Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000823-55.2020.4.03.6336
Relator(a)
Juiz Federal MARISA REGINA AMOROSO QUEDINHO CASSETTARI
Órgão Julgador
9ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
03/12/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL NÃO COMPUTADO
ADMINISTRATIVAMENTE PELO INSS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DOS
PEDIDOS EXORDIAIS. RECURSO INTERPOSTO PELO INSS. ALEGAÇÕES RECURSAIS
GENÉRICAS DO INSS SEM, CONTUDO, DEMONSTRAR A NECESSÁRIA PERTINÊNCIA AO
CASO CONCRETO. RECURSO PELA PARTE AUTORA. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE
DEFESA ARGUIDA PELO AUTOR, EM FACE DO INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE
REALIZAÇÃO DE PERÍCIA TÉCNICA. TRABALHADOR RURAL. O DECRETO Nº 53.831/64, NO
SEU ITEM 2.2.1, CONSIDERA COMO INSALUBRE SOMENTE OS SERVIÇOS E ATIVIDADES
PROFISSIONAIS DESEMPENHADOS NA AGROPECUÁRIA, NÃO SE ENQUADRANDO COMO
TAL A ATIVIDADE LABORAL EXERCIDA APENAS NA LAVOURA. PRECEDENTES. ATIVIDADE
DE MOTORISTA. POSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO PELA ATIVIDADE SOMENTE ATÉ
A EDIÇÃO DA LEI 9.032/95. RECURSO DO INSS NÃO CONHECIDO. RECURSO DA PARTE
AUTORA IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
9ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000823-55.2020.4.03.6336
RELATOR:26º Juiz Federal da 9ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MILTON ORTIZ DE CAMARGO
Advogado do(a) RECORRIDO: ANDREIA DE FATIMA VIEIRA - SP236723-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000823-55.2020.4.03.6336
RELATOR:26º Juiz Federal da 9ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MILTON ORTIZ DE CAMARGO
Advogado do(a) RECORRIDO: ANDREIA DE FATIMA VIEIRA - SP236723-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
RELATÓRIO DISPENSADO, NOS TERMOS DA LEI Nº 9.099/95.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000823-55.2020.4.03.6336
RELATOR:26º Juiz Federal da 9ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MILTON ORTIZ DE CAMARGO
Advogado do(a) RECORRIDO: ANDREIA DE FATIMA VIEIRA - SP236723-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O - E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL NÃO COMPUTADO
ADMINISTRATIVAMENTE PELO INSS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DOS
PEDIDOS EXORDIAIS. RECURSO INTERPOSTO PELO INSS. ALEGAÇÕES RECURSAIS
GENÉRICAS DO INSS SEM, CONTUDO, DEMONSTRAR A NECESSÁRIA PERTINÊNCIA AO
CASO CONCRETO. RECURSO PELA PARTE AUTORA. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE
DEFESA ARGUIDA PELO AUTOR, EM FACE DO INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE
REALIZAÇÃO DE PERÍCIA TÉCNICA. TRABALHADOR RURAL. O DECRETO Nº 53.831/64,
NO SEU ITEM 2.2.1, CONSIDERA COMO INSALUBRE SOMENTE OS SERVIÇOS E
ATIVIDADES PROFISSIONAIS DESEMPENHADOS NA AGROPECUÁRIA, NÃO SE
ENQUADRANDO COMO TAL A ATIVIDADE LABORAL EXERCIDA APENAS NA LAVOURA.
PRECEDENTES. ATIVIDADE DE MOTORISTA. POSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO
PELA ATIVIDADE SOMENTE ATÉ A EDIÇÃO DA LEI 9.032/95. RECURSO DO INSS NÃO
CONHECIDO. RECURSO DA PARTE AUTORA IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA PELOS
PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.
1. Pedido de reconhecimento de tempo de serviço laborado em condições especiais e sua
respectiva averbação, bem como de cômputo de períodos de recolhimento como contribuinte
individual, para fins de concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de
contribuição.
