Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0002257-85.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
03/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 08/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. PRELIMINAR.
PERÍCIA ANTECIPADA. SEM PREJUÍZO. PRECLUSÃO. NÃO ACOLHIDA. SENTENÇA CITRA
E EXTRA PETITA RESTRINGIDA DE OFÍCIO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA
MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. RECONHECIMENTO. ATIVIDADE ESPECIAL.
LAVOURA DE CANA-DE-AÇÚCAR. LIMPEZA DE VIA PÚBLICA. AGENTES BIOLÓGICOS.
RECONHECIMENTO. 85 PONTOS ALCANÇADOS. BENEFÍCIO SEM A INCIDÊNCIA DO
FATOR PREVIDENCIÁRIO DEFERIDO. TERMO INICIAL. DATA DO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PREJUDICADA E DESPROVIDA.
APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - O juízo teria designado a perícia técnica para data anterior ao prazo para a contestação. Desta
forma, a prova técnica não teria sido produzida sob o contraditório. Com efeito, o juízo primário
deferiu a produção da prova pericial (marcada para o dia 02/04/2018) e agendou a audiência da
instrução (em 10/04/2018) já na decisão que determinou a citação do INSS, facultado ao réu a
indicação de assistente e formulação de quesitos no prazo da contestação (ID 95076965 - Pág.
93). Outrossim, vale notar que foi enviado email à AGU informando acerca da decisão supra
referida, cujo recebimento foi confirmando (em 08/03/2018) pelo procurador federal, Dr. Edgard
Pagliarani Sampaio (ID 95076965 - Pág. 101). Este mesmo procurador se fez presente na
assentada do dia 10/04/2018 (ID 95076965 - Pág. 121), deixando, no entanto, de comparecer ao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
local de produção da prova técnica, que ocorreu em 02/04/2018 (ID 95076966 - Pág. 125). Assim,
considerando que não foi arguido óbice à realização da audiência antes do prazo para a
contestação (findo em 19/04/2018), mesma conclusão se há de chegar no que diz respeito à
prova pericial. Caso contrário, poderia o procurador autárquico informar o impedimento de
comparecer à perícia ao juízo.
2 - Ademais, digno de nota que a autarquia previdenciária formulou quesitos ao especialista
designado pelo juízo, devidamente respondidos pelo perito (ID 95076966 - Pág. 138), inclusive
com esclarecimentos complementares (ID 95076966 - Pág. 149).
3 - Então, o que se conclui é que, se o INSS não compareceu ao local de produção da prova
pericial, o fez porque assim escolheu proceder. Não obstante, teve a oportunidade de obter as
informações requeridas do expert, de forma que não se vislumbra qualquer prejuízo à parte ré.
4 - Por fim, e não menos importante, há que se ressaltar que eventual nulidade deve ser arguida
na primeira oportunidade que a parte tiver para se manifestar em juízo, que, no caso, se deu com
a contestação. O INSS, todavia, nada argumentou a esse respeito em sua peça de defesa.
Rejeitada a preliminar.
5 - Ainda como questão preliminar, digno de nota que, conquanto não conste do dispositivo da
sentença, na fundamentação da decisão, foi admitido o cômputo do intervalo de 01/01/2016 a
31/01/2018, em que a autora contribuiu como contribuinte facultativa.
6 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita),
aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC/2015.
7 - Todavia, verifica-se que o magistrado a quo não se ateve aos termos do pedido ao reconhecer
o período em que a autora verteu contribuições facultativamente de 01/01/2016 a 31/01/2018,
lapso não considerado na contagem do tempo de serviço efetuada pelo INSS (ID 95076966 -
Págs. 76/77). Ressalta-se que o interregno, igualmente, não foi computado pela parte autora em
seu cálculo (ID 95076965 - Pág. 87). Por outro lado, a decisão ad quem deixou de analisar o
pedido de reconhecimento da especialidade do intervalo de 15/04/1996 a 18/12/2006. Logo, a
sentença, neste aspecto, é extra e citra petita, eis que concedeu objeto diverso e aquém do
requerido na inicial; restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 492 do
CPC/2015.
8 - Dessa forma, há de se adequar a sentença aos limites do pedido inicial, extirpando da
contagem do tempo de serviço o ínterim de 01/01/2016 a 31/01/2018. Desta forma, prejudicada a
apelação do INSS neste tocante. Do mesmo modo, impõe-se a análise do pedido de admissão da
especialidade do lapso de 15/04/1996 a 18/12/2006.
9 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de
Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em
ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável
à matéria.
10 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova
exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
11 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que
se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da
7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser
contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido
produzidos de forma espontânea, no passado.
12 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de
que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele
retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que
tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
13 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII.
14 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. Precedentes jurisprudenciais.
15 - Contudo, o tempo de serviço do trabalhador rural poderá ser computado, independentemente
do recolhimento de contribuição, exceto para fins de carência, até o dia 31/10/1991, conforme o
disposto no art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99.
16 - Pretende a parte autora o reconhecimento do trabalho rural no intervalo de 19/12/1975 a
01/01/1991.
17 - A respeito do labor no campo, a inicial foi instruída, dentre outros, com os seguintes
documentos: certidão de casamento dos pais da requerente, em 1977, na qual seu genitor é
qualificado como "lavrador" (ID 95076965 - Pág. 30); certidão de casamento da autora, em 1981,
na qual seu cônjuge é identificado como "lavrador" (ID 95076965 - Pág. 31). A documentação
juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material.
18 - A prova documental é reforçada e ampliada pela prova oral constituída nos autos, sendo
possível reconhecer o trabalho campesino durante o período de 19/12/1975 a 01/01/1991.
19 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
20 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria
profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de
1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292
do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de
Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes
agressivos, exceto para ruído e calor.
21 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do
segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente,
sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então,
retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do
segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de
conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
22 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
11/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário
(PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais
responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento
hábil para a avaliação das condições laborais.
23 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao
agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade
desempenhada pelo trabalhador. Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a
comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para
atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal
exigência na legislação anterior.
24 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
25 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
26 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui,
para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em
condições especiais.
