
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5099335-18.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROGERIO ZACCHI FERLA
Advogados do(a) APELADO: LUIZA SEIXAS MENDONCA - SP280955-N, MAURICIO PEREIRA - SP416862-N
OUTROS PARTICIPANTES:
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5099335-18.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROGERIO ZACCHI FERLA
Advogados do(a) APELADO: LUIZA SEIXAS MENDONCA - SP280955-N, MAURICIO PEREIRA - SP416862-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO:
Trata-se de ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o reconhecimento de atividades em condições insalubres, para fins de concessão do benefício de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença (ID 306489000) julgou procedente o pedido, para reconhecer como especiais os períodos de 01/02/1994 a 31/07/2000 e de 01/05/2002 a 31/12/2019 e condenar o INSS a conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com renda mensal calculada nos termos do artigo 29 da Lei de Benefícios, desde a data do requerimento administrativo (14/12/2021), com o pagamento dos atrasados de uma só vez, incidindo correção monetária e juros de mora desde a data da citação. Determinou que as prestações vencidas devem ser corrigidas monetariamente pelos índices do IPCA-E desde a data em que cada verba deveria ter sido paga e juros de mora segundo os índices de remuneração da caderneta de poupança a contar da citação, nos termos do julgamento com repercussão geral do Tema 810 proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal em 20/09/2017. No entanto, a partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, para fins de atualização monetária e compensação da mora, determinou a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente. Condenou o INSS a arcar com as despesas processuais, não abrangidas pela isenção de que goza, bem como com os honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, até a data da sentença, afastada a incidência nas vincendas, em razão do disposto na Súmula 111 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
O INSS interpôs apelação (ID 306489005), requerendo, em preliminar, a suspensão do processo, em razão do Recurso Extraordinário nº 1.368.225/RS, vez que se discute se a atividade exercida pela parte autora é ou não perigosa e pugna pelo conhecimento da remessa oficial. No mérito, sustenta que a exposição ao agente nocivo não é permanente e nem habitual, bem como que a periculosidade não expõe o trabalhador a uma perda acentuada de sua capacidade laboral pelo exercício continuado da atividade profissional. Aduz também que a periculosidade não é considerada mais um agente nocivo desde 06/03/1997. Eventualmente, requer seja declarada a vedação à conversão de tempo especial em comum após 13/11/2019. Aduz que a parte autora não preencheu todos os requisitos legais para a obtenção do benefício. Requer a improcedência do pedido. Subsidiariamente, requer a observância da prescrição quinquenal; a intimação da parte autora para firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo I da Portaria INSS nº 450, de 03 de abril de 2020, em observância às regras de acumulação de benefícios estabelecida no art. 24, §§ 1.º e 2.º da Emenda Constitucional 103/2019; a fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ; a declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias; o desconto dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período e a cobrança de eventuais valores pagos em sede de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada. Faz prequestionamentos para fins recursais.
Com as contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal.
É o relatório.
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5099335-18.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROGERIO ZACCHI FERLA
Advogados do(a) APELADO: LUIZA SEIXAS MENDONCA - SP280955-N, MAURICIO PEREIRA - SP416862-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO:
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado, mostra-se formalmente regular, motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação (art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
De início, rejeito a matéria preliminar arguida pelo INSS, com relação à suspensão do processo em razão do Recurso Extraordinário nº 1.368.225/RS, visto que tal recurso versa sobre a possibilidade de reconhecimento da atividade especial do vigia/vigilante, sendo referida matéria estranha aos presentes autos.
No mais, cumpre observar que, embora a sentença tenha sido desfavorável ao INSS, não se encontra condicionada ao reexame necessário, considerados o valor do benefício e o lapso temporal de sua implantação, não excedente a 1000 (mil) salários-mínimos (art. 496, §3º, I, do NCPC, CPC/2015).
Passo à análise de mérito.
A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91.
A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu artigo 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do citado artigo 25, inciso II.
Para aqueles que implementaram os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço até a data de publicação da EC nº 20/98 (16/12/1998), fica assegurada a percepção do benefício, na forma integral ou proporcional, conforme o caso, com base nas regras anteriores ao referido diploma legal.
Por sua vez, para os segurados já filiados à Previdência Social, mas que não implementaram os requisitos para a percepção da aposentadoria por tempo de serviço antes da sua entrada em vigor, a EC nº 20/98 impôs as condições constantes do seu artigo 9º, incisos I e II.
