Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5166254-91.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
02/12/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL EM PARTE. NÃO PREENCHIDOS OS
REQUISITOS PARA A APOSENTAÇÃO. VERBA HONORÁRIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
- Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer o artigo 201 da Constituição
Federal o direito à aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, ao
completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem e 30 (trinta) anos de contribuição,
se mulher.
- Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de
dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
- Ao segurado inscrito perante o Regime Geral de Previdência Social anteriormente à
promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, mas que, nessa data (16 de dezembro de
1998), ainda não tivesse preenchido os requisitos necessários à sua aposentação, mesmo na
forma proporcional, aplicam-se as regras de transição estabelecidas pelo art. 9º da referida
normação constitucional.
- Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC
20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo
prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
- No caso dos autos, restou comprovado, em parte, o labor rural.
- A somatória do tempo de serviço laborado pela parte autora não autoriza a concessão do
benefício pleiteado.
- Majoração em 100% os honorários fixados em sentença, observando-se o limite máximo de
20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015, observada a
gratuidade da justiça.
- Apelação da Autarquia Federal parcialmente provida.
- Apelação da parte autora improvida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5166254-91.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: ANDREA SILVA DE OLIVEIRA EBURNEO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: WILLIAM RODRIGUES MORAES JUNIOR - SP427199-N,
ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANDREA SILVA DE
OLIVEIRA EBURNEO
Advogados do(a) APELADO: WILLIAM RODRIGUES MORAES JUNIOR - SP427199-N,
ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5166254-91.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
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APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANDREA SILVA DE
OLIVEIRA EBURNEO
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS,
objetivando o reconhecimento de atividade rural e a concessão do benefício de aposentadoria
por tempo de contribuição.
Na r. sentença, o dispositivo restou assim consignado:
“(...)
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos deduzidos em juízo
para reconhecer o labor rural exercido em regime de economia familiar pelo requerente de
08/07/1983 a 31/03/1998. E assim o faço com resolução do mérito, nos termos do artigo 487,
inciso I, do Código de Processo Civil. Em razão da sucumbência recíproca, cada qual deve
arcar com 50% das custas, despesas processuais e honorários de 10% sobre o valor atualizado
da causa, observada a gratuidade da justiça. Dispensado o reexame necessário, nos termos do
art. 496 § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil. (...).”. (ID n. 201453023)
Em razões recursais, a Autarquia Federal sustenta, em síntese, que não restou comprovada a
atividade campesina, não fazendo jus à aposentadoria vindicada. Argumenta que “(...) desde 18
de março de 2019 (vacacio legis de 60 dias a contar de 18/01/2019) a lei previdenciária passa a
exigir que a prova efetiva de atividade rural de segurados especiais precisa ser feita por
autodeclaração ratificada por Conselho Estadual que implementa o PRONATER (Programa
Nacional de Assistência Técnica à Agricultura Familiar). Demais provas de atividade rural
passam a ser apenas complementares a essa autodeclaração.”. (ID n. 201453030)
Por sua vez, a parte autora requer que “(...) seja conhecido e provido o presente recurso,
reformando parcialmente a r. sentença, para então, manter o reconhecimento do tempo de
serviço, averbando-se junto ao CNIS os períodos compreendidos de 31.10.1991 a 31.03.1998,
independente de recolhimento e, ao final julgar pela PROCEDÊNCIA TOTAL da ação
determinando a concessão do benefício da Aposentadoria por Tempo de Contribuição (...).”. (ID
n. 201453032)
Processado(s) o(s) recurso(s) os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
SM
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5166254-91.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: ANDREA SILVA DE OLIVEIRA EBURNEO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: WILLIAM RODRIGUES MORAES JUNIOR - SP427199-N,
ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANDREA SILVA DE
OLIVEIRA EBURNEO
Advogados do(a) APELADO: WILLIAM RODRIGUES MORAES JUNIOR - SP427199-N,
ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, tempestivo(s) o(s) recurso(s) e respeitados os demais pressupostos de
admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
1. DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/ CONTRIBUIÇÃO
O primeiro diploma legal brasileiro a dispor sobre a aposentadoria por tempo de serviço foi a Lei
Eloy Chaves, Decreto nº 4.682, de 24 de janeiro de 1923. Referido benefício era concedido
apenas aos ferroviários, possuindo como requisito a idade mínima de 50 (cinquenta) anos,
tendo sido suspensa no ano de 1940.
