D.E. Publicado em 09/03/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0038176-43.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
A parte autora ajuizou a presente ação em 26/10/2015 em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando reconhecimento de período de labor rural em regime de economia familiar, e a concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição".
Data de nascimento da parte autora - 26/12/1957 (fl. 09).
Documentos (fls. 09/47).
Justiça gratuita concedida (fl. 50).
Citação em 30/11/2015 (fl. 58).
CNIS/Plenus (fls. 66/76).
Depoimentos colhidos em audiência (fls. 87/89).
A r. sentença prolatada em 25/05/2016 (fls. 90/94) julgou procedente o pedido inicial, reconhecendo atividade rural sob regime de economia familiar - a ser averbada pelo INSS - desde ano de 1969 até 15/07/1990 (em total de 21 anos, 06 meses e 14 dias), reconhecendo, ainda, o direito da parte autora à "aposentadoria por tempo de contribuição integral", desde a data da citação, com incidência de juros de mora e correção monetária sobre os atrasados; condenou-se o INSS ao pagamento de verba honorária em percentual de 10% sobre o montante apurado até a sentença. Tutela antecipada concedida. Remessa oficial não-determinada.
Inconformada, a autarquia previdenciária interpôs recurso de apelação (fls. 105/109), defendendo o reconhecimento da improcedência do pedido inaugural, sob alegação de que a documentação carreada aos autos não demonstrara a atividade laborativa no meio rural; noutra hipótese, pela redução do percentual honorário para 5%, incidente sobre parcelas vencidas, respeitada a Súmula 111 do C. STJ.
Com contrarrazões (fls. 113/115), subiram os autos a esta E. Corte.
É O RELATÓRIO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0038176-43.2016.4.03.9999/SP
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
De início, quanto à r. sentença, cumpre dar ênfase às datas, de sua prolação (aos 25/05/2016 - fl. 94) e ciência (disponibilização, via sistema informatizado, aos 06/06/2016 - fl. 96; e intimação pessoal do INSS, aos 19/07/2016 - fl. 104).
Senão vejamos.
Pretende a parte autora ver reconhecido nestes autos período laborativo rural, em regime de mesmo núcleo familiar, a partir do ano de 1969 e até o momento em que prestara tarefas laborativas urbanas; assevera fazer jus à concessão de "aposentadoria por tempo de contribuição", em face de todo o período totalizado, de seu ciclo laborativo.
Pois bem.
DA POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DO LABOR RURAL DESENVOLVIDO A PARTIR DOS 12 ANOS DE IDADE
Sedimentado o entendimento na jurisprudência dos tribunais superiores, de que a atividade rural do trabalhador menor, entre 12 (doze) e 14 (quatorze) anos, deve ser computada para fins previdenciários, eis que a proibição do trabalho ao menor de 14 anos foi estabelecida em seu benefício, e não em seu prejuízo. Nesse sentido colaciono os julgados:
DO RECONHECIMENTO DO LABOR RURAL
Mantenho sob análise o interstício reconhecido em sentença, correspondente a 26/12/1969 (desde os 12 anos de idade) até 15/07/1990 (que antecede labor anotado em CTPS).
No que se refere à comprovação do labor campesino, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o entendimento deste Relator no que diz respeito à valoração das provas comumente apresentadas:
- declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95;
- declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte;
- não alcança os fins pretendidos a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente;
- a mera demonstração, pela parte demandante, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido se trouxer a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor;
- a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades;
- têm-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248;
- a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais;
- na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar; ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos, de sua necessidade, que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido, ou a entrega, como forma de pagamento, pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar;
- de qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos;
- ressalte-se que o trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro; para ocorrer essa descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é suficiente à subsistência da família;
- o art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e sua aceitação;
- a lei não distinguiu entre trabalhadores urbanos e rurais, ao introduzir o preceito de que a perda da qualidade de segurado não infirma o direito à aposentadoria por tempo de contribuição ou por idade, se os requisitos do tempo de contribuição e da carência foram adimplidos em momento anterior;
- a circunstância, ainda, do artigo 3º da Lei nº 10.666/03 mencionar "tempo de contribuição" não exclui o rurícola, pois o legislador contentou-se aqui em explicitar o requisito geral, que é o da contribuição, nem por isso tencionando afastar de sua abrangência o trabalhador rural que, em alguns casos, por norma especial, é dispensado dos recolhimentos; ademais, o raciocínio albergado pela lei é aplicável do ponto de vista fático tanto aos urbanos como aos rurais, sendo de se invocar o brocardo Ubi eadem ratio ibi idem jus;
- a equiparação dos trabalhadores urbanos e rurais, para fins previdenciários, é garantia da Carta de 1988 e não pode ser olvidada, sem justificativa plausível, sob pena de ofensa ao princípio da isonomia e à previsão contida no seu art. 194, parágrafo único, II;
- no que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço, compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação; no caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições, tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, para empregador rural-pessoa física, ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio);
- por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Pois bem.
