Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
5000913-44.2020.4.03.6120
Relator(a)
Juiz Federal ISADORA SEGALLA AFANASIEFF
Órgão Julgador
13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
18/10/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 25/10/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA DE
PARCIAL PROCEDÊNCIA. Recursos da parte autora e do INSS. Tempo especial laborado como
segurança após a edição da Lei 9.032/95. PPP que não indica efetiva situação de potencial
periculosidade em atividade de segurança de empresa privada. Situação que se amolda
parcialmente aos critérios previstos pelo Tema 1031/STJ. Especialidade não reconhecida. Dado
parcial provimento ao recurso do INSS. Negado provimento ao recurso da parte autora
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº5000913-44.2020.4.03.6120
RELATOR:37º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: AILTON JOSE DA COSTA
Advogados do(a) RECORRIDO: LIAMARA BARBUI TEIXEIRA DOS SANTOS - SP335116-N,
CARLOS AUGUSTO BIELLA - SP124496-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº5000913-44.2020.4.03.6120
RELATOR:37º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: AILTON JOSE DA COSTA
Advogados do(a) RECORRIDO: LIAMARA BARBUI TEIXEIRA DOS SANTOS - SP335116-N,
CARLOS AUGUSTO BIELLA - SP124496-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recursos interpostos pela parte autora e pelo INSS em face de sentença que julgou
parcialmente procedente o pedido para condenar o réu a averbar como tempo especial os
períodos de 06.09.1988 a 19.08.1991; de 20.08.1991 a 24.08.1994; de 01.11.1996 a
31.08.1998; de 10.05.2002 a 16.05.2002, bem como a conceder o benefício de aposentadoria
por tempo de contribuição desde a DER, em 29.07.2019.
A parte autora requer o reconhecimento de todo o tempo de serviço especial desenvolvido nos
períodos citados na inicial, com a concessão do benefício de aposentadoria especial,
reafirmando-se a DER para a data em que preencheu os requisitos. Caso Vossas Excelências
entendam que não está suficientemente comprovada a exposição do Recorrente aos agentes
nocivos, requer o retorno dos autos ao primeiro grau e a reabertura da instrução probatória, a
fim de que seja produzida prova pericial.
Por sua vez, oINSS requer, preliminarmente, o sobrestamento do feito até o julgamento do
Tema 1031/STJ. No mérito, alega não ser cabível enquadramento da profissão de vigilante e/ou
vigia como atividade especial, com base no subitem 2.5.7, quadro III, do Decreto n.º 53.831/64,
não bastando a mera CTPS. Aduz que deverá o autor comprovar, além da condição de
vigilante, que portava arma de fogo durante a sua jornada de trabalho. Pugna pela reforma da
sentença.
A parte autora apresentou contrarrazões.
É o breve relatório.
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº5000913-44.2020.4.03.6120
RELATOR:37º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: AILTON JOSE DA COSTA
Advogados do(a) RECORRIDO: LIAMARA BARBUI TEIXEIRA DOS SANTOS - SP335116-N,
CARLOS AUGUSTO BIELLA - SP124496-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, afasto o pedido de sobrestamento do feito, ante o julgamento da controvérsia
constante do Tema nº 1.031 pelo Superior Tribunal de Justiça.
Rejeito, ainda, o pedido de retorno dos autos à origem para produção de prova pericial, bem
como a alegação de cerceamento de defesa pelo indeferimento da prova pretendida.
A Lei n. 9.099/95, art. 33, e o CPC, art. 370, apontam para possibilidade de limitação de meios
de prova excessivos, impertinentes ou protelatórios.
No que toca à produção de prova sobre trabalho em condições nocivas à saúde, o art. 67, §3º,
do Decreto n. 3.048/99, “a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos
será feita mediante formulário emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo
técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de
segurança do trabalho”. O formulário em questão, por sua vez, está descrito nos §§8º a 10 do
mesmo artigo, os quais regulamentam a emissão do perfil profissiográfico previdenciário – PPP.
Esse é o meio de prova pertinente para tanto, ao qual o ordenamento jurídico atribui, como
regra, valor probatório suficiente para comprovar o exercício do trabalho em condições
especiais.
