Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2242233 / SP
0001832-02.2015.4.03.6183
Relator(a)
JUIZA CONVOCADA LEILA PAIVA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/04/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/05/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO
RURAL. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
HONORÁRIOS.
- Recebida a apelação interposta pelo INSS, já que manejada tempestivamente, conforme
certificado nos autos, e com observância da regularidade formal, nos termos do Código de
Processo Civil/2015.
- A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da
comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30 anos, se mulher, além do cumprimento da
carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O
art. 4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser
considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da
previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
- Nos termos do artigo 55, §§2º e 3º, da Lei 8.213/1991, é desnecessário a comprovação do
recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no
período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço
rural, no entanto, tal período não será computado para efeito de carência (TRF3ª Região,
2009.61.05.005277-2/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
2007.61.26.001346-4/SP, Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.83.007818-2/SP. Des. Fed. Toru Yamamoto. DJ 09/04/2018; EDcl no AgRg no REsp
1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em
27/10/2015, DJe 05/11/2015; AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015,
DJe 04/12/2015).
- Foi garantida ao segurado especial a possibilidade do reconhecimento do tempo de serviço
rural, mesmo ausente recolhimento das contribuições, para o fim de obtenção de aposentadoria
por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1
(um) salário mínimo, e de auxílio-acidente. No entanto, com relação ao período posterior à
vigência da Lei 8.213/91, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural para fins de
aposentadoria por tempo de contribuição, cabe ao segurado especial comprovar o recolhimento
das contribuições previdenciárias, como contribuinte facultativo.
- Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem
admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº
8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo, podendo ser admitido início de prova
material sobre parte do lapso temporal pretendido, bem como tempo de serviço rural anterior à
prova documental, desde que complementado por idônea e robusta prova testemunhal. Nesse
passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão
para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a
sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar.
Precedentes.
- No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o
próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do
menor. Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não
possua idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do
direito de ver reconhecido o exercício da atividade rural para fins do benefício previdenciário,
especialmente se considerarmos a dura realidade das lides do campo que obrigada ao trabalho
em tenra idade (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE
906.259, Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).
- No caso, a prova dos autor autoriza o reconhecimento da atividade exercida como trabalhador
rural pelo autor, em regime de economia familiar, no período de 06/08/1971 a 08/071980 (08
anos, 11 meses e 09 dias), independentemente do recolhimento de contribuições
previdenciárias, não podendo tal período ser computado para efeito de carência, nos termos do
art. 55, §2º, da Lei 8.213/1991.
- Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180
contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem
a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos,
conforme dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir
que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido
trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou
integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação
contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para
fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em
regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o
labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao
agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as
condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de
proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
- Presume-se que as informações constantes do PPP são verdadeiras, não sendo razoável nem
proporcional prejudicar o trabalhador por eventual irregularidade formal de referido formulário,
seja porque ele não é responsável pela elaboração do documento, seja porque cabe ao Poder
Público fiscalizar a elaboração do PPP pelas empresas.
- Apresentando o segurado um PPP que indique sua exposição a um agente nocivo, e
inexistindo prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era efetivamente capaz
de neutralizar a nocividade do ambiente laborativo, a configurar uma dúvida razoável no
particular, deve-se reconhecer o labor como especial.
- Constando da perícia que o segurado ficava exposto a agente nocivo, seja pela simples
presença do agente no ambiente , ou porque estava acima do limite de tolerância, deve-se
concluir que tal exposição era, nos termos do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência
Social, habitual, não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da
prestação do serviço.
- A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações. Considerando tal
evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido
como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -,
reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997);
superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
- No tocante à conversão do tempo de serviço comum em especial, deve se aplicar a legislação
vigente no momento do respectivo requerimento administrativo - "tempus regit actum" -, nos
termos da decisão proferida pelo C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia
repetitiva (art. 543-C, do CPC/73: "A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao
direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime
jurídico à época da prestação do serviço" (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).no
particular, o princípio tempus regit actum. Dessa forma, o pedido de conversão do tempo de
trabalho comum em especial, não pode ser provido.
- O período de 06/08/1971 a 08/07/1980, doravante reconhecido como trabalho rural, foi
desempenhado na lavoura de milho, feijão e mandioca conforme declaração do autor e
testemunhas. Como é sabido, em regra, a atividade rural exercida na lavoura não justifica o
enquadramento na categoria profissional prevista no item 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64, o qual
prevê a especialidade das atividades desempenhadas pelos trabalhadores na agropecuária , ou
seja, pelos prestadores de serviço da agricultura e da pecuária, de forma simultânea. E não há
que se falar que o autor trabalhou exposto a calor em nível superior a 28ºC, pois, tal agente
nocivo, por ser decorrente de fonte natural, na época, não justifica a contagem especial para
fins previdenciários.Assim, o período de 06/08/1971 a 08/07/1980 deve ser considerado como
tempo de serviço comum, nos termos da sentença.
- O período de 07/06/1989 a 08/05/1990, por sua vez, foi desempenhado, no setor de
estamparia, na função de prensista. Com efeito, até 28.04.1995, o enquadramento como
atividade especial poderia ser feito com base na categoria profissional, não havendo
necessidade de produzir provas da exposição ao agente nocivo, havendo uma presunção da
nocividade. E segundo o PPP juntado, suas atividades consistiam em: "Dobram chapas e
barras metálicas. Curvam tubos, chapas e barras de metais. Conformam peças de metais por
prensagem hidráulica e excêntrica. Cortam chapas de metais. Controlam a qualidade de
chapas, barras e tubos de metais. Realizam manutenção de máquinas e matrizes." Verifica-se,
assim, que a atividade em comento, referente ao período de 07/06/1989 a 08/05/1990, se
enquadra no item 2.5.2 do Decreto 83.080/1979 (FERRARIAS, ESTAMPARIAS DE METAL À
QUENTE E CALDEIRARIA.), devendo ser considerada especial, conforme reconheceu a
sentença.