27 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
28 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização
do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não
infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF
excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente
neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
29 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
30 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
31 – Controvertida, na demanda, a especialidade dos períodos de 16/08/1993 a 21/11/1993,
01/12/1994 a 03/06/1995, 15/04/1996 a 18/12/2006, 19/12/2006 a 16/07/2014 e 08/07/2014 a
06/12/2015.
32 - A fim de averiguar as condições de trabalho da autora, foi produzida prova técnica, a qual
informou o labor na lavoura de cana-de-açúcar enquanto trabalhadora agrícola de 16/08/1993 a
21/11/1993 e 01/12/1994 a 03/06/1995 e a lida com fezes de animais e demais resíduos no
desempenho da função de varredora de 15/04/1996 a 18/12/2006, 19/12/2006 a 16/07/2014 e
08/07/2014 a 06/12/2015 (ID 95076966 - Págs. 126/127). Diante disso, atestou a exposição ao
agente químico, poeira mineral, e aos agentes biológicos, fungo e bactérias, ambos de forma
habitual e permanente.
33 - De acordo com premissa fundada nas máximas de experiência, subministradas pela
observação do que ordinariamente acontece, a atividade exercida pelos trabalhadores no corte e
cultivo de cana-de-açúcar pode ser enquadrada no código 1.2.11 do Anexo do Decreto n.º
53.831/64 (Tóxicos Orgânicos), no Item 12 do Anexo II do Decreto nº 2.172/97, bem como no
Item XII do Anexo II do Decreto nº 3.048/99, uma vez que o trabalho, tido como insalubre, envolve
desgaste físico excessivo, com horas de exposição ao sol e a produtos químicos, tais como,
pesticidas, inseticidas e herbicidas, além do contato direto com os malefícios da fuligem, exigindo-
se, ainda, alta produtividade, em lamentáveis condições antiergonômicas de trabalho. Precedente
desta C. 7ª Turma.
34 - Sob este prisma, possível o enquadramento dos períodos de 16/08/1993 a 21/11/1993,
01/12/1994 a 03/06/1995 como especiais.
35 - No que diz respeito aos interregnos de 15/04/1996 a 18/12/2006 e 19/12/2006 a 16/07/2014
e 08/07/2014 a 06/12/2015, igualmente, merecem ser admitidos como especiais, com base no
item 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64 e no item 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
36 - Importante esclarecer que, nos casos em que resta comprovada a exposição a agente
biológico nocivo, a natureza das atividades exercidas já revela, por si só, que mesmo nos casos
de utilização de equipamentos de proteção individual, tido por eficazes, não é possível afastar a
insalubridade a que fica sujeito o profissional.
37 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais os períodos de
16/08/1993 a 21/11/1993, 01/12/1994 a 03/06/1995, 15/04/1996 a 18/12/2006, 19/12/2006 a
16/07/2014 e 08/07/2014 a 06/12/2015.
38 - Conforme planilha anexa, somando-se o tempo de serviço incontroverso (resumo de
documentos – ID 95076966 - Págs. 76/77) ao rural e especial, reconhecidos nesta demanda, este
último convertido em comum, verifica-se que a autora alcançou mais de 85 pontos na data do
requerimento administrativo (27/04/2017 – ID 95076966 - Pág. 82), fazendo jus à aposentadoria
por tempo de contribuição, sem incidência do fator previdenciário, deferida na origem.
39 - A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual
de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
40 - Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a
jurisprudência dominante.
41 - A partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, para fins de
atualização monetária e compensação da mora, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo
pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia
(Selic), acumulado mensalmente.
42 - No que tange ao valor da verba honorária sucumbencial, éinegável que as condenações
pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a
referida verba deve, por imposição legal (art. 85, §§2º e 3º, CPC), ser fixada moderadamente, o
que resta perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo este incidir
sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da
Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
43 - Ficam os honorários advocatícios majorados nos termos do disposto no artigo 85, §11, do
CPC, respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.
44 – Sentença citra e extra petita integrada de ofício. Apelação do INSS parcialmente prejudicada
e desprovida. Apelação da parte autora parcialmente provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0002257-85.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARIA APARECIDA DE SOUZA BATISTA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO DE OLIVEIRA CEVALLOS - SP265041-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA APARECIDA DE
SOUZA BATISTA
Advogado do(a) APELADO: RODRIGO DE OLIVEIRA CEVALLOS - SP265041-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0002257-85.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARIA APARECIDA DE SOUZA BATISTA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO DE OLIVEIRA CEVALLOS - SP265041-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA APARECIDA DE
SOUZA BATISTA
Advogado do(a) APELADO: RODRIGO DE OLIVEIRA CEVALLOS - SP265041-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
e por MARIA APARECIDA DE SOUZA BATISTA, em ação previdenciária ajuizada por esta,
objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o
reconhecimento de labor rural e de trabalho exercido em condições especiais.
A r. sentença (ID 95076966 - Págs. 163/169) julgou procedente o pedido, para reconhecer o
labor rural de 19/12/1975 a 29/09/1981 e especial nos períodos de 6/08/1993 a 21/11/1993,
01/12/1994 a 03/06/1995, 19/12/2006 a 16/07/2014 e 08/07/2014 a 06/12/2015 e conceder à
autora aposentadoria por tempo de contribuição, sem a incidência do fator previdenciário, a
partir data do requerimento administrativo (27/04/2017), com juros de mora e correção
monetária. Condenou o INSS em honorários advocatícios, fixados em 10% do valor das
parcelas vencidas até a data da sentença.
Em razões recursais (ID 95076966 - Págs. 174/178), a parte autora defende a admissão do
trabalho rural até 01/01/1991. Pugna para que seja declarada a contagem total de tempo de
serviço. Requer a majoração da verba honorária. E se insurge contra os parâmetros para
liquidação dos juros de mora e correção monetária.
O INSS, em sede recursal (ID 95076966 - Pág. 182 ao ID 95076967 - Pág. 22), suscita
cerceamento de defesa, em razão da realização da perícia técnica antes do prazo da
contestação. Argumenta a ausência de prova material indiciária para a admissão do labor
campesino. Quanto os intervalos especiais, sustenta que a autora não comprova, com os
documentos necessários, o labor de forma contínua em atividades em condições especiais.