2. Sentença de parcial procedência dos pedidos exordiais para: i) reconhecer o caráter especial
das atividades exercidas no período de 02/05/1991 a 14/06/1991, 01/08/1991 a 14/10/1991 e de
01/06/1993 a 28/04/1995, nos termos do Anexo do Decreto nº 53.831/64 e Decretos nºs 357/91
e 611/92 c/c Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração do Decreto nº 4.882/03; e ii)
condenar o INSS ao cumprimento de obrigação de fazer, consistente na averbação, após o
trânsito em julgado, dos períodos acima referidos no Cadastro Nacional de Informações Sociais
– CNIS e em outros sistemas eletrônicos de controle do tempo de serviço dos segurados da
Previdência Social.
3. Recurso interposto pela parte autora. Sustenta, preliminarmente, a ocorrência de
cerceamento de defesa, ante o indeferimento do pedido de produção de prova técnica. Requer
seja conhecido e provido o presente recurso, retornando os autos ao juízo “a quo” para a
realização da perícia no local de trabalho, e, no mérito, para que seja reformada a respeitável
sentença “a quo”, julgando-se totalmente procedentes os pedidos exordiais.
4. Recurso interposto pelo INSS. Reproduz as alegações apresentadas em sede de
contestação, inclusive impugnando períodos que não foram reconhecidos pela sentença
recorrida (períodos de labor rural de 01/10/1983 a 28/01/1984, de 05/03/1984 a 13/04/1987 e de
16/04/1987 a 01/04/1991, e períodos de exercício de atividade de motorista de 02/05/1991 a
14/06/1991, de 01/08/1991 a 14/10/1991 e de 01/06/1993 a 28/04/1995).
5. É a síntese do necessário. Passo a decidir.
6. Afasto a alegação de cerceamento de defesa formulada pela parte autora, ante o
indeferimento de produção de prova técnica nos autos, tendo em vista que o art. 373, I, do
Código de Processo Civil estabelece que incumbe à parte autora o ônus de provar os fatos
constitutivos do direito invocado, e que a legislação previdenciária determina que a
comprovação da exposição a agentes nocivos durante a jornada de trabalho deve ser feita
mediante a apresentação da documentação própria indicada em lei (formulários SB-40, DSS-
8030, DIRBEN-8030 ou PPP e laudo técnico de condições ambientais).
7. Convém, ainda, transcrever excerto do seguinte julgado: “O juiz é o destinatário da prova,
cabendo-lhe indeferir a produção daquelas inúteis em face da existência de dados suficientes
para o julgamento da causa, ou determinar, de ofício, a produção de outras que se façam
necessárias à formação do seu convencimento. Assim, se o magistrado entende desnecessária
a realização de perícia por entender que a constatação da especialidade do labor exercido se
faz por meio dos formulários e laudos fornecidos pela empresa, pode indeferi-la, nos termos dos
arts. 130 e art. 420, parágrafo único, ambos do Código de Processo Civil, sem que isso implique
cerceamento de defesa.” (TRF3, AC 00006600620144036136, DESEMBARGADOR FEDERAL
DAVID DANTAS, OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/12/2016).
8. Passo à análise do recurso interposto pelo INSS.
9. Verifico que o apelo da autarquia ré reproduz as alegações apresentadas em sede de
contestação, inclusive impugnando períodos que não foram reconhecidos pela sentença
recorrida (períodos de labor rural de 01/10/1983 a 28/01/1984, de 05/03/1984 a 13/04/1987 e de
16/04/1987 a 01/04/1991, e períodos de exercício de atividade de motorista de 02/05/1991 a
14/06/1991, de 01/08/1991 a 14/10/1991 e de 01/06/1993 a 28/04/1995), em relação aos quais
não possui interesse recursal.
10. Assim, observo que o recurso do INSS maneja alegações genéricas sem atrelar tal
arrazoado ao contexto da sentença recorrida, apontando quais seriam os períodos de tempo de
serviço impugnados e suas respectivas razões. Não há regularidade formal no recurso que, ao
apresentar suas razões, não confronta a defesa de suas teses com os fundamentos de fato e
de direito utilizados pelo julgador, a fim de demonstrar o suposto desacerto (STJ, AGRESP
1346766, Relator MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJE DATA:
27/09/2013).