Eventualmente, pode haver prova técnica para a comprovação da exposição do segurado a
agentes nocivos em sua jornada de trabalho. Porém, a medida é excepcional, haja vista a
dificuldade que oferece à demonstração, de forma fidedigna, das condições de exercício de
atividade laboral em época pretérita. Jamais será obtida, por meio dessa prova pericial indireta,
a identidade das condições em que o labor do segurado efetivamente se dava à época, pelo
que seu valor probatório é diminuto, e seu deferimento, excepcional.
O tema foi objeto de pronunciamento da Turma Nacional de Uniformização:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. POSSIBILIDADE,
DESDE QUE PRESENTES DETERMINADOS REQUISITOS. QUESTÃO DE ORDEM N.
20/TNU. INCIDENTE PARCIALMENTE PROVIDO.
- Trata-se de incidente de uniformização movido pela parte autora em face de acórdão de
Turma Recursal de São Paulo, que manteve a sentença para deixar de reconhecer como
especiais os períodos em que houve perícia indireta (por similaridade). Pois bem.
- Quanto ao ponto controverso, a Turma de Origem assim consignou, in verbis: “(...) Importante
destacar que o laudo pericial realizado em empresas similares não deve ser admitido, uma vez
que não reflete as reais condições de trabalho em que a parte efetivamente exerceu suas
atividades, esmaecendo, pois, o caráter de certeza de que se espera da perícia técnica. Não se
trata de confiar ou não na habilidade do perito, mas da necessidade de se apurar, por
instrumentação técnica, o que nenhum outro elemento pode suprir, as reais condições de
trabalho por parte do autor. Acrescento que até mesmo a perícia realizada na própria empresa,
porém com maquinário ou disposição física (“layout”) alterados, deve ser analisada com
ressalvas, ou até mesmo desconsiderada. (...)”.
- Consoante já decidiu a TNU, a impossibilidade de o segurado requerer administrativamente
seu benefício munido de todos os documentos, em virtude da omissão de seu empregador
quanto à emissão dos competentes laudos técnico, não deve prejudicar a parte autora
(PEDILEF 200470510073501, Rel. Juiz Federal Derivaldo de Figueiredo Bezerra Filho, Dj
16/02/2009). Aliás, a jurisprudência da TNU aponta no sentido de que não pode o empregado
ser penalizado pelo não cumprimento de obrigação imposta ao empregador.
- Ora, em se tratando de empresa que teve suas atividades encerradas, a solução para a busca
da melhor resposta às condições de trabalho, com a presença ou não de agentes nocivos, é a
realização de perícia indireta (por similaridade) em estabelecimento e local de atividades
semelhantes àquele em que laborou originariamente o segurado, onde certamente estarão
presentes eventuais agentes nocivos.
- A perícia indireta ou por similaridade é um critério jurídico de aferição que se vale do
argumento da primazia da realidade, em que o julgador faz uma opção entre os aspectos
formais e fáticos da relação jurídica sub judice, para os fins da jurisdição.
- Porém, somente se as empresas nas quais a parte autora trabalhou estiverem inativas, sem
representante legal e não existirem laudos técnicos ou formulários poder-se-ia aceitar a perícia
por similaridade, como única forma de comprovar a insalubridade no local de trabalho. Tratar-
se-ia de laudo pericial comparativo entre as condições alegadas e as suportadas em outras
empresas, supostamente semelhantes, além da oitiva de testemunhas. No caso, contudo,
devem descrever: (i) serem similares, na mesma época, as características da empresa
paradigma e aquela onde o trabalho foi exercido, (ii) as condições insalubres existentes, (iii) os
agentes químicos aos quais a parte foi submetida, e (iv) a habitualidade e permanência dessas
condições.
- Com efeito, são inaceitáveis laudos genéricos, que não traduzam, com precisão, as reais
condições vividas pela parte em determinada época e não reportem a especificidade das
condições encontradas em cada uma das empresas. Ademais, valendo-se o expert de
informações fornecidas exclusivamente pela autora, por óbvio a validade das conclusões está
comprometida. Destarte, não há cerceamento do direito de defesa no indeferimento ou não
recebimento da perícia indireta nessas circunstâncias, sem comprovação cabal da similaridade
de circunstâncias à época.
