
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000958-94.2023.4.03.6103
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCISCO ROBERTO DE SOUSA
Advogado do(a) APELADO: PRISCILA SOBREIRA COSTA - SP263205-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000958-94.2023.4.03.6103
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCISCO ROBERTO DE SOUSA
Advogado do(a) APELADO: PRISCILA SOBREIRA COSTA - SP263205-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Trata-se de ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a partir do requerimento administrativo, mediante o reconhecimento de atividade especial.
A r. sentença julgou procedente o pedido, para condenar o INSS a computar, como tempo especial, sujeito à conversão em comum pelo fator 1,4, o período de 02/01/1991 a 08/02/2000, implantando, em favor do autor, a aposentadoria por tempo de contribuição implantando conforme art. 15 ou art. 17 das regras de transição da EC 103/19, com início em 20/10/2020, conforme opção a ser manifestada na fase de execução, com o pagamento dos valores devidos em atraso, acrescido de correção monetária e juros de mora. Condenou o INSS, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios, fixados nos percentuais mínimos previstos no § 3º do artigo 85 do CPC, que devem incidir sobre as prestações vencidas até a prolação da sentença (Súmula nº 111 do STJ).
O INSS ofertou apelação, alegando, preliminarmente, a necessidade de atribuição de efeito suspensivo ativo ao recurso e a necessidade de remessa oficial. No mérito, sustenta que não restou comprovada a exposição a agente nocivo de forma habitual e permanente e a impossibilidade de enquadramento pela categoria profissional. Afirma que não foram preenchidos os requisitos para a concessão do benefício. Requer a reforma da r. sentença, com a improcedência do pedido nos termos da inicial. Se esse não for o entendimento, requer: a observância da prescrição quinquenal; a intimação da parte autora para firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo I da Portaria INSS nº 450/2020; a fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ; a declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias; o desconto dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período e a cobrança de eventuais valores pagos em sede de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada;
Com as contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal Regional Federal.
Convertido o julgamento em diligência e determinada a realização de perícia técnica judicial visando a análise de exposição a agente nocivo, no período de 02/01/1991 a 08/02/2000, considerando a ausência de responsável técnico pelos registros ambientais indicados no PPP (ID 285577814 - Pág. 21/24), bem como no PPRA juntado (ID . 285577814 - Pág. 225/42).
Após apresentação do laudo judicial (ID 302419122) e vista às partes para manifestação, os autos retornaram conclusos.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000958-94.2023.4.03.6103
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCISCO ROBERTO DE SOUSA
Advogado do(a) APELADO: PRISCILA SOBREIRA COSTA - SP263205-A
OUTROS PARTICIPANTES:
VOTO
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado se mostra formalmente regular, motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação (art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
Não conheço da apelação do INSS quanto à aplicação da Súmula 111/STJ, uma vez que a r. sentença já decidiu nesse sentido, não havendo, portanto, sucumbência neste tópico.
Rejeito a matéria preliminar alegada pelo INSS, quanto ao conhecimento da remessa oficial, pois, embora a sentença tenha sido desfavorável ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, não se encontra condicionada ao reexame necessário, visto que o artigo 496, § 3º, I, do CPC, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 1000 (mil) salários-mínimos.
Verifico não ter sido apresentada pela parte apelante fundamentação relevante que ensejasse a atribuição de efeito suspensivo à apelação, nos termos do artigo 1012, § 4º, do Código de Processo Civil, motivo pelo qual deve ser o seu pedido indeferido.
Rejeito a arguição de prescrição das diferenças pretendidas, por não ter transcorrido prazo superior a cinco anos (cf. artigo 103, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91) entre o início do benefício e a propositura da presente demanda.
Passo ao exame do mérito.
Alega a parte autora ter trabalhado em atividades especiais por um período de tempo suficiente à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91.
A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu artigo 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do citado artigo 25, inciso II.
Para aqueles que implementaram os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço até a data de publicação da EC nº 20/98 (16/12/1998), fica assegurada a percepção do benefício, na forma integral ou proporcional, conforme o caso, com base nas regras anteriores ao referido diploma legal.
Por sua vez, para os segurados já filiados à Previdência Social, mas que não implementaram os requisitos para a percepção da aposentadoria por tempo de serviço antes da sua entrada em vigor, a EC nº 20/98 impôs as seguintes condições, em seu artigo 9º, incisos I e II.
Ressalte-se, contudo, que as regras de transição previstas no artigo 9º, incisos I e II, da EC nº 20/98 aplicam-se somente para a aposentadoria proporcional por tempo de serviço, e não para a integral, uma vez que tais requisitos não foram previstos nas regras permanentes para obtenção do referido benefício.