Somente em 1948 tal aposentadoria foi restabelecida, tendo sido mantida pela Lei nº 3.807, de
26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS), que preconizava como
requisito para a concessão do benefício o limite de idade de 55 (cinquenta e cinco) anos,
abolido, posteriormente, pela Lei nº 4.130, de 28 de agosto de 1962, passando a adotar apenas
o requisito tempo de serviço.
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional nº 1/69, também disciplinaram tal
benefício com salário integral, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna manteve o benefício, disciplinando-o em seu art. 202 (redação original) da
seguinte forma:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês,
e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar
seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo
inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, definidas em lei:
(...)
§1º: É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Antes da Emenda Constitucional n. 20/98, de 15 de dezembro de 1998, preceituava a Lei nº
8.213/91, nos arts. 52 e seguintes, que o benefício de aposentadoria por tempo de serviço era
devido ao segurado que, após cumprir o período de carência constante da tabela progressiva
estabelecida pelo art. 142 do referido texto legal, completar 30 anos de serviço, se homem, ou
25, se mulher, iniciando no percentual de 70% do salário-de-benefício até o máximo de 100%
para o tempo integral aos que completarem 30 anos de trabalho se mulher, e 35 anos de
trabalho se homem.
Na redação original do art. 29, caput, §1º, da Lei de Benefícios, o salário-de-benefício consiste
na média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses
imediatamente anteriores ao afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento,
até o máximo de 36, apurados no período não superior a 48 meses. Ao segurado que contava
com menos de 24 contribuições no período máximo estabelecido, o referido salário corresponde
a 1/24 da soma dos salários-de-contribuição.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer, nos arts. 201 e 202 da
Constituição Federal:
"Art. 201 A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro
e atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei,
obedecidos as seguintes condições:
I - 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se
mulher;
Art. 202 O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma
autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na
constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.
(...)"
Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16
de dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados
que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da
EC n. 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o
mesmo prazo e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
2.DA ATIVIDADE RURAL:
2.1 INTRODUÇÃO
A Lei nº 4.214, de 2 de março de 1963, que dispunha sobre o "Estatuto do Trabalhador Rural",
já considerava como segurado obrigatório o trabalhador rural, inclusive os pequenos
produtores, conforme art. 160, in verbis:
"Art. 160. São obrigatoriamente, segurados: os trabalhadores rurais, os colonos ou parceiros,
bem como os pequenos proprietários rurais, empreiteiros, tarefeiros e as pessoas físicas que
explorem as atividades previstas no art. 30 desta lei, estes com menos de cinco empregados a
seu serviço".
A Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971, tanto na redação original, como após a
alteração introduzida pela Lei Complementar nº 16, de 30 de outubro de 1.973, manteve sob a
responsabilidade do produtor o recolhimento de contribuição para o custeio do Programa de
Assistência ao Trabalhador Rural (PRO-RURAL).
É o que dispunha o seu art. 15, a saber:
"Art. 15. Os recursos para o custeio do Programa de Assistência ao Trabalhador Rural provirão
das seguintes fontes:
I - da contribuição de 2% (dois por cento) devida pelo produtor, sobre o valor comercial dos
produtos rurais, e recolhida:
a) pelo adquirente, consignatário ou cooperativa que ficam sub-rogados, para esse fim, em
todas as obrigações do produtor;
b) pelo produtor, quando ele próprio industrializar seus produtos ou vendê-los, no varejo,
diretamente ao consumidor pelo produtor, quando ele próprio industrializar seus produtos,
vendê-los ao consumidor, no varejo, ou a adquirente domiciliado no exterior" (redação dada
pela LC nº 16, de 3/10/73 )".