Aduz o uso de EPI eficaz. Alega que não deve ser computado o lapso em que a autora
contribuição como segurada facultativa, vez que esta teria recolhido somente a alíquota de
11%, na forma do artigo 80 da Lei Complementa nº 126/2006. Subsidiariamente, pugna pela
aplicação da Lei nº 11.960/09.
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional
Federal.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0002257-85.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARIA APARECIDA DE SOUZA BATISTA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO DE OLIVEIRA CEVALLOS - SP265041-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA APARECIDA DE
SOUZA BATISTA
Advogado do(a) APELADO: RODRIGO DE OLIVEIRA CEVALLOS - SP265041-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Preliminarmente, observa-se que a autarquia suscitou a nulidade do julgado, em razão de
cerceamento de defesa. Segundo alega, o juízo teria designado a perícia técnica para data
anterior ao prazo para a contestação. Desta forma, a prova técnica não teria sido produzida sob
o contraditório.
De fato, o juízo primário deferiu a produção da prova pericial (marcada para o dia 02/04/2018) e
agendou a audiência da instrução (em 10/04/2018) já na decisão que determinou a citação do
INSS, facultando ao réu a indicação de assistente e formulação de quesitos no prazo da
contestação (ID 95076965 - Pág. 93).
Outrossim, vale notar que foi enviado email à AGU informando acerca da decisão supra
referida, cujo recebimento foi confirmando (em 08/03/2018) pelo procurador federal, Dr. Edgard
Pagliarani Sampaio (ID 95076965 - Pág. 101).
Este mesmo procurador se fez presente na assentada do dia 10/04/2018 (ID 95076965 - Pág.
121), deixando, no entanto, de comparecer ao local de produção da prova técnica, que ocorreu
em 02/04/2018 (ID 95076966 - Pág. 125). Assim, considerando que não foi arguido óbice à
realização da audiência antes do prazo para a contestação (findo em 19/04/2018), mesma
conclusão se há de chegar no que diz respeito à prova pericial. Caso contrário, poderia o
procurador autárquico informar o impedimento de comparecer à perícia ao juízo.
Ademais, digno de nota que a autarquia previdenciária formulou quesitos ao especialista
designado pelo juízo, devidamente respondidos pelo perito (ID 95076966 - Pág. 138), inclusive
com esclarecimentos complementares (ID 95076966 - Pág. 149).
Então, o que se conclui é que, se o INSS não compareceu ao local de produção da prova
pericial, o fez porque assim escolheu proceder. Não obstante, teve a oportunidade de obter as
informações requeridas do expert, de forma que não se vislumbra qualquer prejuízo à parte ré.
Por fim, e não menos importante, há que se ressaltar que eventual nulidade deve ser arguida na
primeira oportunidade que a parte tiver para se manifestar em juízo, que, no caso, se deu com a
contestação. O INSS, todavia, nada argumentou a esse respeito em sua peça de defesa.
Rejeitada a preliminar.
Ainda como questão preliminar, digno de nota que, conquanto não conste do dispositivo da
sentença, na fundamentação da decisão, foi admitido o cômputo do intervalo de 01/01/2016 a
31/01/2018, em que a autora contribuiu como contribuinte facultativa.
Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita),
aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do
CPC/2015.
Todavia, verifica-se que o magistrado a quo não se ateve aos termos do pedido ao reconhecer
o período em que a autora verteu contribuições facultativamente de 01/01/2016 a 31/01/2018,
lapso não considerado na contagem do tempo de serviço efetuada pelo INSS (ID 95076966 -
Págs. 76/77). Ressalta-se que o interregno, igualmente, não foi computado pela parte autora
em seu cálculo (ID 95076965 - Pág. 87). Por outro lado, a decisão ad quem deixou de analisar o
pedido de reconhecimento da especialidade do intervalo de 15/04/1996 a 18/12/2006.
Logo, a sentença, neste aspecto, é extra e citra petita, eis que concedeu objeto diverso e
aquém do requerido na inicial; restando violado o princípio da congruência insculpido no art.
492 do CPC/2015.
Conveniente esclarecer que a violação ao princípio da congruência traz, no seu bojo, agressão
ao princípio da imparcialidade, porquanto concede algo não pedido, e do contraditório, na
medida em que impede a parte contrária de exercer integralmente seu direito de defesa.
Dessa forma, há de se adequar a sentença aos limites do pedido inicial, extirpando da
contagem do tempo de serviço o ínterim de 01/01/2016 a 31/01/2018. Desta forma, prejudicada
a apelação do INSS neste tocante. Do mesmo modo, impõe-se a análise do pedido de
admissão da especialidade do lapso de 15/04/1996 a 18/12/2006.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na
Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar
em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação
aplicável à matéria.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior
Tribunal de Justiça:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para
efeito de obtenção do benefício previdenciário".
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se
pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o
raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS
NÃO DEMONSTRADOS. 1. (...). 3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o
período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em
que foi constituído o documento.(...)" (APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO nº
0008835-06.2015.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Paulo Domingues, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1
DATA:07/12/2015 - grifos nossos).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO.
CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO
DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...)
2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência
estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua
eficácia probatória. (...)" (AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014 - grifos nossos).
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver
comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil,
assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural
exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos
como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal
idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes
termos:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(omissis)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado
urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda
que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro
outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do
caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal
meio de vida;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal
meio de vida; e
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este
equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente,
trabalhem com o grupo familiar respectivo.
§1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros
da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do
núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a
utilização de empregados permanentes."
É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para
fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido
antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO
REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL.
CÔMPUTO DE TEMPO RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE
RECOLHIMENTO DO TRIBUTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS PARA SANAR
OMISSÃO SEM EFEITO MODIFICATIVO.
(...)
2. No presente caso, impõe-se sanar omissão para asseverar que a jurisprudência do STJ
possui entendimento no sentido de que é dispensável o recolhimento de contribuições
previdenciárias, para fins de reconhecimento de tempo de serviço rural, quanto ao labor
exercido antes da Lei 8.213/1991.(...)" (EDcl no AgRg no REsp 1537424/SC, Rel. Ministro
MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe
05/11/2015).