Desse modo, caso o segurado complete o tempo suficiente para a percepção da aposentadoria na forma integral, faz jus ao benefício independentemente de cumprimento do requisito etário e do período adicional de contribuição, previstos no artigo 9º da EC nº 20/98.
Por sua vez, para aqueles filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98, não há mais possibilidade de percepção da aposentadoria proporcional, mas apenas na forma integral, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Portanto, até o advento da EC nº 103/2019, vigoravam as seguintes regras para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição:
1) Segurados filiados à Previdência Social antes da EC nº 20/98:
a) têm direito à aposentadoria (integral ou proporcional), calculada com base nas regras anteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, e o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91 até 16/12/1998;
b) têm direito à aposentadoria proporcional, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91, além dos requisitos adicionais do art. 9º da EC nº 20/98 (idade mínima e período adicional de contribuição de 40%);
c) têm direito à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres;
2) Segurados filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98:
- têm direito somente à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e 30 (trinta) anos, para as mulheres.
A controvérsia nos presentes autos, portanto, refere-se ao reconhecimento do exercício de atividades especiais desenvolvidas pelo autor no período de 02/01/1991 a 08/02/2000, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER.
Atividade Especial
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60.
Dispõe o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a Lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995).
O critério de especificação da categoria profissional com base na penosidade, insalubridade ou periculosidade, definidas por Decreto do Poder Executivo, foi mantido até a edição da Lei nº 8.213/91, ou seja, as atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo seriam consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico, bastando, assim, a anotação da função em CTPS ou a elaboração do então denominado informativo SB-40.
O Poder Executivo baixou os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, relacionando os serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
Embora o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 tenha limitado a aposentadoria especial às atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, o critério anterior continuou ainda prevalecendo.
De notar que, da edição da Lei nº 3.807/60 até a última CLPS, que antecedeu à Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço especial foi sempre definido com base nas atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo, como penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico.
A própria Lei nº 8.213/91, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo 152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da legislação em vigor para aposentadoria especial.
Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e Anexo IV), mas por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
Destaque-se que o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, deixou de fazer alusão a serviços considerados perigosos, insalubres ou penosos, passando a mencionar apenas atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, sendo que o artigo 58 do mesmo diploma legal, também em sua redação original, estabelecia que a relação dessas atividades seria objeto de lei específica.
A redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 9.032/95 sem que até então tivesse sido editada lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas às condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, não havendo dúvidas até então que continuavam em vigor os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. Nesse sentido, confira-se a jurisprudência: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
A atividade especial somente pode ser considerada por presunção legal até 28/04/1995, ocasião em que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 foram alterados pela Lei nº 9.032/95. A partir de então, o reconhecimento da atividade especial apenas se dá caso seja demonstrada a exposição, de forma habitual e permanente, a agentes nocivos à saúde ou à integridade física, sendo que após 10/12/1997 - data da vigência da Lei nº 9.528/97 - passou a ser necessária a apresentação de laudo técnico para comprovação à exposição a agentes nocivos à saúde.
Registro que o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP substitui o laudo técnico, sendo documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador. E também não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho em condições especiais à extemporaneidade de documento, pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual à constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica.
O artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica. Não tendo a lei determinado que a aferição só poderia ser feita por meio de uma metodologia específica, não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada na Instrução Normativa do INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia.
É de se ressaltar, quanto ao nível de ruído, que a jurisprudência já reconheceu que o Decreto nº 53.831/64 e o Decreto nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, ou seja, não houve revogação daquela legislação por esta, de forma que, constatando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado (STJ - REsp. n. 412351/RS; 5ª Turma; Rel. Min. Laurita Vaz; julgado em 21.10.2003; DJ 17.11.2003; pág. 355).
O Decreto nº 2.172/97, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 dB(A) como prejudicial à saúde.
Por tais razões, até ser editado o Decreto nº 2.172/97, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB(A) como agente nocivo à saúde.
Todavia, com o Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível voltou a ser de 85 dB(A) (art. 2º do Decreto nº 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Houve, assim, um abrandamento da norma até então vigente, a qual considerava como agente agressivo à saúde a exposição acima de 90 dB(A), razão pela qual vinha adotando o entendimento segundo o qual o nível de ruídos superior a 85 dB(A) a partir de 05/03/1997 caracterizava a atividade como especial.
Ocorre que o C. STJ, no julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do artigo 543-C do CPC, decidiu não ser possível a aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, de modo que no período de 06/03/1997 a 18/11/2003, em consideração ao princípio tempus regit actum, a atividade somente será considerada especial quando o ruído for superior a 90 dB(A) (STJ, REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 05/12/2014).