O reconhecimento ou não do tempo de serviço rural prestado sob o regime de economia
familiar ou como diarista/boia-fria, está jungido à lei, razão pela qual, ab initio, transcrevo o art.
55, §3º, da Lei nº 8.213/91:
"O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de
segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de
segurado:
(...)
§3º: A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante
justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito
quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto
no Regulamento."
2.2 REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR
A Lei nº 8.213/91, ao disciplinar o regime de economia familiar, assinalou que a atividade rural
deve ser exercida pelos membros da família em condições de mútua dependência e
colaboração, bem como ser indispensável à própria subsistência do núcleo familiar.
Frise-se que o fato da parte autora contar, eventualmente, com o auxílio de terceiros em suas
atividades, não descaracteriza o regime de economia familiar, conforme ressalva feita no art.
11, VII, in verbis:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII - como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro, e o arrendatário rurais, o
garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades,
individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de
terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14
(quatorze) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo
familiar respectivo.
§ 1º. Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos
membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua
dependência e colaboração, sem a utilização de empregados."
2.3 DOCUMENTOS PARA A COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURÍCOLA
Observo que o art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura
numerus clausus, já que o sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre
convencimento motivado, cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua
validade e a sua aceitação.
Acerca do tema, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o
entendimento desta Corte no que diz com a valoração das provas comumente apresentadas.
Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais somente fazem prova do quanto nelas
alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos
competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja
em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por
testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento
então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem
o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins colimados, a apresentação de documentos comprobatórios da
posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da
atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, por parte do autor, de propriedade rural, só se constituirá em
elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou
agricultor. No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante
a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
2.3.1 INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL
Tem-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a
qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos
por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge
Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a
partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos
Tribunais.
Outro aspecto relevante diz com a averbação do tempo de serviço requerida por menores de
idade, em decorrência da atividade prestada em regime de economia familiar. A esse respeito,
o fato da parte autora não apresentar documentos em seu próprio nome que a identifique como
lavrador, em época correspondente à parte do período que pretende ver reconhecido, por si só
não elide o direito pleiteado, pois é sabido que não se tem registro de qualificação profissional
em documentos de menores, que na maioria das vezes se restringem à sua Certidão de
Nascimento, especialmente em se tratando de rurícolas. É necessária, contudo, a apresentação
de documentos concomitantes, expedidos em nome de pessoas da família, para que a
qualificação dos genitores se estenda aos filhos, ainda que não se possa comprovar
documentalmente a união de esforços do núcleo familiar à busca da subsistência comum.
Em regra, toda a documentação comprobatória da atividade, como talonários fiscais e títulos de
propriedade, é expedida em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar.
Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em
regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva
apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não
emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta
esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da
sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente
tenha colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de
terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº
463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em
nome dos pais ou outros membros da família que os qualifiquem como lavradores, constituem
início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos, mormente no presente caso em que
não se discute se a parte autora integrava ou não aquele núcleo familiar à época em que o pai
exercia o labor rural, o que se presume, pois ainda não havia contraído matrimônio e era,
inclusive, menor de idade.
2.3.2 RECONHECIMENTO DE LABOR RURAL ANTERIOR AO DOCUMENTO MAIS ANTIGO
(Resp 1.348.633)
No tocante ao critério de fixação do termo inicial para contagem do tempo a ser reconhecido, o
recente posicionamento do E. Superior Tribunal de Justiça, em decisão proferida em sede de
recurso especial representativo de controvérsia repetitiva (REsp 1.348.633/SP, 1ª Seção, j.
28.08.13), admitiu a possibilidade de reconhecimento de labor rural anterior ao documento mais
antigo juntado como prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos.