- Oportuno destacar que será ônus do autor fornecer qualquer informação acerca das atividades
por ele executadas, das instalações das empresas, em qual setor trabalhou ou o agente
agressivo a que esteve exposto, ou seja, todos os parâmetros para a realização da prova
técnica.
- No mesmo sentido se posicionou esta Corte, por ocasião do julgamento do PEDILEF
0032746-93.2009.4.03.6301, de minha relatoria.
- Portanto, fixa-se a tese de que é possível a realização de perícia indireta (por similaridade) se
as empresas nas quais a parte autora trabalhou estiverem inativas, sem representante legal e
não existirem laudos técnicos ou formulários, ou quando a empresa tiver alterado
substancialmente as condições do ambiente de trabalho da época do vínculo laboral e não for
mais possível a elaboração de laudo técnico, observados os seguintes aspectos: (i) serem
similares, na mesma época, as características da empresa paradigma e aquela onde o trabalho
foi exercido, (ii) as condições insalubres existentes, (iii) os agentes químicos aos quais a parte
foi submetida, e (iv) a habitualidade e permanência dessas condições.
- Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO INCIDENTE, para determinar o retorno
dos autos à Turma de Origem, nos termos da Questão de Ordem n. 20/TNU, a fim de que se
avalie se a perícia por similaridade realizada atentou aos pressupostos acima descritos.
(Acórdão 00013233020104036318, Relator JUIZ FEDERAL FREDERICO AUGUSTO
LEOPOLDINO KOEHLER, j. 22/06/2017, DOU 12/09/2017 PÁG. 49/58, negritei).
O julgado enuncia os requisitos a serem observados para o deferimento desta espécie de
perícia.
O primeiro é a demonstração de necessidade desse meio de produção de prova. Deve ser
demonstrada documentalmente a inatividade da empresa em que teria laborado em condições
especiais e a ausência de representante legal que possa atestar as condições em que o
trabalho foi prestado, de forma a comprovar a impossibilidade de produção da prova
documental exigida pela legislação previdenciária para a demonstração do fato, quais sejam, os
formulários específicos e, quando for o caso, o laudo técnico.
Comprovado esse primeiro fato, cabe à parte autora, ainda, demonstrar a utilidade e pertinência
da produção de prova pericial por similaridade. Isso implica especificar, de forma clara e
concreta, o objeto da prova e os pontos controvertidos sobre os quais a perícia incidirá. Deve
haver demonstração ainda de possibilidade de que esse meio de prova ostente valor probatório
num processo judicial, ou seja, ser útil e pertinente.
A ausência de apresentação de elementos de convicção suficientes para demonstrar a
pertinência e oportunidade da produção da prova, como acima descrito, torna a prova pericial
um ato processual inútil, que não possuirá valor probatório suficiente para comprovar o fato
pretendido pela parte autora.
No caso em discussão, a prova técnica requerida pela parte autora não preenche os requisitos
em questão, razão pela qual não há que se falar em cerceamento de defesa a ensejar o retorno
dos autos à origem.
Observa-se que a parte foi instada pelo juízo a providenciar os formulários DSS8030 e PPP
(evento 06), não tendo, contudo, comprovado a recusa do empregador em fornecer-lhes a
documentação, conforme bem destacado na r. sentença.
Ora, o ônus de comprovar os fatos constitutivos de seu alegado direito é do autor, que não pode
transferi-lo ao Poder Judiciário por mera comodidade.
Desse modo, não há que se falar em reforma da decisão que indeferiu a realização de prova
pericial por cerceamento de defesa e consequentemente em nulidade da sentença.
Passo ao exame do mérito.
O § 7º do art. 201, da Constituição Federal, estabeleceu os requisitos para a concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição, dispondo:
§ 7º. É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei,
obedecidas as seguintes condições: I – trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta
anos de contribuição, se mulher; (...).
Por outro lado, tratando-se de pedido de concessão da aposentadoria por tempo de
contribuição em que o autor requer o reconhecimento de tempo de serviço especial e a
conversão em comum, necessário tecer considerações a respeito da aposentadoria especial.
