
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005822-78.2023.4.03.6103
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALBERTO MARIA MUSSO
Advogados do(a) APELADO: ANDREA RODRIGUES DA CUNHA FONTOURA - SP322711-A, STELA MARIS DE OLIVEIRA ANDRADE - SP335196-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005822-78.2023.4.03.6103
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALBERTO MARIA MUSSO
Advogados do(a) APELADO: ANDREA RODRIGUES DA CUNHA FONTOURA - SP322711-A, STELA MARIS DE OLIVEIRA ANDRADE - SP335196-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o reconhecimento da atividade exercida em condições especiais e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Na r. sentença, o dispositivo restou assim consignado:
“(...)
Em face do exposto, com fundamento artigo 487, I, do Código de Processo Civil, julgo parcialmente procedente o pedido, para condenar o INSS a computar, como tempo especial, o prestado pelo autor às empresas NEUROCLIN SOCIEDADE SIMPLES LTDA EPP, de 24.10.1986 a 12.2.1987; e SAMEB SERVIÇOS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA DE BARUERI, de 6.4.1986 a 23.10.1986; e também como tempo especial as competências recolhidas como contribuinte individual de 1.6.1986 a 31.1.1988, 1.9.1989 a 30.9.1989, 1.7.1991 a 31.7.1991, e 1.9.1994 a 30.9.1994, implantando a aposentadoria por tempo de contribuição.
Condeno o INSS, ainda, ao pagamento dos valores devidos em atraso, com juros e correção monetária calculados na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução CJF nº 784/2022.
Condeno-o, finalmente, ao pagamento de honorários advocatícios, que arbitro nos percentuais mínimos previstos no § 3º do artigo 85 do CPC, que devem incidir sobre as prestações vencidas até a presente data (Súmula nº 111 do STJ, ainda aplicável conforme o decidido no Tema 1.105/STJ e o artigo 927, III, do CPC).
(...).”. (ID n. 302735297)
A parte autora opôs embargos de declaração, os quais foram acolhidos, cujo dispositivo passo a transcrever:
“
Em face do exposto, dou provimento aos presentes embargos de declaração, atribuindo-lhes efeitos infringentes e também condenando o INSS a computar, como tempo especial, os períodos indicados nas CTCs emitidas pelo Município de São Paulo (23/03/1990 a 14/10/1991, 15/10/1991 a 04/04/1995, 04/08/1992 a 01/04/1996, 25/06/1999 a 09/10/2012, 26/06/2014 a 27/06/2015, 27/08/2015 a 03/09/2016, 03/11/2016 a 09/07/2020 e 06/08/2020 a 10/08/2020), autorizando-se sua conversão em comum até 13.11.2019, pelo fator 1,4.
Por consequência, fica o INSS condenado a implantar a aposentadoria em favor do autor, com termo inicial na DER (20.8.2023), em uma das modalidades, conforme opção a ser manifestada na fase de cumprimento de sentença: a) aposentadoria integral conforme regras anteriores à Emenda nº 103/2019, com exclusão do fator previdenciário (caso mais favorável); b) aposentadorias programadas conforme as regras de transição dos artigos 16, 17 ou 20 da Emenda nº 103/2019.
Mantenho a sentença embargada, no mais, tal como proferida.”. (ID n. 302735302)
Em razões recursais, a Autarquia Federal argui a ilegitimidade passiva para análise da especialidade da atividade exercida no Regime Próprio de Previdência Social. No mérito, alega que não restou comprovada a especialidade da atividade, conforme determina a legislação previdenciária. Argumenta que para o contribuinte individual se faz necessário o recolhimento das contribuições por iniciativa própria e a necessidade de comprovação do desempenho da atividade. Aduz a exigência da certidão de tempo de contribuição (CTC) no RGPS e a impossibilidade de desaverbação do tempo de contribuição. Sustenta ainda a vedação de conversão de tempo especial em comum após a EC 103/2019. Pede a observância da prescrição quinquenal; a juntada da autodeclaração, a isenção de custas e a redução da verba honorária (ID n. 302735303).
É o relatório.
SM
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005822-78.2023.4.03.6103
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALBERTO MARIA MUSSO
Advogados do(a) APELADO: ANDREA RODRIGUES DA CUNHA FONTOURA - SP322711-A, STELA MARIS DE OLIVEIRA ANDRADE - SP335196-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA
Conforme se depreende das certidões de tempo de contribuição (CTCs – id 302735001 – pág. 2, id 302735002 – pág. 2 e id 302735003 – pág. 3) emitidas pela Secretaria Municipal de Saúde do Município de São Paulo, houve o reconhecimento da especialidade da atividade dos períodos de 23/03/1990 a 14/10/1991, 15/10/1991 a 04/04/1995, 04/08/1992 a 01/04/1996, 25/06/1999 a 09/10/2012, 26/06/2014 a 27/06/2015, 27/08/2015 a 03/09/2016, 03/11/2016 a 09/07/2020 e 06/08/2020 a 10/08/2020, uma vez que o autor exerceu atividades de risco, restando tal matéria incontroversa.