"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 485, V, DO CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 55, § 2º, DA LEI N. 8.213/91. OCORRÊNCIA. SEGURADA
VINCULADA AO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL-RGPS. TEMPO DE SERVIÇO
RURAL. APOSENTADORIA. CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE. ANTES DA VIGÊNCIA
DA REFERIDA LEI. PRECEDENTES. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. A autora sempre esteve vinculada ao Regime Geral de Previdência Social.
2. Não é exigível o recolhimento das contribuições previdenciárias, relativas ao tempo de
serviço prestado como trabalhador rural, antes da vigência da Lei n 8.213/91, para fins de
aposentadoria urbana pelo Regime Geral de Previdência Social. Precedentes da Terceira
Seção.
Ação rescisória procedente" (AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015,
DJe 04/12/2015 - grifos nossos).
"APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE
SERVIÇO RURAL ANTERIOR A PROVA DOCUMENTAL.
1. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural exercido antes da data de início de
vigência da Lei n.º 8.213/1991, é de ser computado e averbado, independentemente do
recolhimento das contribuições a ele correspondentes, mas não se presta para efeito de
carência.(...)" (AC nº 0029462-51.2003.4.03.9999, 7ª Turma, Rel. Des. Fed. Fausto de Sanctis,
j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/12/2015).
Contudo, o tempo de serviço do trabalhador rural poderá ser computado, independentemente
do recolhimento de contribuição, exceto para fins de carência, até o dia 31/10/1991, conforme o
disposto no art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99, in verbis:
"Art. 60. Até que lei específica discipline a matéria, são contados como tempo de contribuição,
entre outros:
(...)
X - o tempo de serviço do segurado trabalhador rural anterior à competência novembro de
1991;"
Do caso concreto.
Pretende a parte autora o reconhecimento do trabalho rural no intervalo de 19/12/1975 a
01/01/1991.
A respeito do labor no campo, a inicial foi instruída, dentre outros, com os seguintes
documentos: certidão de casamento dos pais da requerente, em 1977, na qual seu genitor é
qualificado como "lavrador" (ID 95076965 - Pág. 30); certidão de casamento da autora, em
1981, na qual seu cônjuge é identificado como "lavrador" (ID 95076965 - Pág. 31).
A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material.
A testemunha Sra. Anísia Vieira da Silva disse que conhece a autora há muitos anos, desde
criança, pois “sempre trabalharam juntas na roça”. Confirmou que o pai da requerente
trabalhava na lavoura, na colheita de arroz, milho, feijão, algodão, “tudo quanto é lavoura”.
Relatou que, após o casamento, a demandante continuou no labor no campo, com o marido e a
filha. Informou que a postulante deixou a roça quando passou a laborar na coleta de lixo.
A testemunha Sr. Deusdete de Souza Rodrigues disse que conhece a autora desde 1978, mais
ou menos, “desde criança, molecada. Sempre trabalhando na roça. O pai dela era arrendatário,
tocava café, milho, arroz, feijão, de tudo lá”. Referiu que o primeiro marido da requerente
também trabalhava na roça, “eles tudo trabalhavam na roça”. Confirmou que a demandante
sempre trabalhou na lavoura até o ano 1992, mais ou menos.
A testemunha Sr. Edson Braz disse que conhece a autora da década de 70, trabalhando na
roça, com o pai. Afirmou que [o depoente] era gato. Relatou que conheceu o primeiro marido da
autora, o Sr. José, que também trabalhava na roça. Informou que a demandante deixou a roça
por volta da década de 90.
Desta forma, a prova documental é reforçada e ampliada pela prova oral constituída nos autos,
sendo possível reconhecer o trabalho campesino durante o período de 19/12/1975 a
01/01/1991.
Passo a analisar atividade especial.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
Cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria
especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em
virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº
53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de
1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de
Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva
exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº
440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp
nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos,
químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial,
sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto o
Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese da
conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a
harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial,
o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de
conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a
Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória
nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o
artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a
edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997,
que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico
do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
11/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente
nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada
pelo trabalhador.
A propósito do tema:
"(...) Por fim, como afirmado pelo Tribunal de origem, o fundamento sustentado pela Autarquia,
de que a exposição aos agentes biológicos era eventual, não é suficiente para
descaracterização da especialidade.
Não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática
laboral, visto que habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma - que é
protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço cometido ao trabalhador, cujo desempenho,
não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas,
químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho.
Tem-se, assim, que a avaliação no caso dos autos se torna qualitativa, independendo do tempo
de exposição"
(STJ, REsp. nº 1.610.099 - RS (2016/0168867-2), Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de
02/08/2016). (grifos nossos).
Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de
habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como
especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação
anterior (STJ, AgRg no AREsp 295.495/AL, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA
TURMA, DJe de 15/04/2013).
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por
força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado
para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera
insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90
decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos
nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do
Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do
Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece
este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a
18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90
dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo
Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira
Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a
impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a
18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja,
90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Período Trabalhado
Enquadramento
Limites de Tolerância
Até 05/03/1997
1. Anexo do Decreto nº 53.831/64. 2. Decretos nºs 357/91 e 611/92
80 dB
De 06/03/1997 a 18/11/2003
Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, redação original
90dB
A partir de 19/11/2003
Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração do Decreto nº 4.882/03
85 dB
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº
9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico
por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação
de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o
laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face
de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no
cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des.
Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª
Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111,
Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3
Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de
habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como
especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação
anterior (STJ, AgRg no AREsp 295.495/AL, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA
TURMA, DJe de 15/04/2013).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que
o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de
repercussão geral, fixou duas teses:
"(...) a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a
efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for
realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à
aposentadoria especial. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as
informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa
a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da
aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar
suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se
submete";
(...)
a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do
trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no
âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento
de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para
aposentadoria" (STF, ARE 664.335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJe n. 29,
de 11.02.2015, public. 12.02.2015)" (grifos nossos).
