
| D.E. Publicado em 04/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, acolher a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0013015-31.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO:
Trata-se de ação previdenciária ajuizada em face do Instituto Nacional do Seguro Social-INSS, objetivando a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 139.952.104-4 - DIB 31/08/2006), mediante o reenquadramento do tempo de trabalho exercido pelo autor em atividade rural como especial, para novo cálculo do benefício e a majoração de sua RMI.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a atividade especial nos períodos de 01/03/1980 a 03/05/1986 como trabalhador rural, de 24/06/1986 a 31/12/1993, como trabalhador rural e de 24/06/1986 a 31/12/2005, pelo agente nocivo ruído, determinando a revisão da aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal, incidindo juros de mora e correção monetária sobre as parcelas vencidas. Condenou ainda ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$880,00.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Irresignado, o INSS interpôs apelação, requerendo, preliminarmente, o reconhecimento do reexame necessário e, no mérito, alega que o trabalhador rural era amparado pelo PRORURAL, o qual não previa a concessão da aposentadoria especial, nem a conversão de qualquer tempo de serviço e, portanto, durante o período em que era possível o reenquadramento de atividade especial por enquadramento profissional, o trabalho rural era expressamente excluído dessa possibilidade. Não sendo possível o reconhecimento da atividade agropecuária como especial apenas pelo enquadramento contido no Decreto nº 53.831/64. Ademais, alega que ao agente ruído sempre foi necessário laudo técnico contemporâneo para comprovar a exposição ao elemento nocivo ruído, observada a utilização de EPI. Requer assim o reconhecimento do recurso e a reforma da sentença com a improcedência do pedido. Por fim, pugna pelo prequestionamento da matéria.
Com as contrarrazões do autor, subiram os autos a esta E. Corte.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO:
Inicialmente, conforme se verifica, a sentença monocrática deixou de submeter o julgado ao reexame necessário, nos termos do disposto no art. 475, inc. I do CPC/1973.
Na espécie, aplicável a disposição sobre o reexame necessário, considerados o valor do benefício e o lapso temporal de sua implantação, excedendo a 60 salários mínimos (art. 475, § 2º, CPC/1973). Assim, na forma das disposições supracitadas, acolho a preliminar arguida pelo INSS e dou o recurso por interposto, determinando que se proceda às anotações necessárias.
Passo ao exame do mérito.
Da análise dos autos, verifica-se que o INSS concedeu ao autor o benefício de aposentadoria por idade a partir de 01/07/2008.
Ocorre que a parte autora afirma na inicial que o INSS não reconheceu a atividade especial ao trabalho rural exercido pelo autor nos períodos de: 17/04/1972 a 15/04/1974; 18/04/1978 a 10/09/1978; 18/09/1978 a 06/08/1979; 01/03/1980 a 03/05/1986; 24/06/1986 a 31/12/2005 e 24/06/1986 a 30/08/2006, para o acréscimo ao tempo de contribuição e sua RMI.
In casu, cumpre salientar que a aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60 e o critério de especificação da categoria profissional se deu com base na penosidade, insalubridade ou periculosidade, definidas por Decreto do Poder Executivo, foi mantido até a edição da Lei nº 8.213/91, ou seja, as atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo seriam consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico, bastando, assim, a anotação da função em CTPS ou a elaboração do então denominado informativo SB-40.
Foram baixados pelo Poder Executivo os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, relacionando os serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
Embora o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 tenha limitado a aposentadoria especial às atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, o critério anterior continuou ainda prevalecendo.
De notar que, da edição da Lei nº 3.807/60 até a última CLPS, que antecedeu à Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço especial foi sempre definido com base nas atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo como penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico.
A própria Lei nº 8.213/91, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo 152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da legislação em vigor para aposentadoria especial.
Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e Anexo IV), mas por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
Destaque-se que o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, deixou de fazer alusão a serviços considerados perigosos, insalubres ou penosos, passando a mencionar apenas atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, sendo que o artigo 58 do mesmo diploma legal, também em sua redação original, estabelecia que a relação dessas atividades seria objeto de lei específica.
A redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 9.032/95 sem que até então tivesse sido editada lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, não havendo dúvidas até então que continuavam em vigor os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. Nesse sentido, confira-se a jurisprudência: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
É de se ressaltar, quanto ao nível de ruído, que a jurisprudência já reconheceu que o Decreto nº 53.831/64 e o Decreto nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, ou seja, não houve revogação daquela legislação por esta, de forma que, constatando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado (STJ - REsp. n. 412351/RS; 5ª Turma; Rel. Min. Laurita Vaz; julgado em 21.10.2003; DJ 17.11.2003; pág. 355).
O Decreto nº 2.172/97, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 dB(A) como prejudicial à saúde.
Por tais razões, até ser editado o Decreto nº 2.172/97, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB(A) como agente nocivo à saúde.
Todavia, com o Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível voltou a ser de 85 dB(A) (art. 2º do Decreto nº 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Houve, assim, um abrandamento da norma até então vigente, a qual considerava como agente agressivo à saúde a exposição acima de 90 dB(A), razão pela qual vinha adotando o entendimento segundo o qual o nível de ruídos superior a 85 dB(A) a partir de 05/03/1997 caracterizava a atividade como especial.