Sendo assim, a hipótese dos autos não se trata de reconhecer a atividade especial exercida em Regime Próprio da Previdência Social e, sim apenas na utilização de tais interregnos, já enquadrados no regime estatutário, para fim de aposentadoria no Regime Geral da Previdência Social, o que é permitido pela legislação previdenciária.
Portanto, não caracterizada a ilegitimidade passiva do INSS.
1. DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/ CONTRIBUIÇÃO
O primeiro diploma legal brasileiro a dispor sobre a aposentadoria por tempo de serviço foi a Lei Eloy Chaves, Decreto nº 4.682, de 24 de janeiro de 1923. Referido benefício era concedido apenas aos ferroviários, possuindo como requisito a idade mínima de 50 (cinquenta) anos, tendo sido suspensa no ano de 1940.
Somente em 1948 tal aposentadoria foi restabelecida, tendo sido mantida pela Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS), que preconizava como requisito para a concessão do benefício o limite de idade de 55 (cinquenta e cinco) anos, abolido, posteriormente, pela Lei nº 4.130, de 28 de agosto de 1962, passando a adotar apenas o requisito tempo de serviço.
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional nº 1/69, também disciplinaram tal benefício com salário integral, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna manteve o benefício, disciplinando-o em seu art. 202 (redação original) da seguinte forma:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidas em lei:
(...)
§1º: É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após vinte e cinco, à mulher."
Antes da Emenda Constitucional n. 20/98, de 15 de dezembro de 1998, preceituava a Lei nº 8.213/91, nos arts. 52 e seguintes, que o benefício de aposentadoria por tempo de serviço era devido ao segurado que, após cumprir o período de carência constante da tabela progressiva estabelecida pelo art. 142 do referido texto legal, completar 30 anos de serviço, se homem, ou 25, se mulher, iniciando no percentual de 70% do salário-de-benefício até o máximo de 100% para o tempo integral aos que completarem 30 anos de trabalho se mulher, e 35 anos de trabalho se homem.
Na redação original do art. 29, caput, §1º, da Lei de Benefícios, o salário-de-benefício consiste na média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses imediatamente anteriores ao afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento, até o máximo de 36, apurados no período não superior a 48 meses. Ao segurado que contava com menos de 24 contribuições no período máximo estabelecido, o referido salário corresponde a 1/24 da soma dos salários-de-contribuição.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer, nos arts. 201 e 202 da Constituição Federal:
"Art. 201 A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidos as seguintes condições:
I - 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher;
Art. 202 O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.
(...)"
Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da legislação então vigente.
Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC n. 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo prazo e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
2. DO RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE ESPECIAL
Para o reconhecimento da natureza especial da atividade exercida e a conversão desse intervalo especial em comum, cabe ao segurado demonstrar o trabalho em exposição a agentes agressivos, nos termos da lei vigente à época da prestação do trabalho, observando-se o princípio tempus regit actum (Pet 9.194/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
2.1 PERÍODO ANTERIOR À EDIÇÃO DA LEI Nº 9.032/95
Destarte, no período anterior à edição da Lei nº 9.032/95, o direito à aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais naquela ocasião é reconhecido em razão da categoria profissional exercida pelo segurado ou pela sua exposição aos agentes nocivos descritos nos Anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, a ser comprovada por meio da apresentação de SB 40, sem a necessidade de apresentação de laudo técnico, exceção feita à exposição ao ruído.
2.1.1 PERÍODO POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.032/95 ATÉ A EDIÇÃO DO DECRETO Nº 2.172, DE 5 DE MARÇO DE 1997
A comprovação da atividade especial exercida após a edição da Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995 - que promoveu a alteração do art. 57 da Lei n. 8213/91 - se dá com a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, mediante a apresentação do formulário DSS-8030 (antigo SB 40), o qual se reveste da presunção de que as circunstâncias de trabalho ali descritas se deram em condições especiais, não sendo, portanto, imposto que tal documento se baseie em laudo pericial, com exceção ao limite de tolerância para nível de pressão sonora (ruído).
Anote-se que a relação dos agentes nocivos constante do Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, vigoraram até o advento do Decreto Regulamentar nº 2.172/97, de 5 de março de 1997, do Plano de Benefícios, sendo substituído pelo Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999.
Relevante consignar que a partir da Lei nº 9.032/95 não é mais possível o reconhecimento da atividade especial, unicamente, com fulcro no mero enquadramento da categoria profissional.
2.1.2 PERÍODO POSTERIOR À VIGÊNCIA DO DECRETO Nº 2.172, DE 5 DE MARÇO DE 1997 E DEMAIS CONSIDERAÇÕES
Com a edição do Decreto nº 2.172, de 5 de março de 1997, que regulamentou a Medida Provisória nº 1523/96, convertida na Lei nº 9.528/97, é indispensável a apresentação de laudo técnico para a comprovação de atividade especial.
Cabe esclarecer que a circunstância de o laudo não ser contemporâneo à atividade avaliada não lhe retira absolutamente a força probatória, em face de inexistência de previsão legal para tanto e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral (AC 0022396-76.2005.4.01.3800/MG, Rel. Desembargador Federal Candido Moraes, 2ª Turma, e-DJF1 p.198 de 18/11/2014). Súmula 68 da TNU.