A aposentadoria especial foi instituída pela Lei n.º 3.807/60, em seu art. 31, e exigia idade
mínima de 50 anos, com 15, 20 ou 25 anos de atividades perigosas, penosas ou insalubres.
Atualmente, há previsão nos arts. 201, §1° da Constituição Federal de 1988 e 15 da EC 20/98,
além dos art. 57 e 58 da Lei de Benefícios atual.
A regra prevista no art. 57 da Lei n° 8.213/91 prevê a concessão do benefício para quem, uma
vez cumprida a carência, comprovar ter trabalhado em serviço sujeito a agentes nocivos, que
prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco)
anos.
Trata-se de benefício decorrente do trabalho realizado em condições prejudiciais à saúde
(perfeito equilíbrio biológico do ser humano) ou à integridade física (preservação integral do
organismo, sem afetação prejudicial por ação exterior) do segurado, como nas atividades
penosas, perigosas ou insalubres, de acordo com a previsão da lei.
A aposentadoria especial é de natureza extraordinária, ou seja, uma espécie do gênero
aposentadoria por tempo de serviço/contribuição (da qual a aposentadoria do professor é uma
subespécie), pois o beneficiário, sujeito a condições agressivas, pode se aposentar com 15, 20
ou 25 anos de serviço.
Nas últimas décadas, foram introduzidas várias modificações quanto a este benefício. A Lei n.º
9.032/95 redefiniu o art. 57 da Lei n° 8.213/91: a) alterando o coeficiente do salário-de-
benefício, unificado em 100%; b) impondo a necessidade de prova das condições ambientais; c)
cometendo ao MPAS a atribuição de fixar os critérios de conversão; d) eliminando o cômputo do
tempo de serviço do dirigente sindical; e) vedando a volta ao trabalho do aposentado.
A Lei n° 9.528/97, desde a MP n° 1523/96: a) prescreveu a possibilidade de o Poder Executivo
relacionar os agentes nocivos; b) recriou o SB-40, sob o nome de DSS 8030; c) instituiu o laudo
técnico; d) exigiu referência à tecnologia diminuidora da nocividade; e) fixou multa para
empresa sem laudo técnico atualizado; f) instituiu o perfil profissiográfico e revogou a Lei n.º
8.641/93 (telefonistas).
Assim, a evolução legislativa gerou o seguinte quadro para se comprovar a atividade especial:
-Para o trabalho exercido até 28 de abril de 1995, véspera da publicação da Lei nº 9.032, de
1995, bastava o enquadramento da atividade especial de acordo com a categoria profissional a
que pertencia o trabalhador, segundo os agentes nocivos constantes nos róis dos Decretos nº
53.831/64 e 83.080/79;
- para períodos laborados entre 29 de abril de 1995, data da publicação da Lei nº 9.032, de
1995, a 13 de outubro de 1996, véspera da publicação da MP nº 1.523, de 1996, passou-se a
exigir a efetiva exposição aos agentes nocivos, por meio de formulário específico, nos termos
da regulamentação;
- Após a edição da MP n.º 1.523, de 11.10.1996, vigente em 14 de outubro de 1996, tornou-se
legitimamente exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes
nos formulários SB 40, DSS 8030 ou PPP.
Esclareça-se que o laudo técnico pode não estar presente nos autos, desde que haja menção
no formulário juntado, de que as informações nele constantes foram retiradas de laudos
devidamente elaborados, com menção aos seus responsáveis.
Esse é o panorama para todos os agentes agressivos, exceto para o ruído e calor, que sempre
estiveram sujeitos aos imprescindíveis laudos a amparar as conclusões dos formulários.
Para a demonstração da exposição aos agentes agressivos ruído e calor, sempre foi exigida a
apresentação de laudo técnico, conforme o Decreto nº 72.771/73 e a Portaria nº 3.214/78,
respectivamente, independentemente do período em que o trabalho foi efetivamente exercido,
pois só a medição técnica possui condições de aferir a intensidade da referida exposição,
consoante a jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça (AgRg no REsp
941.885/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 19/06/2008, DJe
04/08/2008; AgRg no REsp 877.972/SP, Rel. Ministro HAROLDO RODRIGUES
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE), SEXTA TURMA, julgado em 03/08/2010, DJe
30/08/2010).
