
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5058925-49.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANTONIO LUIZ LOPES
Advogados do(a) APELANTE: CARLOS ALBERTO PIAZZA - SP232476-N, EVELISE SIMONE DE MELO ANDREASSA - SP135328-N
APELADO: ANTONIO LUIZ LOPES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELADO: CARLOS ALBERTO PIAZZA - SP232476-N, EVELISE SIMONE DE MELO ANDREASSA - SP135328-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5058925-49.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANTONIO LUIZ LOPES
Advogados do(a) APELANTE: CARLOS ALBERTO PIAZZA - SP232476-N, EVELISE SIMONE DE MELO ANDREASSA - SP135328-N
APELADO: ANTONIO LUIZ LOPES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento, como especial, dos períodos de maio/1994 a março/2002 e de maio/2004 a abril/2019, bem como do reconhecimento do labor campesino exercido sem registro, nos períodos de janeiro/1978 a janeiro/1991.
O juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido formulado, apenas para reconhecer o labor campesino exercido entre janeiro/1978 a janeiro/1991.
Corrigido o erro material apontado acerca do nome da parte autora constante da parte dispositiva da sentença (Id. 272192879).
O INSS apela, pleiteando, preliminarmente, a necessidade da remessa oficial, bem como a extinção do feito sem resolução de mérito em relação ao pedido de reconhecimento dos períodos de 01/11/1990 a 21/12/1990 e de 17/01/1991 a 31/01/1991, alegando ausência de interesse processual, tendo em vista que os períodos de atividade rural requeridos já haviam sido reconhecidos administrativamente. No mérito, requer a reforma da sentença, argumentando a ausência de início de prova material de todo o período, devendo ser reconhecidos apenas os lapsos de 01/12/1981 a 11/08/1983 e 18/12/1989 a 13/10/1990.
A parte autora apela, requerendo a reforma parcial da sentença, para que seja reconhecido os períodos alegados de tempo especial, sustentando, em síntese, ter comprovado a insalubridade dos referidos períodos, com a consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5058925-49.2023.4.03.9999
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, esclareça-se não ser caso de se ter submetida a decisão de 1.º grau ao reexame necessário, considerando o disposto no art. 496, § 3.º, inciso I, do Código de Processo Civil, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 salários mínimos.
Por outro lado, assiste razão ao INSS ao apontar a ausência de interesse processual da parte autora em relação a alguns períodos em que se requer o reconhecimento do labor campesino exercido sem registro.
Extrato previdenciário acostado aos autos consignou o registro de vínculos empregatícios nos períodos de 19/01/1987 a 28/02/1987, 01/08/1989 a 30/11/1989, 01/11/1990 a 26/12/1990 e de 17/01/1991 a 05/05/1991.
Dessa forma, destaca-se a ausência do binômio utilidade e necessidade do pedido de reconhecimento dos períodos de 19/01/1987 a 28/02/1987, 01/08/1989 a 30/11/1989, 01/11/1990 a 26/12/1990 e de 17/01/1991 a 31/01/1991, de forma a demonstrar a carência de interesse processual da parte autora no pedido de reconhecimento desses períodos, pelo que de rigor o seu não conhecimento.
Tempestivos os recursos e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
O art. 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91, dispõe sobre a obrigatoriedade de início de prova documental para a comprovação de tempo de serviço, para fins previdenciários, sendo insuficiente a produção de prova exclusivamente testemunhal, a qual, por si só, não é válida à demonstração do desempenho do trabalho tido como realizado.
Especificamente a respeito do reconhecimento da atividade de natureza rural, a orientação de há muito conferida pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da imprestabilidade da prova exclusivamente testemunhal (verbete n.º 149 da Súmula da Jurisprudência do STJ) apresenta-se preservada, consoante se observa da ementa do acórdão tirado do julgamento do REsp 1.133.863/RN, sob a sistemática do art. 543-C do diploma processual de 1973 (3.ª Seção, relator Desembargador Convocado do TJ/SP Celso Limongi, DJe de 15.4.2011), reafirmando-se as premissas em questão, no pressuposto de que “prevalece o entendimento de que a prova exclusivamente testemunhal não basta, para o fim de obtenção de benefício previdenciário, à comprovação do trabalho rural, devendo ser acompanhada, necessariamente, de um início razoável de prova material (art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91 e Súmula 149 deste Superior Tribunal de Justiça)”.