No intuito de fazer mostra de sua atividade laborativa rural - sob o manto da economia familiar - a parte autora colacionou aos autos cópias de documentos, quais sejam:
a) em nome de seu genitor, e aludindo à propriedade rural familiar "Sítio Três Coqueiros":
- certidão de matrícula do imóvel (fls. 22/32);
- revalidação de cadastro de produtor rural (fl. 41), com referência ao ano de 1986;
- notas fiscais de produtor rural (fls. 42/43), revelando a comercialização, em pequena escala, de produtos de origem agropecuária, nos anos de 1989 e 1993;
- certificado de cadastro de imóvel rural (fl. 46), dos anos de 1998/1999;
- ITR - Imposto Territorial Rural (fls. 34/40), dos anos de 2002, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008 e 2009;
- contribuição sindical de agricultor familiar (fl. 47), referente ao exercício 2007;
b) em nome próprio do autor:
- certidão de casamento (fl. 10), celebrado aos 23/07/1977, consignada a sua profissão como "lavrador";
- certificado de dispensa de incorporação (fl. 14), emitido aos 02/07/1979, declarada a profissão de "lavrador";
- certidão do nascimento da prole (fl. 13), aos 12/04/1983, com anotação da profissão paterna de "lavrador";
- ficha de cadastro relativa à solicitação do documento de identidade (fl. 15), em 28/12/1989, tendo sido declarada a profissão de "lavrador".
A jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que é insuficiente apenas a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na forma da Súmula 149 - STJ, in verbis:
Nesse diapasão, a seguinte ementa do E. STJ:
Quanto à prova oral produzida, logrou corroborar a documentação acostada, asseverando a fixação da parte autora no meio rural, desde idade tenra, laborando junto a familiares em lavouras como as de feijão e milho.
Não desconheço o teor do julgado proferido no REsp n. 1.348.633/SP entretanto, compulsando os autos, verifico que o teor dos depoimentos colhidos reputam-se fonte segura e robusta para acolhimento do período rural.
A propósito, colaciono o julgado do C. STJ:
E neste cenário, tenho para mim que o período rural a ser reconhecido corresponde a 26/12/1969 até 15/07/1990, independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem recíproca.
DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO.
A concessão da aposentadoria por tempo de serviço está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91, in verbis:
O período de carência é também requisito legal para obtenção do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, dispondo o artigo 25 do mesmo diploma legal, in verbis:
O artigo 55 da Lei nº 8.213/91 determina que o cômputo do tempo de serviço para o fim de obtenção de benefício previdenciário se obtém mediante a comprovação da atividade laborativa vinculada ao Regime Geral da Previdência Social, na forma estabelecida em Regulamento.
No que se refere ao tempo de serviço de trabalho rural anterior à vigência da Lei nº 8.213/91, assim prevê o artigo 55, em seu parágrafo 2º:
Ressalte-se, pela regra anterior à Emenda Constitucional nº 20, de 16/12/98, que a aposentadoria por tempo de serviço, na forma proporcional, será devida ao segurado que completou 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo masculino, antes da vigência da referida Emenda, uma vez assegurado seu direito adquirido (Lei nº 8.213/91, art. 52).
Após a EC nº 20/98, aquele que pretende se aposentar com proventos proporcionais deve cumprir as seguintes condições: estar filiado ao RGPS quando da entrada em vigor da referida Emenda; contar com 53 (cinquenta e três) anos de idade, se homem, e 48 (quarenta e oito) anos de idade, se mulher; somar no mínimo 30 (trinta) anos, homem, e 25 (vinte e cinco) anos, mulher, de tempo de serviço, e adicionar o pedágio de 40% (quarenta por cento) sobre o tempo faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria integral.
Comprovado o exercício de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria na forma integral, pelas regras anteriores à EC nº 20/98, se preenchido o requisito temporal antes da vigência da Emenda, ou pelas regras permanentes estabelecidas pela referida Emenda, se após a mencionada alteração constitucional (Lei nº 8.213/91, art. 53, I e II).
O art. 4º da EC nº 20/98 estabelece que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente é considerado tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da previdência social (art. 55 da Lei nº 8.213/91).
Além do tempo de serviço, deve o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do art. 25, II, da Lei nº 8.213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II.
Outra regra de caráter transitório veio expressa no artigo 142 da Lei nº 8.213/91 destinada aos segurados já inscritos na Previdência Social na data da sua publicação. Determina o número de contribuições exigíveis, correspondente ao ano de implemento dos demais requisitos tempo de serviço ou idade.
Passo a analisar o caso concreto:
Computando-se o período rural ora reconhecido, assim como demais períodos, tidos por incontroversos (CTPS, em fls. 16/21), totalizara-se mais de 35 anos de tempo de serviço, reconhecida a procedência do pedido de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", irretocável a r. sentença - laudas, na sequência deste decisum.
Referentemente à verba honorária, mantenho-a em percentual de 10% (dez por cento), esclarecendo sê-lo sobre as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ.
Isso posto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, apenas para esclarecer a apuração da verba honorária, nos moldes supraexpostos.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 20/02/2017 16:57:59 |