11. Convém lembrar que é dever do recorrente, em atenção ao princípio da dialeticidade refutar,
de forma específica e precisa, todos os fundamentos autônomos e suficientes contidos na
decisão impugnada. Nesse sentido:
“O princípio da dialeticidade recursal impõe ao recorrente o ônus de evidenciar os motivos de
fato e de direito suficientes à reforma da decisão objurgada, trazendo à baila novas
argumentações capazes de infirmar todos os fundamentos do decisum que se pretende
modificar, sob pena de vê-lo mantido por seus próprios fundamentos.” (AI 631672 AgR-
segundo, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 30/10/2012).
12. No âmbito dos Juizados Especiais Federais não há reexame necessário (art. 13, da Lei nº
10.259/2001), o que reforça ainda mais a necessidade do recorrente apontar as específicas
razões para a reforma da sentença, não cabendo, à evidência, ao magistrado realizar um cotejo
entre as teses apresentadas em abstrato no recurso e os fundamentos fáticos e jurídicos
utilizados pela sentença, a fim de identificar eventual desacerto desta.
13. Com a edição do Código de Processo Civil de 2015, tal compreensão foi positivada em seu
art. 932, III, que dispõe:
“Art. 932. Incumbe ao relator:
[...]
III - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado
especificamente os fundamentos da decisão recorrida;”
14. Quanto ao recurso interposto pela parte autora, analisando os pontos impugnados concluo
que não lhe assiste razão.
15. Consoante já decidiu o Supremo Tribunal Federal, "não configura negativa de presunção
jurisdicional ou inexistência de motivação a decisão do Juízo ad quem pela qual se adotam,
como razões de decidir, os próprios fundamentos constantes da decisão da instância recorrida
(motivação per relationem), uma vez que atendida a exigência constitucional e legal da
motivação das decisões emanadas do Poder Judiciário" (STF. ARE 657355 AgR, Relator Min.
LUIZ FUX, 1ª T., julgado em 06/12/2011).
16. Com base no entendimento jurisprudencial supra e considerando o alinhamento da
sentença objurgada com a compreensão deste Juízo sobre a questão litigiosa, adoto, como
razões de decidir, os fundamentos exarados no decisum recorrido que ora passam a incorporar
o presente voto:
“(...) No que tange aos lapsos nos quais o demandante verteu contribuições ao RGPS, na
condição de contribuinte individual, porém também, segundo narrado na exordial, ignorados
pelo INSS no cálculo do tempo de contribuição, observo que a decisão administrativa
demonstra que isso decorreu de omissão imputável exclusivamente ao autor. Com efeito,
vejamos o teor da justificativa administrativa, verbis:
“O(s) recolhimento(s) como prestador de serviço efetuados via GFIP do período de 12/2015 A
06/2016 foram desconsiderados, pois os mesmos foram efetuados de forma extemporânea e
não foram comprovados na forma do § 3° do art. 29-A da Lei 8.213/91 e Inciso II do § 4° e 5° do
art. 61 da Instrução Normativa INSS/PRES 77 de 2015. O(s) recolhimento(s) efetuado(s) abaixo
do valor mínimo legal, definido no § 3° do art. 28 da Lei 8.212/91 e no § 3° do art. 214 do
Decreto 3048/99, referentes ao período de 10/2015 E 09/2016 foram desconsiderados pois não
foram complementados” (fl. 125 do evento 02 – grifei.
Portanto, em relação ao pleito de reconhecimento do tempo de contribuição nos períodos de
01/08/2014 a 31/05/2015, 01/10/2015 a 31/10/2015 e 01/12/2015 a 30/09/2016, o demandante
ignorou a via administrativa, pois sequer apresentou os documentos descritos na carta de
exigências e necessários ao regular cômputo dos períodos acima especificados. Por via de
consequência dessa omissão imputável exclusivamente ao autor, não vislumbro, neste
momento, necessidade de intervenção do Poder Judiciário, na forma do disposto no artigo 485,
VI, do CPC.
No que diz respeito aos demais pleitos, verifico que estão presentes as condições da ação,
nada se podendo objetar quanto à legitimidade das partes e a presença do interesse
processual. Estão igualmente presentes os pressupostos de constituição e desenvolvimento
válido e regular do processo, (i) o proveito econômico pretendido é inferior ao limite de alçada
dos Juizados Especiais Federais, mesmo quando aplicado o disposto no art. 292, §§1º e 2º do
Código de Processo Civil.