LEGISLAÇÃO APLICÁVEL NO TEMPO
Feito o histórico da legislação, consigne-se que é a lei vigente durante a prestação da atividade
que irá reger o seu enquadramento jurídico, conforme o parágrafo 1º do art. 70 do Decreto n°
3.048/99 que assim determina: “a caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob
condições especiais obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do
serviço”.
Assim, é juridicamente relevante assegurar à parte autora que o pedido de enquadramento de
sua atividade laborativa como atividade especial seja examinado de acordo com as normas
vigentes à época da prestação do seu serviço, em homenagem ao princípio da segurança
jurídica, um dos pilares do Estado de Direito.
É esse o entendimento jurisprudencial consolidado em recurso representativo de controvérsia,
julgado pelo Superior Tribunal de Justiça:
CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM. OBSERVÂNCIA DA LEI EM
VIGOR POR OCASIÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE. DECRETO N. 3.0481999, ARTIGO
70, §§ 1º E 2º. FATOR DE CONVERSÃO. EXTENSÃO DA REGRA AO TRABALHO
DESEMPENHADO EM QUALQUER ÉPOCA.
1. A teor do § 1º do art. 70 do Decreto n. 3.04899, a legislação em vigor na ocasião da
prestação do serviço regula a caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob
condições especiais. Ou seja, observa-se o regramento da época do trabalho para a prova da
exposição aos agentes agressivos à saúde: se pelo mero enquadramento da atividade nos
anexos dos Regulamentos da Previdência, se mediante as anotações de formulários do INSS
ou, ainda, pela existência de laudo assinado por médico do trabalho.
(REsp n. 1.151.363MG, Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 542011)
CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM
E o parágrafo 2º do mesmo art. 70 permite que se convole em comum o tempo de atividade
especial auferido a qualquer momento.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período.
(Incluído pelo Decreto nº 4.827, de 2003)
Outrossim, no julgamento do mesmo REsp n. 1.151.363MG, representativo de controvérsia, a
Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça confirmou o posicionamento de que continua
válida a conversão de tempo de especial para comum, mesmo após 1998. Segue ementa do
referido julgado:
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS 1998. MP N.
1.663-14, CONVERTIDA NA LEI N. 9.7111998 SEM REVOGAÇÃO DA REGRA DE
CONVERSÃO.
1. Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades
especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente
convertida na Lei 9.7111998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o
referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.2131991.
2. Precedentes do STF e do STJ.
(REsp n. 1.151.363MG, Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 542011)
O fator de conversão será o disposto nesta mesma regra.
TEMPO A CONVERTER
MULTIPLICADORES
MULHER (PARA 30)
HOMEM (PARA 35)
DE 15 ANOS
2,00
2,33
DE 20 ANOS
1,50
1,75
DE 25 ANOS
1,20
1,40
Nesse sentido, o Enunciado n. 55 da Turma Nacional de Uniformização:
“A conversão do tempo de atividade especial em comum deve ocorrer com aplicação do fator
multiplicativo em vigor na data da concessão da aposentadoria.”
Quanto à profissão de vigilante ou vigia, ainda que não prevista nos Decretos nº 53.831/64 e
83.080/79, passou a ser enquadrada como especial mediante equiparação com a atividade de
“guarda”, prevista no item 2.5.7 do Decreto nº 53.831/64, nos termos da Súmula nº 26 da Turma
Nacional de Uniformização (TNU):
A atividade de vigilante enquadra-se como especial, equiparando-se à de guarda, elencada no
item 2.5.7. do Anexo III do Decreto n. 53.831/64.
Essa equiparação, contudo, somente tem curso quando demonstrado que a atividade de
vigilante exercida pelo segurado continha o mesmo grau de periculosidade da atividade de
guarda, o que se faz, via de regra, mediante prova do porte de arma de fogo na jornada de
trabalho, ou mediante prova da existência de outras circunstâncias que demonstrem, de forma
efetiva, a nocividade da atividade, em face de sua potencial periculosidade.
