Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6073089-41.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
26/02/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 03/03/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL E ESPECIAL. RUÍDO. CONSTRUÇÃO CIVIL.
LAUDO POR SIMILARIDADE. AUSÊNCIA DO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA
CONCESSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS.
- Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer o artigo 201 da Constituição
Federal o direito à aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, ao
completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem e 30 (trinta) anos de contribuição,
se mulher.
- Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de
dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
- Ao segurado inscrito perante o Regime Geral de Previdência Social anteriormente à
promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, mas que, nessa data (16 de dezembro de
1998), ainda não tivesse preenchido os requisitos necessários à sua aposentação, mesmo na
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
forma proporcional, aplicam-se as regras de transição estabelecidas pelo art. 9º da referida
normação constitucional.
- Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que
cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC
20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo
prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
- No caso dos autos, inviável o reconhecimento da atividade rural, ante a ausência de
comprovação efetiva da atividade exercida, restando comprovado em parte o labor exercido em
condições especiais.
- A somatória do tempo de serviço da parte autora é insuficiente para a concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição.
- Em razão da sucumbência recursal, majorados em 100% os honorários fixados em sentença, a
teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015, ficando suspensa sua execução, em razão de ser o
autor beneficiário da Justiça Gratuita (art. 98, §3º, CPC/15).
- Apelação do INSS parcialmente provida. Recurso da parte autora improvido.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6073089-41.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: ROSARIO TEIXEIRA DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: DEISY MARA PERUQUETTI - SP320138-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ROSARIO TEIXEIRA DA
SILVA
Advogado do(a) APELADO: DEISY MARA PERUQUETTI - SP320138-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6073089-41.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: ROSARIO TEIXEIRA DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: DEISY MARA PERUQUETTI - SP320138-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ROSARIO TEIXEIRA DA
SILVA
Advogado do(a) APELADO: DEISY MARA PERUQUETTI - SP320138-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS,
objetivando o reconhecimento de atividade rural sem registro em CTPS e a conversão de tempo
especial em comum e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença julgou parcialmente procedente a demanda para reconhecer os períodos de
04/02/1987 a 17/03/1987, de 24/03/1987 a 01/10/1987, de 25/11/1987 a 01/12/1987, de
04/01/1988 02/06/1990, de 12/09/1990 a 24/07/1992, de 08/05/1993 a 29/11/1993, de 01/02/1994
a 20/04/1994, de 02/05/1994 a 25/11/1994, de 30/01/1995 a 13/12/1995, de 02/05/1996 a
06/12/1996, de 09/05/1997 a 13/12/1997, de 08/05/1998 a 30/11/1998, de 03/05/1999 a
31/10/1999, de 08/05/2000 a 14/10/2000, de 07/05/2001 a 06/12/2001, de 02/05/2002 a
07/11/2002, de 03/05/2003 a 06/11/2003, de 12/04/2004 a 07/12/2004, de 20/12/2004 a
22/02/2005 e de 23/02/2005 a 16/02/2017 como especiais. Condenada a parte autora ao
pagamento de honorários advocatícios fixados em R$500,00 (quinhentos reais), nos termos do
art. 86, parágrafo único, do Código de Processo Civil, observando a gratuidade da justiça.
Apela a parte autora, em que pleiteia o reconhecimento da atividade rural sem registro em CTPS,
com a consequente concessão do benefício.
Por sua vez, apela a autarquia, em que pede a reforma da sentença e improcedência do pedido,
ao argumento de que a parte autora não logrou comprovar a natureza especial dos vínculos
empregatícios.
Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta instância para decisão.
É o sucinto relato.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6073089-41.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: ROSARIO TEIXEIRA DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: DEISY MARA PERUQUETTI - SP320138-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ROSARIO TEIXEIRA DA
SILVA
Advogado do(a) APELADO: DEISY MARA PERUQUETTI - SP320138-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, tempestivos os recursos e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade
recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
1. DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/ CONTRIBUIÇÃO
O primeiro diploma legal brasileiro a dispor sobre a aposentadoria por tempo de serviço foi a Lei
Eloy Chaves, Decreto nº 4.682, de 24 de janeiro de 1923. Referido benefício era concedido
apenas aos ferroviários, possuindo como requisito a idade mínima de 50 (cinquenta) anos, tendo
sido suspensa no ano de 1940.
Somente em 1948 tal aposentadoria foi restabelecida, tendo sido mantida pela Lei nº 3.807, de 26
de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS), que preconizava como requisito
para a concessão do benefício o limite de idade de 55 (cinquenta e cinco) anos, abolido,
posteriormente, pela Lei nº 4.130, de 28 de agosto de 1962, passando a adotar apenas o
requisito tempo de serviço.
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional nº 1/69, também disciplinaram tal
benefício com salário integral, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna manteve o benefício, disciplinando-o em seu art. 202 (redação original) da
seguinte forma:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior,
se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
definidas em lei:
(...)