2.3.3 MENOR DE 12 ANOS
É certo que o regime de repercussão geral, previsto na Emenda Constitucional n. 45/2004 e
instituído na legislação processual pela Lei n. 11.418/06, tem por finalidade uniformizar e
estabilizar a jurisprudência, de forma sistematizada e de fácil referenciação - mediante a
simples citação do julgamento paradigma.
Dessa forma, a jurisprudência uniformizada e estabilizada, anteriormente à instituição do regime
de repercussão geral é passível do mesmo tratamento ainda, que não tenha sido objeto de
submissão da matéria ao referido regime.
Sob este prisma, saliento ser possível o reconhecimento de tempo de serviço em períodos
anteriores à Constituição Federal de 1988, nas situações em que o trabalhador rural tenha
iniciado suas atividades antes dos 14 anos. É histórica a vedação constitucional ao trabalho
infantil. Em 1967, porém, a proibição alcançava apenas os menores de 12 anos. Isso indica que
nossos constituintes viam, àquela época, como realidade incontestável que o menor
efetivamente desempenhava a atividade nos campos, ao lado dos pais.
Nesse sentido:
Agravo de instrumento. 2. Trabalhador rural ou rurícola menor de quatorze anos. Contagem de
tempo de serviço. Art. 11, VII, da Lei nº. 8213. Possibilidade. Precedentes. 3. Alegação de
violação aos arts. 5º, XXXVI; e 97, da CF/88. Improcedente. Impossibilidade de declaração de
efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos trabalhistas. Tratamento
similar na doutrina do direito comparado: México, Alemanha, França e Itália. Norma de garantia
do trabalhador que não se interpreta em seu detrimento. Acórdão do STJ em conformidade com
a jurisprudência desta Corte. 4. Precedentes citados: AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir
Passarinho, DJ 02.04.86; e RE 104.654, 2ª T., Rel. Francisco Rezek, DJ 25.04.86 5. Agravo de
instrumento a que se nega provimento.
(AI 529694, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 15/02/2005, DJ
11-03-2005 PP-00043 EMENT VOL-02183-09 PP-01827 RTJ VOL-00193-01 PP-00417
RDECTRAB v. 12, n. 129, 2005, p. 176-190)
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. COMPROVAÇÃO DO DISSÍDIO.
PROVA DE ATIVIDADE RURÍCOLA EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. MENOR DE 14
ANOS. CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS.
POSSIBILIDADE.
I - Em se tratando de matéria por demais conhecida da Egrégia Seção, dispensáveis se
mostram maiores exigências formais na comprovação da divergência, bastando a transcrição
de ementas. Precedente.
II - In casu, ao tempo da prestação dos serviços - entre 17.08.68 e 31.12.69 - vigorava o art.
165, inciso X, da CF/67, repetido na E.C.
nº 1/69, que admitia o trabalho do menor a partir dos 12 (doze) anos.
III - Reconhecendo a Lei 8.213/91, art. 55, § 2º, o tempo de serviço rural pretérito, sem
contribuição, para efeitos previdenciários - não para contagem recíproca - não podia limitar aos
14 (quatorze) anos, sem ofensa à Norma Maior. É que o tempo de serviço, para fins de
aposentadoria, é disciplinado pela lei vigente à época em que efetivamente prestado, passando
a integrar, como direito autônomo, o patrimônio jurídico do trabalhador.
IV - Comprovada a atividade rurícola de menor de 14 anos, antes da Lei 8.213/91, impõe-se seu
cômputo para fins previdenciários. A proibição do trabalho aos menores de catorze anos foi
estabelecida pela Constituição em benefício do menor e não em seu prejuízo.
V - Embargos acolhidos.
(EREsp 329.269/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2002,
DJ 23/09/2002, p. 221)
Antes dos 12 anos, porém, ainda que o menor acompanhasse os pais na lavoura e
eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não é crível que pudesse exercer
plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma
atividade tão desgastante. Dessa forma, é de se reconhecer o exercício pleno do trabalho
rurícola apenas a partir dos 12 anos de idade.