Além disso, é de se apontar que o rol de agentes insalubres, como também das atividades penosas e perigosas, não se esgotam no regulamento, tal como cristalizado no entendimento jurisprudencial na Súmula/TFR n. 198:
"Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento."
Nesse sentido, julgados do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 395988, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 18.11.2003, DJ 19.12.2003, p. 630; 5ª Turma, REsp nº 651516, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 07.10.2004, DJ 08.11.2004, p. 291.
2.2 USO DO EPI
No tocante à utilização de Equipamentos de Proteção Individual - EPI, em recente decisão, com repercussão geral, no ARE 664.335/SC, assentou a Suprema Corte que:
"o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial" (grifo nosso). No caso, porém, de dúvida em relação à efetiva neutralização da nocividade, decidiu que "a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete".
No mais, especificamente quanto à eficácia do equipamento de proteção individual - EPI ao agente agressivo ruído, o Pretório Excelso definiu que:
"na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria". Isso porque, "ainda que se pudesse aceitar que o problema causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores".
2.3 DA CONVERSÃO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM PARA FINS DE APOSENTADORIA ESPECIAL.
Observo que, em se tratando de aposentadoria especial, são considerados somente os períodos trabalhados nessa condição, descabendo a conversão dos lapsos temporais com a aplicação do fator de conversão respectivo.
Entretanto, é de ressaltar que, para fins de contagem de tempo de serviço objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, a teor do julgamento do REsp 1.310.034 e do REsp 1.151.363, ambos submetidos ao regime do art. 543-C do CPC, inexiste óbice para se proceder à conversão de tempo serviço especial em comum, seja antes da Lei 6.887/80, seja após Lei n. 9.711/1998.
2.4 DA CONVERSÃO DO TEMPO DE SERVIÇO COMUM EM ESPECIAL
O direito à conversão do tempo de serviço comum em especial, para fins de concessão de aposentadoria especial, prevaleceu no ordenamento jurídico até a vigência da Lei nº 9.032/95 (28/04/1995) que, ao dar nova redação ao §3º do art. 57 da Lei n. 8.213/91, suprimiu tal possibilidade.
Desta feita, para os pedidos de aposentadoria especial, formulados a partir de 28/04/1995, inexiste previsão legal para se proceder à conversão.
Nesse sentido, a jurisprudência:
"PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO COMUM. CONVERSÃO A ESPECIAL. VEDAÇÃO DA LEI Nº 9.032/95. INCIDÊNCIA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. INVIABILIDADE. COMPLEMENTAÇÃO DE PROVENTOS POR ENTIDADE FECHADA DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECONHECIMENTO.
(...)
IV - A aposentadoria especial requer a prestação de trabalho sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física por 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme o caso. Aplicação do art. 57, caput, da Lei nº 8.213/91, na redação da Lei nº 9.032/95.
V - (...)
VI - Quanto à conversão do tempo de serviço comum ao tipo especial, para fins de concessão de aposentadoria especial, sua viabilidade perdurou até a edição da Lei nº 9.032/95, em virtude da redação então atribuída ao § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
VII - A vedação legal de transformação de tempo de trabalho comum em especial alcança todos os pleitos de benefício formulados a contar da entrada em vigor da nova lei, porquanto o que está protegido seja pelo ato jurídico perfeito, seja pelo direito adquirido, é o reconhecimento da natureza do trabalho prestado (se comum ou especial) em conformidade com legislação vigente à época de seu exercício.
VIII - Não se deve confundir norma de conversão de tempo de serviço com norma de caracterização de atividade laborativa, porque, na hipótese da prestação de labor de natureza comum, não há, por óbvio, condição outra a ser a ela atribuída, sujeitando-se o segurado, por isso, às regras impostas pelo legislador e vigentes quando da reunião dos requisitos necessários à obtenção da prestação de seu interesse, as quais podem depender de múltiplos fatores, sem que se possa extrair violação a qualquer dispositivo constitucional.
IX - Na data do requerimento da aposentadoria por tempo de serviço, deferida na via administrativa em 05 de junho de 1996, já vigorava a proibição para a conversão, em especial, da atividade de natureza comum exercida nos períodos acima mencionados.
X - (...)
XI - Excluída da relação processual a Fundação Cosipa de Seguridade Social, com a extinção do processo, sem julgamento do mérito. Apelação improvida, no tocante ao pleito de conversão da aposentadoria por tempo de serviço para aposentadoria especial " (g.n.).
(AC 2001.03.99.059370-0, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, j. 31.05.2010, DJF3 CJ1 08.07.2010, p. 1257)
2.5 DA FONTE DE CUSTEIO
Ressalto que no julgamento realizado, em sessão de 4/12/14, pelo Plenário do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do E. Ministro Luiz Fux, a Corte Suprema, afastou a alegação, suscitada pelo INSS, de ausência de prévia fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial.
Na ementa daquele julgado constou:
A norma inscrita no art. 195, § 5º, CRFB/88, veda a criação, majoração ou extensão de benefício sem a correspondente fonte de custeio, disposição dirigida ao legislador ordinário, sendo inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela Constituição.