§1º: É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Antes da Emenda Constitucional n. 20/98, de 15 de dezembro de 1998, preceituava a Lei nº
8.213/91, nos arts. 52 e seguintes, que o benefício de aposentadoria por tempo de serviço era
devido ao segurado que, após cumprir o período de carência constante da tabela progressiva
estabelecida pelo art. 142 do referido texto legal, completar 30 anos de serviço, se homem, ou 25,
se mulher, iniciando no percentual de 70% do salário-de-benefício até o máximo de 100% para o
tempo integral aos que completarem 30 anos de trabalho se mulher, e 35 anos de trabalho se
homem.
Na redação original do art. 29, caput, §1º, da Lei de Benefícios, o salário-de-benefício consiste na
média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses imediatamente
anteriores ao afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento, até o máximo de
36, apurados no período não superior a 48 meses. Ao segurado que contava com menos de 24
contribuições no período máximo estabelecido, o referido salário corresponde a 1/24 da soma dos
salários-de-contribuição.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer, nos arts. 201 e 202 da
Constituição Federal:
"Art. 201 A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei,
obedecidos as seguintes condições:
I - 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se
mulher;
Art. 202 O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma
autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na
constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.
(...)"
Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de
dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que
cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC
20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo
prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
No caso do segurado inscrito perante o Regime Geral de Previdência Social anteriormente à
promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98 mas que, nessa data (16 de dezembro de
1998), ainda não tivesse preenchido os requisitos necessários à sua aposentação, mesmo na
forma proporcional, com pelo menos 30 anos, se do sexo masculino, aplicam-se as regras de
transição estabelecidas pelo art. 9º da referida normação constitucional, assim descritas:
a) limite etário mínimo de 53 (cinquenta e três) anos para os homens e 48 (quarenta e oito) anos
para as mulheres;
b) tempo de contribuição para a aposentadoria integral de pelo menos 35 (trinta e cinco) anos
para homens e 30 (trinta) anos para as mulheres, mais o período adicional "pedágio" na
proporção de 20% (vinte por cento) do tempo que faltaria na data da publicação da Emenda para
atingir o limite de tempo;
c) tempo de contribuição para a aposentadoria proporcional de 30 (trinta) anos para os homens e
25 (vinte e cinco) anos para as mulheres, mais o período adicional "pedágio" na proporção de
40% (quarenta por cento) do tempo faltante na data da publicação da Emenda para atingir o limite
de tempo.
Na hipótese da aposentadoria integral, firmou-se o entendimento acerca da não aplicabilidade da
idade mínima e pedágio, exigências que remanescem tão-somente para a jubilação proporcional.
O julgado proferido por esta 9ª Turma é exemplificativo:
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. TUTELA
ANTECIPADA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. IDADE MÍNIMA EXIGIDA
PELA EC 20/98. INEXIGIBILIDADE NA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO INTEGRAL. REQUISITOS
DO ARTIGO 273 DO CPC DEMONSTRADOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
(...)
II - Afastada a incidência do requisito idade instituído no artigo 9º da Emenda Constitucional nº
20, de 15 de dezembro de 1998, na concessão do benefício de aposentadoria integral por tempo
de contribuição postulado, cabível sua incidência somente na concessão dos benefícios de
aposentadoria proporcional, já que a Emenda Constitucional nº 20, na alteração introduzida no
corpo permanente da Constituição, não fez incluir no inciso I do § 7º do artigo 201 o requisito
idade para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
III - Conclusão decorre da exegese sistemática do tratamento dado à matéria pela Constituição
Federal, e que se encontra devidamente assimilado na Instrução Normativa nº 95, de 07 de
outubro de 2003.
IV - Agravo parcialmente provido."
(AG 216632, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, j. 28/02/2005, v.u., DJU 22/03/2005, p. 448).
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto, conforme escólio de
Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Junior:
"(...) optando pela regra temporária, o segurado necessita atender ao requisito de idade mínima e
do pedágio. Pela regra permanente, não há idade mínima, nem pedágio. Neste quadro, restou
esvaziada a regra temporária, a não ser no caso de aposentadoria proporcional, pois nenhum
segurado irá optar pela regra temporária". (in Comentários à Lei de Benefício da Previdência
Social, 3ª ed., pág. 193. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003).
Por fim, a própria Autarquia Previdenciária perfilhou do entendimento citado, conforme contido
nas Instruções Normativas nº 57/2001, 84/2002, 95/2003 e 118/2005.
2. DA ATIVIDADE RURAL:
2.1 INTRODUÇÃO
A Lei nº 4.214, de 2 de março de 1963, que dispunha sobre o "Estatuto do Trabalhador Rural", já
considerava como segurado obrigatório o trabalhador rural, inclusive os pequenos produtores,
conforme art. 160, in verbis:
"Art. 160. São obrigatoriamente, segurados: os trabalhadores rurais, os colonos ou parceiros,
bem como os pequenos proprietários rurais, empreiteiros, tarefeiros e as pessoas físicas que
explorem as atividades previstas no art. 30 desta lei, estes com menos de cinco empregados a
seu serviço".
A Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971, tanto na redação original, como após a
alteração introduzida pela Lei Complementar nº 16, de 30 de outubro de 1.973, manteve sob a
responsabilidade do produtor o recolhimento de contribuição para o custeio do Programa de
Assistência ao Trabalhador Rural (PRO-RURAL).
É o que dispunha o seu art. 15, a saber:
"Art. 15. Os recursos para o custeio do Programa de Assistência ao Trabalhador Rural provirão
das seguintes fontes:
I - da contribuição de 2% (dois por cento) devida pelo produtor, sobre o valor comercial dos
produtos rurais, e recolhida:
a) pelo adquirente, consignatário ou cooperativa que ficam sub-rogados, para esse fim, em todas
as obrigações do produtor;
b) pelo produtor, quando ele próprio industrializar seus produtos ou vendê-los, no varejo,
diretamente ao consumidor pelo produtor, quando ele próprio industrializar seus produtos, vendê-
los ao consumidor, no varejo, ou a adquirente domiciliado no exterior" (redação dada pela LC nº
16, de 3/10/73 )".
O reconhecimento ou não do tempo de serviço rural prestado sob o regime de economia familiar
ou como diarista/boia-fria, está jungido à lei, razão pela qual, ab initio, transcrevo o art. 55, §3º, da
Lei nº 8.213/91:
"O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo,
além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o
art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§3º: A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
2.2 REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR
A Lei nº 8.213/91, ao disciplinar o regime de economia familiar, assinalou que a atividade rural
deve ser exercida pelos membros da família em condições de mútua dependência e colaboração,
bem como ser indispensável à própria subsistência do núcleo familiar.
Frise-se que o fato da parte autora contar, eventualmente, com o auxílio de terceiros em suas
atividades, não descaracteriza o regime de economia familiar, conforme ressalva feita no art. 11,
VII, in verbis:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII - como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro, e o arrendatário rurais, o
garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente
ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como
seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 (quatorze) anos ou a eles
equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo.
§ 1º. Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros
da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua
dependência e colaboração, sem a utilização de empregados."
2.3 DOCUMENTOS PARA A COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURÍCOLA
Observo que o art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura
numerus clausus, já que o sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento
motivado, cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e a sua
aceitação.
Acerca do tema, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o
entendimento desta Corte no que diz com a valoração das provas comumente apresentadas.
Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais somente fazem prova do quanto nelas
alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos
competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja
em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por
testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento
então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o
crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins colimados, a apresentação de documentos comprobatórios da
posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da
atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, por parte do autor, de propriedade rural, só se constituirá em elemento
probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No
mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos
respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
2.4 INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL
Tem-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a
qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos
por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini,
v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir
da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos
Tribunais.
Outro aspecto relevante diz com a averbação do tempo de serviço requerida por menores de
idade, em decorrência da atividade prestada em regime de economia familiar. A esse respeito, o
fato da parte autora não apresentar documentos em seu próprio nome que a identifique como
lavrador, em época correspondente à parte do período que pretende ver reconhecido, por si só
não elide o direito pleiteado, pois é sabido que não se tem registro de qualificação profissional em
documentos de menores, que na maioria das vezes se restringem à sua Certidão de Nascimento,
especialmente em se tratando de rurícolas. É necessária, contudo, a apresentação de
documentos concomitantes, expedidos em nome de pessoas da família, para que a qualificação
dos genitores se estenda aos filhos, ainda que não se possa comprovar documentalmente a
união de esforços do núcleo familiar à busca da subsistência comum.
Em regra, toda a documentação comprobatória da atividade, como talonários fiscais e títulos de
propriedade, é expedida em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar.
Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime
de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o
suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a
correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O
homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua
colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha
colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra
cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº
463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em
nome dos pais ou outros membros da família que os qualifiquem como lavradores, constituem
início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos, mormente no presente caso em que
não se discute se a parte autora integrava ou não aquele núcleo familiar à época em que o pai
exercia o labor rural, o que se presume, pois ainda não havia contraído matrimônio e era,
inclusive, menor de idade.
2.5 MENOR DE 12 ANOS
A esse respeito, inclusive, saliento ser possível o reconhecimento de tempo de serviço em
períodos anteriores à Constituição Federal de 1988, nas situações em que o trabalhador rural
tenha iniciado suas atividades antes dos 14 anos. É histórica a vedação constitucional ao trabalho
infantil. Em 1967, porém, a proibição alcançava apenas os menores de 12 anos. Isso indica que
nossos constituintes viam, àquela época, como realidade incontestável que o menor efetivamente
desempenhava a atividade nos campos, ao lado dos pais.
Antes dos 12 anos, porém, ainda que o menor acompanhasse os pais na lavoura e
eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não é crível que pudesse exercer
plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma
atividade tão desgastante. Dessa forma, é de se reconhecer o exercício pleno do trabalho rurícola
apenas a partir dos 12 anos de idade.