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma
extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o
passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas.
Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado
pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente
da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos
arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto
nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CONVERSÃO DO
TEMPO DE SERVIÇO EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS PARA COMUM. FATOR DE
CONVERSÃO. INCIDÊNCIA DO DECRETO N. 4.827/2003, QUE ALTEROU O ART. 70 DO
DECRETO N. 3.048/1999. MATÉRIA DECIDIDA SOB O RITO DO ART. 543-C DO CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. AGRAVO DESPROVIDO.
1. "A Terceira Seção desta Corte, no julgamento do REsp.1.151.363/MG, representativo da
controvérsia, realizado em 23.3.2011 e de relatoria do douto Ministro JORGE MUSSI, firmou o
entendimento de que, de acordo com a alteração dada pelo Decreto 4.827/2003 ao Decreto
3.048/99, a conversão dos períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época será
realizada de acordo com as novas regras da tabela definida no artigo 70 que, para o tempo de
serviço especial correspondente a 25 anos, utiliza como fator de conversão, para homens, o
multiplicador 1,40". (AgRg no REsp n. 1.080.255/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, DJe 15.04.2011) 2. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp 1172563/MG, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TJ/RS), SEXTA TURMA, julgado em 16/06/2011, DJe 01/07/2011) (grifos
nossos).
Do caso concreto.
Controvertida, na demanda, a especialidade dos períodos de 16/08/1993 a 21/11/1993,
01/12/1994 a 03/06/1995, 15/04/1996 a 18/12/2006, 19/12/2006 a 16/07/2014 e 08/07/2014 a
06/12/2015.
A fim de averiguar as condições de trabalho da autora, foi produzida prova técnica, a qual
informou o labor na lavoura de cana-de-açúcar enquanto trabalhadora agrícola de 16/08/1993 a
21/11/1993 e 01/12/1994 a 03/06/1995 e a lida com fezes de animais e demais resíduos no
desempenho da função de varredora de 15/04/1996 a 18/12/2006, 19/12/2006 a 16/07/2014 e
08/07/2014 a 06/12/2015 (ID 95076966 - Págs. 126/127). Diante disso, atestou a exposição ao
agente químico, poeira mineral, e aos agentes biológicos, fungo e bactérias, ambos de forma
habitual e permanente.
No que se refere à atividade exercida pelo trabalhador rural na cultura canavieira, vinha
entendendo ser possível o seu reconhecimento como especial, com fundamento no item 2.2.1
do Anexo do Decreto nº 53.831/64 (Trabalhadores na agropecuária).
No entanto, a 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Pedido de
Uniformização de Interpretação de Lei autuado sob nº 452/PE, firmou posicionamento no
sentido de não poder equiparar a categoria profissional de agropecuária à atividade exercida
pelo empregado rural na lavoura de cana-de-açúcar, in verbis:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE
ESPECIAL. EMPREGADO RURAL. LAVOURA DA CANA-DE-AÇÚCAR. EQUIPARAÇÃO.
CATEGORIA PROFISSIONAL. ATIVIDADE AGROPECUÁRIA. DECRETO 53.831/1964.
IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. Trata-se, na origem, de Ação de Concessão de
Aposentadoria por Tempo de Contribuição em que a parte requerida pleiteia a conversão de
tempo especial em comum de período em que trabalhou na Usina Bom Jesus (18.8.1975 a
27.4.1995) na lavoura da cana-de-açúcar como empregado rural. 2. O ponto controvertido da
presente análise é se o trabalhador rural da lavoura da cana-de-açúcar empregado rural poderia
ou não ser enquadrado na categoria profissional de trabalhador da agropecuária constante no
item 2.2.1 do Decreto 53.831/1964 vigente à época da prestação dos serviços. 3. Está
pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no
momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge
Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin,
Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC (Tema
694 - REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 5/12/2014). 4. O
STJ possui precedentes no sentido de que o trabalhador rural (seja empregado rural ou
segurado especial) que não demonstre o exercício de seu labor na agropecuária, nos termos do
enquadramento por categoria profissional vigente até a edição da Lei 9.032/1995, não possui o
direito subjetivo à conversão ou contagem como tempo especial para fins de aposentadoria por
tempo de serviço/contribuição ou aposentadoria especial, respectivamente. A propósito: AgInt
no AREsp 928.224/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 8/11/2016; AgInt
no AREsp 860.631/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe
16/6/2016; REsp 1.309.245/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 22/10/2015;
AgRg no REsp 1.084.268/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 13/3/2013;
AgRg no REsp 1.217.756/RS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 26/9/2012; AgRg
nos EDcl no AREsp 8.138/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, DJe 9/11/2011; AgRg
no REsp 1.208.587/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 13/10/2011; AgRg no
REsp 909.036/SP, Rel. Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, DJ 12/11/2007, p. 329; REsp 291.
404/SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJ 2/8/2004, p. 576. 5. Pedido de
Uniformização de Jurisprudência de Lei procedente para não equiparar a categoria profissional
de agropecuária à atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-açúcar."
(STJ, 1ª Seção, PUIL 452, relator Ministro Herman Benjamin, j. 08.05.2019, DJe 14.06.2019)
(grifos nossos)
Isso fez com que este Relator, a despeito do seu entendimento pessoal, passasse a observar a
orientação advinda daquela Corte Superior.
Novamente refletindo sobre o tema, no entanto, de acordo com premissa fundada nas máximas
de experiência, subministradas pela observação do que ordinariamente acontece, a atividade
exercida pelos trabalhadores no corte e cultivo de cana-de-açúcar pode ser enquadrada no
código 1.2.11 do Anexo do Decreto n.º 53.831/64 (Tóxicos Orgânicos), no Item 12 do Anexo II
do Decreto nº 2.172/97, bem como no Item XII do Anexo II do Decreto nº 3.048/99, uma vez
que o trabalho, tido como insalubre, envolve desgaste físico excessivo, com horas de exposição
ao sol e a produtos químicos, tais como, pesticidas, inseticidas e herbicidas, além do contato
direto com os malefícios da fuligem, exigindo-se, ainda, alta produtividade, em lamentáveis
condições antiergonômicas de trabalho.