Deveras, o direito à aposentadoria especial foi outorgado aos seus destinatários por norma constitucional (em sua origem o art. 202, e atualmente o art. 201, § 1º, CRFB/88). Precedentes: RE 151.106 AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 28/09/1993, Primeira Turma, DJ de 26/11/93; RE 220.742, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03/03/98, Segunda Turma, DJ de 04/09/1998.
Existência de fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial antes, através dos instrumentos tradicionais de financiamento da previdência social mencionados no art. 195, da CRFB/88, e depois da
Medida Provisória nº 1.729/98, posteriormente convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998. Legislação que, ao reformular o seu modelo de financiamento, inseriu os §§ 6º e 7º no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, e estabeleceu que este benefício será financiado com recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou evinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.
O E. Relator, em seu voto, deixou bem explicitada a regra que se deve adotar ao afirmar:
"Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, pois existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria especial da figura do incentivo (art. 22, II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não consubstancia a concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88). Corroborando o supra esposado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal considera que o art. 195, § 5º, da CRFB/88, contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela própria constituição".
DOS AGENTES AGRESSIVOS
AGENTES BIOLÓGICOS
A exposição a agentes biológicos é considerada prejudicial à saúde, estando prevista no item 1.3.2 do Decreto n.º 53.831/64, 1.3.4 do Decreto nº 83.080/79 e 3.0.1 do Decreto nº 2.172/97, cuja sujeição a agentes nocivos é presumida até a Lei nº 9.032/95, sendo possível o reconhecimento sem a apresentação do laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário até 28.04.1995.
DO CASO DOS AUTOS
Nesta esfera recursal, em virtude do apelo autárquico, cumpre examinar os seguintes pontos:
- Enquadramento dos lapsos de 24/10/1986 a 12/02/1987 (NEUROCLIN SOCIEDADE SIMPLES LTDA EPP,), de 06/04/1986 a 23/10/1986 (SAMEB SERVIÇOS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA DE BARUERI) e de 01/06/1986 a 31/01/1988, 01/09/1989 a 30/09/1989, 01/07/1991 a 31/07/1991, e 01/09/1994 a 30/09/1994 (contribuinte individual);
- Cômputo, como tempo especial, os períodos indicados nas CTCs emitidas pelo Município de São Paulo (23/03/1990 a 14/10/1991, 15/10/1991 a 04/04/1995, 04/08/1992 a 01/04/1996, 25/06/1999 a 09/10/2012, 26/06/2014 a 27/06/2015, 27/08/2015 a 03/09/2016, 03/11/2016 a 09/07/2020 e 06/08/2020 a 10/08/2020).
Além da concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Inicialmente, de acordo com o despacho de indeferimento do benefício (id 302734999 - pág. 189), a Autarquia Federal informa que:
“1. Trata-se de Benefício de Aposentadoria por Tempo de Contribuição Indeferido em razão do(a) Requerente não atingir o Tempo de Contribuição mínimo necessário, tendo completado apenas 34 anos 8 meses e 13 dias de contribuição até a Data de Entrada do Requerimento - DER, nos termos do art. 188-A do Decreto nº 3.048/99.
2. Foram considerados todos os vínculos regulares constantes no(s) documento(s) apresentado(s) (Carteira Profissional - CP ou Carteira de Trabalho - CTPS; e Certidão de Tempo de Contribuição - CTC do Órgão:
PREFEITURA DO MUNICIPIO DE SAO PAULO), e no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, nos termos do §1º e caput, art. 19, art. 19-A, e §1º, art. 19-B, todos do Decreto nº 3.048/99, excluindo-se os períodos utilizados na averbação junto a Prefeitura de Osasco.
3. Todas as contribuições como Contribuinte Individual constantes em documentos apresentados e/ou no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS foram consideradas, e somadas ao Tempo de Contribuição. Há contribuições como Facultativo constantes em documentos apresentados e/ou no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS que não puderam ser consideradas por não atendimento de requisitos previstos na legislação: o recolhimento das competências é concomitante com atividade de filiação obrigatória ou benefício previdenciário, em desacordo com o disposto no §5º do art. 107 da Instrução Normativa nº 128/2022, e §5º do art. 74 da Portaria Dirben/INSS nº 990/2022 (Livro I - Cadastro), e ainda que regularizadas as contribuições faltantes e houvesse o cômputo das competências recolhidas na categoria de facultativo, o tempo total seria insuficiente para a concessão do pedido.”. grifei
De se acrescentar que, examinando a planilha de cálculo do INSS (id 302734999 - pág. 163), verifica-se que os períodos de 24/10/1986 a 12/02/1987 (NEUROCLIN SOCIEDADE SIMPLES LTDA EPP,) e de 06/04/1986 a 23/10/1986 (SAMEB SERVIÇOS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA DE BARUERI) integram na contagem, no entanto, como tempo comum e os interregnos em que efetuou o recolhimento de contribuições previdenciárias não foram computados.
