
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013548-62.2020.4.03.6183
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: JOSE IRIDIANO DA SILVA LEAL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: CRISTINA DE SOUZA SACRAMENTO - SP269119-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOSE IRIDIANO DA SILVA LEAL
Advogado do(a) APELADO: CRISTINA DE SOUZA SACRAMENTO - SP269119-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013548-62.2020.4.03.6183
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: JOSE IRIDIANO DA SILVA LEAL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: CRISTINA DE SOUZA SACRAMENTO - SP269119-A
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Advogado do(a) APELADO: CRISTINA DE SOUZA SACRAMENTO - SP269119-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando o reconhecimento, como especial, do período laborado em condições insalubres (9/3/1998 a 17/5/2019), para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
O juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a atividade especial exercida no período de 19/11/2003 a 17/05/2019. Considerando a sucumbência recíproca, condenou “o INSS e a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios (cf. artigos 85, § 14, e 86, parágrafo único, do CPC/2015), os quais, sopesados os critérios legais (incisos do § 2º do artigo 85), arbitro, respectivamente: (a) no valor de R$1.000,00 (um mil reais), com fulcro no § 8º do artigo 85, considerando inestimável o proveito econômico oriundo de provimento jurisdicional eminentemente declaratório; e (b) no percentual legal mínimo (cf. artigo 85, § 3º), incidente sobre o correspondente a metade do valor atualizado da causa (cf. artigo 85, § 4º, inciso III), observada a suspensão prevista na lei adjetiva (§§ 2º e 3º do artigo 98), por ser a parte beneficiária da justiça gratuita. Sem custas para a autarquia, em face da isenção de que goza, nada havendo a reembolsar, ainda, à parte autora, beneficiária da justiça gratuita.”
O INSS apela, insurgindo-se contra o reconhecimento da atividade especial. Subsidiariamente, requer a observância da prescrição quinquenal das parcelas, a intimação da parte autora para juntar a autodeclaração prevista no Anexo I da Portaria nº 450/2020 do INSS, a reforma da sentença com relação à correção monetária e juros moratórios, a redução do percentual dos honorários advocatícios, com limitação da base de cálculo nos termos da Súmula n.º 111/STJ, bem como isenção de custas e outras taxas judiciárias.
A parte autora apela, alegando, preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de defesa, pleiteando a anulação da sentença e devolução dos autos à vara de origem para produção da prova pericial. No mérito, aduz a procedência do pedido formulado na petição inicial.
Sem contrarrazões do autor, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013548-62.2020.4.03.6183
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: JOSE IRIDIANO DA SILVA LEAL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivos os recursos e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
Inicialmente, observa-se que o autor pleiteia o reconhecimento da atividade especial, no período de 9/3/1998 a 17/5/2019, laborado na empresa Celulose Irani S/A, bem como a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data de entrada do requerimento administrativo, em 15/1/2018.
O juízo a quo julgou improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição e considerou parcialmente procedente o pedido de reconhecimento da atividade especial no período de 19/11/2003 a 17/05/2019.
O autor apela, sustentando a ocorrência de cerceamento de defesa e pleiteando a anulação da sentença, com a devolução dos autos à vara de origem para produção da prova pericial.
Da análise dos autos, observa-se constar da CTPS (Id. 268123896, pp. 4) que o autor manteve vínculo empregatício com a empregadora Indústria de Papel e Papelão São Roberto S/A (atual Celulose Irani S/A), no período de 9/3/1998 a 15/8/2019, no cargo de “Auxiliar de Produção”, em estabelecimento “Industrial”.
No PPP juntado aos autos (Id. 268123897) consta que o recorrente trabalhou para a empresa acima mencionada, exercendo a função de Auxiliar de produção, no setor Onduladeira e realizando a atividade de “Colocar os palettes, direcionando até a esteira; Retirar chapas de papelão ondulado da esteira montando os palettes conforme altura especificada, a serem transportadas por empilhadeiras; Manter o ambiente de trabalho limpo e organizado”.
No entanto, consta do referido PPP a exposição a distintos níveis de ruído, sendo o menor de 85 dB(A) e o maior de 105,4 dB(A), a depender do período trabalhado, não sendo possível aferir o motivo pelo qual constatou-se a presença de diferentes decibéis, haja vista que a função, o setor trabalhado e a profissiografia foram exatamente os mesmos no período de 9/3/1998 a 17/5/2019.