A questão, inclusive, já foi decidida pela Turma de Uniformização das Decisões dos Juizados
Especiais Federais, que editou a Súmula nº 5:
"A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213 de 24 de
julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários." (DJ
25.09.2003).
2.6 RECONHECIMENTO DE LABOR RURAL ANTERIOR AO DOCUMENTO MAIS ANTIGO
(Resp 1.348.633)
No tocante ao critério de fixação do termo inicial para contagem do tempo a ser reconhecido, o
recente posicionamento do E. Superior Tribunal de Justiça, em decisão proferida em sede de
recurso especial representativo de controvérsia repetitiva (REsp 1.348.633/SP, 1ª Seção, j.
28.08.13), admitiu a possibilidade de reconhecimento de labor rural anterior ao documento mais
antigo juntado como prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos.
2.7 DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTOS ATÉ 24/07/1991
A teor do § 2º do artigo 55 da Lei n.º 8.213/91, permite-se o cômputo do tempo de serviço do
segurado trabalhador rural, independentemente do recolhimento das contribuições
previdenciárias, somente em relação ao período que antecede a vigência desta Lei, não havendo,
entretanto, dispensa dessas contribuições para o período posterior a 24/07/1991.
Na ausência de comprovação pela parte autora do recolhimento dessas contribuições, a
averbação de período reconhecido em período posterior a 24/07/1991 há que ser adstrita à data
da edição da reportada Lei.
Nesse sentido, já decidiu esta Egrégia Corte, confira-se:
"PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. DECLARATÓRIA. RURÍCOLA. INÍCIO DE PROVA
MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO PARCIAL DE
TEMPO DE SERVIÇO. INEXIGIBILIDADE DA COMPROVAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE
CONTRIBUIÇÕES.
(...)
5- Inexigível o recolhimento das contribuições previdenciárias do trabalhador rural com relação ao
cômputo do tempo de serviço que antecede a 24/07/1991, data da edição da Lei n.º 8.213/91, não
havendo, entretanto, dispensa dessas contribuições para o período posterior a essa data, que
deve ser considerada como termo ad quem do período a ser averbado, obrigando sua restrição
no caso sob exame. Aplicação do enunciado da Súmula n.º 272 do E. Superior Tribunal de
Justiça.
6- Remessa oficial não conhecida. Apelação do INSS parcialmente provida".
(TRF3, 9ª Turma, AC 2004.03.99.003417-6, Desembargador Federal Santos Neves, DJU
17/05/2007, p. 598).
Destaco, entretanto, que a obrigação de se efetuar o recolhimento das contribuições
previdenciárias ao Instituto Autárquico e promover seu desconto da remuneração do empregado
a seu serviço, compete, exclusivamente, ao empregador, por ser este o responsável pelo repasse
de tal valor aos cofres da Previdência.
A fiscalização do cumprimento da obrigação previdenciária cabe ao INSS, inclusive, tendo
ordenamento jurídico disponibilizado ação própria para haver o seu crédito, a fim de exigir do
devedor o cumprimento da legislação.
Na hipótese de diarista/boia-fria, há determinação expressa no art. 55, §2º, da Lei nº 8.213/91,
segundo a qual o tempo de serviço do trabalhador rural laborado antes da sua vigência, será
computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para fins de carência.
Em relação ao período em que o segurado laborou em regime de economia familiar, é certo que
ao mesmo cabe o dever de recolher as contribuições tão-somente se houver comercializado a
produção no exterior ou no varejo, isto é, para o consumidor final, a empregador rural pessoa
física ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
A pretensão da parte autora, concernente ao mero reconhecimento do tempo de serviço e a
respectiva expedição da certidão, independe de indenização relativamente aos períodos que se
pretende ver reconhecidos, ainda que para fins de contagem recíproca; contudo, merece
destaque a observação trazida pelo eminente Desembargador Federal Sérgio Nascimento, em
seu voto-vista desenvolvido por ocasião do sentido de que "a falta de pagamento da indenização
em discussão não afasta o direito do autor de que seja expedida certidão que conste a averbação
do tempo de serviço rural, reconhecido no presente feito, com a ressalva de que não foi efetuado
o recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, tampouco o pagamento da
indenização de que trata o artigo 96, IV, da Lei n.8.213/91".
Frise-se, ainda, que a contagem recíproca constitui direito do segurado da Previdência Social,
tanto para somá-la ao tempo de atividade laborativa exercida unicamente na atividade privada,
quanto para acrescentá-la ao tempo em que também trabalhou no setor público.
3. DA CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM
3.1 DO DIREITO À CONVERSÃO ANTES DA LEI 6.887/80 E APÓS A LEI 9.711/98
A teor dojulgamento do REsp 1.310.034 e do REsp 1.151.363, ambos submetidos ao regime do
art. 543-C do CPC, inexiste óbice para se proceder à conversão de tempo de serviço especial em
comum, seja antes da Lei 6.887/80 seja após Lei n. 9.711/1998.
