D.E. Publicado em 11/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações do INSS e da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0010604-28.2014.4.03.6105/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de pedido de aposentadoria por tempo de contribuição formulado por Jose Mauricio Pereira em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Foram juntados aos autos procuração e documentos (fls. 32/249, 252/499, 502/749 e 752/774).
Contestação do INSS às fls. 786/796, na qual sustenta não ter sido comprovado o exercício de qualquer atividade especial, bem como a impossibilidade de se computar os períodos de trabalho comum e na condição de aluno-aprendiz, uma vez que não registrados no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, motivo por que entende improcedentes os pedidos formulados pelo autor.
Réplica da parte autora às fls. 800/828.
Foram colhidos os depoimentos de duas testemunhas (mídias digitais de fls. 859 e 875).
Sentença às fls. 890/898, pela parcial procedência do pedido.
Apelação da parte autora às fls. 902/930, pela total procedência do pedido.
Apelação do INSS às fls. 934/937v, pela parcial reforma da sentença, a fim de que seja desconsiderado o tempo de serviço reconhecido pela Justiça do Trabalho, em razão da revelia da reclamada.
Com contrarrazões (fls. 938 e 943/952), subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 19.03.1952, o reconhecimento do exercício de atividades especiais nos períodos de 08.11.1976 a 13.06.1977, 01.08.1977 a 30.10.1981, 05.04.1982 a 01.03.1984, 01.07.1984 a 04.04.1986, 27.10.1987 a 30.11.1998 e 12.10.1990 a 07.05.1991, além do interregno de 16.02.1971 a 14.08.1971, laborado como aluno-aprendiz, bem como os intervalos de atividade comum desenvolvida entre 27.10.1987 a 30.11.1998 e 13.02.1987 a 29.10.1990, e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 07.04.2008) ou, eventualmente, em data posterior, quando preenchidos os requisitos legais para a sua concessão.
Para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial, pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da EC 20/98.
Do mérito.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que "(...) A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...)". Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, tal dispositivo legal teve sua redação alterada, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação foi definida apenas com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV). Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal disposição somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual a apresentação de laudo técnico só pode ser exigida a partir dessa ultima data. Nesse sentido é o entendimento majoritário do E. STJ:
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030 (exceto para o agente nocivo ruído, por depender de prova técnica).
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à saúde. Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao C. Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do Código de Processo Civil (Recurso Especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, na forma que segue:
Dessa forma, deve-se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a nível de ruído superior a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, superior a 90 decibéis e, a partir de então, superior a 85 decibéis.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente porque a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica tende a propiciar condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas: i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
NO CASO DOS AUTOS, todos os períodos pleiteados se mostram controvertidos, tendo em vista não terem sido acolhidos em sede administrativa (fls. 231/235).
Em relação aos períodos de 08.11.1976 a 13.06.1977, 01.08.1977 a 30.10.1981, 05.04.1982 a 01.03.1984, 01.07.1984 a 04.04.1986, 12.10.1990 a 07.05.1991 e 27.10.1987 a 30.11.1998 (fls. 83/85), nos quais o autor exerceu as funções de Engenheiro Agrônomo de Vendas, Assistente-Técnico, Inspetor de Vendas Agrônomo Pleno, Representante Técnico Comercial e Vendedor Técnico Júnior, todas referentes à área comercial, não houve comprovação de qualquer exposição à agente insalubre, tampouco a possibilidade de enquadramento pela atividade, nos termos dos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79. Desse modo, os trabalhos exercidos nos interregnos citados devem ser contabilizados como sendo comuns.
Por sua vez, no que diz respeito, especificamente, ao período de 27.10.1987 a 30.11.1998, verifica-se que sentença proferida no âmbito da Justiça do Trabalho (fls. 189/192) reconheceu a sua existência, determinando a averbação em CTPS. Ocorre que, em virtude da ausência de contestação foi aplicada a revelia, presumindo-se verdadeiros os fatos alegados pelo reclamante.
Assim, em que pese a autoridade da decisão da Justiça do Trabalho, esta apenas poderá ser tida, para efeitos previdenciários, como início de prova material. Isso por que o conjunto probatório analisado na reclamação trabalhista, em razão da revelia, é insuficiente, por si só, para averbação do período, repita-se, para fins previdenciários.
Entretanto, o início de prova material do labor desenvolvido foi complementado por prova testemunhal, que ratificou a existência do trabalho desenvolvido pelo autor entre 27.10.1987 a 30.11.1998 (mídias digitais de fls. 859 e 875).
Ante o conjunto probatório, restou demonstrada a regular atividade urbana da parte autora, no período de 27.10.1987 a 30.11.1998, devendo ser procedida a contagem de tempo de serviço cumprido no citado interregno, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, cujo ônus incumbe ao empregador (Nesse sentido: TRF - 3ª Região, 2ª Turma, AC 2000.03.99.006110-1, Rel. Des. Fed. Sylvia Steiner, j. 15.05.2001, RTRF-3ª Região 48/234).
Outrossim, também deve ser reconhecido o período de atividade comum executado entre 13.02.1987 a 29.10.1990, na qualidade de professor, conforme certidão de tempo de serviço expedida pela Secretária de Estado da Educação de São Paulo (fls. 52/53), acrescida das informações de fl. 844.
Por fim, no tocante ao período laborado como aluno-aprendiz (16.02.1971 a 14.08.1971), registro que, a teor do art. 58, XXI, do Decreto nº 611/92, o vínculo de aprendizado deve ser considerado para fins previdenciários:
A Súmula nº 96 do Tribunal de Contas da União, por sua vez, assim dispõe:
Estabelecidas estas premissas, cumpre ressaltar que a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, de forma consolidada, reconheceu o direito à averbação do período de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz de estudante do "Instituto Tecnológico da Aeronáutica - ITA", exigindo-se, para tanto, a demonstração de remuneração paga pela União, que pode ser realizada mediante o fornecimento de utilidades ou em espécie.
Nesse sentido:
No caso em tela, consoante se infere do documento de fl.140, apenas foi comprovado o período de estudo, não existindo provas de remuneração paga (ainda que indireta) pelos cofres da União, razão pela qual não poderá ser averbado referido tempo para efeitos previdenciários.
Sendo assim, somados todos os períodos, totaliza a parte autora 26 (vinte e seis) anos, 11 (onze) meses e 18 (dezoito) dias de tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo (D.E.R. 07.04.2008), observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
Ainda que reafirmada a D.E.R. até a data da contestação, não possuía a parte autora tempo mínimo necessário para a concessão do benefício de aposentadoria pleiteado.
Honorários advocatícios fixados na forma da sentença.
Diante do exposto, nego provimento às apelações do INSS e da parte autora, mantendo integralmente a sentença, tudo na forma acima explicitada.
É como voto.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 26/02/2019 17:12:17 |