A questão, inclusive, já foi decidida pela Turma de Uniformização das Decisões dos Juizados
Especiais Federais, que editou a Súmula nº 5:
"A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213 de 24 de
julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários." (DJ
25.09.2003).
2.4 DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTOS ATÉ 24/07/1991
A teor do § 2º do artigo 55 da Lei n.º 8.213/91, permite-se o cômputo do tempo de serviço do
segurado trabalhador rural, independentemente do recolhimento das contribuições
previdenciárias, somente em relação ao período que antecede a vigência desta Lei, não
havendo, entretanto, dispensa dessas contribuições para o período posterior a 24/07/1991.
Na ausência de comprovação pela parte autora do recolhimento dessas contribuições, a
averbação de período reconhecido em período posterior a 24/07/1991 há que ser adstrita à data
da edição da reportada Lei.
Nesse sentido, já decidiu esta Egrégia Corte, confira-se:
"PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. DECLARATÓRIA. RURÍCOLA. INÍCIO DE PROVA
MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO PARCIAL
DE TEMPO DE SERVIÇO. INEXIGIBILIDADE DA COMPROVAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE
CONTRIBUIÇÕES.
(...)
5- Inexigível o recolhimento das contribuições previdenciárias do trabalhador rural com relação
ao cômputo do tempo de serviço que antecede a 24/07/1991, data da edição da Lei n.º
8.213/91, não havendo, entretanto, dispensa dessas contribuições para o período posterior a
essa data, que deve ser considerada como termo ad quem do período a ser averbado,
obrigando sua restrição no caso sob exame. Aplicação do enunciado da Súmula n.º 272 do E.
Superior Tribunal de Justiça.
6- Remessa oficial não conhecida. Apelação do INSS parcialmente provida".
(TRF3, 9ª Turma, AC 2004.03.99.003417-6, Desembargador Federal Santos Neves, DJU
17/05/2007, p. 598).
Destaco, entretanto, que a obrigação de se efetuar o recolhimento das contribuições
previdenciárias ao Instituto Autárquico e promover seu desconto da remuneração do
empregado a seu serviço, compete, exclusivamente, ao empregador, por ser este o responsável
pelo repasse de tal valor aos cofres da Previdência.
A fiscalização do cumprimento da obrigação previdenciária cabe ao INSS, inclusive, tendo
ordenamento jurídico disponibilizado ação própria para haver o seu crédito, a fim de exigir do
devedor o cumprimento da legislação.
Na hipótese de diarista/boia-fria, há determinação expressa no art. 55, §2º, da Lei nº 8.213/91,
segundo a qual o tempo de serviço do trabalhador rural laborado antes da sua vigência, será
computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para fins de
carência.
Em relação ao período em que o segurado laborou em regime de economia familiar, é certo que
ao mesmo cabe o dever de recolher as contribuições tão-somente se houver comercializado a
produção no exterior ou no varejo, isto é, para o consumidor final, a empregador rural pessoa
física ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
A pretensão da parte autora, concernente ao mero reconhecimento do tempo de serviço e a
respectiva expedição da certidão, independe de indenização relativamente aos períodos que se
pretende ver reconhecidos, ainda que para fins de contagem recíproca; contudo, merece
destaque a observação trazida pelo eminente Desembargador Federal Sérgio Nascimento, em
seu voto-vista desenvolvido por ocasião do sentido de que "a falta de pagamento da
indenização em discussão não afasta o direito do autor de que seja expedida certidão que
conste a averbação do tempo de serviço rural, reconhecido no presente feito, com a ressalva de
que não foi efetuado o recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, tampouco o
pagamento da indenização de que trata o artigo 96, IV, da Lei n.8.213/91".
Frise-se, ainda, que a contagem recíproca constitui direito do segurado da Previdência Social,
tanto para somá-la ao tempo de atividade laborativa exercida unicamente na atividade privada,
quanto para acrescentá-la ao tempo em que também trabalhou no setor público.
3. DO CASO DOS AUTOS
Presentes as condições de ação (interesse de agir), nos termos do julgamento do RE 631240 e
Súmula/TRF3 n. 9.