Registre-se, a propósito, haver constado do PPP a observação de que, desde a admissão do autor até a data da elaboração dos laudos técnicos que serviram de base para a elaboração do referido formulário, “não houve mudanças do seu layout industrial. E durante todo esse período o mesmo trabalhou de maneira habitual e permanente, e não de forma ocasional e nem intermitente”.
Assim, tendo em vista a inconsistência verificada nos documentos acostados aos autos, mostra-se imprescindível, para viabilizar a análise do pedido de concessão do benefício vindicado, a realização da perícia técnica para a comprovação do efetivo exercício de atividade em condições agressivas, de forma habitual e permanente, idôneas a ocasionar danos à saúde ou à integridade física do trabalhador.
O juiz é o destinatário da prova e se entender que o conjunto probatório é insuficiente, pode determinar a produção daquelas necessárias à formação de seu convencimento, nos termos do art. 370 do CPC.
Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO REGRESSIVA. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. INCIDÊNCIA.
(...)
2. É firme a compreensão desta Corte no sentido de que, "sendo o juiz o destinatário da prova, cabe a ele, com base em seu livre convencimento, avaliar a necessidade desta, podendo determinar a sua produção até mesmo de ofício, conforme prevê o art. 130 do Código de Processo Civil' (AgRg no Ag 1.114.441/SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 16/12/2010, DJe 4/2/2011).
(...)
(AgRg no AREsp 512821/CE - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2014/0106400-1 - Ministro OG FERNANDES – SEGUNDA TURMA – Julgado em 18.06.2014 – Publicado no DJe de 25.06.2014)
Ademais, a jurisprudência tem admitido a utilização de perícia por similaridade, realizada em empresa com características semelhantes àquela em que se deu a prestação do serviço, quando impossível sua realização no próprio ambiente de trabalho do segurado.
Nesse sentido, é o entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. SÚMULA 284/STF. CÔMPUTO DE TEMPO ESPECIAL. PROVA TÉCNICA. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E NESSA PARTE PROVIDO.
(...)
2. A tese central do recurso especial gira em torno do cabimento da produção de prova técnica por similaridade, nos termos do art. 429 do CPC e do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/1991.
3. A prova pericial é o meio adequado e necessário para atestar a sujeição do trabalhador a agentes nocivos à saúde para seu enquadramento legal em atividade especial. Diante do caráter social da previdência, o trabalhador segurado não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção da prova técnica.
4. Quanto ao tema, a Segunda Turma já teve a oportunidade de se manifestar, reconhecendo nos autos do Recurso Especial 1.397.415/RS, de Relatoria do Ministro Humberto Martins, a possibilidade de o trabalhador se utilizar de perícia produzida de modo indireto, em empresa similar àquela em que trabalhou, quando não houver meio de reconstituir as condições físicas do local onde efetivamente prestou seus serviços.
5. É exatamente na busca da verdade real/material que deve ser admitida a prova técnica por similaridade. A aferição indireta das circunstâncias de labor, quando impossível a realização de perícia no próprio ambiente de trabalho do segurado é medida que se impõe.
6. A perícia indireta ou por similaridade é um critério jurídico de aferição que se vale do argumento da primazia da realidade, em que o julgador faz uma opção entre os aspectos formais e fáticos da relação jurídica sub judice, para os fins da jurisdição.
7. O processo no Estado contemporâneo tem de ser estruturado não apenas consoante as necessidades do direito material, mas também dando ao juiz e à parte a oportunidade de se ajustarem às particularidades do caso concreto.
8. Recurso especial conhecido em parte e nessa parte provido.
(REsp nº 1.370.229-RS, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, v.u., j. 25/02/14, DJe 11/03/14)
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO. PERÍCIA INDIRETA EM EMPRESA SIMILAR. LOCAL DE TRABALHO ORIGINÁRIO INEXISTENTE. POSSIBILIDADE.
1. “Mostra-se legítima a produção de perícia indireta, em empresa similar, ante a impossibilidade de obter os dados necessários à comprovação de atividade especial, visto que, diante do caráter eminentemente social atribuído à Previdência, onde sua finalidade primeira é amparar o segurado, o trabalhador não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção, no local de trabalho, de prova, mesmo que seja de perícia técnica”. (REsp 1.397.415/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 20.11.2013).