A Corte Superior consolidou o entendimento de que, não obstante sua indispensabilidade, o fato de o início de prova material não abranger todo o lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por prova testemunhal idônea e consistente que lhe amplie a eficácia.
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. TEMA STJ 554. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ABRANGÊNCIA DE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. DESNECESSIDADE. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA PELA PROVA TESTEMUNHAL. POSSIBILIDADE. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.
(...)
3. O Recurso Especial combatia decisum da Corte a quo que considerou suficiente a prova material dos autos para atestar o exercício da atividade rural, em caso de aposentadoria por idade de trabalhador boia-fria.
4. O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial representativo da controvérsia, pacificou o assunto ora tratado nos seguintes termos: "Tema STJ 554 - Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal".
(...)
7. Ainda que assim não fosse, conforme jurisprudência do STJ, os
documentos trazidos aos autos pela autora, caracterizados como início de prova material, podem ser corroborados por prova testemunhal firme e coesa, e estender sua eficácia tanto para períodos anteriores como posteriores aos das provas apresentadas. Nesse sentido: REsp 1.348.633/SP, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014, acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC/1973; AgRg no REsp 1.435.797/PB, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 10/11/2016, AgInt no AREsp 673.604/PR, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 14/2/2017.
9. Agravo conhecido para conhecer parcialmente do Recurso Especial, apenas no tocante à citada violação do art. 1.022 do CPC/2015, e, nessa parte, não provido.
(AREsp 1550603/PR, Segunda Turma, Min. Herman Benjamin, DJe 11/10/2019)
Por fim, ainda sob o rito do referido art. 543-C do Código de Processo Civil, o Superior Tribunal de Justiça apreciou o REsp 1.348.633/SP, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima (DJe de 05/12/2014), pacificando a possibilidade de reconhecimento de trabalho rural desenvolvido anteriormente ao documento mais antigo apresentado como início de prova material, desse entendimento resultando a Súmula 577/STJ:
“É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório”.
Sob outro aspecto, com relação ao recolhimento de contribuições previdenciárias, mister a observância do previsto no art. 55, § 2.º, da Lei n.º 8.213/91, que preceitua: "O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o regulamento".
Desse dispositivo legal, depreende-se que a atividade rural desempenhada em data anterior a novembro de 1991 pode ser considerada para averbação do tempo de serviço, sem necessidade de recolhimento de contribuições previdenciárias, exceto para fins de carência.
A partir do advento da Lei n.º 8.213/91, cabe ao segurado especial o recolhimento de contribuições previdenciárias facultativas, se pretender o cômputo do tempo de serviço rural para fins de obtenção de outros benefícios que não os arrolados no inciso I do art. 39.
Nesse sentido, inclusive, a Súmula n.º 272 do Superior Tribunal de Justiça, que expressamente determina que o segurado especial somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço se recolher as contribuições facultativas.
Dessa forma, o reconhecimento de período posterior, sem contribuições previdenciárias facultativas, servirá somente para futura concessão de aposentadoria por idade ou por invalidez, auxílio-doença, auxílio-reclusão ou pensão, ficando vedado o aproveitamento para os demais fins previdenciários.
DO CASO DOS AUTOS
A controvérsia reside na possibilidade de enquadramento, como especial, dos períodos de maio/1994 a março/2002 e de maio/2004 a abril/2019, no reconhecimento de labor rural sem registro de janeiro/1978 a 18/01/1987, 01/03/1987 a 31/07/1989, 01/12/1989 a 31/10/1990 e de 27/12/1990 a 16/01/1991, com a consequente concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
O juízo a quo julgou antecipadamente o pedido, deixando de produzir a prova testemunhal do alegado labor campesino, baseando-se exclusivamente na prova documental trazida aos autos.