Por sua vez, conforme se extrai da declaração emitida pelo Instituto de Previdência do Município de Osasco (id 302735294), o autor foi aposentado na modalidade aposentadoria por tempo de contribuição e idade em 08/09/2020, com a utilização do período vinculado ao RGPS de 18/03/1987 a 21/08/1994, por outro lado, não foram utilizados os seguintes lapsos (que totalizam 06 anos, 09 meses e 18 dias):
- 06/04/1986 a 03/10/1986;
- 01/10/1986 a 12/02/1987;
- 01/02/1988 a 30/09/1989;
- 01/10/1989 a 31/07/1991;
- 01/08/1991 a 24/09/1991;
- 01/06/1992 a 21/07/1994.
Além do que, no mencionado documento, há informação que, para fins de aposentadoria por tempo no RPPS, foram computados os períodos de:
- 22/08/1994 a 12/08/2020, vinculado perante o RPPS, ou seja, 25 anos, 11 meses e 26 dias;
- 18/03/1987 a 21/08/1994, em que o segurado também esteve filiado junto ao RPPS, que corresponde a 6 anos, 09 meses e 10 dias e,
- 29/04/1985 a 14/07/1985, de 15/10/1985 a 12/02/1987, de 13/02/1987 a 16/03/1987 e de 25/09/1991 a 31/05/1992, tempo vinculado ao RGPS que totaliza 02 anos, 03 meses e 05 dias.
Foi carreada também as certidões de tempo de contribuição (CTCs – id 302735001 – pág. 2, id 302735002 – pág. 2 e id 302735003 – pág. 3) emitidas pela Secretaria Municipal de Saúde do Município de São Paulo, informando:
1) houve o reconhecimento da especialidade da atividade dos períodos de 23/03/1990 a 14/10/1991, 15/10/1991 a 04/04/1995, 04/08/1992 a 01/04/1996, 25/06/1999 a 09/10/2012, 26/06/2014 a 27/06/2015, 27/08/2015 a 03/09/2016, 03/11/2016 a 09/07/2020 e 06/08/2020 a 10/08/2020, uma vez que o autor exerceu atividades de risco.
2) que o autor prestou serviços, como médico, no período de 18/05/1992 a 10/08/2020 e que deve ser aproveitado no INSS, sendo que, de efetivo exercício, corresponde a 28 anos, 01 mês e 10 dias.
Após esse relato dos fatos, passo a examinar a questão controvertida.
CONTRIBUINTE INDIVIDUAL E RECOLHIMENTO EM ATRASO
Ao indeferir o pedido de aposentadoria, o órgão previdenciário informou que as contribuições vertidas como contribuinte individual não puderam ser contabilizadas, em conformidade com o disposto no §5º do art. 107 da Instrução Normativa nº 128/2022, e §5º do art. 74 da Portaria Dirben/INSS nº 990/2022.
Segundo o § 5º , do artigo 107 da Instrução Normativa n. 128/2022 é vedada a filiação ao RGPS, na qualidade de segurado facultativo:
I - dentro do mesmo mês em que iniciar ou cessar o exercício da atividade sujeita à filiação obrigatória, tanto no RGPS como no RPPS, ou pagamento de benefício previdenciário, ressalvadas as hipóteses de benefícios de pensão por morte e auxílio-reclusão;
Em que pese tal orientação administrativa, não se pode olvidar que as contribuições questionadas são referentes as competências de 06/1986 a 09/1994, portanto, não se aplicando a instrução normativa apontada, tampouco a Portaria DIRBEN/INSS n. 990 de 2022 em observância ao princípio tempus regit actum, que garante a regência das relações jurídicas pela lei vigente no momento em que ocorreram os fatos, não se aplicando leis posteriores.
Sendo assim, ao analisar a matéria e a legislação vigente na época dos fatos, extrai-se que de acordo com a Lei n. 3.807/70:
Art. 5º São obrigatoriamente segurados da Previdência Social, os trabalhadores autônomos, avulsos e temporários (Redação dada pela Lei nº 6.887, de 1980)
Art. 7º A perda da qualidade de segurado importa na caducidade dos direitos inerentes a essa qualidade.
Art. 8º Perderá a qualidade de segurado aquele que, não se achando no gozo de benefício, deixar de contribuir por mais de doze meses consecutivos.
§ 2º Durante o prazo de que trata este artigo, o segurado conservará todos os direitos, perante a instituição de previdência social a que estiver filiado.
Sendo assim, a legislação vigente a época dos fatos, penaliza o segurado com a perda da qualidade de segurado na hipótese de ausência de contribuição por mais de 12 (doze) meses consecutivos, resguardadas as hipóteses em que esse prazo pode ser dilatado.
No caso dos autos, de acordo com o extrato do sistema CNIS (id 302735030), o autor possui vínculo empregatício nos períodos de 29/04/1985 a 04/07/1986, de 15/10/1985 a 30/10/1987, de 06/04/1986 a 23/10/1986, de 01/10/1986 a 16/03/1987 e efetuou o recolhimento de contribuições previdenciárias, como contribuinte em dobro, nos interregnos de 01/02/1988 a 31/08/1989, de 01/10/1989 a 30/06/1991 e como facultativo de 01/08/1991 a 31/12/1993, sem constar qualquer tipo de pendência.