Assim, passo ao exame do mérito.
2.2. Do pedido de reconhecimento de atividade especial (rural)
A parte autora requer o reconhecimento de atividade especial por enquadramento por categoria
profissional no item 2.2.1 do Decreto 53.831/64, sob o argumento de que, nos períodos de
01/10/1983 a 28/01/1984, 05/03/1984 a 13/04/1987 e 16/04/1987 a 01/04/1991, desempenhou
a função de trabalhador rural, equiparado a agropecuário, junto a ex-empregadores rurais,
conforme provas acostadas a estes autos virtuais.
Pois bem, em regra, o trabalho rural não é considerado especial, vez que a exposição a
poeiras, sol e intempéries não justifica a contagem especial para fins previdenciários. Contudo,
tratando-se de atividade em agropecuária (empregados em empresas agroindustriais e/ou
agrocomerciais), cuja contagem especial está prevista no código 2.2.1 do Decreto 53.831/64, há
presunção de prejudicialidade que vige até o advento da Lei nº 9.032/95, de 28 de abril de
1995.
Ademais, está sedimentado na jurisprudência que o código 2.2.1 do Decreto 53.831/64
considerava especial apenas as atividades desenvolvidas por trabalhadores ocupados na
agropecuária, em produção de larga escala, com utilização intensiva e habitual de defensivos
agrícolas, não havendo, ainda, previsão para a contagem especial de tempo de serviço por
mera exposição a poeiras, sol e intempéries. (TRF 3ª Região, DÉCIMA TURMA, ApReeNec -
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2220182 - 0002163-96.2013.4.03.6136, Rel.
DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, julgado em 08/05/2018, e-DJF3
Judicial 1 DATA:16/05/2018; TRF 3ª R; Agravo 2004.03.99.021636-9, 8ª Turma; Rel. Des.
Federal Vera Jucovsky; julg. 20.09.2010; DJ 06.10.2010, pág.734; TRF 3ª R, 10ª Turma,
Apelação nº 0025807-80.2017.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal Sergio Nascimento,
julgado em 14/11/2017, e-DJF3 24/11/2017).
Entretanto, recentemente, o c. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal PUIL 452/PE, em 14/06/2019, afastou
o entendimento outrora perfilhado pela Turma Nacional de Uniformização, para fixar o
entendimento no sentido de que o trabalhador rural (seja empregado rural ou segurado
especial) que não demonstre o exercício de seu labor na agropecuária, nos termos do
enquadramento por categoria profissional vigente até a edição da Lei 9.032/1995, não possui o
direito subjetivo à conversão ou contagem como tempo especial para fins de aposentadoria por
tempo de serviço/contribuição ou aposentadoria especial, respectivamente. Eis o teor da
ementa do julgado:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE
ESPECIAL. EMPREGADO RURAL. LAVOURA DA CANA-DE-AÇÚCAR. EQUIPARAÇÃO.
CATEGORIA PROFISSIONAL. ATIVIDADE AGROPECUÁRIA. DECRETO 53.831/1964.
IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. Trata-se, na origem, de Ação de Concessão de
Aposentadoria por Tempo de Contribuição em que a parte requerida pleiteia a conversão de
tempo especial em comum de período em que trabalhou na Usina Bom Jesus (18.8.1975 a
27.4.1995) na lavoura da cana-de-açúcar como empregado rural. 2. O ponto controvertido da
presente análise é se o trabalhador rural da lavoura da cana-de-açúcar empregado rural poderia
ou não ser enquadrado na categoria profissional de trabalhador da agropecuária constante no
item 2.2.1 do Decreto 53.831/1964 vigente à época da prestação dos serviços. 3. Está
pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no
momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge
Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin,
Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC (Tema
694 - REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 5/12/2014). 4. O
STJ possui precedentes no sentido de que o trabalhador rural (seja empregado rural ou
segurado especial) que não demonstre o exercício de seu labor na agropecuária, nos termos do
enquadramento por categoria profissional vigente até a edição da Lei 9.032/1995, não possui o
direito subjetivo à conversão ou contagem como tempo especial para fins de aposentadoria por
tempo de serviço/contribuição ou aposentadoria especial, respectivamente. A propósito: AgInt
no AREsp 928.224/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 8/11/2016; AgInt
no AREsp 860.631/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe
16/6/2016; REsp 1.309.245/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 22/10/2015;
AgRg no REsp 1.084.268/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 13/3/2013;
AgRg no REsp 1.217.756/RS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 26/9/2012; AgRg
nos EDcl no AREsp 8.138/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, DJe 9/11/2011; AgRg
no REsp 1.208.587/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 13/10/2011; AgRg no
REsp 909.036/SP, Rel. Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, DJ 12/11/2007, p. 329; REsp 291.