Nesse sentido, colaciono recente julgado desta C. 7ª Turma:
“PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO.
CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO CONFORME O ESTADO. DESNECESSIDADE
DE MAIS PROVAS. REVISÃO DA RMI DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS.
TRABALHADOR RURAL EM LAVOURA DE CANA-DE-AÇÚCAR. IMPLEMENTAÇÃO DOS
REQUISITOS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA
FEDERAL. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA DA PARTE AUTORA. 1. Agravo retido não conhecido, nos
termos do artigo 523, § 1º, do CPC/73, vigente à época da interposição. 2. Alegação de
cerceamento de defesa afastada. Documentos hábeis à comprovação das condições de
trabalho. 3. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de
acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições,
ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98
equivale a tempo de contribuição, a teor do seu art. 4º. 4. Deve ser observada a legislação
vigente à época da prestação do trabalho para o reconhecimento da natureza da atividade
exercida pelo segurado e os meios de sua demonstração. 5. A especialidade do tempo de
trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95),
por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via
laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97). 6. A atividade do
trabalhador rural na cultura de cana-de-açúcar encontra enquadramento no código 1.2.11 do
Decreto nº 53.831/64. É do senso comum que o plantio e a colheita de cana-de-açúcar, assim
como o trato posterior, requerem intensa atividade física do rurícola, que está associada a
riscos ergonômicos e a riscos de acidentes na operação de equipamentos, bem como na
manipulação de insumos, além da factível exposição habitual e permanente a agentes químicos
(pesticidas, herbicidas e inseticidas). 7. Reconhecidas as atividades especiais, deve o INSS
proceder ao recálculo da renda mensal inicial (RMI) do benefício da parte autora. 8. Juros e
correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de
Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em
relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR - Taxa Referencial,
consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de
repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. 9. Sucumbência mínima da
parte autora. Condenação do INSS ao pagamento de honorários. Aplicação da regra do
parágrafo único do artigo 21 do Código de Processo Civil/73. Exigibilidade condicionada à
hipótese prevista no artigo 12 da Lei nº 1.060/50. 10. Agravo retido não conhecido. Preliminar
rejeitada e, no mérito, apelação da parte autora parcialmente provida.”
(ApCiv 0033407-89.2016.4.03.9999, Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES,
TRF3 - 7ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 04/02/2020) (grifos nossos)
Sob este prisma, possível o enquadramento dos períodos de 16/08/1993 a 21/11/1993 e
01/12/1994 a 03/06/1995 como especiais.
No que diz respeito aos interregnos de 15/04/1996 a 18/12/2006, 19/12/2006 a 16/07/2014 e
08/07/2014 a 06/12/2015, igualmente, merecem ser admitidos como especiais, com base no
item 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64 e no item 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
Importante esclarecer que, nos casos em que resta comprovada a exposição a agente biológico
nocivo, a natureza das atividades exercidas já revela, por si só, que mesmo nos casos de
utilização de equipamentos de proteção individual, tido por eficazes, não é possível afastar a
insalubridade a que fica sujeito o profissional. Na mesma linha, confira-se:
"PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA ESPECIAL.
ATIVIDADES EXERCIDAS EM CONDIÇÕES ESPECIAIS DE TRABALHO. AGENTE
AGRESSIVO BIOLÓGICO. EXPOSIÇÃO. UTILIZAÇÃO DO EPI EFICAZ. CONFIGURADAS AS
CONDIÇÕES ESPECIAIS DE TRABALHO.- Apelação tempestiva, recebida no efeito previsto
no CPC/2015.- (...) As profissões de "auxiliar de enfermagem", "atendente de enfermagem" e
"enfermeira" constam dos decretos legais e a sua natureza especial pode ser reconhecida
apenas pelo enquadramento profissional até 05.03.1997, ocasião em que passou a ser
imprescindível a apresentação do laudo técnico ou do perfil profissiográfico previdenciário.- O
enquadramento foi realizado com base na exposição a vírus e bactérias, pelo exercício das
atividades de enfermagem em hospital.- A exposição ao agente agressivo biológico,
demonstrada no período abrangido pelo PPP, é suficiente para a concessão da aposentadoria
especial, uma vez que a utilização de EPI eficaz, no caso de tal agente, não neutraliza os
efeitos nocivos da exposição.- A natureza da atividade corrobora a exposição a agentes
biológicos, sendo viável a aferição da condição especial de trabalho, conforme se verifica nas
informações trazidas nos PPPs constantes do processo administrativo que indeferiu a
concessão do benefício.- Comprovada a exposição a agentes biológicos, de forma habitual e
permanente, até a expedição do PPP. (...).- Remessa oficial, tida por interposta, parcialmente
provida e Apelação provida."(AC 00059571820124036183, DESEMBARGADORA FEDERAL
MARISA SANTOS, TRF3 - NONA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/02/2017
.FONTE_REPUBLICACAO.)
Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais os períodos de
16/08/1993 a 21/11/1993, 01/12/1994 a 03/06/1995, 15/04/1996 a 18/12/2006, 19/12/2006 a
16/07/2014 e 08/07/2014 a 06/12/2015.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I,
da Constituição Federal, o qual dispõe:
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei,
obedecidas as seguintes condições:
I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;
Preleciona o art. 29-C da Lei de Benefícios:
Art. 29-C. O segurado que preencher o requisito para a aposentadoria por tempo de
contribuição poderá optar pela não incidência do fator previdenciário no cálculo de sua
aposentadoria, quando o total resultante da soma de sua idade e de seu tempo de contribuição,
incluídas as frações, na data de requerimento da aposentadoria, for:
I - igual ou superior a noventa e cinco pontos, se homem, observando o tempo mínimo de
contribuição de trinta e cinco anos; ou
II - igual ou superior a oitenta e cinco pontos, se mulher, observado o tempo mínimo de
contribuição de trinta anos.
§ 1ºPara os fins do disposto nocaput, serão somadas as frações em meses completos de tempo
de contribuição e idade.