3.2 DO RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE EXERCIDA EM ATIVIDADE ESPECIAL
Para o reconhecimento da natureza especial da atividade exercida e a conversão desse intervalo
especial em comum, cabe ao segurado demonstrar o trabalho em exposição a agentes
agressivos, nos termos da lei vigente à época da prestação do trabalho, observando-se o
princípio tempus regit actum (Pet 9.194/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção,
julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
3.2.1 PERÍODO ANTERIOR À EDIÇÃO DA LEI Nº 9.032/95
No período anterior à edição da Lei nº 9.032/95, o direito à aposentadoria especial e à conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais é reconhecido em razão da categoria profissional
exercida pelo segurado ou pela sua exposição aos agentes nocivos descritos nos Anexos dos
Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, a ser comprovada por meio da apresentação de SB 40, sem
a necessidade de apresentação de laudo técnico, exceção feita à exposição ao ruído.
3.2.2 PERÍODO POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.032/95 ATÉ A EDIÇÃO DO DECRETO
Nº 2.172, DE 5 DE MARÇO DE 1997
A comprovação da atividade especial exercida após a edição da Lei nº 9.032, de 29 de abril de
1995 - que promoveu a alteração do art. 57 da Lei n. 8213/91 - se dá com a demonstração da
efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, mediante a
apresentação do formulário DSS-8030 (antigo SB 40), o qual se reveste da presunção de que as
circunstâncias de trabalho ali descritas se deram em condições especiais, não sendo, portanto,
imposto que tal documento se baseie em laudo pericial, com exceção ao limite de tolerância para
nível de pressão sonora (ruído).
Anote-se que a relação dos agentes nocivos constante do Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de
março de 1964, e dos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, em vigor até
o advento do Decreto Regulamentar nº 2.172/97, de 5 de março de 1997, fora substituído pelo
Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999.
Relevante consignar que, a partir da Lei nº 9.032/95, não é mais possível o reconhecimento da
atividade especial, unicamente, com fulcro no mero enquadramento da categoria profissional.
3.2.3 PERÍODO POSTERIOR À VIGÊNCIA DO DECRETO Nº 2.172, DE 5 DE MARÇO DE 1997
E DEMAIS CONSIDERAÇÕES
Com a edição do Decreto nº 2.172, de 5 de março de 1997, que regulamentou a Medida
Provisória nº 1523/96, convertida na Lei nº 9.528/97, é indispensável a apresentação de laudo
técnico para a comprovação de atividade especial.
Cabe esclarecer que a circunstância de o laudo não ser contemporâneo à atividade avaliada não
lhe retira absolutamente a força probatória, em face de inexistência de previsão legal para tanto e
desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral (AC 0022396-
76.2005.4.01.3800/MG, Rel. Desembargador Federal Candido Moraes, 2ª Turma, e-DJF1 p.198
de 18/11/2014). Súmula 68 TNU.
Além disso, é de se apontar que o rol de agentes insalubres, como também das atividades
penosas e perigosas não se esgotam no regulamento, tal como cristalizado no entendimento
jurisprudencial na Súmula/TFR n. 198:
"Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata
que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em
Regulamento."
Nesse sentido, julgados do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 395988, Rel.
Min. Hamilton Carvalhido, j. 18.11.2003, DJ 19.12.2003, p. 630; 5ª Turma, REsp nº 651516, Rel.
Min. Laurita Vaz, j. 07.10.2004, DJ 08.11.2004, p. 291.
3.3 USO DO EPI
No tocante à utilização de Equipamentos de Proteção Individual - EPI, em recente decisão, com
repercussão geral, no ARE 664.335/SC, assentou a Suprema Corte que:
"o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo
à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá
respaldo constitucional à aposentadoria especial" (grifo nosso). No caso, porém, de dúvida em
relação à efetiva neutralização da nocividade, decidiu que "a premissa a nortear a Administração
e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto
porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar
completamente a relação nociva a que o empregado se submete".
No mais, especificamente quanto à eficácia do equipamento de proteção individual - EPI ao
agente agressivo ruído, o Pretório Excelso definiu que:
"na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a
declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido
da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço
especial para aposentadoria". Isso porque, "ainda que se pudesse aceitar que o problema
causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que
indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação
dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores
que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle
efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores".
3.4 DA FONTE DE CUSTEIO
Ressalto que no julgamento realizado, em sessão de 4/12/14, pelo Plenário do C. Supremo
Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário com Agravo nº
664.335/SC, de Relatoria do E. Ministro Luiz Fux, a Corte Suprema, afastou a alegação,
suscitada pelo INSS, de ausência de prévia fonte de custeio para o direito à aposentadoria
especial.
Na ementa daquele julgado constou:
"A norma inscrita no art. 195, § 5º, CRFB/88, veda a criação, majoração ou extensão de benefício
sem a correspondente fonte de custeio, disposição dirigida ao legislador ordinário, sendo
inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela Constituição.