Quanto à eficácia do EPI, vale dizer que, por ocasião do julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou as seguintes teses: a) “o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial"; b) "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Contudo, cabe ressaltar que, para descaracterização da atividade especial em razão do uso de EPI, há necessidade de prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado.
Destaco, ainda, que inexiste vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa, ou nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado.
Por seu turno, o recebimento de adicional de insalubridade ou de pagamento da taxa SAT (com indicação de IEAN no CNIS) não implica necessariamente no reconhecimento de exercício de atividade especial, que tem que ser comprovada pelos meios estabelecidos na legislação vigente.
Quanto à possibilidade da contagem do tempo em gozo de auxílio-doença como atividade especial, o julgamento proferido em sede de repetitivo (Tema repetitivo n. 998), fixou da seguinte tese: “O Segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial”.
No presente caso, da análise do laudo judicial (ID . 302419122), e de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, verifica-se que a parte autora comprovou o exercício de atividade especial no período de 02/01/1991 a 08/02/2000, vez que exposto de forma habitual e permanente a agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos - óleos minerais e thinner, gasolina), nos termos dos códigos 1.2.10, Anexo I, do Decreto 83.080/79, 1.07, Anexo IV, do Decreto nº 2.172/97 e do Decreto nº 3.048/99.
Cumpre lembrar que a simples manipulação do agente químico elencado, em especial em se tratando de ' hidrocarbonetos ', gera presunção de risco em razão da exposição a produtos cancerígenos. A presença da substância no ambiente é suficiente para expor a risco a saúde do trabalhador, com danos irreversíveis.
Sendo o requerimento do benefício posterior à Lei Federal nº 8.213/91, deve ser aplicado o fator de conversão de 1,40, mais favorável ao segurado, como determina o artigo 70 do Decreto Federal nº. 3048/99, com a redação dada pelo Decreto Federal nº. 4.827/03.
Os períodos registrados em CTPS são suficientes para garantir o cumprimento da carência, de acordo com a tabela do artigo 142 da Lei Federal nº 8.213/1991.
Conforme planilha anexa, computando-se o tempo de serviço especial ora reconhecido, acrescidos dos períodos considerados incontroversos até a data do requerimento administrativo (20/10/2020), resulta em tempo suficiente para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, nos seguintes termos:
- em 13/11/2019, o autor tem direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, com fundamento na EC 20, art. 9º, pois (i) cumpriu o requisito tempo comum, com 37 anos, 6 meses e 11 dias, para o mínimo de 35 anos; (ii) cumpriu o requisito carência, com 409 meses, para o mínimo de 180 meses; e
- em 20/10/2020, tem direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com fundamento na EC 103, art. 17, pois (i) cumpriu o requisito tempo comum, com 37 anos, 6 meses e 11 dias, para o mínimo de 33 anos (até 13/11/2019); (ii) cumpriu o requisito tempo com pedágio, com 38 anos, 3 meses e 28 dias, para o mínimo de 35 anos; (iii) cumpriu o requisito carência, com 418 meses, para o mínimo de 180 meses.
Desse modo, reconhece-se o direito da parte autora à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição nos termos supracitados, podendo optar pelo benefício mais vantajoso.
No tocante ao termo inicial dos efeitos da concessão do benefício previdenciário, cumpre manter a r. sentença diante da ausência de impugnação pelas partes.
Em relação à apresentação de autodeclaração, observo que se trata de procedimento a ser exigido no âmbito administrativo.
Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observado o quanto decidido pelo C. STF por ocasião do julgamento do RE 870947, sendo que a partir da promulgação da EC 113/2021, publicada em 09/12/2021, haverá a incidência da taxa Selic para fins de atualização monetária e compensação da mora, inclusive do precatório, uma única vez, até o efetivo pagamento, acumulado mensalmente.
O eventual pagamento de benefício previdenciário na via administrativa, seja ele total ou parcial, após a citação válida, não tem o condão de alterar a base de cálculo para os honorários advocatícios fixados na ação de conhecimento, que será composta pela totalidade dos valores devidos.
O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, além de reembolsar as custas recolhidas pela parte contrária, o que não é o caso dos autos, por se tratar de beneficiário da gratuidade da justiça (arts. 4º, I e parágrafo único, da Lei nº 9.289/1996, 24-A da Lei nº 9.028/1995, n.r., e 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/1993).
Anote-se, ainda, a obrigatoriedade da dedução dos valores eventualmente pagos à parte autora após o termo inicial assinalado à benesse outorgada, ao mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993).