Portanto, em que pese os recolhimentos efetuados em atraso, como contribuinte individual, é possível que os lapsos de 01/06/1986 a 31/01/1988, 01/09/1989 a 30/09/1989, 01/07/1991 a 31/07/1991, e 01/09/1994 a 30/09/1994 integrem na contagem do tempo de contribuição, uma vez que não restou caracterizada a perda da qualidade de segurado.
DA ATIVIDADE ESPECIAL
Para comprovar a especialidade nos períodos de 24/10/1986 a 12/02/1987 (NEUROCLIN SOCIEDADE SIMPLES LTDA EPP,), de 06/04/1986 a 23/10/1986 (SAMEB SERVIÇOS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA DE BARUERI) e de 01/06/1986 a 31/01/1988, 01/09/1989 a 30/09/1989, 01/07/1991 a 31/07/1991 e 01/09/1994 a 30/09/1994 (contribuinte individual), foram carreados os seguintes documentos:
- CTPS indicando que exerceu a atividade de médico; Enquadramento dos períodos de 24/10/1986 a 12/02/1987 e de 06/04/1986 a 23/10/1986, no item 1.3.2 do Decreto n.º 53.831/64 e item 1.3.4 do Decreto nº 83.080/79.
- Guias de recolhimento, efetuados em atraso, referentes aos períodos de 01/06/1986 a 31/01/1988, 01/09/1989 a 30/09/1989, 01/07/1991 a 31/07/1991 e 01/09/1994 a 30/09/1994, com pagamento de juros, multa e correção monetária (id 302735008, id 302735009, id 302735010, id 302735011 e id 302735012). Para comprovar o exercício de atividade laborativa, foi carreado o diploma universitário, informando a conclusão do Curso de Medicina em 25/10/1984 (id 302735286). Possibilidade de enquadramento no item 1.3.2 do Decreto n.º 53.831/64 e item 1.3.4 do Decreto nº 83.080/79.
Não se pode olvidar que a jurisprudência pátria é uníssona no sentido de possibilitar o enquadramento, como especial, da atividade exercida pelo contribuinte individual, desde que comprovada, de forma eficaz, as condições agressivas do seu ambiente de trabalho.
Nesse sentido trago a colação a seguinte jurisprudência desta E. Corte
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. ELETRICISTA. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DO LABOR PRESTADO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA EFETIVA SUBMISSÃO A AGENTES AGRESSIVOS. OBSERVÂNCIA DA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL À ÉPOCA DO TRABALHO. PRECEDENTES DO C. STJ. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. NÃO COMPROVAÇÃO DO TRABALHO ESPECIAL. TEMPO SUFICIENTE. BENEFÍCIO INTEGRAL CONCEDIDO. DATA DO INÍCIO. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. VERBA HONORÁRIA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
2 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
3 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
4 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
5 - Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
6 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
(...)
16 - Sustenta o autor ter laborado como eletricista de 05/1986 a 11/2012, requerendo o reconhecimento de tal período como especial, com a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. Vê-se da documentação acostada aos autos que o autor exerceu a referida atividade, em verdade, na condição de contribuinte individual. O extrato do CNIS de fl. 70 demonstra que ele inscreveu-se como empresário junto ao INSS, em 01/05/1986, bem como abriu firma individual no ramo de comércio varejista de máquinas e aparelhos de uso doméstico e pessoal (televisor, vídeo, rádio, antenas e aparelho de som), conforme Declaração de fl. 74 e Requerimento de Empresário de fls. 75/76, além de Comprovante de Inscrição e de Situação Cadastral de fl. 77.
17 - Os extratos do CNIS de fls. 78/82 demonstram, ainda, que o postulante efetuou recolhimentos de 05/1986 a 03/1990; 05/1990 a 08/1999; 09/1999 a 11/1999, 01/2000 a 03/2003, 04/2003 a 01/2006 e de 03/2006 a 01/2010.
18 - O C. Superior Tribunal de Justiça, em sua jurisprudência mais atual, vem consolidando o entendimento no sentido de ser possível ao segurado individual pleitear o reconhecimento de labor prestado em condições especiais, com a ressalva de que seja capaz também de comprovar a efetiva submissão aos agentes agressivos, nos moldes previstos à época em que realizado o serviço.
19 - Caberia ao autor, portanto, demonstrar que esteve efetivamente submetido a condições de trabalho prejudiciais à sua saúde/integridade física, bem como que tais condições se amoldam ao quanto estabelecido na legislação vigente à época em que exerceu suas atividades como autônomo. E no presente caso, o demandante não logrou êxito em tal empreitada. No tocante à atividade de eletricista, as normas anteriormente mencionadas na fundamentação desta decisão, que regem o labor exercido sob condições especiais, exigiam que o labor fosse exercido com exposição à tensão superior a 250 volts, para fins de enquadramento da categoria profissional no rol de atividades consideradas prejudiciais à saúde e à integridade física. E quanto ao ponto, não há qualquer indício nos autos de que o autor estivesse submetido a tal agente agressivo. Não fora produzida qualquer prova técnica hábil à comprovação da referida exposição.
