano completo de atividade, até o máximo de 100% (cem por cento) do salário-de-benefício aos 30 (trinta) anos de serviço:
II - para homem: 70% (setenta por cento) do salário-de-benefício aos 30 (trinta) anos de serviço, mais 6% (seis por cento) deste, para cada novo ano completo de atividade, até o máximo de 100% (cem por cento) do salário-de-benefício aos 35 (trinta e cinco) anos de serviço."
O período de carência é também requisito legal para obtenção do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, dispondo o artigo 25 do mesmo diploma legal, in verbis:
"Artigo 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no artigo 26:
omissis
II - aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de serviço e aposentadoria especial: 180 contribuições mensais." (Redação dada pela Lei 8.870, de 15 de abril de 1994)
O artigo 55 da Lei 8.213/91 determina que o cômputo do tempo de serviço para o fim de obtenção de benefício previdenciário se obtém mediante a comprovação da atividade laborativa vinculada ao Regime Geral da Previdência Social, na forma estabelecida em Regulamento.
No que se refere ao tempo de serviço de trabalho rural anterior à vigência da Lei 8.213/91, assim prevê o artigo 55, em seu parágrafo 2º:
"§ 2º. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento." (g. n.)
Ressalte-se que, pela regra anterior à Emenda Constitucional nº 20, de 16/12/1998, que a aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, na forma proporcional, será devida ao segurado que completou 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo masculino, antes da vigência da referida Emenda, uma vez assegurado seu direito adquirido (Lei 8.213/91, art. 52).
Após a EC nº 20/98, aquele que pretender se aposentar com proventos proporcionais deve cumprir as seguintes condições: estar filiado ao RGPS quando da entrada em vigor da referida Emenda; contar com 53 (cinquenta e três) anos de idade, se homem, e 48 (quarenta e oito) anos de idade, se mulher; somar no mínimo 30 (trinta) anos, homem, e 25 (vinte e cinco) anos, mulher, de tempo de serviço, e adicionar o pedágio de 40% (quarenta por cento) sobre o tempo faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria integral.
Comprovado o exercício de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria na forma integral, pelas regras anteriores à EC nº 20/98, se preenchido o requisito temporal antes da vigência da Emenda, ou pelas regras permanentes estabelecidas pela referida Emenda, se após a mencionada alteração constitucional (Lei 8.213/91, art. 53, I e II).
O art. 4º da EC nº 20/98 estabelece que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente é considerado tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da previdência social (art. 55 da Lei 8.213/91).
Além do tempo de serviço, deve o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8.213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II.
Outra regra de caráter transitório veio expressa no artigo 142 da Lei 8.213/91 destinada aos segurados já inscritos na Previdência Social na data da sua publicação. Determina o número de contribuições exigíveis, correspondente ao ano de implemento dos demais requisitos tempo de serviço ou idade.
Do reconhecimento do labor rural
Passo à análise do período em que a parte autora (nascida em 18/10/1963) laborou no meio rural em regime de economia familiar.
Para o reconhecimento do labor rural/urbano é necessário o início de prova material corroborado por prova testemunhal conforme previsão contida no art. 55, §3º, da Lei de Benefícios. Contudo, tal exigência não tem o condão de descartar a prova produzida por testemunhas, exigindo-se tão-somente um começo de prova material que venha a robustecê-la.
Não poderia ser diferente. Princípio basilar do processo civil brasileiro é o do livre convencimento motivado ou da persuasão racional, segundo o qual o juiz é livre para apreciar os elementos probatórios, não estando adstrito a uma valoração prévia de cada prova, como no sistema das chamadas provas legais ou tarifadas. É bem verdade que tal princípio não é absoluto, podendo-se observar em certos artigos do novo Código de Processo Civil alguma restrição quanto à prova exclusivamente testemunhal (ex: arts. 406 e 44), o que se verifica igualmente no já referido artigo da Lei 8.213/91.
Esse o entendimento esposado em inúmeras decisões do Superior Tribunal de Justiça - STJ:
Observe-se que também serve a este mister a prova material desacompanhada de prova testemunhal, desde que robusta e apta a demonstrar todo o período que se deseja comprovar, como as anotações em CTPS, por exemplo, que acarretam presunção juris tantum de veracidade, admitindo prova em contrário.
Ressalvo outra questão que suscita debates, relativa ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Pertinente dizer que é sedimentado o entendimento de que documentos apresentados para comprovação de tempo rural não precisam referir-se a todo o interregno que se pretende comprovar, constituindo em início de prova material e não prova plena, podendo, assim, ser complementado por depoimentos testemunhais. Confira-se:
A convicção de que ocorreu o efetivo exercício da atividade, durante determinado período, nesses casos, forma-se através do exame minucioso do conjunto probatório, que se resume nos indícios de prova escrita, em consonância com a oitiva das testemunhas. É preciso que se estabeleça um entrelaçamento entre os elementos extraídos de ambos os meios probatórios: o material e o testemunhal.