Nesse sentido, precedente da TNU:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL SUSCITADO PELO
AUTOR. PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. VIGILANTE.
EQUIPARAÇÃO À ATIVIDADE DE GUARDA, NOS TERMOS DA SUMULA 26 DA TNU.
NECESSIDADE DE EFETIVA COMPROVAÇÃO DO PORTE DE ARMA DE FOGO TANTO
PARA O PERÍODO POSTERIOR QUANTO ANTERIOR À LEI N. 9.032, DE 28/04/1995.
JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA NESTA TNU. QUESTÃO DE ORDEM N.º 013/TNU.
INCIDENTE NÃO CONHECIDO.
(Pedilef 0500254-55.2017.4.05.8402, Relator CARMEN ELIZANGELA DIAS MOREIRA DE
RESENDE, j. 21/02/2019, data da publicação 22/03/2019.)
No mesmo sentido, precedente do STJ:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO EXERCIDO
EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. INCIDÊNCIA DA LEI VIGENTE NO MOMENTO DA
PRESTAÇÃO. DECRETOS 53.831/1964 E 83.080/1979. IMPOSSIBILIDADE DE
ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL. ATIVIDADE NÃO PREVISTA NA LEGISLAÇÃO.
NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA NOCIVIDADE DA ATIVIDADE. PROVAS
COLIGIDAS AOS AUTOS QUE ATESTAM NÃO ESTAR O TRABALHADOR SUBMETIDO À
ATIVIDADE NOCIVA OU PERIGOSA. AGRAVO INTERNO DO SEGURADO A QUE SE NEGA
PROVIMENTO.
1. Busca o autor o reconhecimento da especialidade da atividade desenvolvida como vigia, no
período de 26.7.1958 a 2.9.1977, em razão da periculosidade da atividade.
2. No período em exame, a comprovação da especialidade da atividade laboral encontrava-se
disciplinada pelos Decretos 53.831/1964 e 83.080/1979, que elencavam as categorias
profissionais sujeitas a condições nocivas de trabalho por presunção legal, fazendo jus à
contagem majorada do tempo de serviço.
3. Na hipótese dos autos, embora os Decretos Regulamentares vigentes no período em análise
não previssem a categoria profissional Vigia, o Decreto 53.831/1964, item 2.5.7, reconhecia a
especialidade da atividade realizada na condição de Guarda, Bombeiro e Investigador. Assim,
esta Corte pacificou a orientação de que até 28.4.1995 é possível o reconhecimento da
especialidade da profissão de Vigia ou Vigilante, por analogia, à função de Guarda, desde que
comprovada a periculosidade da atividade.
4. Ocorre que, no caso dos autos, as instâncias ordinárias são uníssonas em afirmar que os
documentos trazidos atestam que o autor não estava submetido à atividade perigosa, não
havendo qualquer documento que comprove a utilização de arma de fogo, que a atividade fosse
desenvolvida em empresa de vigilância ou segurança ou qualquer outra informação que
pudesse indicar a nocividade da atividade, o que afasta a possibilidade de reconhecimento da
especialidade do período.
5. Agravo Interno do Segurado a que se nega provimento.
(AIEDARESP 815198, Relator NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, j.
09/12/2019, DJE DATA:12/12/2019, negritei.)
Feitas essas considerações, conclui-se que, para o vigilante, até 28.04.1995, é possível o
reconhecimento da especialidade da atividade mediante demonstração, por documento idôneo,
de que exercia essa profissão sujeito à situação de potencial periculosidade.
Para período posterior, é igualmente necessária a comprovação de que o segurado exercia sua
atividade de vigilante com exposição habitual e permanente a situações potencialmente
perigosas, o que deve ser feito, a partir de então, mediante laudo técnico, lembrando-se que a
apresentação do PPP regularmente preenchido dispensa a apreciação do LTCAT.
