
| D.E. Publicado em 04/04/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária, afastar a ocorrência da prescrição quinquenal, negar provimento à apelação e fixar os consectários legais de ofício, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0026088-36.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de pedido de aposentadoria por tempo de contribuição ajuizado por Maria de Fátima Capra Linares em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Contestação do INSS às fls. 81/99, na qual sustenta o não enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como sendo de natureza especial, requerendo, ao final, a improcedência total do pedido. Na eventualidade de entendimento contrário, requer seja observada a prescrição quinquenal das parcelas atrasadas, a fixação dos honorários de acordo com a Súmula 111/STJ e a incidência de correção monetária conforme os índices legais e dos juros de mora computados da citação válida.
Réplica às fls. 106/111.
Sentença às fls. 114/115, pela procedência do pedido para reconhecer o exercício da atividade especial nos períodos pleiteados e conceder a aposentadoria por tempo de contribuição integral a partir da data do requerimento administrativo. Fixou a sucumbência, determinou a implantação do benefício e submeteu o feito à remessa necessária.
Apelação às fls. 120/124, requerendo a reforma do julgado em razão da ausência de comprovação do exercício da atividade especial nos períodos vindicados na inicial, ao final, pugnando pela improcedência total do pedido.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 07.03.1963, o reconhecimento do exercício de atividades especiais nos períodos de 11.03.1985 a 20.07.1990, 28.07.1999 a 16.01.2007, 11.03.2007 a 24.04.2012, 08.05.2012 a 23.02.2014 e de 11.05.2014 a 13.10.2014, e a concessão do benefício de aposentadoria especial, a partir da data do requerimento administrativo (D.E.R.: 13.10.2014).
Inicialmente, anoto que a sentença foi proferida já na vigência do novo Código de Processo Civil - Lei 13.105/2015 -, razão pela qual se deve observar o disposto no art. 496, §3º, I. No caso dos autos, não obstante a sentença ser ilíquida é certo que o proveito econômico obtido pela parte autora não superará o valor de 1.000 salários mínimos, ainda que se considere o teto dos benefícios pagos pela previdência social, tendo em vista que a sentença foi prolatada em 06.05.2016 e o termo inicial da condenação foi fixado na DER (13.10.2014). Não conheço, portanto, da remessa oficial.
Igualmente, afasto a ocorrência da prescrição quinquenal das parcelas atrasadas, tendo em vista a interrupção do lapso prescricional entre a data do requerimento administrativo (13.10.2014) e a ciência da decisão final na via administrativa. No caso dos autos, a ciência deu-se em 07.02.2015 (fl. 16) e a presente ação foi ajuizada em 23.02.2015 (fl. 01).
No mérito, para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial, pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da EC 20/98.
Da atividade especial.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que "(...) A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...)". Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, tal dispositivo legal teve sua redação alterada, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
"Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação foi definida apenas com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV). Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal disposição somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual a apresentação de laudo técnico só pode ser exigida a partir dessa ultima data. Nesse sentido é o entendimento majoritário do E. STJ:
"PREVIDENCIÁRIO - RECURSO ESPECIAL - APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO - CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM - POSSIBILIDADE - LEI 8.213/91 - LEI 9.032/95 - LAUDO PERICIAL INEXIGÍVEL - LEI 9.528/97.
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030 (exceto para o agente nocivo ruído, por depender de prova técnica).
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à saúde. Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao C. Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do Código de Processo Civil (Recurso Especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, na forma que segue:
"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. DESAFETAÇÃO DO PRESENTE CASO. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
Dessa forma, deve-se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a nível de ruído superior a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, superior a 90 decibéis e, a partir de então, superior a 85 decibéis.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente porque a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica tende a propiciar condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas: i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
NO CASO DOS AUTOS, os períodos incontroversos totalizam 25 (vinte e cinco) anos, 11 (onze) meses e 20 (vinte) dias de tempo de contribuição (fls. 16, 66/67), não tendo sido reconhecido como de natureza especial nenhum dos períodos pleiteados na inicial. Portanto, a controvérsia colocada nos autos engloba o reconhecimento da natureza especial das atividades exercidas nos períodos de 11.03.1985 a 20.07.1990, 28.07.1999 a 16.01.2007, 11.03.2007 a 24.04.2012, 08.05.2012 a 23.02.2014 e de 11.05.2014 a 13.10.2014, e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 13.10.2014).
Ocorre que, nos períodos de 11.03.1985 a 20.07.1990, na atividade de servente prática, atuando no setor de produção de papel e acabamento, junto à empresa International Paper do Brasil Ltda, a parte autora esteve exposta a ruído acima dos limites legalmente permitidos (de forma contínua e na intensidade de 91,40 dB(A), conforme consta do P.P.P de fls. 52/54, atestado por engenheira de segurança do trabalho credenciada - fl. 55, responsável pelo registros ambientais, bem como pela representação legal da empresa, constando do referido documento a indicação do NIT e do carimbo da empresa), sendo certo também que, nos períodos de 28.07.1999 a 16.01.2007, 11.03.2007 a 24.04.2012, 08.05.2012 a 23.02.2014 e de 11.05.2014 a 13.10.2014, a parte autora, na atividade de auxiliar de enfermagem, atuando em estabelecimento hospitalar, em contato com pacientes e materiais infecto-contaminantes (auxiliando na preparação e coleta de material para exames de laboratório, na movimentação e transporte de pacientes, na administração de medicações via oral, tópica, subcutânea, intramuscular, endovenosa e retal, segundo prescrição médica, auxiliando na limpeza, desinfecção, esterilização de materiais e equipamentos, etc.), esteve exposta a agente biológicos nocivos à saúde (P.P.P. - fls. 56/57), portanto, em todos os períodos devendo ser reconhecida a natureza especial inerente às atividades desempenhadas, conforme códigos 1.1.6 e 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64, códigos 1.1.5, 1.3.4 e 2.1.3 do Decreto nº 83.080/79, código 3.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
Sendo assim, somados todos os períodos comuns com anotações em CTPS e no CNIS (fls. 37/51 e fls. 94/100), e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a parte autora 30 (trinta) anos, 11 (onze) meses e 09 (nove) dia de tempo de contribuição, até a data do requerimento administrativo (D.E.R.: 13.10.2014), observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
Restaram atendidos pela parte autora, ainda, os requisitos da qualidade de segurado (art. 15 e seguintes da Lei nº 8.213/91) e carência para a concessão do benefício almejado (art. 24 e seguintes da Lei nº 8.213/91).
Destarte, a parte autora faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição, com valor calculado na forma prevista no art. 29, I, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
O benefício é devido a partir da data do requerimento administrativo (D.E.R.) ou, na sua ausência, a partir da citação.
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, §3º, §4º, II, e §11, e no art. 86, todos do CPC/2015, e incidirá sobre as parcelas vencidas até data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
As verbas acessórias e as prestações em atraso também deverão ser calculadas na forma acima estabelecida, em fase de liquidação de sentença.
Acaso a parte autora esteja recebendo benefício previdenciário concedido administrativamente, deverá optar, à época da liquidação de sentença, pelo beneficio judicial ou administrativo que entenda ser mais vantajoso. Se a opção recair no benefício judicial, deverão ser compensadas as parcelas já recebidas em sede administrativa, face à vedação da cumulação dos benefícios.
Diante do exposto, não conheço da remessa necessária, afasto a ocorrência da prescrição quinquenal, nego provimento à apelação do INSS e fixo, de ofício, os consectários legais.
É como voto.
Desembargador Federal
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