2. Agravo Regimental não provido.
(AgRg no REsp nº 1.422.399-RS, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, v.u., j. 18/03/14, DJe 27/03/14)
Da mesma forma, tem se decidido no âmbito desta Corte (ApCiv - 0029745-54.2015.4.03.9999, Oitava Turma, Rel. Des. Fed. LUIZ DE LIMA STEFANINI, julgado em 09/09/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/09/2019; AI - 5012457-90.2019.4.03.0000, Décima Turma, Rel. Des. Fed. SERGIO DO NASCIMENTO, julgado em 29/08/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 03/09/2019; ApCiv - 5772349-59.2019.4.03.9999, Sétima Turma, Rel. Des. Fed. TORU YAMAMOTO, julgado em 20/05/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 26/05/2020; ApCiv - 5006310-12.2018.4.03.6102, Oitava Turma, Rel. Des. Fed. TANIA REGINA MARANGONI, julgado em 25/03/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 28/03/2019; ApCiv - 0004884-60.2012.4.03.6102, Nona Turma, Rel. Des. Fed. GILBERTO RODRIGUES JORDAN, julgado em 20/03/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 24/03/2020; e ApCiv - 0011401-20.2018.4.03.9999, Sétima Turma, Rel. Des. Fed. PAULO SERGIO DOMINGUES, julgado em 01/06/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 03/06/2020).
Em específico, a posição prevalecente nesta 8.ª Turma:
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO.
I- O inciso LV, do art. 5º, da Constituição Federal dispõe que: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
II - O princípio constitucional do devido processo legal impõe que se conceda aos litigantes o direito à produção de provas, devendo facultar-se amplos meios para que se possa comprovar os fatos que amparam o direito disputado em juízo. Segundo Eduardo Couture, "A lei instituidora de uma forma de processo não pode privar o indivíduo de razoável oportunidade de fazer valer seu direito, sob pena de ser acoimada de inconstitucional" (BARACHO, José Alfredo de Oliveira; Teoria Geral do Processo Constitucional in Revista de Direito Constitucional e Internacional, vol. 62, p. 135, Jan/2008).
III- impositiva a anulação da r. sentença, para que seja produzida a prova pericial nas respectivas empregadoras ou em empresas similares, caso as primeiras não estejam mais em funcionamento, a fim de aferir o caráter especial das atividades desenvolvidas nos períodos de 01/11/1978 a 16/01/1979, 01/06/1979 a 13/03/1980, 02/06/1980 a 15/09/1981, 04/01/1982 a Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos 04/04/1983, 01/07/1983 a 24/11/1983, 21/02/1984 a 18/10/1985, 06/11/1985 a 20/02/1987,13/03/1987 a 25/03/1988, 01/08/1988 a 01/10/1988, 02/01/1989 a 12/06/1990, 01/04/1991 a 30/04/1991, 01/07/1991 a 20/07/1993, 19/08/1993 a 28/04/1995.
IV – Sentença anulada, de ofício. Recurso do INSS prejudicado.
(ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP 0001682-71.2014.4.03.6113, Relator Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA, Data do Julgamento 22/07/2020, Data da Publicação/Fonte Intimação via sistema DATA: 24/07/2020)
A realização da perícia judicial é, portanto, indispensável ao julgamento da pretensão formulada, a fim de se aferir a insalubridade ou não das atividades desenvolvidas no período de 9/3/1998 a 17/5/2019.
Assim, a falta de oportunidade para a realização da prova pericial, requerida pela parte em diversas ocasiões no curso do processo, implica cerceamento de defesa e ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e do devido processo legal, impondo a nulidade parcial do feito, a partir da eiva verificada.
Registre-se que a perícia deve ser realizada por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, nos termos do art. 58, § 1.º, da Lei n.º 8.213/91, com o objetivo de apurar a efetiva exposição da segurada, de forma habitual e permanente, aos agentes nocivos no ambiente laborado.
Posto isto, acolho a preliminar de cerceamento de defesa para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à vara de origem, para a produção de prova pericial, nos termos da fundamentação supra e, no mérito, julgo prejudicadas as apelações do autor e do INSS.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA.
- É imprescindível a produção da prova pericial para a comprovação do efetivo exercício de atividade em condições agressivas.
- Registre-se que a perícia deve ser realizada por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, nos termos do artigo 58, §1º, da Lei nº 8.213/91, com o objetivo de apurar a efetiva exposição do segurado, de forma habitual e permanente, aos agentes nocivos no ambiente laborado.
- A falta de oportunidade para a realização da prova pericial, requerida pela parte, implica cerceamento de defesa e ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e do devido processo legal, impondo a nulidade parcial do feito, a partir da eiva verificada.