Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5481743-66.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
07/10/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 09/10/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL
PARCIALMENTE COMPROVADA. NATUREZA ESPECIAL DO TRABALHO RECONHECIDA.
SETOR AGROPECUÁRIO. REGULAR ENQUADRAMENTO NORMATIVO. POSSIBILIDADE DE
CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM MEDIANTE APLICAÇÃO DO FATOR
PREVISTO NA LEGISLAÇÃO. TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO INSUFICIENTE. BENEFÍCIO
INDEVIDO.
1. A aposentadoria especial é devida ao segurado que tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20
(vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física (art. 64 do Decreto nº 3.048/99). E a aposentadoria
por tempo de contribuição, conforme art. 201, § 7º, da constituição Federal, com a redação dada
pela EC nº 20/98, é assegurada após 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30
(trinta) anos de contribuição, se mulher. Nos dois casos, necessária, ainda, a comprovação da
carência e da qualidade de segurado.
2. Ante o conjunto probatório, restou demonstrada a regular atividade rural da parte autora, sem
registro em CTPS, no período de 01.01.1987 a 31.10.1991, devendo ser procedida a contagem
de tempo de serviço cumprido no citado interregno, independentemente do recolhimento das
respectivas contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência, nos termos do art. 55,
parágrafo 2º, da Lei nº 8.213/91. Por outro lado, o labor sem registro exercido a partir da
competência de novembro de 1991 (art. 55, §2º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 60, X, do Decreto
3.048/99), tem o seu reconhecimento restrito às hipóteses previstas nos artigos 39, inciso I, e 143
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
da referida lei, que não contempla a mera averbação de tempo de serviço rural sem registro em
CTPS, na qualidade de segurado especial, para o fim de obtenção do benefício da aposentadoria
por tempo de contribuição. Assim, para a contagem do tempo de serviço do trabalhador rural sem
registro em CTPS, posterior a 31.10.1991, torna-se imprescindível o recolhimento das
contribuições previdenciárias. Desse modo, não obstante o depoimento das testemunhas
apontarem ter a parte autora laborado em atividades campesinas até o ano de 2000, em função
de não restar comprovado o recolhimento das respectivas contribuições, o tempo contributivo
deverá ser limitado ao período de 01.01.1987 a 31.10.1991.
3. A legislação aplicável para caracterização da natureza especial é a vigente no período em que
a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, ser levada em
consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até
05.03.1997 e, após, pelos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.049/99.
4. Os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo
revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas
normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
5. A atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pode
ser considerada especial, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então,
era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos
informativos SB-40 e DSS-8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova
técnica.
6. É de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de
06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a
ruídos de 85 decibéis.
7. Efetivo exercício de atividades especiais comprovado por meio de formulários de insalubridade
e laudos técnicos que atestam a exposição a agentes agressores à saúde, em níveis superiores
aos permitidos em lei.
8. No caso dos autos, a controvérsia colocada engloba tanto a averbação de atividade rurícola já
analisada quanto o reconhecimento da natureza especial dos períodos de 03.10.1977 a
19.11.1977, 24.11.1977 a 28.04.1979, 02.05.1979 a 13.10.1979, 24.10.1979 a 25.03.1982,
17.05.1982 a 15.12.1982, 16.12.1982 a 31.12.1983, 02.01.1984 a 02.01.1984 e 01.01.1987 a
31.10.1991. Em relação aos intervalos de 24.10.1979 a 25.03.1982, 17.05.1982 a 15.12.1982,
16.12.1982 a 31.12.1983 e 02.01.1984 a 02.01.1984, verifico que a demandante exerceu
atividades em estabelecimentos do ramo agropecuário (ID 49123088 –pág. 4 e ID 49123103 –
pág. 20), razão por que devem ser enquadrados como especiais, nos termos do código 2.2.1 do
Decreto nº 53.831/64. Por fim, no tocante aos demais interregnos, inexiste comprovação do
trabalho em setor agropecuário, tampouco a demonstração da especialidade do labor
desenvolvido, motivo por que devem ser contabilizados como atividades comuns.
9. Somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a
parte autora 21 (vinte e um) anos, 08 (oito) meses e 23 (vinte e três) dias de tempo de
contribuição até a data do requerimento administrativo (DER 30.11.2016).
10. Destarte, a parte autora não faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição.
11. Honorários advocatícios conforme fixados em sentença.
12. Apelações parcialmente providas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5481743-66.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: TEREZA RODRIGUES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: ERICA APARECIDA MARTINI BEZERRA PEREIRA - SP169162-
N, JOSE LUIZ PEREIRA JUNIOR - SP96264-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, TEREZA RODRIGUES
Advogados do(a) APELADO: ERICA APARECIDA MARTINI BEZERRA PEREIRA - SP169162-N,
JOSE LUIZ PEREIRA JUNIOR - SP96264-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5481743-66.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: TEREZA RODRIGUES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: ERICA APARECIDA MARTINI BEZERRA PEREIRA - SP169162-
N, JOSE LUIZ PEREIRA JUNIOR - SP96264-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, TEREZA RODRIGUES
Advogados do(a) APELADO: ERICA APARECIDA MARTINI BEZERRA PEREIRA - SP169162-N,
JOSE LUIZ PEREIRA JUNIOR - SP96264-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação previdenciária
proposta por Tereza Rodrigues em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pelo qual
almeja a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Concedidos os benefícios de gratuidade da justiça.
Contestação do INSS, na qual sustenta não ter a parte autora preenchido os requisitos
necessários à concessão do benefício pleiteado, requerendo, ao final, a improcedência total do
pedido.
Houve réplica.
Foram colhidos os depoimentos das testemunhas arroladas pela parte autora.
Sentença pela parcial procedência do pedido.
A parte autora apresentou recurso de apelação, objetivando, em síntese, o acolhimento total do
pedido.
O INSS, por sua vez, interpôs recurso de apelação, ao argumento da inexistência de
comprovação do período de trabalho rural, sem registro em CTPS, tampouco da especialidade
dos intervalos de trabalho indicados pela autora.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5481743-66.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: TEREZA RODRIGUES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: ERICA APARECIDA MARTINI BEZERRA PEREIRA - SP169162-
N, JOSE LUIZ PEREIRA JUNIOR - SP96264-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, TEREZA RODRIGUES
Advogados do(a) APELADO: ERICA APARECIDA MARTINI BEZERRA PEREIRA - SP169162-N,
JOSE LUIZ PEREIRA JUNIOR - SP96264-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em
16.08.1963, o reconhecimento do exercício de atividades especiais no período de 16.08.1975 a
10.12.1997, bem como a averbação de atividade rural executada entre 16.08.1975 a 31.11.2016,
descontados os intervalos anotados em CTPS, e a concessão do benefício de aposentadoria por
tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (DER 30.11.2016).
Do mérito.
Para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57
da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo
diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial,
pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à
aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não
estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de
idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91.
Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de
atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade
especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do
trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter
às regras da EC 20/98.
Do período de trabalho anotado em CTPS.
Registre-se que as anotações constantes em carteira de trabalho constituem prova plena de
exercício de atividade e, portanto, de tempo de serviço, para fins previdenciários. Há, ainda,
previsão legal no sentido de ser a CTPS um dos documentos próprios para a comprovação,
perante a Previdência Social, do exercício de atividade laborativa, conforme dispõe o art. 62, § 1º,
inciso I, do Decreto nº 3.038, de 06 de maio de 1999 - Regulamento da Previdência Social -, na
redação que lhe foi dada pelo Decreto nº 4.729, de 09 de junho de 2003.
Desse modo, o registro presente na CTPS não precisa de confirmação judicial, diante da
presunção de veracidade juris tantum de que goza tal documento. Referida presunção somente
cede lugar quando o documento não se apresenta formalmente em ordem ou quando o
lançamento aposto gera dúvida fundada acerca do fato nele atestado.
Ocorre, todavia, que a simples ausência de informação nos registros do INSS não afasta, a
princípio, a veracidade dos vínculos empregatícios constantes na CTPS. Nesse sentido, o
entendimento da Décima Turma desta Corte:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ANOTAÇÕES EM CTPS. PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE.
TEMPO DE SERVIÇO COMPROVADO.