Nesse sentido, trago à baila o Tema nº 1.031, oportunidade em que se fixou a seguinte tese:
“É admissível o reconhecimento da especialidade da atividade de Vigilante, com ou sem o uso
de arma de fogo, em data posterior à Lei 9.032/1995 e ao Decreto 2.172/1997, desde que haja
a comprovação da efetiva nocividade da atividade, por qualquer meio de prova até 5.3.1997,
momento em que se passa a exigir apresentação de laudo técnico ou elemento material
equivalente, para comprovar a permanente, não ocasional nem intermitente, exposição à
atividade nociva, que coloque em risco a integridade física do Segurado.”
Fixadas as premissas jurídicas, passo à apreciação dos períodos de atividade especial cuja
análise foi devolvida a esta Turma Recursal:
- períodos de 01.03.1980 a 12.01.1981; de 11.02.1981 a 22.01.1982; de 01.09.1982 a
13.12.1984; de 15.03.1985 a 29.10.1986; de 05.01.1988 a 05.04.1988; de 18.07.1988 a
02.09.1988; 15.09.1994 a 28.11.1994; e de 19.03.1999 a 08.11.1999: tempo comum
Não assiste razão ao recurso da parte autora.
Neste ponto, a sentença comporta confirmação pelos próprios fundamentos, na forma do art. 46
da Lei n. 9.099/95. Isso porque todas as questões de fato e de direito relevantes ao julgamento
da demanda foram corretamente apreciadas em primeiro grau de jurisdição.
Extrai-se da sentença o seguinte excerto, que destaco como razão de decidir:
“Períodos: de 01.03.1980 a 12.01.1981; de 11.02.1981 a 22.01.1982; de 01.09.1982 a
13.12.1984; de 05.01.1988 a 05.04.1988; de 18.07.1988 a 02.09.1988; 15.09.1994 a
28.11.1994; e de 19.03.1999 a 08.11.1999
Empresas: SB Confecções Esportivas Ltda; Confecções Elite Ltda; Confecções Emmes Ltda;
Central Citrus S/ Indpustria e Comércio; Baldan Implementos Agrícolas S/A; Agropecuária
Aquidaban S/A e Leão e Leão Ltda.
Setores: não informados.
Cargos/funções: serviços gerais, motorista, operador de furadeira
Agentes nocivos: não informados.
Atividades: não informadas.
Meios de prova: CTPSs (seq 01, fls. 25/27) e CNIS (seq 29).
Enquadramento legal: prejudicado.
Conclusão: o tempo de serviço nos períodos é comum, pois as funções exercidas até
28.04.1995 não permitiam o enquadramento por atividade profissional, tampouco foi
comprovada a exposição do segurado a qualquer agente nocivo à saúde. De fato, na CTPS
constam vínculos empregatícios no cargo de motorista, mas não há nos autos qualquer
elemento comprovando que os veículos utilizados pelo autor nestes períodos fossem ônibus ou
caminhão. O item 2.4.4 do Anexo do Decreto 53.831/1964 (“motoristas e ajudantes de
caminhão”) e o item 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/1979 (“motorista de ônibus e de
caminhões de cargas”) somente consideram como especial a atividade de motorista de ônibus
ou caminhão, o que não foi comprovado pelo demandante. Para a função de operador de
furadeira, da mesma forma, não restou demonstrada quais as atividades eram exercidas, que
permitisse o enquadramento por categoria profissional. Para as funções exercidas após
28.04.1995 não há comprovação de exposição a agente nocivo. Reitero que o demandante foi
intimado para providenciar a juntada de formulários comprovando o alegado exercício de
atividades em condições especiais (laudo técnico, SB-40, DSS-8030 e PPP). Entretanto, não
apresentou os documentos requeridos ou comprovou a negativa dos empregadores em
fornecê-los, pugnando somente pela realização de perícia judicial, a qual foi indeferida,
conforme fundamentado supra.
Períodos: de 15.03.1985 a 29.10.1986
Empresa: Departamento Autônomo de Água e Esgoto de Matão/Prefeitura Municipal de Matão
Setor: D.A.E.M.A.