Ante o exposto, não conheço de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou-lhe parcial provimento, para conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição nos termos supracitados e observar a isenção de custas processuais, consoante fundamentação.
É como voto.
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. MATÉRIA PRELIMINAR REJEITADA. AGENTES QUÍMICOS. EXPOSIÇÃO COMPROVADA. REQUISITOS PREENCHIDOS. DIREITO AO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. ISENÇÃO DE CUSTAS PROCESSUAIS. APELAÇÃO DO INSS CONHECIDA EM PARTE E PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Apelação do INSS não conhecida quanto à aplicação da Súmula 111/STJ, uma vez que a r. sentença já decidiu nesse sentido, não havendo, portanto, sucumbência neste tópico.
2. Rejeitada a matéria preliminar alegada pelo INSS, quanto ao conhecimento da remessa oficial, pois, embora a sentença tenha sido desfavorável ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, não se encontra condicionada ao reexame necessário, visto que o artigo 496, § 3º, I, do CPC, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 1000 (mil) salários-mínimos.
3. Verifica-se não ter sido apresentada pela parte apelante fundamentação relevante que ensejasse a atribuição de efeito suspensivo à apelação, nos termos do artigo 1012, § 4º, do Código de Processo Civil, motivo pelo qual deve ser o seu pedido indeferido.
4. Rejeitada a arguição de prescrição das diferenças pretendidas, por não ter transcorrido prazo superior a cinco anos (cf. artigo 103, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91) entre o início do benefício e a propositura da presente demanda.
5. A controvérsia nos presentes autos, portanto, refere-se ao reconhecimento do exercício de atividades especiais desenvolvidas pelo autor no período de 02/01/1991 a 08/02/2000, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER.
6. No presente caso, da análise do laudo judicial, e de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, verifica-se que a parte autora comprovou o exercício de atividade especial no período de 02/01/1991 a 08/02/2000, vez que exposto de forma habitual e permanente a agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos - óleos minerais e thinner, gasolina), nos termos dos códigos 1.2.10, Anexo I, do Decreto 83.080/79, 1.07, Anexo IV, do Decreto nº 2.172/97 e do Decreto nº 3.048/99.
7. Cumpre lembrar que a simples manipulação do agente químico elencado, em especial em se tratando de ' hidrocarbonetos ', gera presunção de risco em razão da exposição a produtos cancerígenos. A presença da substância no ambiente é suficiente para expor a risco a saúde do trabalhador, com danos irreversíveis.
8. Sendo o requerimento do benefício posterior à Lei Federal nº 8.213/91, deve ser aplicado o fator de conversão de 1,40, mais favorável ao segurado, como determina o artigo 70 do Decreto Federal nº. 3048/99, com a redação dada pelo Decreto Federal nº. 4.827/03.
9. Os períodos registrados em CTPS são suficientes para garantir o cumprimento da carência, de acordo com a tabela do artigo 142 da Lei Federal nº 8.213/1991.
10. Conforme planilha anexa, computando-se o tempo de serviço especial ora reconhecido, acrescidos dos períodos considerados incontroversos até a data do requerimento administrativo (20/10/2020), resulta em tempo suficiente para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, nos seguintes termos: - em 13/11/2019, o autor tem direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, com fundamento na EC 20, art. 9º, pois (i) cumpriu o requisito tempo comum, com 37 anos, 6 meses e 11 dias, para o mínimo de 35 anos; (ii) cumpriu o requisito carência, com 409 meses, para o mínimo de 180 meses; e - em 20/10/2020, tem direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com fundamento na EC 103, art. 17, pois (i) cumpriu o requisito tempo comum, com 37 anos, 6 meses e 11 dias, para o mínimo de 33 anos (até 13/11/2019); (ii) cumpriu o requisito tempo com pedágio, com 38 anos, 3 meses e 28 dias, para o mínimo de 35 anos; (iii) cumpriu o requisito carência, com 418 meses, para o mínimo de 180 meses.
11. Desse modo, reconhece-se o direito da parte autora à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição nos termos supracitados, podendo optar pelo benefício mais vantajoso.
12. O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, além de reembolsar as custas recolhidas pela parte contrária, o que não é o caso dos autos, por se tratar de beneficiário da gratuidade da justiça (arts. 4º, I e parágrafo único, da Lei nº 9.289/1996, 24-A da Lei nº 9.028/1995, n.r., e 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/1993).
13. Anote-se, ainda, a obrigatoriedade da dedução dos valores eventualmente pagos à parte autora após o termo inicial assinalado à benesse outorgada, ao mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993).
14. Matéria preliminar rejeitada. Apelação do INSS conhecida em parte e parcialmente provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