I - As anotações em CTPS gozam de presunção legal de veracidade juris tantum, que somente
pode ser afastada mediante robusta prova em contrário, ou seja, que se comprove sua falsidade,
sendo que a averbação tardia do contrato de trabalho no CNIS - Cadastro Nacional de
Informações Sociais não se afigura como tal, vez que é passível de ratificação por outros meios
de prova.
II - No caso dos autos, a parte autora apresentou carteiras profissionais contemporâneas, estando
os contratos em ordem cronológica, sem sinais de rasura ou contrafação. Assim, na presente
hipótese, não haveria razão para o INSS não computar os interstícios de 03.01.1977 a
28.02.1980, 03.03.1980 a 24.12.1981, 11.01.1982 a 24.04.1983, 27.04.1983 a 16.01.1985,
17.01.1985 a 20.06.1986, 25.08.1986 a 06.06.1988, 14.07.1988 a 31.03.1989, 03.04.1989 a
05.05.1989 e 07.05.1989 a 02.06.1990, salvo eventual fraude, o que não restou comprovado.
III - Em se tratando de labor urbano, não responde o empregado por eventual falta do
empregador em efetuar os respectivos recolhimentos.
IV - Apelação do INSS e remessa oficial improvidas. (APELREEX 00007006820164039999,
DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, TRF3 - DÉCIMA TURMA, e-DJF3
Judicial 1 DATA:26/10/2016).
Assim, caberia ao Instituto-réu comprovar a falsidade das informações, por meio de prova robusta
que demonstrasse a inexistência do vínculo empregatício anotado na Carteira de Trabalho. Tal
prova não foi, contudo, produzida pela autarquia previdenciária.
Portanto, considerando que a presunção juris tantum de veracidade dos registros constantes em
CTPS não foi, em nenhum momento, afastada pelo INSS, reconheço-os como efetivo tempo de
contribuição (ID 49123088).
Da atividade rural.
É certo que a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido de que é
insuficiente apenas a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, nos
termos da Súmula 149: (...) A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário (...).
Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA.
CERTIDÃO DE CASAMENTO. MARIDO LAVRADOR. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA
MATERIAL.
1. A comprovação da atividade laborativa do rurícola deve-se dar com o início de prova material,
ainda que constituído por dados do registro civil, como certidão de casamento onde consta à
profissão de lavrador atribuída ao marido da Autora. Precedentes da Terceira Seção do STJ.
2. Recurso especial conhecido em parte e provido (...).” (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA
VAZ, Quinta Turma, DJ de14/3/2005)
Importante anotar, contudo, que não se exige que a prova material se estenda por todo o período
de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal amplie a eficácia probatória dos
documentos, como se verifica nos autos.
No mesmo sentido:
"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURAL.
COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE AGRÍCOLA NO PERÍODO DE CARÊNCIA. INÍCIO DE PROVA
MATERIAL AMPLIADO POR PROVA TESTEMUNHAL. PEDIDO PROCEDENTE.
1. É firme a orientação jurisprudencial desta Corte no sentido de que, para concessão de
aposentadoria por idade rural, não se exige que a prova material do labor agrícola se refira a todo
o período de carência, desde que haja prova testemunhal apta a ampliar a eficácia probatória dos
documentos, como na hipótese em exame.
2. Pedido julgado procedente para, cassando o julgado rescindendo, dar provimento ao recurso
especial para restabelecer a sentença (...).” (AR 4.094/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE
ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 26/09/2012, DJe 08/10/2012)
A matéria, a propósito, foi objeto de Recurso Especial Representativo de Controvérsia:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/91. TEMPO DE
SERVIÇO RURAL. RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO.
DESNECESSIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA
TESTEMUNHAL. PERÍODO DE ATIVIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE
ATIVIDADE URBANA REGISTRADA EM CTPS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do período
de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material.
2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil "a prova testemunhal é sempre
admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar a
aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a
comprovação do tempo de serviço só produzirá efeito quando baseada em início de prova
material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo
de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (Súmula 149/STJ).
3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconhecimento do tempo
de serviço mediante apresentação de um início de prova material, desde que corroborado por
testemunhos idôneos. Precedentes.