Deveras, o direito à aposentadoria especial foi outorgado aos seus destinatários por norma
constitucional (em sua origem o art. 202, e atualmente o art. 201, § 1º, CRFB/88). Precedentes:
RE 151.106 AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 28/09/1993, Primeira Turma, DJ de
26/11/93; RE 220.742, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03/03/98, Segunda Turma, DJ de
04/09/1998.
Existência de fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial antes, através dos
instrumentos tradicionais de financiamento da previdência social mencionados no art. 195, da
CRFB/88, e depois da
Medida Provisória nº 1.729/98, posteriormente convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de
1998. Legislação que, ao reformular o seu modelo de financiamento, inseriu os §§ 6º e 7º no art.
57 da Lei n.º 8.213/91, e estabeleceu que este benefício será financiado com recursos
provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas
serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo
segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze,
vinte ou evinte e cinco anos de contribuição, respectivamente."
O E. Relator, em seu voto, deixou bem explicitada a regra que se deve adotar ao afirmar:
"Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, pois
existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria especial da figura do incentivo (art. 22,
II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não consubstancia a concessão do benefício sem a
correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88). Corroborando o supra esposado, a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal considera que o art. 195, § 5º, da CRFB/88, contém
norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se tratar de benefício criado
diretamente pela própria constituição".
DOS AGENTES NOCIVOS
RUÍDO
O reconhecimento da insalubridade em decorrência da pressão sonora observa o regulamento
vigente na ocasião do exercício da atividade laboral.
Assim, a atividade é considerada insalubre caso constatada a sujeição do trabalhador ao nível de
pressão sonora da seguinte forma: até 05 de março de 1997, superior ou equivalente a 80
(oitenta) decibéis (Decreto nº 53.831/64); entre 06 de março de 1997 e 18 de novembro de 2003,
superior ou equivalente a 90 (noventa) decibéis (Decreto n. 2.172/97) e, a partir dessa data
(edição do Decreto nº 4.882/03), superior ou equivalente a 85 (oitenta e cinco) decibéis, não
havendo que se falar em aplicação retroativa deste último diploma legal, conforme entendimento
firmado pelo Superior Tribunal de Justiça (AgRg no REsp nº 1.146.243/RS - 6ª Turma, Rel. Min.
Maria Thereza de Assis Moura, DJE 12/03/2012).
Ressalte-se que o perfil profissiográfico previdenciário, criado pelo art. 58, § 4º, da Lei 9.528/97, é
documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do
engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para
comprovar o exercício de atividade sob condições especiais, fazendo as vezes do laudo técnico.
Precedente: TRF3, 10ª Turma, AC 00283905320084039999, Relator Desembargador Federal
Sérgio Nascimento, DJF3 24/02/2010, p. 1406.
CORTE DE CANA
Com relação à atividade desempenhada no corte de cana, entendo que, considerando a sua
natureza extremamente penosa, caracteriza-se como insalubre e, portanto, passível de
conversão.
Confira-se o seguinte precedente:
"CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO.
RURÍCOLA. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. ATIVIDADE
COMPROVADA. CORTE DE CANA. ATIVIDADE ESPECIAL. DIREITO À CONVERSÃO DO
TEMPO ESPECIAL EM COMUM. CARÊNCIA. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS E DESPESAS
PROCESSUAIS.
1 - A concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço é devida, nos termos do art.
202, §1º, da Constituição Federal (redação original) e dos arts. 52 e seguintes da Lei nº 8.213/91,
ao segurado que preencheu os requisitos necessários antes da Emenda Constitucional nº 20/98.
2 - A qualificação de lavrador do autor constante dos atos de registro civil constitui início razoável
de prova material do exercício de atividade rural, conforme entendimento consagrado pelo
Colendo Superior Tribunal de Justiça.
3 - A prova testemunhal, acrescida de início razoável de prova material, é meio hábil à
comprovação da atividade rurícola.
4 - O art. 55, §2º, da Lei nº 8.213/91 estabelece que será computado o tempo de serviço rural
independentemente do recolhimento das contribuições correspondente ao período respectivo,
razão pela qual não há necessidade da parte autora indenizar a Autarquia Previdenciária.
5 - A atividade rural exercida no corte de cana é de ser considerada como exercida em condições
especiais à saúde ou integridade física do trabalhador.
(...)
11 - Apelação e remessa oficial parcialmente providas. Tutela específica concedida."
(TRF3, 9ª Turma, AC nº 2006.03.99.013743-0/SP, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, Rel. p/ Acórdão:
Des. Fed. Nelson Bernardes, j. 08/02/2010, D.E. 12/3/2010).
NO CASO DOS AUTOS
Pretende a parte autora o reconhecimento da atividade rural exercida sem registro em CTPS nos
períodos de 01/01/1981 a 30/12/1986, 02/06/1990 a 11/09/1990, 25/07/1992 a 07/05/1993,
30/11/1993 a 30/01/1994, 14/12/1995 a 01/05/1996, 07/12/1996 a 08/05/1997, 14/12/1997 a
07/05/1998, 01/12/1998 a 02/05/1999, 01/11/1999 a 04/05/2000, 15/10/2000 a 06/05/2001,
07/12/2001 a 01/05/2002, 08/11/2002 a 02/05/2003 e 07/11/2003 a 11/04/2004.