Ressalte-se, contudo, que as regras de transição previstas no artigo 9º, incisos I e II, da EC nº 20/98 aplicam-se somente para a aposentadoria proporcional por tempo de serviço, e não para a integral, uma vez que tais requisitos não foram previstos nas regras permanentes para obtenção do referido benefício.
Desse modo, caso o segurado complete o tempo suficiente para a percepção da aposentadoria na forma integral, faz jus ao benefício independentemente de cumprimento do requisito etário e do período adicional de contribuição previstos no artigo 9º da EC nº 20/98.
Por sua vez, para aqueles filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98, não há mais possibilidade de percepção da aposentadoria proporcional, mas apenas na forma integral, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Portanto, atualmente vigoram as seguintes regras para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição:
Segurados filiados à Previdência Social antes da EC nº 20/98:
a) têm direito à aposentadoria (integral ou proporcional), calculada com base nas regras anteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, e o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91 até 16/12/1998;
b) têm direito à aposentadoria proporcional, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91, além dos requisitos adicionais do art. 9º da EC nº 20/98 (idade mínima e período adicional de contribuição de 40%);
c) têm direito à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres;
Segurados filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98:
- têm direito somente à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e 30 (trinta) anos, para as mulheres.
O autor alega na inicial ter trabalhado em atividades em condições insalubres, resultando em tempo suficiente para a concessão da aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença reconheceu como especiais os períodos de 01/02/1994 a 31/07/2000 e de 01/05/2002 a 31/12/2019, concedendo a aposentadoria por tempo de contribuição em favor do autor.
Portanto, a controvérsia nos presentes autos refere-se ao reconhecimento do exercício de atividades especiais nos períodos supramencionados, para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Atividade Especial
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60.
O critério de especificação da categoria profissional com base na penosidade, insalubridade ou periculosidade, definidas por Decreto do Poder Executivo, foi mantido até a edição da Lei nº 8.213/91, ou seja, as atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo seriam consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico, bastando, assim, a anotação da função em CTPS ou a elaboração do então denominado informativo SB-40.
O Poder Executivo baixou os Decretos números 53.831/64 e 83.080/79, relacionando os serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
Embora o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 tenha limitado a aposentadoria especial às atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, o critério anterior continuou ainda prevalecendo.
De notar que, da edição da Lei nº 3.807/60 até a última CLPS, que antecedeu à Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço especial foi sempre definido com base nas atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo, como penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico.
A própria Lei nº 8.213/91, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo 152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da legislação em vigor para aposentadoria especial.
Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e Anexo IV), mas por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
Destaque-se que o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, deixou de fazer alusão a serviços considerados perigosos, insalubres ou penosos, passando a mencionar apenas atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, sendo que o artigo 58 do mesmo diploma legal, também em sua redação original, estabelecia que a relação dessas atividades seria objeto de lei específica.
A redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 9.032/95 sem que até então tivesse sido editada lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, não havendo dúvidas até então que continuavam em vigor os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. Nesse sentido, confira-se a jurisprudência: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
É de se ressaltar, quanto ao nível de ruído, que a jurisprudência já reconheceu que o Decreto nº 53.831/64 e o Decreto nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, ou seja, não houve revogação daquela legislação por esta, de forma que, constatando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado (STJ - REsp. n. 412351/RS; 5ª Turma; Rel. Min. Laurita Vaz; julgado em 21.10.2003; DJ 17.11.2003; pág. 355).
O Decreto nº 2.172/97, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 dB(A) como prejudicial à saúde.
Por tais razões, até ser editado o Decreto nº 2.172/97, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB(A) como agente nocivo à saúde.
Todavia, com o Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível voltou a ser de 85 dB(A) (art. 2º do Decreto nº 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Houve, assim, um abrandamento da norma até então vigente, a qual considerava como agente agressivo à saúde a exposição acima de 90 dB(A), razão pela qual vinha adotando o entendimento segundo o qual o nível de ruídos superior a 85 dB(A), a partir de 05/03/1997 caracterizava a atividade como especial.
Ocorre que o C. STJ, no julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do artigo 543-C do CPC, decidiu não ser possível a aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, de modo que no período de 06/03/1997 a 18/11/2003, em consideração ao princípio tempus regit actum, a atividade somente será considerada especial quando o ruído for superior a 90 dB(A) (STJ, REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 05/12/2014).
