
| D.E. Publicado em 09/03/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida, dar parcial provimento à apelação autárquica, e negar provimento ao recurso adesivo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0040469-83.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
A parte autora ajuizou a presente ação em 24/09/2014 em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando, em síntese, o reconhecimento de período laborado em atividade rural, bem como o reconhecimento e conversão de períodos de labor exercidos sob condições especiais, que, somado a tempo de labor incontroverso, autorizaria a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Documentos acostados à exordial (fls. 16-96).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 97).
Citação, em 15/10/2014 (fl. 98).
Audiência de Instrução e Julgamento (fls. 131-133).
A r. sentença, prolatada em 05/02/2016, julgou procedente o pedido, reconhecendo o labor rural da parte autora exercido no período de 29/05/1972 a 11/05/1977, condenando a autarquia federal à proceder a averbação do referido período, determinando conversão de períodos de trabalho realizados sob condições especiais em tempo comum ("16/06/1977 a 30/09/1977, 01/10/1977 a 31/12/1977, 02/01/1978 a 20/12/1978, 24/06/1979 a 31/03/1981, 01/04/1981 30/04/1985, 01/05/1985 a 30/03/1987, 13/11/1989 a 18/08/1990, 16/11/1990 a 31/07/1991, 01/06/1991 a 31/08/1992 e, 01/09/1992 a 01/03/1995"), e deferindo o pleito de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do pedido administrativo, 09/10/2013. As prestações em atraso deverão ser pagas de uma só vez, corrigidas monetariamente desde os respectivos vencimentos; os juros moratórios devem ser calculados com base no índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, nos termos da regra do art. 1º F da Lei 9.494/07, com redação da Lei 11.960/09. Já a correção monetária, por força da declaração de inconstitucionalidade parcial do art. 5º da Lei 11.960/09, deverá ser calculada com base no IPCA, índice que melhor reflete a inflação acumulada no período. Condenada também a autarquia federal ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 15% do valor dado à causa, monetariamente corrigidos (fls. 142-146).
Inconformado, o INSS interpôs recurso de apelação. Preliminarmente, aduz ser ilíquida a sentença prolatada, portanto, obrigatória a submissão do decisum ao reexame necessário. No mérito, requer a reforma total do julgado, à falta de comprovação do labor rural no período declinado pelo autor na exordial (fls. 150-171).
Contrarrazões da parte autora (fls. 175-192).
A parte autora interpôs recurso adesivo, no qual requer a majoração da verba honorária para 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, que compreende as parcelas vencidas até a data da sentença (fls. 193-196).
Sem contrarrazões da autarquia federal, subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0040469-83.2016.4.03.9999/SP
VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Inicialmente, sob análise a matéria preliminar arguida. Assim, quanto à remessa oficial, a qual foi submetida a r. sentença pelo douto Juiz a quo, seguem as seguintes considerações:
1. DA REMESSA OFICIAL
O novo Estatuto processual trouxe inovações no tema da remessa ex officio, mais especificamente, estreitou o funil de demandas cujo trânsito em julgado é condicionado ao reexame pelo segundo grau de jurisdição, para tanto elevou o valor de alçada, verbis:
Convém recordar que no antigo CPC, dispensava do reexame obrigatório a sentença proferida nos casos CPC, art. 475, I e II sempre que a condenação, o direito controvertido, ou a procedência dos embargos em execução da dívida ativa não excedesse a 60 (sessenta) salários mínimos. Contrario sensu, aquelas com condenação superior a essa alçada deveriam ser enviadas à Corte de segundo grau para que pudesse receber, após sua cognição, o manto da coisa julgada.
Pois bem. A questão que se apresenta, no tema Direito Intertemporal, é de se saber se as demandas remetidas ao Tribunal antes da vigência do Novo Diploma Processual - e, consequentemente, sob a égide do antigo CPC -, vale dizer, demandas com condenações da União e autarquias federais em valor superior a 60 salários mínimos, mas inferior a 1.000 salários mínimos, se a essas demandas aplicar-se-ia o novel Estatuto e com isso essas remessas não seriam conhecidas (por serem inferiores a 1.000 SM), e não haveria impedimento - salvo recursos voluntários das partes - ao seu trânsito em julgado; ou se, pelo contrario, incidiria o antigo CPC (então vigente ao momento em que o juízo de primeiro grau determinou envio ao Tribunal) e persistiria, dessa forma, o dever de cognição pela Corte Regional para que, então, preenchida fosse a condição de eficácia da sentença.
Para respondermos, insta ser fixada a natureza jurídica da remessa oficial.
Natureza Jurídica Da Remessa Oficial
Cuida-se de condição de eficácia da sentença, que só produzirá seus efeitos jurídicos após ser ratificada pelo Tribunal.
Portanto, não se trata o reexame necessário de recurso, vez que a legislação não a tipificou com essa natureza processual.
Apenas com o reexame da sentença pelo Tribunal haverá a formação de coisa julgada e a eficácia do teor decisório.
Ao reexame necessário aplica-se o principio inquisitório (e não o principio dispositivo, próprio aos recursos), podendo a Corte de segundo grau conhecer plenamente da sentença e seu mérito, inclusive para modificá-la total ou parcialmente. Isso ocorre por não ser recurso, e por a remessa oficial implicar efeito translativo pleno, o que, eventualmente, pode agravar a situação da União em segundo grau.
Finalidades e estrutura diversas afastam o reexame necessário do capítulo recursos no processo civil.
Em suma, constitui o instituto em "condição de eficácia da sentença", e seu regramento será feito por normas de direito processual.
Direito Intertemporal
Como vimos, não possuindo a remessa oficial a natureza de recurso, na produz direito subjetivo processual para as partes, ou para a União. Esta, enquanto pessoa jurídica de Direito Publico, possui direito de recorrer voluntariamente. Aqui temos direitos subjetivos processuais. Mas não os temos no reexame necessário, condição de eficácia da sentença que é.
A propósito oportuna lição de Nelson Nery Jr.:
Por consequência, como o Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferior a 1000 salários mínimos, esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, inobstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.
2. DA NULIDADE DA SENTENÇA ULTRA PETITA
A parte autora pretende a conversão de períodos de trabalho realizados sob condições especiais em tempo comum nos períodos de 12/05/1977 a 13/08/1977, de 16/08/1977 a 31/12/1977, de 02/01/1978 a 20/12/1978, de 24/07/1979 a 31/03/1981, de 01/01/1979 a 27/02/1979, de 24/07/1979 a 31/03/1981, de 01/04/1981 a 30/03/1987, de 01/04/1987 a 08/07/1979, de 13/11/1989 a 18/08/1990, e de 16/11/1990 a 01/03/1995.
Verifica-se que a r. sentença reconhecera o direito da parte autora à conversão de tempo de serviço especial como se comum fosse também dos períodos de 14/08/1977 a 15/08/1977, e de 24/06/1979 a 31/03/1981, intervalos esses não guerreados nesta demanda, consoante fls. 02/03 e 13 da petição inicial.
Cabe destacar que, nos termos do que rezam os artigos 128 e 460 do Código de Processo Civil, é defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
No caso em apreço, verifica-se essa ocorrência, dado que a sentença reconheceu como tempo de labor realizado sob condições especiais os períodos acima elencados, sendo caso, pois, de reduzi-la aos limites da discussão.
Nas palavras do ilustre jurista Humberto Theodoro Júnior:
Porém, entendo não ser o caso de se determinar a remessa dos autos à Vara de origem, para a prolação de nova decisão e, sim, de se passar ao exame das questões suscitadas.
A prolação de sentença ultra petita não impede a apreciação do pedido por esta Corte. Trata-se de questão em condições de imediato julgamento, cujo conhecimento atende aos princípios da celeridade e da economia processual, bem como encontra respaldo na Constituição Federal (art. 5º, LXXVIII, com a redação dada pela EC 45/04) e na legislação adjetiva (art. 515, § 3º, do CPC, em aplicação analógica).
Diante do exposto, a sentença merece reparo quanto à parte excedente, conformando-a a lide, mas sem expurgo da ordem jurídica, reduzindo-se-a aos limites do pedido, in casu, à análise da especialidade dos labores exercidos nos períodos de 12/05/1977 a 13/08/1977, de 16/08/1977 a 31/12/1977, de 02/01/1978 a 20/12/1978, de 01/01/1979 a 27/02/1979, de 24/07/1979 a 31/03/1981, de 01/04/1981 a 30/03/1987, de 01/04/1987 a 08/07/1979, de 13/11/1989 a 18/08/1990, e de 16/11/1990 a 01/03/1995.
Passo ao julgamento do mérito.
3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DA ATIVIDADE RURAL
Objetiva a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento do período de 29/05/1972 a 11/05/1977, laborado informalmente em atividade rural, sem qualquer interrupção, "sob o regime de economia familiar/trabalhador rural" (fls. 03 e 13).
3.2 DA POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DO LABOR RURAL DESENVOLVIDO A PARTIR DOS 12 ANOS DE IDADE
No que concerne ao cômputo de tempo de serviço, o artigo 55 e parágrafos, da Lei 8.213/91 preceituam o seguinte:
A lei, portanto, assegura a contagem de tempo de serviço, sem o respectivo registro, desde que acompanhada de prova material indiciária corroborada por prova testemunhal idônea.
Ressalto que a jurisprudência do E. STJ já se firmou no sentido de que é insuficiente apenas a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na forma da Súmula 149 do C. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
O demandante coligiu aos autos, como início de prova material da atividade rurícola realizada os seguintes documentos:
a) certidão de casamento do autor, ocorrido em 25/12/1976, na qual consta sua profissão à época, "lavrador" (fl. 23);
b) título eleitoral, expedido em 18/06/1976, do qual se extrai que o requerente exercia a profissão de lavrador (fl. 04);
c) certificado de dispensa de incorporação, em nome do requerente, emitido em 06/01/1977, no qual ele foi qualificado como lavrador (fl. 25);
d) certidão expedida pelo Juízo da 53ª Zona Eleitoral - Itapeva, no sentido de que consta da inscrição do autor, ocorrida em 18/06/1976, a profissão de lavrador (fl. 26);
e) carteira de trabalho do demandante, com vínculos de natureza rural nos seguintes períodos: 12/05/1977 a 13/08/1977, de 16/08/1977 a 31/12/1977, de 02/01/1978 a 20/12/1978, de 01/01/1979 a 27/02/1979, e de 24/07/1979 a 31/03/1981(fls. 27-37).
Não obstante o INSS costumeiramente deixar de reconhecer quaisquer documentos que não estejam elencados entre os do art. 106 da Lei 8.213/91, assentado entendimento jurisprudencial do STJ caminha em sentido contrário, considerando que a lista é meramente exemplificativa, abrindo a possibilidade de que o início de prova material não dependa da existência tão somente dos documentos mencionados. Destarte, documentos como certidão de casamento, de óbito, registro junto a sindicato local, etc. passam a representar um válido início de prova material, desde que sólida prova testemunhal amplie sua eficácia probatória, ou seja, permita que prospere o entendimento de que tal atividade teve seu início em determinado termo, mas não se restringiu àquele período.
Colaciono decisão conforme:
Ressalte-se que a jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que é insuficiente apenas a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na forma da Súmula 149 - STJ, in verbis:
Nesse diapasão, a seguinte ementa do E. STJ:
Não obstante, confrontados com a prova testemunhal ((fls. 131-133), os documentos anexados aos autos ganham credibilidade para ratificar parte do período alegado de exercício de atividade rural pelo demandante, mais especificamente, o período de 01/01/1976 a 11/05/1977, e isso porque além de não haver prova material indiciária no tocante ao restante do período pretendido, as testemunhas não lograram declinar quaisquer característica do labor exercido pelo autor sob o regime de economia familiar (nomes dos familiares, culturas existentes, período de trabalho, etc), porquanto não poderia ser outro o trabalho rural exercido por uma criança de dez a quatorze anos.
Diante do exposto, considero devidamente comprovados o seguinte período de labor em atividades de natureza rural, que não teria sido reconhecido pela autarquia federal: de 01/01/1976 a 11/05/1977, e determino ao réu a averbação do referido período.
4. DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
A concessão da aposentadoria por tempo de serviço está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei 8.213/91, in verbis:
O período de carência é também requisito legal para obtenção do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, dispondo o artigo 25 do mesmo diploma legal, in verbis:
O artigo 55 da Lei 8.213/91 determina que o cômputo do tempo de serviço para o fim de obtenção de benefício previdenciário se obtém mediante a comprovação da atividade laborativa vinculada ao Regime Geral da Previdência Social, na forma estabelecida em Regulamento.
No que se refere ao tempo de serviço de trabalho rural anterior à vigência da Lei 8.213/91, assim prevê o artigo 55, em seu parágrafo 2º:
Ressalte-se que, pela regra anterior à Emenda Constitucional nº 20, de 16/12/1998, que a aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, na forma proporcional, será devida ao segurado que completou 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo masculino, antes da vigência da referida Emenda, uma vez assegurado seu direito adquirido (Lei 8.213/91, art. 52).
Após a EC nº 20/98, aquele que pretender se aposentar com proventos proporcionais deve cumprir as seguintes condições: estar filiado ao RGPS quando da entrada em vigor da referida Emenda; contar com 53 (cinquenta e três) anos de idade, se homem, e 48 (quarenta e oito) anos de idade, se mulher; somar no mínimo 30 (trinta) anos, homem, e 25 (vinte e cinco) anos, mulher, de tempo de serviço, e adicionar o pedágio de 40% (quarenta por cento) sobre o tempo faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria integral.
Comprovado o exercício de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria na forma integral, pelas regras anteriores à EC nº 20/98, se preenchido o requisito temporal antes da vigência da Emenda, ou pelas regras permanentes estabelecidas pela referida Emenda, se após a mencionada alteração constitucional (Lei 8.213/91, art. 53, I e II).
O art. 4º da EC nº 20/98 estabelece que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente é considerado tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da previdência social (art. 55 da Lei 8.213/91).
Além do tempo de serviço, deve o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8.213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II.
Outra regra de caráter transitório veio expressa no artigo 142 da Lei 8.213/91 destinada aos segurados já inscritos na Previdência Social na data da sua publicação. Determina o número de contribuições exigíveis, correspondente ao ano de implemento dos demais requisitos tempo de serviço ou idade.
4.1 DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL
A jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para a caracterização do denominado serviço especial é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64, até 05/03/1997, e após pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei 9.032/95, conforme a seguir se verifica.
Ressalto que os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
O E. STJ já se pronunciou nesse sentido, através do aresto abaixo colacionado:
O art. 58 da Lei 8.213/91 dispunha, em sua redação original:
Até a promulgação da Lei 9.032/95, de 28 de abril de 1995, presume-se a especialidade do labor pelo simples exercício de profissão que se enquadre no disposto nos anexos dos regulamentos acima referidos, exceto para os agentes nocivos ruído, poeira e calor (para os quais sempre fora exigida a apresentação de laudo técnico).
Entre 28/05/1995 e 11/10/1996, restou consolidado o entendimento de ser suficiente, para a caracterização da denominada atividade especial, a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030, com a ressalva dos agentes nocivos ruído, calor e poeira.
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, em 11/10/1996, o dispositivo legal supra transcrito passou a ter a redação abaixo transcrita, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23/10/97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10/11/1997 e convertida na Lei 9.528, de 10/12/1997), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei 9.528, de 10/12/1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido, confira-se a jurisprudência:
Desta forma, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10/12/1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência vigente até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial o enquadramento pela categoria profissional (até 28/04/1995 - Lei 9.032/95), e/ou a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030.
Por fim, ainda no que tange a comprovação da faina especial, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, apto para comprovar o exercício de atividade sob condições especiais, de sorte a substituir o laudo técnico.
Além disso, a própria autarquia federal reconhece o PPP como documento suficiente para comprovação do histórico laboral do segurado, inclusive da faina especial, criado para substituir os formulários SB-40, DSS-8030 e sucessores. Reúne as informações do Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho - LTCAT e é de entrega obrigatória aos trabalhadores, quando do desligamento da empresa.
Outrossim, a jurisprudência desta Corte destaca a prescindibilidade de juntada de laudo técnico aos autos ou realização de laudo pericial, nos casos em que o demandante apresentar PPP, a fim de comprovar a faina nocente:
4.2 DA POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte consolidou-se no sentido da possibilidade de transmutação de tempo especial em comum, nos termos do art. 70, do Decreto 3.048/99, seja antes da Lei 6.887/80, seja após maio/1998, in verbis:
No mesmo sentido, a Súmula 50 da Turma Nacional de Uniformização Jurisprudencial (TNU), de 15/03/2012:
Ressalte-se que a possibilidade de conversão do tempo especial em comum, mesmo após 28/05/1998, restou pacificada no Superior Tribunal de Justiça, com o julgamento do recurso especial repetitivo número 1151363/MG, de relatoria do Min. Jorge Mussi, publicado no DJe em 05.04.11.
4.3 DO AGENTE NOCIVO RUÍDO
No que tange a caracterização da nocividade do labor em função da presença do agente agressivo ruído, faz-se necessária a análise quantitativa, sendo considerado prejudicial nível acima de 80 decibéis até 05/03/1997 (edição do Decreto 2.172/97); de 90 dB, até 18/11/2003 (edição do Decreto 4.882/03), quando houve uma atenuação, sendo que o índice passou a ser de 85 dB.
Ainda que tenha havido atenuação pelo Decreto nº 4.882/03, não se aceita a retroatividade da norma mais benéfica. Nesse sentido, a jurisprudência do STJ:
Também, no mesmo sentido, as Súmulas nº 32, da TNU, e nº 29, da AGU.
4.4 DO USO DE EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL
Quanto ao uso de equipamentos de proteção individual (EPIS), nas atividades desenvolvidas no presente feito, sua utilização não afasta a insalubridade. Ainda que minimize seus efeitos, não é capaz de neutralizá-lo totalmente. Nesse sentido, veja-se a Súmula nº 9 da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, segundo a qual "O uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o serviço especial prestado".
Outrossim, cumpre ressaltar que não é necessário que os documentos que demonstram a atividade insalubre sejam contemporâneos ao período de prestação do serviço, ante a falta de previsão legal para tanto. Nesse sentido:
4.5. PASSO A ANALISAR A ATIVIDADE ESPECIAL NO CASO CONCRETO
De 16/06/1977 a 13/08/1977 a parte autora laborou para o empregador (pessoa física) Valdir Zelindo Romano, estabelecido no Município de São Roque (SP), exercendo atividade de "trabalhador rural", conforme CTPS (fl. 28). Pretendendo comprovar a especialidade do labor exercido nesse período o autor apresentou formulário DSS-8030 emitido em 31/10/2003 (fl. 78) No entanto, o nome da empresa emitente (Siderúrgica Barra Mansa S/A, sucessora da Soc. Agrícola Santa Helena), e seu endereço - no Município de São Roque (SP), constantes no referido formulário, não correspondem ao vínculo registrado na carteira de trabalho apresentada. Consequentemente, considero imprestável o referido formulário como prova do labor especial exercido pelo autor para Valdir Zelindo Romano. Assim, o interstício em questão deve ser considerado tempo comum, porquanto nesse período a atividade de "trabalhador rural" não pode ser enquadrada como especial com base na categoria profissional, consoante fundamentação acima.
De 01/10/1977 a 31/12/1977 e de 02/01/1978 a 20/12/1978 o requerente laborou na empresa Cia Agrícola Santa Helena, tendo sido contratado para exercer o cargo de "Trabalhador Rural", consoante anotações em CTPS (fl. 28). Conforme formulário coligido aos autos (fl. 77), o autor exerceu, nos períodos acima, a atividade de "Tratorista Rural", realizando as seguintes atividades: "Transporte pesado de cargas, toretes de madeira da área de corte até o depósito, efetuando esses transportes em trator acoplado com carreta, trator tipo CBT, Massey Fergunson e Valmet", exposto, de forma habitual e permanente, a ruído de (média ponderada) de 94 dB (A), portanto, acima do nível de tolerância previsto em lei para o período, conforme fundamentação supra.
De 24/06/1979 a 31/03/1981, e de 01/04/1981 a 30/03/1987 a parte autora laborou na empresa Cia Sociedade Agrícola Santa Helena Ltda, onde exerceu as atividades, respectivamente, de "trabalhador rural" e "encarregado de campo", consoante anotações na CTPS (fl. 29).
De acordo com os formulários trazidos aos autos (fls. 78 e 79), o requerente executou, de 24/06/1979 a 31/03/1981, ao ar livre, "serviços de limpeza, desbrota de eucalyptus, capina e roçada", exposto aos agentes nocivos "calor, picadas de insetos e animais peçonhentos"; e de 01/04/1981 a 30/04/1985 (não obstante o contrato de trabalho tenha se estendido até 30/04/1987) exerceu o cargo de "Encarregado Corte c/ Moto Serra", executando as seguintes atividades: "Executava serviços de fiscalização de corte de madeira , derrubadas das arvores, medição de toras as madeira cortadas e limpeza de carreadores", exposto aos agentes nocivos "Calor, poeiras riscos de picadas de insetos e animais peçonhentos."
De 13/11/1989 a 18/08/1990 o demandante trabalhou na empresa Transportadora Horii Ltda, tendo sido contratado para exercer o cargo de motorista, conforme anotação em CTPS (fl. 32). O formulário coligido aos autos (fl. 80) comprova que o autor executava "transporte de cargas, toretes de madeiras, carvão acondicionados em sacos plásticos e transportes de materiais diversos, efetuando esses transportes em caminhão tipo Mercedes Bens 2013, Ford F600 e F9000."(g.n.).
De 16/11/1990 a 01/03/1995 o requerente laborou na empresa Cia Sociedade Agrícola Santa Helena Ltda, para exercer a atividade de "motorista", consoante anotação na sua CTPS (fl. 39). O formulário coligido aos autos (fl. 80) comprova que o autor executou, no período de 16/11/1990 a 31/07/1991 "transporte de cargas, toretes de madeiras, carvão acondicionados em sacos plásticos e transportes de materiais diversos, efetuando esses transportes em caminhão tipo Mercedes Bens 2013, Ford F600 e F9000."
O período supracitado, de 16/11/1990 a 31/07/1991, deve ser considerado como tempo de serviço especial, convertido em comum, e averbado pelo réu, o porquanto laborado como motorista, cujo enquadramento tem a previsão expressa no código 2.4.4 do quadro Anexo a que se refere o art. 2º do Decreto nº 53.831/64, bem como no código 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79, que classifica como penosas, as categorias profissionais: motorneiros e condutores de bondes; motorista e cobradores de ônibus; motoristas e ajudantes de caminhão.
5. DA CONTAGEM DO TEMPO NECESSÁRIO À APOSENTAÇÃO
Na data do pedido administrativo, em 09/10/2013 (fl. 16), a parte autora, nascida em 28/04/1958 (fl. 22), contava com 55 anos de idade.
Computando-se o período de labor rural reconhecido na presente ação (de 01/01/1976 a 11/05/1977), os interregnos acima referidos, sujeitos à conversão de especial para comum (de 01/10/1977 a 31/12/1977, de 02/01/1978 a 20/12/1978, de 13/11/1989 a 18/08/1990, e de 16/11/1990 a 31/07/1991), e os períodos incontroversos, constantes nas CTPS coligidas aos autos (fls. 27-37, 38-52 e de fls. 53-55) confrontadas com a pesquisa realizada no CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais (fls. 112-113.), verifica-se que, na data do pedido administrativo, 09/10/2013, parte autora, além de ter cumprido o requisito etário, possuía tempo suficiente (34 anos 01 mês e 21 dias) para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional, razão pela qual lhe defiro o benefício da aposentação na referida modalidade.
Ressalto que o período em que a parte autora trabalhou registrada é suficiente para lhe garantir o cumprimento da carência, de acordo com a tabela do artigo 142 da Lei 8.213/91.
6. CONSECTÁRIOS
Dada a sucumbência recíproca, cada parte pagará os honorários advocatícios de seus respectivos patronos e dividirá as custas processuais, respeitada a gratuidade conferida à autora e a isenção de que é beneficiário o réu.
Diante do exposto, rejeito a preliminar arguida, e dou parcial provimento à apelação autárquica, para limitar o reconhecimento do labor rural do autor ao interstício de 01/01/1976 a 11/05/1977, bem como restringir aos períodos de 01/10/1977 a 31/12/1977, de 02/01/1978 a 20/12/1978, de 13/11/1989 a 18/08/1990, e de 16/11/1990 a 31/07/1991, o reconhecimento do exercício de labor do requerente sob condições nocivas à saúde, e, por fim, nego provimento ao recurso adesivo da parte autora. Sucumbência recíproca.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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