4. A Lei de Benefícios, ao exigir um "início de prova material", teve por pressuposto assegurar o
direito à contagem do tempo de atividade exercida por trabalhador rural em período anterior ao
advento da Lei 8.213/91 levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente.
5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado,
ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias
ordinárias, corroboraram a alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967.
6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença,
alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de trabalho
urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como rurícola, não
impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de serviço,
mormente por estar incontroversa a circunstância de que o autor cumpriu a carência devida no
exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei 8.213/91.
7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da
Súmula n. 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei
11.960/09, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime do
art. 543-C do Código de Processo Civil."
(STJ - 1ª Seção, REsp 1.348.622/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 23/08/2013) - grifo
nosso.
Ocorre que a parte autora anexou aos autos razoávelinício de prova material da sua atividade
rurícola, consubstanciado em diversos documentos, dos quais cito: i) cópias de sua CTPS,
indicando vínculo de trabalho campesino (1977/1982 e 2001; ID 49126088 – págs. 1/6), e ii)
certidão de casamento, na qual a profissão do marido, que lhe pode ser estendida, consta como
sendo “lavrador” (1983; ID 49123086 – págs. 1/2). Nessa direção:
“PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. EXERCÍCIO
DE ATIVIDADE RURAL. VERIFICAÇÃO DO ACERVO PROBATÓRIO. POSSIBILIDADE.
PRECEDENTES. DOCUMENTAÇÃO COMPROBATÓRIA DA ATIVIDADE. EXTENSÃO DA
CONDIÇÃO DE TRABALHADOR RURAL DE UM DOS CÔNJUGES. I - A Terceira Seção deste
Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que constitui valoração, e não
reexame de provas, a verificação do acervo probatório dos autos com vistas a confirmar o
alegado exercício de atividade rurícola (AgRg no REsp 880.902/SP, Rel. Ministra Laurita Vaz,
Quinta Turma, julgado em 15/02/2007, DJ 12/03/2007, p. 329). II - O precedente indicado pela
embargante como paradigma retrata, de fato, o entendimento consolidado por esta Colenda
Seção, segundo o qual, diante das dificuldades encontradas pelos trabalhadores rurais para a
comprovação do tempo de serviço prestado nas lides campesinas, o exame das provas
colacionadas aos autos não encontra óbice na Súmula 7 do STJ, por consistir em devida
revaloração do acervo probatório (AgRg no REsp 1150564/SP, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta
Turma, julgado em 02/12/2010, DJe 13/12/2010). III - Este Superior Tribunal de Justiça, nas
causas de trabalhadores rurais, tem adotado critérios interpretativos favorecedores de uma
jurisdição socialmente justa, admitindo mais amplamente documentação comprobatória da
atividade desenvolvida. IV - Seguindo essa mesma premissa, firmou posicionamento segundo o
qual as certidões de nascimento, casamento e óbito, bem como certidão da Justiça Eleitoral,
carteira de associação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais e contratos de parceria agrícola
são aceitos como início da prova material, nos casos em que a profissão rural estiver
expressamente consignada. V - Da mesma forma, admite que a condição profissional de
trabalhador rural de um dos cônjuges, constante de assentamento em Registro Civil, seja
extensível ao outro, com vistas à comprovação de atividade rurícola. VI - Orienta ainda no sentido
de que, para a concessão de aposentadoria por idade rural, não se exige que a prova material do
labor agrícola se refira a todo o período de carência, desde que haja prova testemunhal apta a
ampliar a eficácia probatória dos documentos (AR 4.094/SP, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis
Moura, Terceira Seção, julgado em 26/09/2012, DJe 08/10/2012). VII - Embargos de Divergência
acolhidos.”
(STJ – 3ª Seção, ERESP 201200872240, Rel. Min. Nefi Cordeiro, DJE 05.03.2015) – grifo nosso.