Ocorre que o C. STJ, no julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do artigo 543-C do CPC, decidiu não ser possível a aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, de modo que no período de 06/03/1997 a 18/11/2003, em consideração ao princípio tempus regit actum, a atividade somente será considerada especial quando o ruído for superior a 90 dB(A).
Nesse sentido, segue a ementa do referido julgado:
"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. |
Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC |
1. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC. |
2. O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ. Caso concreto |
3. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço decorrente da supressão do acréscimo da especialidade do período controvertido não prejudica a concessão da aposentadoria integral. |
4. Recurso Especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008." |
(STJ, REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 05/12/2014) |
Destaco, ainda, que o uso de equipamento de proteção individual não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Nesse sentido, precedentes desta E. Corte (AC nº 2000.03.99.031362-0/SP; 1ª Turma; Rel. Des. Fed. André Nekatschalow; v.u; J. 19.08.2002; DJU 18.11) e do Colendo Superior Tribunal de Justiça: REsp 584.859/ES, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 18/08/2005, DJ 05/09/2005 p. 458).
Quanto ao reconhecimento da natureza insalubre dos períodos de atividade rural desenvolvidos pelo autor entre 01/03/1980 a 03/05/1986 como trabalhador rural em agropecuária; de 24/06/1986 a 31/12/2005, como rurícola em agricultura e pecuária, sobre esta questão deve ficar esclarecido que a Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social, que instituiu a aposentadoria especial, assim dispôs em seu artigo 3º, in verbis:
"Artigo 3º: São excluídos do regime desta lei: |
(...) |
II - os trabalhadores rurais assim entendidos os que cultivam a terra e os empregados domésticos." |
Cabe esclarecer, que a atividade rural considerada insalubre com previsão no Decreto nº 53.831/64, Anexo III, item 2.2.1 diz respeito somente às atividades exercidas em agropecuária, não abrangendo o trabalho rural exercido em agricultura.
Nesse sentido, observo que o período de 01/03/1980 a 03/05/1986 o autor exerceu a atividade de trabalhador rural em estabelecimento de agropecuária, corroborado pela cópia da CTPS, cuja atividade a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento no sentido de que o exercício de atividade na agropecuária esta enquadra no item 2.2.1, do Decreto nº 53.831/64, fazendo jus ao reconhecimento da atividade especial, conforme determinado na sentença.
Ademais, ressalte-se, que para o trabalho exercido até o advento da Lei nº 9.032/95, bastava o enquadramento da atividade especial de acordo com a categoria profissional a que pertencia o trabalhador, segundo os agentes nocivos constantes nos róis dos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79, cuja relação é considerada como meramente exemplificativa.
Com a promulgação da Lei nº 9.032/95 passou-se a exigir a efetiva exposição aos agentes nocivos, para fins de reconhecimento da agressividade da função, através de formulário específico, nos termos da lei.
Desse modo, a partir de 28/04/ 1995, torna-se imperativo à parte autora a comprovação de que esteve exposta de forma habitual e permanente a agentes nocivos através de formulários SB-40/DSS- 8030, Perfil Profissiográfico Previdenciário ou laudo técnico.
Ao período de 24/06/1986 a 31/12/2005, período em que o autor laborou na atividade de rurícola/empreiteiro em estabelecimento agrícola e pecuária, restou reconhecida a atividade especial no período de 24/06/1986 a 28/04/1995 pelo enquadramento profissional no item 2.2.1, do Decreto nº 53.831/64, conforme já esclarecido anteriormente. Bem como, restou demonstrada a atividade especial no período de 24/06/1986 a 31/12/2005, visto que o PPP apresentado (fls. 33) demonstrou a exposição do autor ao agente agressivo ruído de 96 dB(A), de forma habitual e permanente, estando enquadrado como atividade especial pelos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79, que estabelecia o limite de 80 dB(A), o Decreto nº 2.172/98 que estabelecia o limite de 90 dB(A) e o Decreto nº 4.882/2003 que estabelecia o limite de 85 dB(A), vigentes no período citado.
Desse modo, mantenho o reconhecimento da atividade especial nos períodos reconhecidos na sentença, de 01/03/1980 a 03/05/1986 e de 24/06/1986 a 31/12/2005, devendo ser convertido em atividade comum, com o acréscimo ao PBC para nova RMI a contar da data do requerimento administrativo (31/08/2006), respeitada a prescrição quinquenal.
Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947.
Anote-se, na espécie, a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos à parte autora após o termo inicial assinalado à benesse outorgada, ao mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por Lei.
Ante o exposto, ACOLHO a preliminar arguida pelo INSS, para determinar o reexame necessário do julgado e, no mérito, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS e dou parcial provimento à remessa oficial, para esclarecer os critérios de aplicação dos juros de mora e correção monetária, nos termos da fundamentação.
É o voto.
TORU YAMAMOTO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 27/11/2018 18:12:51 |