Efetivamente, os documentos acostados aos autos a saber: a) recibo de entrega de declaração
de ITR (exercício 2015), declaração do imposto sobre a propriedade rural – ITR, protocolo de
inscrição do imóvel rural no SICAR-MG e escritura pública constando a declaração dos
proprietários do imóvel rural, informando que o autor laborou no imóvel rural nos períodos
indicados na exordial (id Num. 97617767 - Pág. 67/85), por si só não comprovam a alegada
atividade rural exercida pelo autor, pois somente demonstram a existência da propriedade rural.
Ademais, a declaração constante do id Num. 97617767 - Pág. 83/84, não contemporânea à
prestação do trabalho não se presta ao fim colimado, pois equivale a mero depoimento reduzido a
termo e sem o crivo do contraditório.
Ressalta-se, no caso, que sequer houve a produção de prova testemunhal com o fito de
corroborar os fatos alegados.
Por conseguinte, inviável o reconhecimento do labor sem registro em CTPS.
Passo à análise da atividade especial.
Pleiteia o reconhecimento das atividades exercidas como especiais nos períodos de 04/02/1987 a
17/03/1987, 24/03/1987 a 01/10/1987, de 25/11/1987 a 01/12/1987, 04/01/1988 a 01/06/1990,
12/09/1990 a 24/07/1992, 08/05/1993 a 29/11/1993, 01/02/1994 a 20/04/1994, 02/05/1994 a
25/11/1994, 30/01/1995 a 13/12/1995, 02/05/1996 a 06/12/1996, 09/05/1997 a 13/12/1997,
08/05/1998 a 30/11/1998, 03/05/1999 a 31/10/1999, 05/05/2000 a 14/10/2000, 07/05/2001 a
06/12/2001, 02/05/2002 a 07/11/2002, 03/05/2003 a 06/11/2003, 12/04/2004 a 07/12/2004,
20/12/2004 a 22/02/2005 e 23/02/2005 a 16/12/2016.
Com relação aos períodos de 04/02/1987 a 17/03/1987, de 24/03/1987 a 01/10/1987, de
25/11/1987 a 01/12/1987, de 04/01/1988 a 02/06/1990 e de 12/09/1990 a 24/07/1992, laborados
pelo autor como servente em construção civil, e nos períodos de 09/05/1997 a 13/12/1997, de
08/05/1998 a 30/11/1998, de 03/05/1999 a 31/10/1999, de 08/05/2000 a 14/10/2000, de
07/05/2001 a 06/12/2001, de 02/05/2002 a 07/11/2002, de 03/05/2003 a 06/11/2003 e de
20/12/2004 a 22/02/2005, como trabalhador rural, nota-se que o laudo pericial se baseou em
empresa paradigma, em que pese a parte autora não lograr demonstrar que as empresas
empregadoras se recusaram a fornecer os laudos periciais, tenha dificultado sua obtenção,
tampouco que a empresa está inativa.
Não se pode olvidar que a perícia por similaridade é aceita para a comprovação da especialidade
da atividade, no entanto, apenas nos casos em que restar comprovada que a empresa encerrou
suas atividades, o que não é o caso dos autos.
Sendo assim, afasto o reconhecimento da insalubridade nos períodos de 04/02/1987 a
17/03/1987, de 24/03/1987 a 01/10/1987, de 25/11/1987 a 01/12/1987, de 04/01/1988 a
02/06/1990 e de 12/09/1990 a 24/07/1992, laborados pelo autor como servente em construção
civil, e nos períodos de 09/05/1997 a 13/12/1997, de 08/05/1998 a 30/11/1998, de 03/05/1999 a
31/10/1999, de 08/05/2000 a 14/10/2000, de 07/05/2001 a 06/12/2001, de 02/05/2002 a
07/11/2002, de 03/05/2003 a 06/11/2003 e de 20/12/2004 a 22/02/2005, como trabalhador rural.
Ademais, com relação à função de servente, o enquadramento, pela categoria profissional,
permitida até 28/04/1995, sendo que o Decreto n. 53.831/64, nos itens 2.3.1, 2.3.2 e 2.3.3, elenca
as atividades dos trabalhadores em túneis e galerias; trabalhadores em escavações à céu aberto;
trabalhadores em edifícios, barragens, pontes e torres, sendo que a simples menção na carteira
de trabalho de labor na construção civil, não é hábil para o reconhecimento pretendido.
Com relação ao agente agressivo ruído, o laudo pericial conclui pela exposição a 91,4 decibéis,
que difere dos constantes dos Perfis Profissiográficos Profissionais-PPP apresentados pelos
empregadores, que identificam a exposição a 83,4 decibéis.