In casu, pleiteia a requerente o reconhecimento dos períodos de labor rural de 08.07.1983 a
31.03.1998 e a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Na r. sentença de primeiro grau, foi reconhecido o labor campesino questionado, no entanto, a
MM. Juíza deixou consignado:
“(...)
Nesse ponto, reconheço o trabalho rural realizado pelo autor no período de 08/07/1983 a
31/03/1998, eis que devidamente comprovado, sendo desnecessária a prova da contribuição ao
INSS.
Contudo, para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, não podem ser considerados
os posteriores a 31/10/1991, sabendo-se que, após essa data, para fins de aposentadoria por
tempo de contribuição, faz-se necessária a contribuição efetiva, inclusive do segurado especial,
sem possibilidade de utilização para fins de carência.
(...).”.
Nesse contexto, cumpre examinar se comprovado o labor rurícola alegado, além da
possibilidade de sua utilização para o cumprimento da carência exigida.
Para comprovação da atividade campesina durante o intervalo de 08.07.1983 a 31.03.1998, a
autora (nascimento em 08/07/1973) instruiu a demanda com os seguintes documentos:
- Certidão de Casamento de seus genitores em que seu pai figura como “lavrador” em 1961;
- Certidão de Nascimento da autora, em que consta ter nascido no Bairro Moquém, no
Município de Conchas/SP e a profissão de seu pai como “lavrador” em 1973;
- Histórico Escolar da autora, indicando que frequentou as escolas “EEPG (EMERGÊNCIA)” e
“EEPG (ISOLADA)”, localizadas nos Bairros Santana e Moquém, situadas no município de
Conchas/SP nos anos de 1981 a 1984;
- Escritura Pública de Pacto Antenupcial, em que seu marido está qualificado como “lavrador”
em 07.03.1991;
- Certidão de Casamento da autora, apontando que o seu cônjuge exercia a profissão de
“lavrador” em 11.05.1991.
Por seu turno, foi ouvida a requerente e as testemunhas, cujos depoimentos foram gravados em
mídia digital, e que passo transcrever da r. sentença de primeiro grau:
“(...)
Em juízo, a autora disse que morava com seus pais, moravam no sítio. Seu pai fazia lavoura de
feijão, milho e levada os filhos para o ajudarem. A depoente, seus irmãos. O sítio era do seu
pai, mas fazia serviços para terceiros também. O sítio ficava no Bairro Santana, Bairro Moquém.
Plantava cana, horta também. Ficou desde 7 anos até quando a autora se casou, em 1985.
Quando casou foi para um sítio próximo. Seu sogro tinha sítio também, gado, plantava cana.
Ajudava também na propriedade do sogro. Ficou depois registrada em casa de família que
morava próximo ao sítio, foi seu primeiro registro. As terras do sogro, depois que faleceu, não
ficaram mais com a família.
Benedito Edécio de Oliveira disse que conhece a autora desde criança, nasceram em bairros
vizinhos. Conheceu a família toda. A família era trabalhadora rural, plantavam milho e feijão. Os
pais trabalhavam e a autora ajudava. ANDREA já começou a trabalhar por volta de 9 anos de
idade. Trabalharam juntos, inclusive para terceiros. Trabalharam no sítio do Casemiro. Ficou
com os pais até 17 anos mais ou menos. Depois ela casou. Conhece o marido, chama de
“Dinho”. Na época que casaram, “Dinho” trabalhava junto com o pai: trabalhavam tirando leite,
porco, criações. ANDREA continuou trabalhando na propriedade com eles. Ultimamente ela não
exerce mais a profissão rural, trabalha na cidade. Ela trabalhou em casa de família, com
Elizabeth, e depois com outras pessoas. Antes da Elizabeth.
Augustinho Rodrigues de Lima disse que conhece a autora desde pequena. Ela trabalhava na
roça com sua família. Os pais tinham pequeno sítio, faziam lavoura e os filhos ajudavam. Ficou
com a família até casar. Depois foi trabalhar com o sogro e o marido. O sogro já faleceu.