As testemunhas ouvidas em Juízo, por sua vez, corroboraram o alegado na petição inicial:
“A testemunha N.R. dos S. aduz que já trabalhou sem registro com a autora e que a mesma
trabalho nas lides rurais até o ano de 2003. Aduz que trabalharam juntas a partir de 1987. Em
depoimento, a testemunha N.R. dos S. disse, em síntese, que: conhece a autora faz 35 anos; que
já trabalharam juntos; que trabalharam em várias firmas juntos; que trabalharam na Santa Elísia,
Cergell; que tem umas registradas e outras avulsos; que já trabalhou sem registro com a autora
na laranja, tipo firma de colheita de laranja; que já trabalharam com os empreiteiros Nené, Miltão,
Geraldo, José Ambrósio; que trabalhavam na Santa Elísa; que a autora entrou no meio da safra e
se conheceram na roça; que autora está trabalhando de empregada doméstica faz tempo; que a
autora trabalhou na roça até o ano de 2000; que se recorda vagamente; que de 2000 para cá
trabalharam juntas numa firma tercerizada da prefeitura; que a depoente saiu e a autora
continuou na firma; que aí não trabalharam mais juntos; que depois de sair desta firma
terceirizada a autora passou a ser empregada doméstica; que chegou a trabalhar por pouco
tempo para empreiteiro na cooperativa; que trabalharam na laranja; que trabalharam na safra com
registro e na entressafra avulso; que trabalharam na cana também; que carpiam, plantava cana;
arrancavam colonhão; que a autora nunca parou de trabalhar; que o salário era por quinzena; que
trabalhavam de segunda a sábado o tempo todo; que trabalharam juntas a partir do ano de 1987
a 1988; que trabalharam juntas até no ano de 2003; que trabalharam em uma firma terceirizada
da prefeitura; que trabalharam numa firma dentro da cidade; que uma parte registrava outra não;
que era muito raro separar; que sempre trabalharam juntos; que é difícil lembrar o nome das
propriedades que já faz anos; que trabalhou numa firma de laranja, cana, serviço avulso; que era
empreiteiro, tipo José, Miltão, Nené, Zelão, que é empreiteiro muito conhecido na cidade; que era
firma tercerizada; que neste período era só rural; que não tinha trabalho na cidade; que de 2003
em diante foi cada uma para um lado. (audiovisual)
“A testemunha a J.C.R. de A aduziu que começou conheceu a autora em 1994; que eram de lides
rurais e que a depoente parou de trabalhar em 2002. Em depoimento, a testemunha J.C.R. de A
disse, em síntese, que: a depoente chegou do Paraná em 1994; que moravam na mesma rua;
que trabalharam avulsa juntos; que trabalharam em bastante lugar avulso; que trabalharam na
Santa Elisa; que na safra cortava cana; que na planta ia catar coronhão; que a depoente ficou na
santa Elisa e a Autora saiu; que a depoente pegava o ponto numa esquina e a depoente na outra;
que a depoente registrou na Santa Elisa em 1994; que a depoente não lembra o ano que a autor
trabalhou na Santa Elisa; que também trabalhava sem registro na Santa Elisa; que não sabe
quantos anos a autora trabalhou na Santa Elisa; que sempre via a autora no ponto; que não
lembra quando foi a última que vez que viu a autora trabalhando como rural; que atualmente a
autora trabalha como doméstica; que a autora saiu da Santa Elisa a autora foi trabalhar na
laranja; que a autora trabalhou na Prefeitura, pintando as calçadas, fazendo muro; que a autora
trabalhou no corte de cana e na laranja como rural; que depois que trabalhou no corte de cana e
laranja, a autora foi trabalhar na Prefeitura; que a autora trabalhou fazendo muda para a
Prefeitura; que a autora trabalhou na Prefeitura até ser empregada doméstica; que não sabe os
empreiteiros com os quais a autora trabalhou na cana ou na laranja; que a autora trabalhou na
laranja sob cooperativa; que a depoente nunca trabalhou na laranja; que a autora está sempre
trabalhando; que ela é guerreira; que a depoente entrou na Santa Elisa em 1994; que conhece a
autora desde 1994; que a autora trabalhou quase 10 anos na Santa Elisa; que não sabe quanto
tempo ela saiu; que depois disso não voltou a trabalhar; que via a autora no ponto; que sabia
onde ela ia; que via a autora com o podão para ir trabalhar no corte de cana; que via a autora
entrando no ônibus; que não sabe até que ano viu a autora entrar no ônibus; que a depoente
trabalhou até 2002; que depois disso a autora sempre trabalhando; que depois disso a autora foi
trabalhar na laranja; que sempre perguntava e a autora contava. (audiovisual)” (ID 49123124 –
págs. 5/6).