Com efeito, na ocorrência de dados conflitantes prevalecem as informações atestadas nos
documentos técnicos emitidos pelo empregador, pois contemporâneos à época do labor,
elaborados nos termos da legislação previdenciária e preenchidos por responsável técnico
legalmente habilitado pelos registros ambientais.
Assim, com relação aos períodos de 01/01/2012 a 31/12/2012, de 01/01/2013 a 31/12/2013, de
01/01/2014 a 30/04/2014, de 01/05/2014 a 31/12/2014, e de 01/01/2015 a 16/02/2017, em que o
autor exerceu a função de auxiliar operador máquina– inviável o reconhecimento do labor como
especial, pois de acordo com os Perfis Profissiográficos Profissionais-PPP (id Num. 97617767 -
Pág. 43/61), estava exposto a ruído de 83,4 dB, inferior ao mínimo legal (85 decibéis).
Por todo exposto, com base na documentação acostada nos autos, é de se reconhecer a
especialidade apenas nos períodos de:
- 08/05/1993 a 29/11/1993 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 – Pág 1/2)
- atividade de cortador de cana.
- 01/02/1994 a 20/04/1994 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 – Pág 1/2)
- atividade de cortador de cana.
- 02/05/1994 a 25/11/1994 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 - Pág. 5/6)
- atividade de cortador de cana.
- 30/01/1995 a 13/12/1995 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 - Pág. 7/8)
- atividade de cortador de cana.
- 02/05/1996 a 06/12/1996 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 - Pág.
9/10) - atividade de cortador de cana.
- 12/04/2004 a 07/12/2004 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 - Pág.
11/12) - atividade de cortador de cana.
- 23/02/2005 a 31/12/2005 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 - Pág.
13/14) - atividade de cortador de cana.
- 01/01/2006 a 31/12/2006 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 - Pág.
17/19) - atividade de cortador de cana.
- 01/01/2007 a 31/12/2007 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 - Pág.
21/23) - atividade de cortador de cana.
- 01/01/2008 a 31/12/2008 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 - Pág.
25/27) - atividade de cortador de cana.
- 01/01/2009 a 31/12/2009 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 - Pág.
29/31) - atividade de cortador de cana.
- 01/01/2010 a 31/12/2010 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 - Pág.
33/35) - atividade de cortador de cana.
- 01/01/2011 a 31/12/2011 - Perfil Profissiográfico Profissional-PPP (id Num. 97617767 - Pág.
37/40) - atividade de cortador de cana.
A atividade desempenhada no corte de cana, considerando a sua natureza extremamente
penosa, caracteriza-se como especial.
Por fim, torna-se inviável a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
ante a ausência dos requisitos legais.
Em razão da sucumbência recursal, majoro em 100% os honorários fixados em sentença, a teor
dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015, ficando suspensa sua execução, em razão de ser o autor
beneficiário da Justiça Gratuita (art. 98, §3º, CPC/15).
Diante do exposto, nego provimento à apelação do autor e dou parcial provimento à apelação do
INSS, para afastar o reconhecimento da atividade especial nos períodos de 04/02/1987 a
17/03/1987, de 24/03/1987 a 01/10/1987, de 25/11/1987 a 01/12/1987, de 04/01/1988 a
02/06/1990, de 12/09/1990 a 24/07/1992, de 09/05/1997 a 13/12/1997, de 08/05/1998 a
30/11/1998, de 03/05/1999 a 31/10/1999, de 08/05/2000 a 14/10/2000, de 07/05/2001 a
06/12/2001, de 02/05/2002 a 07/11/2002, de 03/05/2003 a 06/11/2003 de 20/12/2004 a
22/02/2005, e de 01/01/2012 a 16/02/2017, nos termos da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL E ESPECIAL. RUÍDO. CONSTRUÇÃO CIVIL.
LAUDO POR SIMILARIDADE. AUSÊNCIA DO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA
CONCESSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS.
- Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer o artigo 201 da Constituição
Federal o direito à aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, ao
completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem e 30 (trinta) anos de contribuição,
se mulher.
- Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de
dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
- Ao segurado inscrito perante o Regime Geral de Previdência Social anteriormente à
promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, mas que, nessa data (16 de dezembro de
1998), ainda não tivesse preenchido os requisitos necessários à sua aposentação, mesmo na
forma proporcional, aplicam-se as regras de transição estabelecidas pelo art. 9º da referida
normação constitucional.
- Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que
cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC
20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo
prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
- No caso dos autos, inviável o reconhecimento da atividade rural, ante a ausência de
comprovação efetiva da atividade exercida, restando comprovado em parte o labor exercido em
condições especiais.
- A somatória do tempo de serviço da parte autora é insuficiente para a concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição.
- Em razão da sucumbência recursal, majorados em 100% os honorários fixados em sentença, a
teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015, ficando suspensa sua execução, em razão de ser o
autor beneficiário da Justiça Gratuita (art. 98, §3º, CPC/15).
- Apelação do INSS parcialmente provida. Recurso da parte autora improvido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS e negar provimento ao recurso
do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
