Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0004021-30.2020.4.03.6327
Relator(a)
Juiz Federal TAIS VARGAS FERRACINI DE CAMPOS GURGEL
Órgão Julgador
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
12/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 19/11/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE PERÍODO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA
PELA PROVA TESTEMUNHAL. CÔMPUTO COMO CARÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE.
1. O reconhecimento de tempo de serviço rural exige um início de prova material, que deve ser
corroborado pela prova testemunhal, gerando um conjunto probatório indicativo de sua
realização; não é necessário, entretanto, que todos os documentos sejam contemporâneos, nem
que haja um documento por ano pretendido, gerando efeitos retroativos, assim como protraindo
seus efeitos no tempo, diante de conjunto probatório idôneo.
2. No caso concreto, foi juntada farta documentação, parcialmente contemporânea, mas que lida
dentro do conjunto probatório, inclusive à luz das testemunhas ouvidas em juízo, leva ao
convencimento acerca do labor rural no período pretendido.
3. O tempo rural não contributivo anterior a 01/11/1991 pode ser computado somente como
tempo de contribuição e não para fim de carência.
4. Recurso parcialmente provido.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004021-30.2020.4.03.6327
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MARIO DA SILVA
Advogados do(a) RECORRIDO: ANA THAIS CARDOSO BARBOSA - SP420170-N, DENIS
RODRIGUES DE SOUZA PEREIRA - SP406755-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004021-30.2020.4.03.6327
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MARIO DA SILVA
Advogados do(a) RECORRIDO: ANA THAIS CARDOSO BARBOSA - SP420170-N, DENIS
RODRIGUES DE SOUZA PEREIRA - SP406755-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso interposto pelo INSS, ora Recorrente, contra a sentença que julgou
procedente o pedido inicial, reconhecendo o período rural de 01/01/1976 a 31/07/1981,
concedendo, ainda, aposentadoria por tempo de contribuição, desde 13/07/2020.
Insurge-se o Recorrente, sustentando em suas razões recursais que não foi apresentada pelo
autor autodeclaração e que não houve a apresentação de documentos contemporâneos ao
período reconhecido, ainda alegando não ser possível que este tempo seja usado como
carência.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004021-30.2020.4.03.6327
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MARIO DA SILVA
Advogados do(a) RECORRIDO: ANA THAIS CARDOSO BARBOSA - SP420170-N, DENIS
RODRIGUES DE SOUZA PEREIRA - SP406755-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Considerando o artigo 1.013 do Código de Processo Civil, o recurso devolve a instância
recursal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido
solucionadas desde que relativas ao capítulo impugnado.
Dispõe a Lei 8.213/91, em seu artigo 55, § 3o, que não pode ser considerada para a
comprovação de tempo de serviço exclusivamente a prova testemunhal havendo necessidade
de indício de prova material:
“Art. 55.
(...)
§3º. A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante
justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito
quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto
no Regulamento.”
De saída, é notório que as famílias que residiam no campo contavam com ajuda de todos os
membros do núcleo familiar, na atividade rural. Pais e filhos costumavam (e até hoje persiste
esta tradição em vários lugares) trabalhar dentro da mesma propriedade, visando ao sustento
do grupo.
Por outro lado, a idade base para contagem do termo inicial deve ser a de 14 anos. O
reconhecimento de exercício efetivo em idade inferior a esta depende de prova contemporânea
daquela atividade, pois se presume que a criança menor de 14 anos ainda estudava e não
dedicava seu tempo integral à atividade rural. Além disso, antes dos 14 anos, muitas crianças
sequer tinham condições físicas de suportar o duro trabalho do campo de maneira
independente.
Esta é a interpretação mais razoável da Súmula n. 5 da TNU, que admite a possibilidade
reconhecimento do labor rural entre 12 e 14 anos de idade:
“A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de
julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários.”
O reconhecimento do período anterior aos 12 (doze) anos, assim, requer a juntada de
documentos contemporâneos mais sólidos.
Tratando-se de período anterior a 1991, ademais, não se está diante dos requisitos mais rígidos
para a caracterização de segurado especial. Basta a comprovação de labor rural, em sentido
amplo. Entretanto, era necessária a comprovação de que a parte autora residia com seu pai na
propriedade rural em que esse laborava, exercendo a atividade de lavrador.
Há que se consignar, ainda, que não é necessário que o autor traga aos autos um documento
por ano que pretende comprovar de labor rural, assim como que os documentos precisam
manter uma certa relação de contemporaneidade com os fatos que pretendem comprovar, mas
que podem lançar seus efeitos retrospectivamente e prospectivamente. O que importa é a
harmonia do conjunto probatório produzido, levando-se em consideração também a prova
testemunhal produzida. Neste sentido:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. INICIO
DE PROVA MATERIAL. CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. SÚMULAS 7 E
83/STJ. APLICAÇÃO.
1. Não se configura a alegada ofensa ao artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015,
uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou, de maneira
amplamente fundamentada, a controvérsia, em conformidade com o que lhe foi apresentado.
2. O argumento de que não há prova material correspondente ao período de atividade que se
pretende comprovar não merece prosperar pois o Tribunal a quo foi categórico em afirmar que
os documentos carreados ao processo inserem a família do autor no meio rural em todo o
período pleiteado, tendo sido corroborados pela prova testemunhal.
3. O Recurso Especial 1.348.633/SP, submetido ao rito dos recursos repetitivos, firmou
entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo
documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de
prova material do tempo de serviço rural.