404/SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJ 2/8/2004, p. 576. 5. Pedido de
Uniformização de Jurisprudência de Lei procedente para não equiparar a categoria profissional
de agropecuária à atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-açúcar.
(PUIL 452/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/05/2019,
DJe 14/06/2019 - grifei).
Colhe-se dos autos nos intervalos de 01/10/1983 a 28/01/1984, 05/03/1984 a 13/04/1987 e
16/04/1987 a 01/04/1991, a parte autora exerceu atividade de natureza rurícola, na qualidade
de “lavrador”, “trabalhador rural” e “ajudante de serviços agrícolas diversos”, não se
enquadrando, por via de consequência, como atividade agropecuária, conforme anotações na
CTPS do autor (c.f. fls. 68 do evento 02).
Ademais, a simples sujeição às intempéries da natureza (condições climáticas - sol, chuva, frio,
calor, radiações não ionizantes, poeira etc.), como sói ocorrer nesse meio, é insuficiente a
caracterizar a lida no campo como insalubre ou penosa.
Nesse sentido, friso que o simples fato do empregador do autor qualificar-se como
estabelecimento agropecuário não implica, por si só, que todos seus empregados são
considerados trabalhadores do setor agropecuário, para fins de enquadramento item 2.2.1 do
Decreto 53.831/1964, como decorre das mais comezinhas regras das máximas da experiência.
Assim, o pleito autoral não merece ser acolhido.
2.3. Do pedido de reconhecimento do labor especial (motorista)
A parte autora postula o reconhecimento da especialidade de labor desempenhado na função
de motorista, nos seguintes períodos, in verbis:
“De 02/05/1991 a 14/06/1991 o Autor exerceu a função de MOTORISTA, laborado junto a
Empresa TRANSPORTADORAF;
De 01/08/1991 a 14/10/1991 o Autor exerceu a função de MOTORISTA, laborado junto a
Empresa BEBIDASPRIMOR;
De 01/06/1993 a 05/06/1995 o Autor exerceu a função de MOTORISTA, laborado junto a
Empresa BEBIDASPRIMOR;
De 01/02/1996 a 21/07/1998 o Autor exerceu a função de MOTORISTA, laborado junto a
Empresa TRANSPORTADORAF.F; PPP anexo a inicial
De 14/04/2011 a 13/11/2011 o Autor exerceu a função de MOTORISTA, laborado junto a
Empresa BOLDO E BRUNELLI; PPP anexo
De 02/12/2011 a 20/12/2011 o Autor exerceu a função de MOTORISTA, laborado junto a
Empresa BOLDO E BRUNELLI; PPP anexo
De 26/04/2012 a 16/04/2012 o Autor exerceu a função de MOTORISTA, laborado junto a
Empresa BOLDO E BRUNELLI; PPP anexo
De 01/10/2016 a 07/02/2017 o Autor exerceu a função de MOTORISTA, laborado junto a
Empresa ANDRE LUIZ MASCARO LTDA; PPP anexo a inicial
De 09/03/2017 a 14/12/2017 o Autor exerceu a função de MOTORISTA, laborado junto a
Empresa IMEDIATO AGRÍCOLA; PPP anexo a inicial
De 02/04/2018 a 18/12/2018 o Autor exerceu a função de MOTORISTA, laborado junto a
Empresa IMEDIATO AGRÍCOLA; PPP anexo a inicial
De 25/03/2019 a 13/12/2019 o Autor exerceu a função de MOTORISTA, laborado junto a
Empresa IMEDIATOAGRÍCOLA. PPP anexo a inicial” (trecho da manifestação do autor - evento
12).