Ante o conjunto probatório, restou demonstrada a regular atividade rural da parte autora, sem
registro em CTPS, no período de 01.01.1987 a 31.10.1991, devendo ser procedida a contagem
de tempo de serviço cumprido no citado interregno, independentemente do recolhimento das
respectivas contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência, nos termos do art. 55,
parágrafo 2º, da Lei nº 8.213/91.
Por outro lado, o labor sem registro exercido a partir da competência de novembro de 1991 (art.
55, §2º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 60, X, do Decreto 3.048/99), tem o seu reconhecimento restrito
às hipóteses previstas nos artigos 39, inciso I, e 143 da referida lei, que não contempla a mera
averbação de tempo de serviço rural sem registro em CTPS, na qualidade de segurado especial,
para o fim de obtenção do benefício da aposentadoria por tempo de contribuição. Assim, para a
contagem do tempo de serviço do trabalhador rural sem registro em CTPS, posterior a
31.10.1991, torna-se imprescindível o recolhimento das contribuições previdenciárias.
Desse modo, não obstante o depoimento das testemunhas apontarem ter a parte autora laborado
em atividades campesinas até o ano de 2000, em função de não restar comprovado o
recolhimento das respectivas contribuições, o tempo contributivo deverá ser limitado ao período
de 01.01.1987 a 31.10.1991.
Da atividade especial.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação
aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi
efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a
disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo
Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de
contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se
verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que "(...) A relação de atividades
profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...)". Com a
edição da Medida Provisória nº 1.523/96, tal dispositivo legal teve sua redação alterada, com a
inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
"Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes
prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da
aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.
§ 1º a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante
formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela
empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho
expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
§ 2º Deverão constar do laudo técnico referido no parágrafo anterior informação sobre a
existência de tecnologia de proteção coletiva que diminua a intensidade do agente agressivo a
limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo.
§ 3º A empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos
existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de
comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à
penalidade prevista no art. 133 desta Lei.
§ 4º A empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abrangendo as
atividades desenvolvidas pelo trabalhador, e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de
trabalho, cópia autêntica deste documento (...)".
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida
pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na
MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados
os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação foi definida apenas com a edição do
Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV). Ocorre que, em se tratando de matéria
reservada à lei, tal disposição somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de
10.12.1997, razão pela qual a apresentação de laudo técnico só pode ser exigida a partir dessa
ultima data. Nesse sentido é o entendimento majoritário do E. STJ:
"PREVIDENCIÁRIO - RECURSO ESPECIAL - APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO -
CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM - POSSIBILIDADE - LEI
8.213/91 - LEI 9.032/95 - LAUDO PERICIAL INEXIGÍVEL - LEI 9.528/97.
(...)
- A Lei nº 9.032/95 que deu nova redação ao art. 57 da Lei 8.213/91 acrescentando seu § 5º,
permitiu a conversão do tempo de serviço especial em comum para efeito de aposentadoria
especial. Em se tratando de atividade que expõe o obreiro a agentes agressivos, o tempo de
serviço trabalhado pode ser convertido em tempo especial, para fins previdenciários.
- A necessidade de comprovação da atividade insalubre através de laudo pericial, foi exigida após
o advento da Lei 9.528, de 10.12.97, que convalidando os atos praticados com base na Medida
Provisória nº 1.523, de 11.10.96, alterou o § 1º, do art. 58, da Lei 8.213/91, passando a exigir a
comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, mediante formulário, na
forma estabelecida pelo INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico
das condições ambientais do trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de
segurança do trabalho. Tendo a mencionada lei caráter restritivo ao exercício do direito, não pode
ser aplicada à situações pretéritas, portanto no caso em exame, como a atividade especial foi
exercida anteriormente, ou seja, de 17.11.75 a 19.11.82, não está sujeita à restrição legal.