Ambos, marido e sogro, eram lavradores também. Mexiam com vaquinhas, gado. Era pouco,
mas era o que faziam. Depois ela passou a trabalhar como doméstica, registrada. Antes disso
só na lavoura mesmo. O Bairro antigamente era do Moquém, hoje passou a ser Santana.
Regina Célia Cinti de Lima prestou depoimento no mesmo (...).”.
Do conjunto probatório, especificamente, para fins de concessão de aposentadoria por tempo
de contribuição,é possível reconhecer o tempo laborado na roça no período de 08/07/1985
(quando completou 12 anos de idade) a 23/07/1991.
Quanto ao labor sem registro exercido a partir de 24/07/1991, seria necessário verter
contribuições ou demonstrar a competente anotação em CTPS para o reconhecimento da
atividade, em atendimento à Lei de Custeio (8.212/91), razão pela qual se justifica a cessação
da contagem em 23/07/1991. Precedente: TRF3, 9ª Turma, AC 2004.03.99.003417-6,
Desembargador Federal Santos Neves, DJU 17/05/2007, p. 598.
Acrescente-se que, o tempo de trabalho rural ora reconhecido não está sendo computado para
efeito de carência, nos termos do §2º, do artigo 55, da Lei nº 8.213/91.
Por seu turno, quanto à insurgência da Autarquia Federal a respeito da necessidade da
autodeclaração, para a comprovação da atividade rurícola, razão não lhe assiste, vejamos:
A Lei n. 8.213/91 dispõe sobre a matéria que:
“(...)
Art. 38-B. O INSS utilizará as informações constantes do cadastro de que trata o art. 38-A para
fins de comprovação do exercício da atividade e da condição do segurado especial e do
respectivo grupo familiar. (Incluído pela Lei nº 13.134, de 2015)
§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2023, a comprovação da condição e do exercício da atividade
rural do segurado especial ocorrerá, exclusivamente, pelas informações constantes do cadastro
a que se refere o art. 38-A desta Lei.(Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
§ 2º Para o período anterior a 1º de janeiro de 2023, o segurado especial comprovará o tempo
de exercício da atividade rural por meio de autodeclaração ratificada por entidades públicas
credenciadas, nos termos doart. 13 da Lei nº 12.188, de 11 de janeiro de 2010, e por outros
órgãos públicos, na forma prevista no regulamento.(Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
(...).”.
Com efeito, no artigo em comento, a legislação previdenciária aborda os meios de comprovação
da atividade rural na esfera administrativa, o que não implica na impossibilidade de utilização de
outras provas para o reconhecimento do labor alegado.
De acordo com o artigo 106 da Lei n. 8.213/91:
“(...)
Art. 106. A comprovação do exercício de atividade rural será feita, complementarmente à
autodeclaração de que trata o § 2º e ao cadastro de que trata o § 1º, ambos do art. 38-B desta
Lei, por meio de, entre outros:(Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
I – contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social; (Redação dada
pela Lei nº 11.718, de 2008)
II – contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural; (Redação dada pela Lei nº 11.718,
de 2008)
III -(revogado);(Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
IV - Declaração de Aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, de
que trata oinciso II do caput do art. 2º da Lei nº 12.188, de 11 de janeiro de 2010, ou por
documento que a substitua;(Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
V – bloco de notas do produtor rural;(Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
VI – notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata o§ 7odo art. 30 da Lei no8.212, de 24
de julho de 1991, emitidas pela empresa adquirente da produção, com indicação do nome do
segurado como vendedor;(Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
VII – documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola,
entreposto de pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante;
(Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
VIII – comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da
comercialização da produção; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
IX – cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da
comercialização de produção rural; ou (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
X – licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra. (Incluído pela Lei nº 11.718, de
2008)
(...).".
Além do que, a jurisprudência pátria também engloba, como início razoável de prova material,
documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis
ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067,
Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a
partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos
Tribunais.