20 - Não obstante conste dos autos a oitiva de testemunhas, tal prova não se presta à demonstração da especialidade do labor. A comprovação da existência e da intensidade de supostos agentes agressivos ou danosos à saúde do trabalhador - que justificassem a caracterização da especialidade do labor exercido - somente poderá ser atestada por profissional com conhecimentos específicos, prova esta que deve ser obtida pela realização de perícia técnica ou, no máximo, por meio de documentos firmados por profissionais com conhecimento específico, mas jamais por tomada de depoimentos de testemunhas.
21 - Assim, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, inviável o reconhecimento pretendido pelo postulante.
(...)
29 - Apelação da parte autora parcialmente provida.
(TRF3a. Região – 5001988-63.2016.4.03.9999 - 7ª. Turma - Data da publicação – DJF3 Judicial - 28/01/2020 - Des. Fed. Carlos Eduardo Delgado)
DO DIREITO À APOSENTADORIA
A Constituição Federal, em seu § 9º do artigo 201, assegura a contagem recíproca entre o RGPS e RPPS, observando-se a compensação financeira, e para isto, o regime de origem tem que expedir a devida Certidão de Tempo de Contribuição. Somente o órgão de origem é que pode reconhecer se a atividade prestada pelo trabalhador foi uma atividade especial e que, em razão disto, o outro sistema será ressarcido financeiramente pelo reconhecimento também desta especialidade.
Ademais, o tempo fictício de serviço não está contemplado no instituto da contagem recíproca prescrita no texto constitucional e é importante registrar que no serviço público inexiste aposentadoria especial, com redução ou conversão de tempo de serviço, por isto um regime expede para o outro a CTC. Para tanto, cito o precedente do Supremo Tribunal Federal que, no julgamento da ADIn nº 1.664-0, destaca que a regra da contagem recíproca inserta no § 2º do artigo 202 da Constituição Federal de 1988 é restrita ao tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada. Dito de outra forma, o tempo de serviço fictício considerado como tempo de contribuição por um regime previdenciário, não pode ser aproveitado para efeito da contagem recíproca assegurada pelo texto constitucional, sem que o regime de origem a tenha certificado.
Por seu turno, não se pode olvidar que a Certidão de Tempo de Contribuição tem o condão de comprovar os recolhimentos previdenciários do servidor público para o RPPS, para fins de contagem recíproca do tempo de contribuição entre os regimes de previdência.
De acordo com o art. 130 do Decreto 3.048/99 o tempo de contribuição para regime próprio de previdência social ou para Regime Geral de Previdência Social deve ser provado com certidão fornecida: (Redação dada pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
I - pela unidade gestora do regime próprio de previdência social ou pelo setor competente da administração federal, estadual, do Distrito Federal e municipal, suas autarquias e fundações, desde que devidamente homologada pela unidade gestora do regime próprio, relativamente ao tempo de contribuição para o respectivo regime próprio de previdência social; ou (Redação dada pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
(...)
§ 9º A certidão só poderá ser fornecida para os períodos de efetiva contribuição para o Regime Geral de Previdência Social, devendo ser excluídos aqueles para os quais não tenha havido contribuição, salvo se recolhida na forma dos §§ 7º a 14 do art. 216. (Incluído pelo Decreto nº 3.668, de 2000)
Com efeito, com a somatória do tempo de contribuição em que o autor prestou serviços junto à Secretaria Municipal de Saúde do Município de São Paulo correspondente a 28 anos, 01 mês e 10 dias, devidamente comprovado através da CTC, além dos períodos especiais já reconhecidos no RPPS e também os lapsos ora reconhecidos, devidamente convertidos, até 13/11/2019, data da entrada em vigor da EC 103/2019, totaliza mais de 35 anos, suficientes à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, com renda mensal inicial correspondente a 100% (cem por cento) do salário de benefício, em valor a ser devidamente calculado pelo Instituto Previdenciário.
Também restou amplamente comprovada pelo conjunto probatório acostado aos autos, a carência prevista na tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.
AUTODECLARAÇÃO
No mais, quanto ao requerimento do INSS pela apresentação da autodeclaração prevista na Portaria nº 450, destaco que a presente decisão se limitará a analisar a legalidade do pedido de concessão do benefício previdenciário, sem prejuízo de eventuais procedimentos de praxe a serem adotados pela Autarquia Previdenciária no momento de sua implementação.
AUSÊNCIA DE PARCELAS PRESCRITAS
O termo inicial foi fixado na r. sentença de primeiro grau na data do requerimento administrativo em 20.8.2023, portanto, não havendo parcelas prescritas.
CUSTAS
Conquanto a Lei Federal nº 9.289/96 disponha no art. 4º, I, que as Autarquias são isentas do pagamento de custas na Justiça Federal, seu art. 1º, §1º, delega à legislação estadual normatizar sobre a respectiva cobrança nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual no exercício da competência delegada. Note-se que, em se tratando das demandas aforadas no Estado de São Paulo, tal isenção encontra respaldo na Lei Estadual nº 11.608/03 (art. 6º).