Nesse sentido, é a orientação do Superior Tribunal de Justiça.
Confira-se:
Finalmente, impende sublinhar que, para a conclusão sobre ter ou não direito à aposentadoria, mister se faz a constatação, por meio da prova testemunhal, se efetivamente a parte autora trabalhou no campo e a duração do referido labor, corroborando, assim, o início de prova material apresentado, o que ocorreu nos autos.
O caso concreto.
Alega a parte autora que se casou e que exerceu a atividade rural junto com seu cônjuge. Como prova material indiciária anexou documentação relativa a seu sogro, tais como notas fiscais de produtor rural, notas de insumos agrícolas dos anos de 1980 a 1990 e certidão de nascimento de sua filha ocorrido em 1986, constando a qualificação de Lavrador de seu cônjuge.
De outra parte, a oitiva das testemunhas confirmou de maneira simples, porém coerente, o local e o labor campesino da parte autora junto de seus familiares.
Desta maneira reconheço a atividade rural no período de 01/01/1982 a 31/12/1992 (período delimitado pela parte autora).
Nos termos do art. 55, §§ 1ºe 2º, da Lei 8.213/91, não há obstáculo à contagem do tempo rural anterior a 25/07/1991 para a obtenção de qualquer benefício do regime geral, independentemente de contribuição, com a ressalva de que dito tempo não se computa para efeito de carência.
Em relação aos períodos posteriores à edição da referida lei, somente há possibilidade de cômputo do tempo de serviço reconhecido para a benesse perseguida (aposentadoria por tempo de serviço/contribuição) se houver o recolhimento das contribuições, o que inocorreu nos autos.
Ou seja, o cômputo do tempo de serviço posterior à edição da Lei 8.213/91, sem o recolhimento de contribuições somente é válido para os benefícios previstos no art. 39, inc. I e parágrafo único.
Da contagem necessária para a concessão da aposentadoria.
Computando-se o tempo de serviço incontroverso pelo INSS (26 anos, 9 meses e 14 dias) e o período de atividade rural reconhecido até a edição da Lei 8.213/91 (9 anos, 6 meses e 24 dias) verifica-se que a parte autora (do sexo feminino) possui tempo suficiente para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral, calculado de acordo com a legislação à época vigente.
Fixo o termo inicial do benefício a partir da data da citação, em 14/03/2017 (fls. 43/44) ocasião em que o INSS teve ciência da pretensão e a ela resistiu.
Condeno o INSS ao pagamento em ato único das parcelas vencidas, atualizadas e acrescidas de juros moratórios.
Com relação aos índices de correção monetária e taxa de juros, deve ser observado o julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no recurso Extraordinário nº 870.947.
Anote-se, na espécie, a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores pagos à parte autora após o termo inicial assinalado ao benefício ora concedido (aposentadoria especial), ao mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei nº 8.213/1991).
A responsabilidade pela sucumbência fica carreada integralmente ao INSS. Fixo a verba honorária, consideradas a natureza, o valor e as exigências da causa, em 10% sobre o valor da condenação, incidentes sobre as parcelas vencidas até a data deste decisum, nos termos do art. 85, §§ 2º e 8º, do CPC/2015 e da Súmula 111, do E. STJ.
Quanto às despesas processuais, são elas devidas, à observância do disposto no artigo 11 da Lei n.º 1060/50, combinado com o artigo 91 do Novo Código de Processo Civil. Porém, a se considerar a hipossuficiência da parte autora e os benefícios que lhe assistem, em razão da assistência judiciária gratuita, a ausência do efetivo desembolso desonera a condenação da autarquia federal à respectiva restituição.
Da tutela antecipada.
Por fim, presentes que se encontram os pressupostos contidos no CPC, notadamente a prova inequívoca de que a parte requerente já implantou os requisitos necessários ao gozo da benesse perseguida, assinalando ainda a urgência na percepção do benefício que - pela sua própria natureza - constitui-se em verba de alimentos, defiro a antecipação de tutela, para o fim de determinar a implantação imediata do benefício. Para tanto, concedo ao INSS o prazo máximo de 30 (trinta) dias para as providências administrativas necessárias.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, para conceder o benefício da aposentadoria por tempo de contribuição, nos termos da fundamentação do voto.
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 29/01/2019 13:32:26 |