Nesse contexto, não se pode olvidar a existência de prova material do trabalho rurícola alegado,
o que possibilita o reconhecimento no período de 08/07/1985 (quando completou 12 anos de
idade) a 23/07/1991.
Assentados esses pontos, cumpre examinar se preenchidos os requisitos para o deferimento da
aposentadoria por tempo de contribuição.
Examinando os autos, verifica-se que, de acordo com o extrato do sistema CNIS da Previdência
Social, a requerente efetuou recolhimento de contribuições previdenciárias de 01/02/2012 a
31/12/2016, como segurada facultativa, com indicadores de pendências: IREC-LC123 e PREC-
MENOR-MIN, ou seja, Recolhimento no Plano Simplificado de Previdência Social (LC
123/2006) e Recolhimento Abaixo do Valor Mínimo.
A Lei Complementar n. 123/06, a qual acrescentou os parágrafos 2º e 3º ao art. 21 da Lei
8.212/91, veda a utilização das contribuições previdenciárias para efeito de concessão de
aposentadoria por tempo de contribuição, ao contribuinte que efetuou o recolhimento na
alíquota de 11% (contribuinte individual) ou 5% (microempreendedor individual).
Nessa hipótese, para que referidos recolhimentos fossem utilizados para esse fim, a autora
deveria demonstrar que complementou o valor das contribuições, na forma do §3º do art. 21 da
referida lei, com o recolhimento da diferença entre o percentual pago e o de 20% (vinte por
cento), acrescido dos juros moratórios.
Desse modo, tendo em vista que não restou demonstrado que a parte autora complementou o
valor das contribuições, inviável o cômputo das contribuições vertidas durante o período em
comento, na forma da Lei Complementar n. 123/2006, para fins de concessão do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição.
Assentados esses pontos, refeita a contagem realizada pela Autarquia Federal, com a inclusão
do labor rural reconhecido, verifica-se que até 15/10/2019, data do requerimento administrativo,
a requerente não perfez tempo suficiente para o deferimento da aposentadoria vindicada, que
exige, pelo menos, 30 anos de contribuição.
4. CONSECTÁRIOS
VERBA HONORÁRIA
Em razão da sucumbência recursal majoro em 100% os honorários fixados em sentença,
observando-se o limite máximo de 20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85
do CPC/2015.
No entanto, quanto à parte autora, suspendo a exigibilidade, por se tratar de beneficiária da
assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no art. 98, § 3º, do CPC.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora e dou parcial provimento à
apelação da Autarquia Federal, para restringir o reconhecimento do labor campesino ao período
de 08/07/1985 a 23/07/1991, observando-se no que tange à verba honorária os critérios
estabelecidos no presente Julgado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL EM PARTE. NÃO PREENCHIDOS OS
REQUISITOS PARA A APOSENTAÇÃO. VERBA HONORÁRIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
- Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer o artigo 201 da Constituição
Federal o direito à aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, ao
completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem e 30 (trinta) anos de contribuição,
se mulher.
- Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16
de dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
- Ao segurado inscrito perante o Regime Geral de Previdência Social anteriormente à
promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, mas que, nessa data (16 de dezembro de
1998), ainda não tivesse preenchido os requisitos necessários à sua aposentação, mesmo na
forma proporcional, aplicam-se as regras de transição estabelecidas pelo art. 9º da referida
normação constitucional.
- Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados
que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da
EC 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o
mesmo prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
- No caso dos autos, restou comprovado, em parte, o labor rural.
- A somatória do tempo de serviço laborado pela parte autora não autoriza a concessão do
benefício pleiteado.
- Majoração em 100% os honorários fixados em sentença, observando-se o limite máximo de
20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015, observada a
gratuidade da justiça.
- Apelação da Autarquia Federal parcialmente provida.
- Apelação da parte autora improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora e dar parcial provimento à
apelação da Autarquia Federal. A Juíza Federal Convocada Leila Paiva acompanhou o Relator
com ressalva de entendimento pessoal
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