Destaco, ainda, que o uso de equipamento de proteção individual não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Nesse sentido, precedentes desta E. Corte (AC nº 2000.03.99.031362-0/SP; 1ª Turma; Rel. Des. Fed. André Nekatschalow; v.u; J. 19.08.2002; DJU 18.11) e do Colendo Superior Tribunal de Justiça: REsp 584.859/ES, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 18/08/2005, DJ 05/09/2005 p. 458).
No presente caso, da análise dos documentos juntados aos autos e de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, a parte autora comprovou o exercício de atividades especiais nos seguintes períodos:
- 01/02/1994 a 31/07/2000 e 01/05/2002 a 31/12/2019, vez que no exercício de sua função ficava exposto de modo habitual e permanente a tensão elétrica superior a 250 volts, sendo tal atividade enquadrada como especial com base no código 1.1.8 do Anexo III do Decreto 53.831/64, conforme PPP (ID 306488770, fls. 31/34), datado de 07/05/2021, e laudo pericial realizado em Juízo (ID 306488975).
Neste ponto, cumpre observar que, não obstante os Decretos números 2.172/97 e 3.048/99 tenham deixado de prever a eletricidade como agente nocivo para fins previdenciários, a jurisprudência tem entendido que a exposição ao referido agente não deixou de ser perigosa.
Neste sentido:
"PREVIDENCIÁRIO - MANDADO DE SEGURANÇA - APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO - SUSPENSÃO - ELETRICIDADE - ATIVIDADE ESPECIAL DESCONSIDERADA - ILEGALIDADE.
1 - Até sobrevir a regulamentação da Lei 9.032/95 pelo Decreto nº 2.172/97, continuaram aplicáveis os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79, no tocante aos agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física neles elencados.
2 - O fato de não constar no Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 a exposição à eletricidade, não significa que deixou de existir a possibilidade de aposentadoria especial por atividades perigosas.
3 - As atividades de risco, ainda quando delas não resultem danos diretos ao trabalhador, envolvem um maior desgaste emocional, pela tensão permanente a que o expõem, motivo pelo qual devem ser incluídas entre aquelas que causam danos à saúde, inclusive a saúde psíquica que, sabidamente, tem reflexos na saúde física do trabalhador.
4 - Admitido que as atividades perigosas se incluem na previsão constitucional (art. 202, § 1º, da Constituição Federal) e, igualmente, na previsão legal (art. 57 da Lei 8.213/91), e ausente a regulamentação administrativa de suas hipóteses, configura-se uma lacuna de regulamentação, que compete ao Judiciário preencher.
5 - A exposição ao risco de choques elétricos de voltagem superior a 250 volts não deixou de ser perigosa, só por não ter sido catalogada pelo Regulamento. Não é só potencialmente lesiva, como potencialmente letal, e o risco de vida, diário, constante, permanente, a que se submete o trabalhador, sem dúvida lhe ocasiona danos à saúde que devem ser compensados com a proporcional redução do tempo exigido para ser inativado.
6 - Comprovada a especialidade das atividades exercidas pelo segurado, é devida a conversão do respectivo tempo especial e sua soma ao período de atividade comum, na forma do § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, para fins de restabelecimento de aposentadoria.
7- Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais, em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial (Súmula nº 271 do STF)."
(TRF 4ª Região. Apelação em Mandado de Segurança n.º 2002.70.03.0041131/PR, 5ª Turma, Relator Juiz A. A. Ramos de Oliveira. DJU de 23/07/2003, p. 234)
A respeito do tema, vale destacar que o Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, ao dispor sobre a aposentadoria especial instituída pela Lei 3.807/60, considerou perigosa a atividade profissional sujeita ao agente físico "eletricidade", em instalações ou equipamentos elétricos com riscos de acidentes, tais como eletricistas, cabistas, montadores e outros, expostos à tensão superior a 250 volts (item 1.1.8 do anexo).
De seu lado, a Lei nº 7.369, de 20/09/1985, reconheceu a condição de periculosidade ao trabalhador do setor de energia elétrica, independentemente do cargo, categoria ou ramo da empresa.