- No tocante ao período de 25/01/2005 a 20/02/2006, com razão a r.sentença, eis que, de
acordo com o PPP juntado, o autor trabalhou na função de prensista, exposto a ruído de 92 dB,
portanto, acima do limite máximo de tolerância (acima de 90 dB até 19/11/2003 e acima de 85
dB, a partir desta data).
- Da mesma forma, deve ser considerada a natureza especial da atividade de prensista
desempenhada no período de 06/03/1997 a 03/12/2002, eis que trabalhou exposto a ruído de
86 dB, portanto, acima do limite máximo de tolerância (acima de 85 dB), conforme comprovou o
PPP juntado.
- Em resumo, deve se reconhecida a natureza especial das atividades desempenhadas nos
períodos de 07/06/1989 a 08/05/1990, 06/03/1997 a 03/12/2002 e de 25/01/2005 a 20/02/2006
(07anos, 08 meses e 29 dias), devendo o INSS proceder a devida adequação nos registros
previdenciários competentes, e convertê-los em tempo comum, pelo fator 1,40.
- O autor requer a concessão de aposentadoria especial ou, subsidiariamente, aposentadoria
por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo ou desde quando os
requisitos restaram preenchidos, conforme constou da inicial. Observa-se que o INSS
reconheceu, administrativamente, como especial, os períodos de 18/08/1980 a 29/01/1981 e
03/07/1995 a 05/03/1997 (02 anos, 01 mês e 15 dias), os quais somados aos períodos
especiais doravante reconhecidos (07/06/1989 a 08/05/1990, 06/03/1997 a 03/12/2002 e de
25/01/2005 a 20/02/2006) resultam no tempo de serviço de 09 anos, 10 meses e 14 dias,
insuficientes, portanto, para a concessão do benefício de aposentadoria especial.
- Consta, também, que até 22/03/2013, o INSS reconheceu o tempo total de 19 anos, 08 meses
e 05 dias, nele consideradas as atividades especiais de 18/08/1980 a 29/01/1981 e 03/07/1995
a 05/03/1997, e não considerado o tempo prestado para o "Estado de São Paulo (15/03/2006
em diante - último pagamento 12/2016, segundo CNIS atual). Assim, somando-se o tempo de
trabalhou rural sem registro (08 anos, 11 meses e 09 dias), o tempo incontroverso (19 anos, 08
meses e 05 dias), o tempo prestado para o "Estado de São Paulo" (15/03/2006 a
22/03/2013/DER - total de 07 anos e 09 dias), e o acréscimo pela conversão do tempo especial
reconhecido judicialmente em tempo comum (03 anos, 01 mês e 05 dias), excluído o período
concomitante (07/10/2008 a 10/02/2009 - total de 04 meses e 06 dias), verifica-se um tempo
total de 38 anos, 04 meses e 22 dias, suficientes, portanto para a concessão do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo.
- Vencido o INSS na maior parte, a ele incumbe o pagamento das verbas de sucumbência,
respeitadas as isenções legais. Fixa-se os honorários advocatícios em 12% do valor das
prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ), já considerados os
honorários recursais previstos no art. 85, § 11, do CPC/2015, valor que considero adequado,
face a moderada dificuldade da questão e tema relativamente repetitivo.
- Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária aplicam-se, (1) até a entrada em vigor
da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, (2) na vigência da
Lei nº 11.960/2009, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios
estabelecidos pelo Egrégio STF, no julgamento do RE nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017,
na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam, (2.1) os juros moratórios serão calculados
segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo
1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e (2.2) a correção
monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E..
- Apelação do INSS desprovida. Apelação do autor parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao
recurso interposto pelo INSS, e dar parcial provimento ao recurso interposto pelo autor, para lhe
conceder o beneficio de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do
requerimento administrativo, com juros e correção monetária, condenando o INSS nas verbas
de sucumbência, mantendo, no mais, a r.sentença, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Referência Legislativa
LEG-FED EMC-20 ANO-1998 ART-4***** LBPS-91 LEI DE BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA
SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-25 INC-2 ART-55 PAR-2 PAR-3 ART-106 PAR-ÚNICO
ART-142 ART-57***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-543CLEG-FED DEC-53831 ANO-1964 ITE-2.2.1*****
RBPS-79 REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979 ITE-2.5.2***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA
LEG-FED SUM-111***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-85 PAR-11LEG-FED LEI-11960 ANO-2009LEG-FED LEI-
9494 ANO-1997 ART-1F
Veja
STF RE 870.947/SEREPERCUSSÃO GERALTEMA 810;
STJ RESP 1.310.034/PRREPETITIVOTEMA 546.
Precedentes
PROC: 2007.61.26.001346-4/SP ÓRGÃO: SÉTIMA TURMA JUIZ: DESEMBARGADOR
FEDERAL CARLOS DELGADO AUD: 09/04/2018
DATA: 16/04/2018 PROC: APCIV 2007.61.83.007818-2/SP ÓRGÃO: SÉTIMA TURMA JUIZ:
DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO AUD: 23/04/2018
DATA: 08/05/2018