D.E. Publicado em 20/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações do INSS e da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007133-54.2007.4.03.6103/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação previdenciária proposta por Antenor Ferreira Camilo em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pelo qual almeja a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Foram juntados procuração e documentos às fls. 14/161.
Indeferida a antecipação dos efeitos da tutela (fl. 177).
Contestação do INSS às fls. 188/199, na qual sustenta não ter a parte autora preenchido os requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado, requerendo, ao final, a improcedência total do pedido.
Houve réplica (fls. 206/208).
Sentença às fls. 253/258, pela parcial procedência do pedido.
Apelação da parte autora às fls. 260/263, buscando a total procedência do pedido.
Apelação do INSS, em que aponta, preliminarmente, a existência de prescrição, decadência e coisa julgada. No mérito, insurge-se contra o reconhecimento de atividades desenvolvidas pelo autor sob condições especiais (fls. 266/274v).
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 25.01.1947, o reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 07.03.1975 a 12.07.1985, 10.10.1985 a 25.02.1988, 15.05.1990 a 03.07.1992 e 24.03.1993 a 05.05.1993, bem como a inclusão como tempo comum dos interregnos laborados entre 11.11.1970 a 14.02.1975, 06.05.1998 a 13.04.1999, 01.1998 a 31.03.1998 e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do segundo requerimento administrativo (D.E.R. 28.03.2002).
Da coisa julgada.
Inicialmente, afasto a preliminar de coisa julgada, uma vez que o objeto do presente processo diverge daquele apresentado nos autos do processo nº 2006.63.01.027510-8, julgado pelo Juizado Especial Federal da 3ª Região.
Nos termos da sentença de fls. 174/176, o pedido do autor foi julgado improcedente, uma vez que, reconhecidos todos os períodos de trabalho - comuns e especiais -, apontados em sua petição inicial, ainda assim não faria jus ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição na data do requerimento administrativo formulado em 09.03.2000. Por outro lado, na presenta ação, apesar de também se buscar o reconhecimento de períodos especiais e comuns, analisados apenas hipoteticamente pelo Juizado Especial Federal, o termo inicial do benefício pleiteado é apontado como sendo o de 28.03.2002, data do segundo requerimento administrativo.
Dos períodos de trabalho comuns.
Registre-se que as anotações constantes em carteira de trabalho constituem prova plena de exercício de atividade e, portanto, de tempo de serviço, para fins previdenciários. Há, ainda, previsão legal no sentido de ser a CTPS um dos documentos próprios para a comprovação, perante a Previdência Social, do exercício de atividade laborativa, conforme dispõe o art. 62, § 1º, inciso I, do Decreto nº 3.038, de 06 de maio de 1999 - Regulamento da Previdência Social -, na redação que lhe foi dada pelo Decreto nº 4.729, de 09 de junho de 2003.
Desse modo, o registro presente na CTPS não precisa de confirmação judicial, diante da presunção de veracidade juris tantum de que goza tal documento. Referida presunção somente cede lugar quando o documento não se apresenta formalmente em ordem ou quando o lançamento aposto gera dúvida fundada acerca do fato nele atestado.
Ocorre, todavia, que a simples ausência de informação nos registros do INSS não elide, a princípio, a veracidade dos vínculos empregatícios constantes na CTPS. Nesse sentido, o entendimento da Décima Turma desta Corte:
Assim, caberia ao Instituto-réu comprovar a falsidade das informações, por meio de prova robusta que demonstrasse a inexistência do vínculo empregatício anotado na Carteira de Trabalho. Tal prova não foi, contudo, produzida pela autarquia previdenciária.
Portanto, considerando que a presunção juris tantum de veracidade dos registros constantes em CTPS não foi, em nenhum momento, elidida pelo INSS, reconheço como efetivo tempo de contribuição o período de 11.11.1970 a 14.02.1975 (fl. 21), que deverá ser computado para a concessão do benefício de aposentadoria.
De outro modo, o período de 01.1998 a 31.03.1998 não deverá ser computado, tendo em vista não ter a parte autora se desincumbido do ônus probatório. O único documento constante nos autos em que é feita menção ao trabalho por ela realizado junto à COOPETRAVI não é apto sequer a constituir início de prova material, uma vez que apresenta como data de admissão o mês de maio de 1978 (fl. 78), ou seja, fora do intervalo em que pretende ver reconhecido o tempo de contribuição. Já em relação ao intervalo de 06.05.1998 a 13.04.1999, o documento apontado pode constituir início de prova do seu trabalho. Ocorre que o começo de prova carreado aos autos restou isolado, inexistindo outros elementos idôneos para a sua confirmação, motivo pelo qual impossível contabilizá-lo como tempo de contribuição.
Da atividade especial.
Para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial, pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da EC 20/98.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que "(...) A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...)". Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, tal dispositivo legal teve sua redação alterada, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação foi definida apenas com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV). Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal disposição somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual a apresentação de laudo técnico só pode ser exigida a partir dessa ultima data. Nesse sentido é o entendimento majoritário do E. STJ:
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030 (exceto para o agente nocivo ruído, por depender de prova técnica).
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à saúde. Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao C. Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do Código de Processo Civil (Recurso Especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, na forma que segue:
Dessa forma, deve-se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a nível de ruído superior a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, superior a 90 decibéis e, a partir de então, superior a 85 decibéis.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente porque a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica tende a propiciar condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas: i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
NO CASO DOS AUTOS, todos os períodos apontados na inicial são controversos, em razão de inexistir qualquer período reconhecido como especial quando dos requerimentos formulados na esfera administrativa.
Em relação ao período de 10.10.1985 a 25.02.1988, a parte autora esteve exposta a ruídos acima dos limites legalmente admitidos (fls. 35/36), devendo também ser reconhecida a natureza especial da atividade exercida nesse período, conforme código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, código 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99, neste ponto observado, ainda, o Decreto nº 4.882/03.
Por sua vez, o interregno de trabalho realizado entre 07.03.1975 a 12.07.1985, no ramo da indústria calçadista, deve ser reconhecido como de atividade especial, já que expostos ao agente químico hidrocarboneto (fl. 34), nos termos do código 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e código 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79.
Ainda, finalizando, também deve ser enquadrada como especial a atividade desenvolvida entre os períodos de 15.05.1990 a 03.07.1992 e 24.03.1993 a 05.05.1993, junto à "Granja Itambi Ltda", na função de abatedor de frangos (fl. 37), pela evidente exposição a agentes biológicos, nos moldes do código 1.3.1 do Decreto nº 53.831/64 e código 1.3.1 do Decreto nº 83.080/79.
Sendo assim, somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a parte autora 29 (vinte e nove) anos, 01 (um) mês e 18 (dezoito) dias de tempo de contribuição até a data do segundo requerimento administrativo (D.E.R. 28.03.2002), período este inferior ao necessário para a concessão do benefício pretendido.
Honorários advocatícios conforme fixados em sentença.
Diante do exposto, nego provimento às apelações do INSS e da parte autora, tudo na forma acima explicitada.
É como voto.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
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Nº de Série do Certificado: | 11DE180529616199 |
Data e Hora: | 11/12/2018 17:26:53 |