A seguir, o Decreto nº 93.412, de 14/10/1986, regulamentou a Lei nº 7.369/85 para assegurar o direito à remuneração adicional ao empregado que permanecesse habitualmente na área de risco e em situação de exposição contínua, ou nela ingressasse de modo intermitente e habitual, onde houvesse equipamentos e instalações de cujo contato físico ou exposição aos efeitos da eletricidade que pudessem resultar incapacitação, invalidez permanente ou morte (arts. 1º e 2º), exceto o ingresso e permanência eventual, tendo referida norma especificada, ainda, as atividades e áreas de risco correspondentes, na forma de seu anexo.
Por fim, em decisão proferida em sede de Recurso Especial representativo de controvérsia repetitiva (REsp nº 1.306.113/SC, 1ª Seção, DJE 07/03/2013), o Colendo Superior Tribunal de Justiça acabou por reconhecer a especialidade da atividade sujeita ao agente eletricidade, ainda que referido agente nocivo tenha sido suprimido pelo Decreto nº 2.172/97.
Logo, deve ser mantido o reconhecimento como especiais dos períodos de 01/02/1994 a 31/07/2000 e de 01/05/2002 a 31/12/2019.
Registro que não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho em condições especiais à extemporaneidade de documento, pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual à constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica.
Por sua vez, cabe ressaltar que somente é possível a conversão do tempo especial em tempo de serviço comum com relação aos períodos anteriores ao advento da EC 103/2019.
Sendo o requerimento do benefício posterior à Lei 8.213/91, deve ser aplicado o fator de conversão de 1,40, mais favorável ao segurado, como determina o artigo 70 do Decreto nº 3048/99, com a redação dada pelo Decreto nº 4.827/03.
Os períodos registrados em CTPS são suficientes para garantir o cumprimento da carência, de acordo com a tabela do artigo 142 da Lei nº 8.213/1991.
Desse modo, computando-se os períodos especiais ora reconhecidos, convertidos em tempo comum, acrescidos dos períodos incontroversos constantes da CTPS e do CNIS, até a data anterior ao advento da EC 103/2019, perfazem-se mais de 35 (trinta e cinco) anos de tempo de contribuição, conforme planilha anexa, o que autoriza a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral, na forma do artigo 53, inciso II, da Lei nº 8.213/91, correspondente a 100% (cem por cento) do salário de benefício, com valor a ser calculado nos termos do artigo 29 da Lei nº 8.213/91, com redação dada pela Lei nº 9.876/99.
Assim, reconhece-se o direito da parte autora à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo, em 14/12/2021, data em que o réu tomou conhecimento da pretensão.
Verifica-se que o PPP (ID 306488770, fls. 31/34) apresentado no processo administrativo comprovou a atividade especial do autor, sendo que o laudo pericial, realizado em Juízo, apenas ratificou os dados do citado documento, razão pela qual não há que se falar em aplicação do Tema nº 1124 do C. STJ.
Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observado o quanto decidido pelo C. STF por ocasião do julgamento do RE 870947, sendo que a partir da promulgação da EC 113/2021, publicada em 09/12/2021, haverá a incidência da taxa Selic para fins de atualização monetária e compensação da mora, inclusive do precatório, uma única vez, até o efetivo pagamento, acumulado mensalmente.
O INSS deve arcar com o pagamento da verba honorária de sucumbência fixada no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento desta Turma (artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil/2015), aplicada, nos termos do julgamento do Tema Repetitivo 1105, a Súmula 111 do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidirão sobre o valor das prestações vencidas após a data da prolação da sentença ou, na hipótese de a pretensão do segurado somente ser deferida em sede recursal, não incidirão sobre as parcelas vencidas após a prolação da decisão ou acórdão.
O eventual pagamento de benefício previdenciário na via administrativa, seja ele total ou parcial, após a citação válida, não tem o condão de alterar a base de cálculo para os honorários advocatícios fixados na ação de conhecimento, que será composta pela totalidade dos valores devidos.
O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, inclusive honorários periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar custas recolhidas pela parte contrária, o que não é o caso dos autos, ante a gratuidade processual concedida (art. 4º, I e parágrafo único, da Lei 9.289/1996, art. 24-A da Lei 9.028/1995, n.r., e art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/1993).
Anote-se, ainda, a obrigatoriedade da dedução dos valores eventualmente pagos à parte autora após o termo inicial assinalado à benesse outorgada, ao mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993).