Conforme planilha anexa, somando-se o tempo de serviço incontroverso (resumo de
documentos – ID 95076966 - Págs. 76/77) ao rural e especial, reconhecidos nesta demanda,
este último convertido em comum, verifica-se que a autora alcançou mais de 85 pontos na data
do requerimento administrativo (27/04/2017 – ID 95076966 - Pág. 82), fazendo jus à
aposentadoria por tempo de contribuição, sem incidência do fator previdenciário, deferida na
origem.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos
para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência
dominante.
A partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, para fins de atualização
monetária e compensação da mora, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo
pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia
(Selic), acumulado mensalmente.
No que tange ao valor da verba honorária sucumbencial, éinegável que as condenações
pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a
referida verba deve, por imposição legal (art. 85, §§2º e 3º, CPC), ser fixada moderadamente, o
que resta perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo este incidir
sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete
da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Em atenção ao disposto no artigo 85, §11, do CPC, ficam os honorários advocatícios majorados
em 2%, respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, dou parcial provimento à apelação da
parte autora, para reconhecer o trabalho rural de 30/09/1981 a 01/01/1991 e, de ofício, restrinjo
e integro a sentença, extra e citra petita, para expurgar o cômputo do período de vertido como
contribuinte facultativa de 01/01/2016 a 31/01/2018 e reconhecer a especialidade do intervalo
de 15/04/1996 a 18/12/2006, e estabeleço que sobre os valores em atraso incidirá correção
monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09,
a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora
serão fixados de acordo com o mesmo Manual, observando que a partir da promulgação da EC
nº 113/2021 haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa
referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente,
mantendo, no mais, a r. sentença prolatada em primeiro grau de jurisdição. Apelação do INSS
parcialmente prejudicada. Verba honorária majorada.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. PRELIMINAR.
PERÍCIA ANTECIPADA. SEM PREJUÍZO. PRECLUSÃO. NÃO ACOLHIDA. SENTENÇA CITRA
E EXTRA PETITA RESTRINGIDA DE OFÍCIO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA
MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. RECONHECIMENTO. ATIVIDADE ESPECIAL.
LAVOURA DE CANA-DE-AÇÚCAR. LIMPEZA DE VIA PÚBLICA. AGENTES BIOLÓGICOS.
RECONHECIMENTO. 85 PONTOS ALCANÇADOS. BENEFÍCIO SEM A INCIDÊNCIA DO
FATOR PREVIDENCIÁRIO DEFERIDO. TERMO INICIAL. DATA DO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PREJUDICADA E DESPROVIDA.
APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - O juízo teria designado a perícia técnica para data anterior ao prazo para a contestação.
Desta forma, a prova técnica não teria sido produzida sob o contraditório. Com efeito, o juízo
primário deferiu a produção da prova pericial (marcada para o dia 02/04/2018) e agendou a
audiência da instrução (em 10/04/2018) já na decisão que determinou a citação do INSS,
facultado ao réu a indicação de assistente e formulação de quesitos no prazo da contestação
(ID 95076965 - Pág. 93). Outrossim, vale notar que foi enviado email à AGU informando acerca
da decisão supra referida, cujo recebimento foi confirmando (em 08/03/2018) pelo procurador
federal, Dr. Edgard Pagliarani Sampaio (ID 95076965 - Pág. 101). Este mesmo procurador se
fez presente na assentada do dia 10/04/2018 (ID 95076965 - Pág. 121), deixando, no entanto,
de comparecer ao local de produção da prova técnica, que ocorreu em 02/04/2018 (ID
95076966 - Pág. 125). Assim, considerando que não foi arguido óbice à realização da audiência
antes do prazo para a contestação (findo em 19/04/2018), mesma conclusão se há de chegar
no que diz respeito à prova pericial. Caso contrário, poderia o procurador autárquico informar o
impedimento de comparecer à perícia ao juízo.
2 - Ademais, digno de nota que a autarquia previdenciária formulou quesitos ao especialista
designado pelo juízo, devidamente respondidos pelo perito (ID 95076966 - Pág. 138), inclusive
com esclarecimentos complementares (ID 95076966 - Pág. 149).
3 - Então, o que se conclui é que, se o INSS não compareceu ao local de produção da prova
pericial, o fez porque assim escolheu proceder. Não obstante, teve a oportunidade de obter as
informações requeridas do expert, de forma que não se vislumbra qualquer prejuízo à parte ré.
4 - Por fim, e não menos importante, há que se ressaltar que eventual nulidade deve ser
arguida na primeira oportunidade que a parte tiver para se manifestar em juízo, que, no caso, se
deu com a contestação. O INSS, todavia, nada argumentou a esse respeito em sua peça de
defesa. Rejeitada a preliminar.
5 - Ainda como questão preliminar, digno de nota que, conquanto não conste do dispositivo da
sentença, na fundamentação da decisão, foi admitido o cômputo do intervalo de 01/01/2016 a
31/01/2018, em que a autora contribuiu como contribuinte facultativa.
6 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita),
aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do
CPC/2015.
7 - Todavia, verifica-se que o magistrado a quo não se ateve aos termos do pedido ao
reconhecer o período em que a autora verteu contribuições facultativamente de 01/01/2016 a
31/01/2018, lapso não considerado na contagem do tempo de serviço efetuada pelo INSS (ID
95076966 - Págs. 76/77). Ressalta-se que o interregno, igualmente, não foi computado pela
parte autora em seu cálculo (ID 95076965 - Pág. 87). Por outro lado, a decisão ad quem deixou
de analisar o pedido de reconhecimento da especialidade do intervalo de 15/04/1996 a
18/12/2006. Logo, a sentença, neste aspecto, é extra e citra petita, eis que concedeu objeto
diverso e aquém do requerido na inicial; restando violado o princípio da congruência insculpido
no art. 492 do CPC/2015.
8 - Dessa forma, há de se adequar a sentença aos limites do pedido inicial, extirpando da
contagem do tempo de serviço o ínterim de 01/01/2016 a 31/01/2018. Desta forma, prejudicada
a apelação do INSS neste tocante. Do mesmo modo, impõe-se a análise do pedido de
admissão da especialidade do lapso de 15/04/1996 a 18/12/2006.