- Precedentes desta Corte.
- Recurso conhecido, mas desprovido" (STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge
Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482).
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo
sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada
até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação
dos informativos SB-40 e DSS-8030 (exceto para o agente nocivo ruído, por depender de prova
técnica).
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não
havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre
as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em
período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a
redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente
o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último
dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível
de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o
referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à
saúde. Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo
de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º,
que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência
Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o
disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição
a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao C. Superior Tribunal de Justiça que, no
julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do
Código de Processo Civil (Recurso Especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade
de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para
85 decibéis, na forma que segue:
"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E
RESOLUÇÃO STJ 8/2008. DESAFETAÇÃO DO PRESENTE CASO. PREVIDENCIÁRIO.
REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO
PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
1. Considerando que o Recurso especial 1.398.260/PR apresenta fundamentos suficientes para
figurar como representativo da presente controvérsia, este recurso deixa de se submeter ao rito
do art.543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008.
2. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela
vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel.
Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman
Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC.
3. O limite de tolerância para configuração da especial idade do tempo de serviço para o agente
ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto
2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, não sendo possível aplicação retroativa do
Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB
(ex-LICC). Precedentes do STJ.
4. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço especial implica indeferimento do
pedido de aposentadoria especial por falta de tempo de serviço.
5. Recurso especial provido" (REsp 1401619/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA
SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Dessa forma, deve-se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a nível de ruído superior
a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, superior a 90 decibéis e, a partir de então, superior a
85 decibéis.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº
9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a
identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho,
sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes
do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado
posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente
porque a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar
com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica tende a propiciar
condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época
da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com
repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de
atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-
se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao
caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído,
que podem ser assim sintetizadas: "i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial
pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o
Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente
nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de
tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP),
no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo
de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe
equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte
auditiva, mas também óssea e outros órgãos".
NO CASO DOS AUTOS, a controvérsia colocada engloba tanto a averbação de atividade rurícola
já analisada quanto o reconhecimento da natureza especial dos períodos de 03.10.1977 a
19.11.1977, 24.11.1977 a 28.04.1979, 02.05.1979 a 13.10.1979, 24.10.1979 a 25.03.1982,
17.05.1982 a 15.12.1982, 16.12.1982 a 31.12.1983, 02.01.1984 a 02.01.1984 e01.01.1987 a
31.10.1991.
Em relação aos intervalos de 24.10.1979 a 25.03.1982, 17.05.1982 a 15.12.1982, 16.12.1982 a
31.12.1983 e 02.01.1984 a 02.01.1984, verifico que a demandante exerceu atividades em
estabelecimentos do ramo agropecuário (ID 49123088 –pág. 4 e ID 49123103 – pág. 20), razão
por que devem ser enquadrados como especiais, nos termos do código 2.2.1 do Decreto nº
53.831/64.
Por fim, no tocante aos demais interregnos, inexiste comprovação do trabalho em setor
agropecuário, tampouco a demonstração da especialidade do labor desenvolvido, motivo por que
devem ser contabilizados como atividades comuns.
Sendo assim, somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos,
totaliza a parte autora 21 (vinte e um) anos, 08 (oito) meses e 23 (vinte e três) dias de tempo de
contribuição até a data do requerimento administrativo (DER 30.11.2016), observado o conjunto
probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
Destarte, a parte autora não faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição.
Honorários advocatícios conforme fixados em sentença.
Diante de todo o exposto, dou parcial provimento às apelações, para limitar o reconhecimento do
trabalho rural desenvolvido pela parte autora, sem registro em CTPS, ao período de 01.01.1987 a
31.10.1991, bem como reconhecer o exercício de atividade especial nos intervalos de 24.10.1979
a 25.03.1982, 17.05.1982 a 15.12.1982, 16.12.1982 a 31.12.1983 e 02.01.1984 a 02.01.1984,
tudo na forma acima explicitada.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL
PARCIALMENTE COMPROVADA. NATUREZA ESPECIAL DO TRABALHO RECONHECIDA.