A isenção referida não abrange as despesas processuais que houver efetuado, bem como, aquelas devidas a título de reembolso à parte contrária, por força da sucumbência.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015, bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios, a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência.
DISPOSIÇÕES RELATIVAS À EXECUÇÃO DE SENTENÇA
Na liquidação da obrigação de fazer a que o INSS foi condenado nestes autos serão observadas as seguintes determinações:
Caberá ao INSS calcular o tempo de serviço para a concessão do benefício de acordo com os períodos reconhecidos nos autos, vinculado aos termos da coisa julgada, somando-se ao tempo de contribuição incontroverso.
Deixo consignado, também, que não cabe ao Poder Judiciário, através de sua contadoria, elaborar cálculos para a identificação de qual benefício é o mais vantajoso para o segurado, cabendo ao INSS orientar quanto ao exercício deste direito de opção.
Fica o INSS autorizado a compensar valores pagos administrativamente ao autor no período abrangido pela presente condenação, efetivados a título de benefício previdenciário que não pode ser cumulado com o presente.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, rejeito a preliminar e dou parcial provimento à apelação da Autarquia Federal, para isentá-la do pagamento das custas processuais, com exceção das despesas em reembolso, observando-se no que tange à verba honorária o disposto no presente julgado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. PRELIMINAR REJEITADA. ATIVIDADE ESPECIAL RECONHECIDA. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. CONTAGEM RECÍPROCA. REQUISITOS PARA A APOSENTAÇÃO PREENCHIDOS. CUSTAS. VERBA HONORÁRIA. MAJORAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
I. Caso em exame:
- Apelação do INSS em face da sentença que julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, com o reconhecimento de atividade especial, inclusive, como contribuinte individual.
II. Questão em discussão:
- Há três questões em discussão: (i) possibilidade de reconhecimento da especialidade da atividade; (ii) inclusão do período vinculado ao RPPS para fins de aposentadoria no RGPS; (iii) saber se preenchidos os requisitos para o deferimento da aposentadoria por tempo de contribuição.
III. Razões de decidir:
- In casu, conforme se depreende das certidões de tempo de contribuição (CTCs) emitidas pela Secretaria Municipal de Saúde do Município de São Paulo, houve o reconhecimento da especialidade da atividade dos períodos de 23/03/1990 a 14/10/1991, 15/10/1991 a 04/04/1995, 04/08/1992 a 01/04/1996, 25/06/1999 a 09/10/2012, 26/06/2014 a 27/06/2015, 27/08/2015 a 03/09/2016, 03/11/2016 a 09/07/2020 e 06/08/2020 a 10/08/2020, uma vez que o autor exerceu atividades de risco, restando tal matéria incontroversa.
- Sendo assim, a hipótese dos autos não se trata de reconhecer a atividade especial exercida em Regime Próprio da Previdência Social e, sim apenas na utilização de tais interregnos, já enquadrados no regime estatutário, para fim de aposentadoria no Regime Geral da Previdência Social, o que é permitido pela legislação previdenciária. Ilegitimidade passiva do INSS não caracterizada.
- Foram contempladas três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
- A Emenda Constitucional n. 103 de 15 de novembro de 2019 trouxe inúmeras alterações ao sistema de Previdência Social, que passaram a vigorar na data da sua publicação em 13/11/2019.
- Tempo de serviço especial reconhecido, uma vez que a CTPS indica que exerceu a atividade de médico. Além das guias de recolhimento, efetuados em atraso, referentes aos períodos de 1.6.1986 a 31.1.1988, 1.9.1989 a 30.9.1989, 1.7.1991 a 31.7.1991, e 1.9.1994 a 30.9.1994, com pagamento de juros, multa e correção monetária, sendo que o exercício da atividade laborativa foi comprovado através do diploma universitário, informando a conclusão do Curso de Medicina em 25/10/1984. Possibilidade de enquadramento no item 1.3.2 do Decreto n.º 53.831/64 e item 1.3.4 do Decreto nº 83.080/79.
- A Constituição Federal, em seu § 9º do artigo 201, assegura a contagem recíproca entre o RGPS e RPPS, observando-se a compensação financeira, e para isto, o regime de origem tem que expedir a devida Certidão de Tempo de Contribuição. Somente o órgão de origem é que pode reconhecer se a atividade prestada pelo trabalhador foi uma atividade especial e que, em razão disto, o outro sistema será ressarcido financeiramente pelo reconhecimento também desta especialidade.
- A Certidão de Tempo de Contribuição tem o condão de comprovar os recolhimentos previdenciários do servidor público para o RPPS, para fins de contagem recíproca do tempo de contribuição entre os regimes de previdência.
- A somatória do tempo de contribuição autoriza o deferimento do benefício vindicado, não havendo parcelas prescritas.
- As contribuições vertidas em atraso devem ser contabilizadas como tempo de contribuição.
- A isenção de custas, pela Autarquia Federal, não abrange as despesas processuais que houver efetuado, bem como, aquelas devidas a título de reembolso à parte contrária, por força da sucumbência.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
IV. Dispositivo e tese
- Apelação da Autarquia Federal parcialmente provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