9 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de
Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em
ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação
aplicável à matéria.
10 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
11 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
12 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
13 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII.
14 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. Precedentes jurisprudenciais.
15 - Contudo, o tempo de serviço do trabalhador rural poderá ser computado,
independentemente do recolhimento de contribuição, exceto para fins de carência, até o dia
31/10/1991, conforme o disposto no art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99.
16 - Pretende a parte autora o reconhecimento do trabalho rural no intervalo de 19/12/1975 a
01/01/1991.
17 - A respeito do labor no campo, a inicial foi instruída, dentre outros, com os seguintes
documentos: certidão de casamento dos pais da requerente, em 1977, na qual seu genitor é
qualificado como "lavrador" (ID 95076965 - Pág. 30); certidão de casamento da autora, em
1981, na qual seu cônjuge é identificado como "lavrador" (ID 95076965 - Pág. 31). A
documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material.
18 - A prova documental é reforçada e ampliada pela prova oral constituída nos autos, sendo
possível reconhecer o trabalho campesino durante o período de 19/12/1975 a 01/01/1991.
19 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
20 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
21 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
22 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
11/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
23 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao
agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade
desempenhada pelo trabalhador. Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a
comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para
atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal
exigência na legislação anterior.
24 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
25 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
26 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
27 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
28 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
29 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
30 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
31 – Controvertida, na demanda, a especialidade dos períodos de 16/08/1993 a 21/11/1993,
01/12/1994 a 03/06/1995, 15/04/1996 a 18/12/2006, 19/12/2006 a 16/07/2014 e 08/07/2014 a
06/12/2015.
32 - A fim de averiguar as condições de trabalho da autora, foi produzida prova técnica, a qual
informou o labor na lavoura de cana-de-açúcar enquanto trabalhadora agrícola de 16/08/1993 a
21/11/1993 e 01/12/1994 a 03/06/1995 e a lida com fezes de animais e demais resíduos no
desempenho da função de varredora de 15/04/1996 a 18/12/2006, 19/12/2006 a 16/07/2014 e
08/07/2014 a 06/12/2015 (ID 95076966 - Págs. 126/127). Diante disso, atestou a exposição ao
agente químico, poeira mineral, e aos agentes biológicos, fungo e bactérias, ambos de forma
habitual e permanente.
33 - De acordo com premissa fundada nas máximas de experiência, subministradas pela
observação do que ordinariamente acontece, a atividade exercida pelos trabalhadores no corte
e cultivo de cana-de-açúcar pode ser enquadrada no código 1.2.11 do Anexo do Decreto n.º
53.831/64 (Tóxicos Orgânicos), no Item 12 do Anexo II do Decreto nº 2.172/97, bem como no
Item XII do Anexo II do Decreto nº 3.048/99, uma vez que o trabalho, tido como insalubre,
envolve desgaste físico excessivo, com horas de exposição ao sol e a produtos químicos, tais
como, pesticidas, inseticidas e herbicidas, além do contato direto com os malefícios da fuligem,
exigindo-se, ainda, alta produtividade, em lamentáveis condições antiergonômicas de trabalho.
Precedente desta C. 7ª Turma.
34 - Sob este prisma, possível o enquadramento dos períodos de 16/08/1993 a 21/11/1993,
01/12/1994 a 03/06/1995 como especiais.
35 - No que diz respeito aos interregnos de 15/04/1996 a 18/12/2006 e 19/12/2006 a
16/07/2014 e 08/07/2014 a 06/12/2015, igualmente, merecem ser admitidos como especiais,
com base no item 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64 e no item 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
36 - Importante esclarecer que, nos casos em que resta comprovada a exposição a agente
biológico nocivo, a natureza das atividades exercidas já revela, por si só, que mesmo nos casos
de utilização de equipamentos de proteção individual, tido por eficazes, não é possível afastar a
insalubridade a que fica sujeito o profissional.
37 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais os períodos de
16/08/1993 a 21/11/1993, 01/12/1994 a 03/06/1995, 15/04/1996 a 18/12/2006, 19/12/2006 a
16/07/2014 e 08/07/2014 a 06/12/2015.
38 - Conforme planilha anexa, somando-se o tempo de serviço incontroverso (resumo de
documentos – ID 95076966 - Págs. 76/77) ao rural e especial, reconhecidos nesta demanda,
este último convertido em comum, verifica-se que a autora alcançou mais de 85 pontos na data
do requerimento administrativo (27/04/2017 – ID 95076966 - Pág. 82), fazendo jus à
aposentadoria por tempo de contribuição, sem incidência do fator previdenciário, deferida na
origem.
39 - A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual
de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei
nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob
a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de
variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
40 - Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a
jurisprudência dominante.
41 - A partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, para fins de
atualização monetária e compensação da mora, haverá a incidência, uma única vez, até o
efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de
Custódia (Selic), acumulado mensalmente.
42 - No que tange ao valor da verba honorária sucumbencial, éinegável que as condenações
pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a
referida verba deve, por imposição legal (art. 85, §§2º e 3º, CPC), ser fixada moderadamente, o
que resta perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo este incidir
sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete
da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
43 - Ficam os honorários advocatícios majorados nos termos do disposto no artigo 85, §11, do
CPC, respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.
44 – Sentença citra e extra petita integrada de ofício. Apelação do INSS parcialmente
prejudicada e desprovida. Apelação da parte autora parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação
da parte autora, para reconhecer o trabalho rural de 30/09/1981 a 01/01/1991 e, de ofício,
restringir e integrar a sentença, extra e citra petita, para expurgar o cômputo do período de
vertido como contribuinte facultativa de 01/01/2016 a 31/01/2018 e reconhecer a especialidade
do intervalo de 15/04/1996 a 18/12/2006, e estabelecer que sobre os valores em atraso incidirá
correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros
de mora serão fixados de acordo com o mesmo Manual, observando que a partir da
promulgação da EC nº 113/2021 haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento,
do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic),
acumulado mensalmente, mantendo, no mais, a r. sentença prolatada em primeiro grau de
jurisdição. Apelação do INSS parcialmente prejudicada. Verba honorária majorada, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