SETOR AGROPECUÁRIO. REGULAR ENQUADRAMENTO NORMATIVO. POSSIBILIDADE DE
CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM MEDIANTE APLICAÇÃO DO FATOR
PREVISTO NA LEGISLAÇÃO. TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO INSUFICIENTE. BENEFÍCIO
INDEVIDO.
1. A aposentadoria especial é devida ao segurado que tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20
(vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física (art. 64 do Decreto nº 3.048/99). E a aposentadoria
por tempo de contribuição, conforme art. 201, § 7º, da constituição Federal, com a redação dada
pela EC nº 20/98, é assegurada após 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30
(trinta) anos de contribuição, se mulher. Nos dois casos, necessária, ainda, a comprovação da
carência e da qualidade de segurado.
2. Ante o conjunto probatório, restou demonstrada a regular atividade rural da parte autora, sem
registro em CTPS, no período de 01.01.1987 a 31.10.1991, devendo ser procedida a contagem
de tempo de serviço cumprido no citado interregno, independentemente do recolhimento das
respectivas contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência, nos termos do art. 55,
parágrafo 2º, da Lei nº 8.213/91. Por outro lado, o labor sem registro exercido a partir da
competência de novembro de 1991 (art. 55, §2º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 60, X, do Decreto
3.048/99), tem o seu reconhecimento restrito às hipóteses previstas nos artigos 39, inciso I, e 143
da referida lei, que não contempla a mera averbação de tempo de serviço rural sem registro em
CTPS, na qualidade de segurado especial, para o fim de obtenção do benefício da aposentadoria
por tempo de contribuição. Assim, para a contagem do tempo de serviço do trabalhador rural sem
registro em CTPS, posterior a 31.10.1991, torna-se imprescindível o recolhimento das
contribuições previdenciárias. Desse modo, não obstante o depoimento das testemunhas
apontarem ter a parte autora laborado em atividades campesinas até o ano de 2000, em função
de não restar comprovado o recolhimento das respectivas contribuições, o tempo contributivo
deverá ser limitado ao período de 01.01.1987 a 31.10.1991.
3. A legislação aplicável para caracterização da natureza especial é a vigente no período em que
a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, ser levada em
consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até
05.03.1997 e, após, pelos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.049/99.
4. Os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo
revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas
normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
5. A atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pode
ser considerada especial, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então,
era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos
informativos SB-40 e DSS-8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova
técnica.
6. É de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de
06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a
ruídos de 85 decibéis.
7. Efetivo exercício de atividades especiais comprovado por meio de formulários de insalubridade
e laudos técnicos que atestam a exposição a agentes agressores à saúde, em níveis superiores
aos permitidos em lei.
8. No caso dos autos, a controvérsia colocada engloba tanto a averbação de atividade rurícola já
analisada quanto o reconhecimento da natureza especial dos períodos de 03.10.1977 a
19.11.1977, 24.11.1977 a 28.04.1979, 02.05.1979 a 13.10.1979, 24.10.1979 a 25.03.1982,
17.05.1982 a 15.12.1982, 16.12.1982 a 31.12.1983, 02.01.1984 a 02.01.1984 e 01.01.1987 a
31.10.1991. Em relação aos intervalos de 24.10.1979 a 25.03.1982, 17.05.1982 a 15.12.1982,
16.12.1982 a 31.12.1983 e 02.01.1984 a 02.01.1984, verifico que a demandante exerceu
atividades em estabelecimentos do ramo agropecuário (ID 49123088 –pág. 4 e ID 49123103 –
pág. 20), razão por que devem ser enquadrados como especiais, nos termos do código 2.2.1 do
Decreto nº 53.831/64. Por fim, no tocante aos demais interregnos, inexiste comprovação do
trabalho em setor agropecuário, tampouco a demonstração da especialidade do labor
desenvolvido, motivo por que devem ser contabilizados como atividades comuns.
9. Somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a
parte autora 21 (vinte e um) anos, 08 (oito) meses e 23 (vinte e três) dias de tempo de
contribuição até a data do requerimento administrativo (DER 30.11.2016).
10. Destarte, a parte autora não faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição.
11. Honorários advocatícios conforme fixados em sentença.
12. Apelações parcialmente providas. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento às apelações, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