4. É inviável analisar a tese defendida no Recurso Especial, pois inarredável a revisão do
conjunto probatório dos autos para afastar as premissas fáticas estabelecidas pelo acórdão
recorrido de que, "comprovado o exercício da atividade rural durante o período correspondente
à carência, deve ser mantida a sentença de procedência". Aplica-se, portanto, o óbice da
Súmula 7/STJ.
5. Agravo conhecido para não conhecer do Recurso Especial.” (AREsp 1527015/RS, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/09/2019, DJe 11/10/2019)
Por fim, é sempre importante consignar que o tempo de labor rural desacompanhado de
contribuições anterior a novembro de 1991 não pode ser considerado para carência no caso de
aposentadoria por tempo de contribuição, mas pode ser contado como tempo de contribuição.
No caso concreto, a sentença reconheceu o período de 01/01/1976 a 37/07/1981, tendo
analisado a prova dos autos da seguinte maneira:
“(...)
No caso dos autos, o autor requer o reconhecimento do período de 01/01/1976 a 31/07/1981
como tempo de atividade rural.
Para comprovar o labor rural, o autor juntou aos autos os seguintes documentos:
* autodeclaração do segurado especial-rural (fls. 28/30 do evento 02);
* certificado de cadastro de imóvel rural e declaração de ITR e de rendimentos, em nome do pai
do autor (fl. 86, 89 e 93/113 do evento 02);
* comprovante de contribuição sindical em nome de seu pai no ano de 1971 (fls. 91/92 do
evento 02);
* guia de sepultamento do pai do autor, onde consta a profissão e lavrador (fl. 119 do evento
02)
* nota fiscal (fl. 120 do evento 02).
* certidão de casamento de seus genitores, constando a profissão do pai como lavrador (evento
25).
Conforme extrato do CNIS, o demandante possui vínculo empregatício registrado a partir de
21/09/1981, enquanto seu genitor recebia aposentadoria por idade rural (eventos 17 a 19).
A prova oral confirmou o trabalho rural do autor, em regime de economia familiar.
Considerando o conjunto probatório, reconheço como tempo de atividade rural o período de
01/01/1976 a 31/07/1981.
Passo a apreciar o direito à concessão do benefício.
Acrescendo-se o tempo rural ora reconhecido à contagem elaborada na via administrativa, o
novo tempo de contribuição apurado até a DER (13/07/2020) é de 37 anos, 03 meses e 24 dias.
Tendo em vista que o autor atingiu 35 anos de tempo de contribuição antes da promulgação da
EC 103/2019, e que a renda mensal apurada em 13/11/2019 é mais benéfica, conforme
cálculos da Contadoria Judicial, fica resguardado o direito adquirido ao benefício com as regras
de cálculo anteriores à reforma constitucional, e efeitos financeiros a partir da DER
(13/07/2020).”
De saída, diferentemente ao alegado pelo INSS, houve a apresentação de autodeclaração pelo
autor, como se observa dos documentos que acompanharam a inicial.
No mais, a parte autora trouxe farta prova documental no sentido de que sua família residia no
campo desde o seu nascimento, com diversos documentos que comprovam a existência de
propriedade rural de seu pai, datados de 1966 e 1989, certidão de casamento dos pais em que
ele é qualificado como lavrador, declaração de rendimentos também de seu pai, de 1973/1974
onde se observa a atividade de lavrador, nota fiscal de venda de produção datada de 1976 e
cadastro rural junto à Secretaria de Finanças de Minas Gerais de 1969, constando como
atividade a agricultura e pecuária.
Os documentos apresentados são suficiente início de prova material, desde que corroborados
por prova testemunhal, formando um robusto conjunto probatório, sendo importante ressaltar
que há documento contemporâneo, qual seja a nota fiscal de 1976, além de documentos
posteriores e anteriores, que demonstram a continuidade das atividades pelo núcleo familiar.
As testemunhas ouvidas em Juízo foram bastante uniformes e harmônicas com a prova
documental juntada, explicitando o labor rural do autor com sua família na propriedade deles.
Por fim, como já mencionado, é pacífico o entendimento de que o tempo de atividade rural
desacompanhado de contribuições e anterior a novembro de 1991 pode ser considerada como
tempo de contribuição, mas não como carência.
Da análise do feito, observo que o tempo em questão foi computado como carência pela
sentença que, assim, merece reforma neste ponto; entretanto, mesmo excluído o período para
tal fim, o autor possui carência mais do que suficiente para a concessão do benefício, o que não
altera o resultado final do processo.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso do INSS, apenas para que o período rural
reconhecido não seja computado para carência.
Sem condenação em custas e honorários advocatícios, só devidos pelo recorrente vencido no
âmbito do JEF.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE PERÍODO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA
PELA PROVA TESTEMUNHAL. CÔMPUTO COMO CARÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE.
1. O reconhecimento de tempo de serviço rural exige um início de prova material, que deve ser
corroborado pela prova testemunhal, gerando um conjunto probatório indicativo de sua
realização; não é necessário, entretanto, que todos os documentos sejam contemporâneos,
nem que haja um documento por ano pretendido, gerando efeitos retroativos, assim como
protraindo seus efeitos no tempo, diante de conjunto probatório idôneo.
2. No caso concreto, foi juntada farta documentação, parcialmente contemporânea, mas que
lida dentro do conjunto probatório, inclusive à luz das testemunhas ouvidas em juízo, leva ao
convencimento acerca do labor rural no período pretendido.
3. O tempo rural não contributivo anterior a 01/11/1991 pode ser computado somente como
tempo de contribuição e não para fim de carência.
4. Recurso parcialmente provido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quarta Turma
Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região, Seção Judiciária de São Paulo
decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