Para ser considerada atividade especial, necessária a prova de que o labor foi realizado como
motorista de caminhão ou de ônibus, ou ainda como cobrador de ônibus ou ajudante de
caminhão, atividades enquadradas como especiais no código 2.4.2, do quadro Anexo do
Decreto nº 53.831/64.
Consigno que a legislação aplicável para caracterização da natureza especial é a vigente no
período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, ser
levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79,
até 05.03.1997 e, após, pelos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.049/99.
E, consoante legislação acima fundamentada, o enquadramento por categoria profissional
ocorreu somente até a promulgação da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, sendo
necessária, após essa data, a comprovação da exposição aos agentes agressivos considerados
insalubres ou penosos, nos termos legais.
Também cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a
aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram
concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do
Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de
janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual
regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo
técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
NO CASO SOB JULGAMENTO, nos períodos de 02/05/1991 a 14/06/1991, 01/08/1991 a
14/10/1991 e de 01/06/1993 a 28/04/1995, reputo que o autor logrou demonstrar que exerceu a
função de motorista, conforme decorre do cotejo das anotações em CTPS (fls. 36, 68 e 69 do
evento 02) e das informações contidas nos formulários previdenciários de fls. 16 a 29 do evento
02.
Ainda que o autor não tenha juntado aos autos comprovação de tipo de caminhão conduzido,
tampouco demonstrado sua habilitação, conforme asseverado pelo INSS, noto que o autor, nos
períodos anteriores a 28/04/1995, desempenhou suas funções para empresa de transporte de
cargas e para conhecida empresa dessa região, a qual também na entrega de bebidas para
diversas regiões do País, conforme temos observado recorrentemente nas lides previdenciárias
dessa Subseção Judiciária.
Tanto isso é verdade que as ex-empregadoras anotaram na CTPS do autor o exercício da
função de motorista e, posteriormente ao término dos referidos vínculos, o autor desenvolveu
intensa atuação no setor de transportes de carga, na indústria sucroalcooleira, consoante se
infere da profissiografia contida nos formulários previdenciários de fls. 16 a 29 do evento 02.
Prosseguindo, observo que, em relação aos períodos posteriores ao advento da Lei n. 9.032/95,
de 28 de abril de 1995, quando passou a ser necessária a comprovação da exposição aos
agentes agressivos considerados insalubres ou penosos, nos termos legais, inclusive, no caso
do motorista dedicado ao transporte de cargas, como é o caso do autor, os formulários
anexados a este feito virtual demonstram a condução de caminhão, porém informam a
exposição a ruído, na intensidade inferior ao parâmetro fixado pela legislação previdenciária
vigente na época da prestação dos serviços.
Na verdade, observo que o demandante busca o reconhecimento da especialidade de período
laborado como motorista, em relação aos períodos posteriores ao advento da Lei n. 9.032/95,
de 28 de abril de 1995, isto é, de 29/04/1995 a 13/12/2019, mediante enquadramento por
categoria profissional, somente admitido até a promulgação da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de
1995, na linha da jurisprudência uníssona do C. STJ, de sorte que manifestamente inviável o
acolhimento do pleito sob análise.
Em consequência, o autor faz jus ao reconhecimento de labor especial desempenhado nos
interregnos de 02/05/1991 a 14/06/1991, 01/08/1991 a 14/10/1991 e de 01/06/1993 a
28/04/1995.
2.4. Do benefício pleiteado
O labor especial desempenhado de 02/05/1991 a 14/06/1991, 01/08/1991 a 14/10/1991 e de
01/06/1993 a 28/04/1995 soma 2 anos, 2 meses e 25 dias e, quando multiplicado pelo fator de
conversão (1,4), resulta no montante de 3 anos, 1 meses e 17 dias de atividade comum,
acrescendo, aproximadamente, o período de 11 (onze) meses à contagem realizada pelo INSS
às fls. 109/113 do evento 02 (26 anos, 7 meses e 25 dias; 331 contribuições, a título de
carência - fls. 100/101 do evento 02).
Dessa forma, somando-se os períodos reconhecidos administrativamente e aqueles
reconhecidos judicialmente, tem-se que, na data de entrada do requerimento do benefício
identificado pelo número NB 42/192.827.576-9 (DER em 16/08/2019 - fls. 06 e 122 do evento
02), a parte autora contava com menos de 28 anos de contribuição comum, não fazendo,
portanto, jus à percepção do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de
contribuição, ainda que reafirmada a DER para a data desta sentença.
3. DO DISPOSITIVO
Ante todo o exposto, decreto a extinção, sem resolução do mérito, do pedido de
reconhecimento do tempo de contribuição nos períodos de 19/10/1992 a 30/03/1993, de
09/02/1999 a 31/08/2000, 01/08/2014 a 31/05/2015, 01/10/2015 a 31/10/2015 e 01/12/2015 a
30/09/2016, porquanto não vislumbro a necessidade de intervenção do Poder Judiciário, na
forma do disposto no artigo 485, VI, do CPC.
No mérito, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS formulados pela parte
autora, com resolução de mérito, para: i) reconhecer o caráter especial das atividades exercidas
no período de 02/05/1991 a 14/06/1991, 01/08/1991 a 14/10/1991 e de 01/06/1993 a
28/04/1995, nos termos do Anexo do Decreto nº 53.831/64 e Decretos nºs 357/91 e 611/92 c/c
Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração do Decreto nº 4.882/03; ii) condenar o
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) ao cumprimento de obrigação de fazer,
consistente na averbação, após o trânsito em julgado, dos períodos acima referidos no
Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS e em outros sistemas eletrônicos de controle
do tempo de serviço dos segurados da Previdência Social, tudo nos termos da fundamentação.
(...)”
17. Verifica-se, portanto, que a sentença recorrida analisou perfeitamente a lide, sendo
desnecessárias novas considerações além das já lançadas no citado provimento jurisdicional,
devendo, pois, ser mantida pelos próprios fundamentos, nos termos do art. 46, da Lei nº
9.099/95, aplicável aos Juizados Especiais Federais, por força do art. 1º, da Lei nº 10.259/01.
18. Ante o exposto:
• NÃO CONHEÇO do recurso do INSS.
• NEGO PROVIMENTO ao recurso da parte autora, mantendo a sentença por seus próprios
fundamentos, nos termos do art. 46, da Lei nº 9.099/95, aplicável aos Juizados Especiais
Federais, por força do art. 1º, da Lei nº 10.259/01.
19. Sem condenação em honorários, face ao disposto no artigo 55 da Lei nº 9.099/1995.
20. É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL NÃO COMPUTADO
ADMINISTRATIVAMENTE PELO INSS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DOS
PEDIDOS EXORDIAIS. RECURSO INTERPOSTO PELO INSS. ALEGAÇÕES RECURSAIS
GENÉRICAS DO INSS SEM, CONTUDO, DEMONSTRAR A NECESSÁRIA PERTINÊNCIA AO
CASO CONCRETO. RECURSO PELA PARTE AUTORA. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE
DEFESA ARGUIDA PELO AUTOR, EM FACE DO INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE
REALIZAÇÃO DE PERÍCIA TÉCNICA. TRABALHADOR RURAL. O DECRETO Nº 53.831/64,
NO SEU ITEM 2.2.1, CONSIDERA COMO INSALUBRE SOMENTE OS SERVIÇOS E
ATIVIDADES PROFISSIONAIS DESEMPENHADOS NA AGROPECUÁRIA, NÃO SE
ENQUADRANDO COMO TAL A ATIVIDADE LABORAL EXERCIDA APENAS NA LAVOURA.
PRECEDENTES. ATIVIDADE DE MOTORISTA. POSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO
PELA ATIVIDADE SOMENTE ATÉ A EDIÇÃO DA LEI 9.032/95. RECURSO DO INSS NÃO
CONHECIDO. RECURSO DA PARTE AUTORA IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA PELOS
PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Visto, relatado e discutido
este processo, em que são partes as acima indicadas, decide a Nona Turma Recursal do
Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por unanimidade,
negar provimento ao recurso da parte autora e não conhecer do recurso do INSS, nos termos
do voto da Juíza Federal Relatora. Participaram do julgamento os Excelentíssimos Juízes
Federais Marisa Regina Amoroso Quedinho Cassettari, Danilo Almasi Vieira Santos e Márcio
Rached Millani., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