Cargos/funções: distribuidor de avisos
Agentes nocivos informados: prejudicado
Atividades: “percorrer as ruas e avenidas da cidade visitando os imóveis para proceder a leitura
dos hidrômetros, em prédios residenciais e estabelecimentos comerciais; distribuir os talões de
tarifa de consumo de água do município; cuidar para que a qualidade dos trabalhos
desenvolvidos mantenham-se sempre dentro dos padrões definidos e determinados pela
Prefeitura, executar tarefas afins.”
Meios de prova: CTPS (seq. 1, fl. 26) e PPP (seq 23).
Enquadramento legal: prejudicado.
Conclusão: o tempo de serviço nos períodos é comum, pois não restou comprovada a efetiva
exposição do segurado aos agentes nocivos relacionados no PPP”.
A parte não logrou comprovou demonstrar exposição a fator de risco, elemento essencial para o
reconhecimento da natureza especial do labor desempenhado. Assim, rejeito o pedido da parte
autora quanto ao enquadramento dos períodos em tela como tempo especial.
- períodos de 06.09.1988 a 19.08.1991; de 20.08.1991 a 24.08.1994; de 10.05.2002 a
16.05.2002; de 01.04.2011 a 15.07.2016; e de 01.02.2017 a 29.07.2019: tempo comum: os
Perfis Profissiográfico Previdenciário dos eventos nº 11, 15, 17 e 21 consignam que o autor
exerceu a função de “vigia/vigilante” em empresas privadas zelando pela segurança das
pessoas e do patrimônio, pelo cumprimento da lei, fazendo ronda, prevenindo e combatendo
delitos, recepcionando as pessoas e controlando sua movimentação, fiscalizando entrada e
saída de pessoas, veículos, materiais e produtos, etc”.
Além da ausência de comprovação do uso de arma de fogo, não verifico, dentre as atividades
exercidas pelo autor, situações que colocassem em risco de potencial a sua integridade física,
já que a descrição das atividades exercidas pelo autor é vaga, não havendo qualquer sinal de
exposição à situação efetiva de perigo. Assim, não identifico, da profissiografia do autor,
potencial situação de periculosidade na atividade então desenvolvida.
É o caso, portanto, de acolhimento do recurso do INSS, deixando de enquadrar os períodos de
06.09.1988 a 19.08.1991; de 20.08.1991 a 24.08.1994; de 10.05.2002 a 16.05.2002; de
01.04.2011 a 15.07.2016; e de 01.02.2017 a 29.07.2019 como especial.
- período de 01.11.1996 a 31.08.1998: tempo especial
O Perfil Profissiográfico Previdenciário informa a utilização de arma de fogo, denotando o
caráter periculoso da atividade (anexo 13).
Por fim, considerada a reforma da sentença, com a determinação do cômputo dos períodos
acima mencionados como comuns, verifico que o autor deixa de ter tempo de contribuição para
fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição concedido, conforme cálculo
que segue:
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso da parte autora e dar parcial provimento
ao recurso do INSS, para julgar improcedente o pedido inicial, excluindo o enquadramento nos
interregnos de 06.09.1988 a 19.08.1991; de 20.08.1991 a 24.08.1994; de 10.05.2002 a
16.05.2002; de 01.04.2011 a 15.07.2016; e de 01.02.2017 a 29.07.2019 como especial. Revogo
o benefício concedido.
Sem honorários, ausentes contrarrazões pelo INSS.
Oficie-se à Equipe de Atendimento às Demandas Judiciais do INSS, a fim de que cumpra o
presente acórdão.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA DE
PARCIAL PROCEDÊNCIA. Recursos da parte autora e do INSS. Tempo especial laborado
como segurança após a edição da Lei 9.032/95. PPP que não indica efetiva situação de
potencial periculosidade em atividade de segurança de empresa privada. Situação que se
amolda parcialmente aos critérios previstos pelo Tema 1031/STJ. Especialidade não
reconhecida. Dado parcial provimento ao recurso do INSS. Negado provimento ao recurso da
parte autora ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Terceira Turma
Recursal do Juizado Especial Federal da 3ª Região - Seção Judiciária do Estado de São Paulo,
por unanimidade, negar provimento ao recurso da parte autora e dar parcial provimento ao
recurso do INSS, nos termos do voto da relatora Juíza Federal Isadora Segalla Afanasieff, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