Conforme preleciona Arruda Alvim, em sua obra Manual de Direito Processual Civil, 5ª ed.: “O julgamento antecipado da lide marca-se pela desnecessidade ou irrelevância da audiência para produção de provas. Este entendimento vem claro na interpretação do novo § 2º do artigo 331 ao se referir à designação da audiência de instrução e julgamento se necessária. Esta expressão, parece-nos, diz com a necessidade de produção de provas em audiência de instrução e julgamento. Assim sendo, deve-se ter o julgamento antecipado da lide porque a questão de mérito se resume na aplicação da lei ao caso concreto, já definido pela ausência de qualquer controvérsia em torno dos fatos e, então, encontra aplicação a regra de que acerca do direito não se faz prova, por força da aplicação do princípio iura novit curia (...), ou, então, porque, apesar da existência de questões de fato que dependam de prova, essa prova não é oral e nem há prova pericial a ser realizada em audiência de instrução, por ser exclusivamente documental, por exemplo”.
O caráter alimentar dos benefícios previdenciários imprime ao processo em que são vindicados a necessidade de serem facultados todos os meios de prova, não só a documental, a fim de que a autora possa comprovar os fatos por ela alegados.
Para demonstrar suas alegações de efetivo exercício de labor rural sem registro, a parte autora juntou:
- certidão de nascimento de seu filho, nascido em 30/10/1990, qualificando o autor como lavrador;
- CTPS do autor com vínculos como trabalhador rural de 01/11/1990 a 21/12/1990 e de 17/01/1991 a 05/05/1991, já computados administrativamente;
- rescisão de contrato de trabalho junto à Fazenda Santa Benedita como trabalhador rural constando sua admissão em 01/12/1981 e demissão em 11/08/1983;
- rescisão de contrato de trabalho junto à Fazenda São Francisco como serviços gerais constando admissão em 06/10/1987 e demissão em 13/04/1989;
- rescisão de contrato de trabalho junto à Fazenda Santo Antônio como serviços diversos constando admissão em 01/08/1989 e demissão em 30/11/1989;
- rescisão de contrato de trabalho junto à Fazenda Califórnia como serviços gerais na lavoura constando admissão em 18/12/1989 e demissão em 13/10/1990;
Embora a documentação acostada seja suficiente para formar início de prova material, não o é para comprovar o efetivo labor campesino por todo o período que se pretende comprovar.
Isso porque a documentação carreada aos autos, por si só considerada, tão somente possui o condão de comprovar os períodos nela consignada. Assim, a ampliação da eficácia do início de prova material do alegado labor campesino, capaz de comprovar o reconhecimento de todo o período alegado, só é possível, segundo a jurisprudência dominante, por meio de robusta e coesa prova testemunhal.
Assim, havendo início de prova material, a ausência de produção de prova testemunhal, devidamente requerida e necessária para o fim declarado, acarreta violação ao princípio constitucional do contraditório e do devido processo legal, tornando nula a sentença, conforme se tem decidido nesta 8.ª Turma (ApCiv 5788360-66.2019.4.03.9999 - Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA – Julgado em 06/11/2019 - Intimação via sistema DATA: 08/11/2019).
Posto isso, acolho a questão preliminar suscitada pelo INSS para deixar de reconhecer os pedidos de reconhecimento de labor rural exercido sem registro nos interregnos de 19/01/1987 a 28/02/1987, 01/08/1989 a 30/11/1989, 01/11/1990 a 26/12/1990 e de 17/01/1991 a 05/05/1991 e, de ofício, anulo a sentença proferida, para retorno dos autos para produção de prova testemunhal do labor campesino alegado nos períodos de janeiro/1978 a 18/01/1987, 01/03/1987 a 31/07/1989, 01/12/1989 a 31/10/1990 e de 27/12/1990 a 16/01/1991, restando prejudicada a análise de mérito dos recursos interpostos, nos termos da fundamentação, supra.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. NÃO OPORTUNIZAÇÃO DA PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova testemunhal.
- Caracterizado o cerceamento de defesa ante a retirada da oportunidade de colheita de depoimentos das testemunhas, impõe-se de rigor a anulação da decisão 1.º grau e o retorno dos autos à vara de origem, para seu regular processamento.