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou parcial provimento à apelação do INSS, apenas para determinar a conversão do tempo especial em comum até a data anterior ao advento da EC nº 103/2019, bem como para explicitar os consectários legais, mantida, no mais, a r. sentença, nos termos da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADES EM CONDIÇÕES ESPECIAIS COMPROVADAS. REQUISITOS PREENCHIDOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO ANTES DO ADVENTO DA EC 103/2019. MATÉRIA PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA
1. Rejeitada a matéria preliminar arguida pelo INSS, com relação à suspensão do processo em razão do Recurso Extraordinário nº 1.368.225/RS, visto que tal recurso versa sobre a possibilidade de reconhecimento da atividade especial do vigia/vigilante, sendo referida matéria estranha aos presentes autos.
2. No mais, cumpre observar que, embora a sentença tenha sido desfavorável ao INSS, não se encontra condicionada ao reexame necessário, considerados o valor do benefício e o lapso temporal de sua implantação, não excedente a 1000 (mil) salários-mínimos (art. 496, §3º, I, do NCPC, CPC/2015).
3. A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91. A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91.
4. No presente caso, da análise dos documentos juntados aos autos e de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, a parte autora comprovou o exercício de atividades especiais nos seguintes períodos: - 01/02/1994 a 31/07/2000 e 01/05/2002 a 31/12/2019, vez que no exercício de sua função ficava exposto de modo habitual e permanente a tensão elétrica superior a 250 volts, sendo tal atividade enquadrada como especial com base no código 1.1.8 do Anexo III do Decreto 53.831/64, conforme PPP (ID 306488770, fls. 31/34), datado de 07/05/2021, e laudo pericial realizado em Juízo (ID 306488975).
5. Cumpre observar que, não obstante os Decretos números 2.172/97 e 3.048/99 tenham deixado de prever a eletricidade como agente nocivo para fins previdenciários, a jurisprudência tem entendido que a exposição ao referido agente não deixou de ser perigosa.
6. Por sua vez, cabe ressaltar que somente é possível a conversão do tempo especial em tempo de serviço comum com relação aos períodos anteriores ao advento da EC 103/2019.
7. Computando-se os períodos especiais ora reconhecidos, convertidos em tempo comum, acrescidos dos períodos incontroversos constantes da CTPS e do CNIS, até a data anterior ao advento da EC 103/2019, perfazem-se mais de 35 (trinta e cinco) anos de tempo de contribuição, conforme planilha anexa, o que autoriza a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral, na forma do artigo 53, inciso II, da Lei nº 8.213/91, correspondente a 100% (cem por cento) do salário de benefício, com valor a ser calculado nos termos do artigo 29 da Lei nº 8.213/91, com redação dada pela Lei nº 9.876/99.
8. Assim, reconhece-se o direito da parte autora à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo, em 14/12/2021, data em que o réu tomou conhecimento da pretensão.
9. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observado o quanto decidido pelo C. STF por ocasião do julgamento do RE 870947, sendo que a partir da promulgação da EC 113/2021, publicada em 09/12/2021, haverá a incidência da taxa Selic para fins de atualização monetária e compensação da mora, inclusive do precatório, uma única vez, até o efetivo pagamento, acumulado mensalmente.
10. O INSS deve arcar com o pagamento da verba honorária de sucumbência fixada no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento desta Turma (artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil/2015), aplicada, nos termos do julgamento do Tema Repetitivo 1105, a Súmula 111 do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidirão sobre o valor das prestações vencidas após a data da prolação da sentença ou, na hipótese de a pretensão do segurado somente ser deferida em sede recursal, não incidirão sobre as parcelas vencidas após a prolação da decisão ou acórdão. O eventual pagamento de benefício previdenciário na via administrativa, seja ele total ou parcial, após a citação válida, não tem o condão de alterar a base de cálculo para os honorários advocatícios fixados na ação de conhecimento, que será composta pela totalidade dos valores devidos.
11. O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, inclusive honorários periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar custas recolhidas pela parte contrária, o que não é o caso dos autos, ante a gratuidade processual concedida (art. 4º, I e parágrafo único, da Lei 9.289/1996, art. 24-A da Lei 9.028/1995, n.r., e art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/1993).
12. Anote-se, ainda, a obrigatoriedade da dedução dos valores eventualmente pagos à parte autora após o termo inicial assinalado à benesse outorgada, ao mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993).
13. Matéria preliminar rejeitada. Apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL