
| D.E. Publicado em 28/06/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012953-88.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A parte autora ajuizou a presente ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS objetivando o reconhecimento de tempo laborado no meio rural, sem registro em CTPS, que, somado a tempo de labor com o devido registro legal, autorizaria a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço.
A sentença julgou procedente o pedido para, reconhecendo como de efetivo exercício de atividade rural o período de 02/06/1973 a 31/12/1993, determinar ao INSS a concessão do benefício almejado desde a data do requerimento administrativo. Foram fixados os consectários legais e afastado o reexame necessário.
O INSS interpôs apelação. Requer a reforma do julgado, sob o fundamento de que não foi comprovado o período laborado pela autora sem registro em CTPS, motivo pelo qual o postulante não faz jus à aposentadoria pleiteada. Caso mantida a procedência, pugnou pela fixação do termo inicial na data da citação e redução da verba honorária.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012953-88.2016.4.03.9999/SP
VOTO
No que se refere à comprovação do labor campesino, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o entendimento deste Relator no que diz respeito à valoração das provas comumente apresentadas:
- declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95;
- declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte;
- não alcança os fins pretendidos a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente;
- a mera demonstração, pela parte demandante, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido se trouxer a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor;
- a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades;
- têm-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248;
- a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais;
- na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar; ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos, de sua necessidade, que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido, ou a entrega, como forma de pagamento, pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar;
- de qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos;
- ressalte-se que o trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro; para ocorrer essa descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é suficiente à subsistência da família;
- o art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e sua aceitação;
- a lei não distinguiu entre trabalhadores urbanos e rurais, ao introduzir o preceito de que a perda da qualidade de segurado não infirma o direito à aposentadoria por tempo de contribuição ou por idade, se os requisitos do tempo de contribuição e da carência foram adimplidos em momento anterior;
- a circunstância, ainda, do artigo 3º da Lei nº 10.666/03 mencionar "tempo de contribuição" não exclui o rurícola, pois o legislador contentou-se aqui em explicitar o requisito geral, que é o da contribuição, nem por isso tencionando afastar de sua abrangência o trabalhador rural que, em alguns casos, por norma especial, é dispensado dos recolhimentos; ademais, o raciocínio albergado pela lei é aplicável do ponto de vista fático tanto aos urbanos como aos rurais, sendo de se invocar o brocardo Ubi eadem ratio ibi idem jus;
- a equiparação dos trabalhadores urbanos e rurais, para fins previdenciários, é garantia da Carta de 1988 e não pode ser olvidada, sem justificativa plausível, sob pena de ofensa ao princípio da isonomia e à previsão contida no seu art. 194, parágrafo único, II;
- no que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço, compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação; no caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições, tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, para empregador rural - pessoa física, ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio);
- por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Pois bem.
No intuito de fazer mostra de sua atividade rural, a parte autora colacionou aos autos cópias de documentos que indicam a condição de lavrador de seu cônjuge a partir do casamento, realizado em 1973 (certidão de casamento, CTPS, título de eleitor e certidão de nascimento da filha - fls. 32/40).
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira.
Entretanto, os documentos apresentados não têm o condão de comprovar o trabalho campesino por todo o período alegado.
Conquanto irrefutável a condição de trabalhador rural do cônjuge da autora até 28/02/1975, consoante cópia da CTPS presente a fls. 34, a partir de então não mais é possível afirmar a predominância do labor campesino por parte dele, pois o extrato do sistema CNIS presente a fls. 84 demonstra a existência de dois vínculos, no ano de 1977, junto a empresas de ramo dissociado da atividade rural (Cestari Industrial e Comercial S/A e Cica S/A). Aliados à ausência de cópias das folhas 11 e 12 de sua CTPS, esses fatos impossibilitam o reconhecimento do labor rural ininterrupto do cônjuge varão desde o matrimônio.
Os vínculos junto a Aurélio Nardini e à Secretaria de Agricultura e Abastecimento, a seu turno, são notoriamente de natureza urbana. O primeiro, como operário na fabricação de aguardente de cana e o segundo, como trabalhador braçal em órgão do serviço público estadual. Assim, inviável também o reconhecimento da atividade rural do cônjuge como segurado especial a partir de 21/06/1979, pois descaracterizada sua qualidade de rurícola desde então.
Observo, ademais, que a fls. 90 restou demonstrado que o marido da autora aposentou-se por idade, em 2008, na condição de servidor público.
Assim, confrontados com as provas testemunhais compromissadas, os documentos anexados aos autos ganham credibilidade somente para reconhecer o exercício de atividade rural pela demandante em parte do período almejado, mais especificamente entre a data do casamento e o fim do primeiro contrato de labor rural do cônjuge (02/06/1973 a 28/02/1975) e na vigência do segundo contrato rural (11/09/1978 a 01/03/1979).
Isso porque, embora possível a contagem do tempo rural anterior a 25/07/1991 para a obtenção de qualquer benefício do regime geral, independentemente de contribuição, com a ressalva de que dito tempo não se computa para efeito de carência (art. 55, § 2º, da Lei 8.213/91), a partir de 25/07/1991 é preciso que se prove terem sido recolhidas contribuições individuais , conforme pacífico entendimento jurisprudencial consubstanciado na Súmula 272 do E. STJ, o que não restou demonstrado no caso concreto.
A concessão de aposentadoria por tempo de serviço não exige apenas a comprovação de efetiva atividade rural, tal qual ocorre com os benefícios elencados no art. 39, inciso I, da Lei nº 8.213/91, mas sim a contribuição facultativa para os cofres da Previdência Social, nos termos do art. 39, inciso II, da referida lei, sendo certo que a contribuição incidente sobre a comercialização da produção, prevista no art. 25, inciso I, da Lei nº 8.212/91, não garante aos segurados especiais a obtenção de aposentadoria por tempo de serviço.
Como consequência das razões acima expendidas, tenho que o período a ser reconhecido como de efetiva labuta no campo, no caso dos autos, circunscreve-se aos interregnos de 02/06/1973 a 28/02/1975 e 11/09/1978 a 01/03/1979, sendo que, nos termos do art. 55, § 2º, da Lei 8.213/91, os interregnos em alusão não podem ser computados para fins de carência.
DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO
A concessão da aposentadoria por tempo de serviço está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91, in verbis:
O período de carência é também requisito legal para obtenção do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, dispondo o artigo 25 do mesmo diploma legal, in verbis:
O artigo 55 da Lei nº 8.213/91 determina que o cômputo do tempo de serviço para o fim de obtenção de benefício previdenciário se obtém mediante a comprovação da atividade laborativa vinculada ao Regime Geral da Previdência Social, na forma estabelecida em Regulamento.
No que se refere ao tempo de serviço de trabalho rural anterior à vigência da Lei nº 8.213/91, assim prevê o artigo 55, em seu parágrafo 2º:
Ressalte-se, pela regra anterior à Emenda Constitucional nº 20, de 16/12/98, que a aposentadoria por tempo de serviço, na forma proporcional, será devida ao segurado que completou 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo masculino, antes da vigência da referida Emenda, uma vez assegurado seu direito adquirido (Lei nº 8.213/91, art. 52).
Após a EC nº 20/98, aquele que pretende se aposentar com proventos proporcionais deve cumprir as seguintes condições: estar filiado ao RGPS quando da entrada em vigor da referida Emenda; contar com 53 (cinquenta e três) anos de idade, se homem, e 48 (quarenta e oito) anos de idade, se mulher; somar no mínimo 30 (trinta) anos, homem, e 25 (vinte e cinco) anos, mulher, de tempo de serviço, e adicionar o pedágio de 40% (quarenta por cento) sobre o tempo faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria integral.
Comprovado o exercício de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria na forma integral, pelas regras anteriores à EC nº 20/98, se preenchido o requisito temporal antes da vigência da Emenda, ou pelas regras permanentes estabelecidas pela referida Emenda, se após a mencionada alteração constitucional (Lei nº 8.213/91, art. 53, I e II).
O art. 4º da EC nº 20/98 estabelece que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente é considerado tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da previdência social (art. 55 da Lei nº 8.213/91).
Além do tempo de serviço, deve o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do art. 25, II, da Lei nº 8.213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II.
Outra regra de caráter transitório veio expressa no artigo 142 da Lei nº 8.213/91 destinada aos segurados já inscritos na Previdência Social na data da sua publicação. Determina o número de contribuições exigíveis, correspondente ao ano de implemento dos demais requisitos tempo de serviço ou idade.
No caso concreto, não reconhecida a integralidade do labor rural alegado, e considerando-se as contribuições previdenciárias que restaram incontroversas, até a data do requerimento administrativo a autora comprovou tempo insuficiente à concessão da benesse perseguida.
Assim sendo, reconheço o exercício em atividade rural nos períodos de 02/06/1973 a 28/02/1975 e 11/09/1978 a 01/03/1979, devendo o INSS proceder à sua averbação.
Impende ainda acrescentar que o tempo de serviço rural anterior à vigência da Lei n° 8.213/91 deve ser computado independentemente do recolhimento das respectivas contribuições, não podendo, entretanto, ser computado para efeito de carência, nos termos do artigo 55, parágrafo 2º c/c artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91.
Ante a sucumbência recíproca, cada uma das partes arcará com as despesas que efetuou, inclusive verba honorária de seus respectivos patronos, nos termos do art. 21 do Código de Processo Civil.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, para restringir aos períodos de 02/06/1973 a 28/02/1975 e 11/09/1978 a 01/03/1979 os interregnos efetivamente trabalhados nas lides rurais pela parte autora, devendo o INSS proceder à sua averbação para fins de futura concessão de benefícios, e julgar improcedente o pedido de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição".
É o voto.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 14/06/2016 18:33:26 |
