Processo
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2046919 / SP
0008750-20.2015.4.03.9999
Relator(a)
JUIZA CONVOCADA LEILA PAIVA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/04/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/05/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO
RURAL. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. BENEFÍCIO INDEFERIDO.
SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
- A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da
comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30 anos, se mulher, além do cumprimento da
carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O
art. 4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser
considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da
previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
- Nos termos do artigo 55, §§2º e 3º, da Lei 8.213/1991, é desnecessário a comprovação do
recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no
período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço
rural, no entanto, tal período não será computado para efeito de carência (TRF3ª Região,
2009.61.05.005277-2/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.26.001346-4/SP, Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.83.007818-2/SP. Des. Fed. Toru Yamamoto. DJ 09/04/2018; EDcl no AgRg no REsp
1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
27/10/2015, DJe 05/11/2015; AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015,
DJe 04/12/2015).
- Foi garantida ao segurado especial a possibilidade do reconhecimento do tempo de serviço
rural, mesmo ausente recolhimento das contribuições, para o fim de obtenção de aposentadoria
por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1
(um) salário mínimo, e de auxílio-acidente. No entanto, com relação ao período posterior à
vigência da Lei 8.213/91, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural para fins de
aposentadoria por tempo de contribuição, cabe ao segurado especial comprovar o recolhimento
das contribuições previdenciárias, como contribuinte facultativo.
- Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem
admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº
8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo, podendo ser admitido início de prova
material sobre parte do lapso temporal pretendido, bem como tempo de serviço rural anterior à
prova documental, desde que complementado por idônea e robusta prova testemunhal. Nesse
passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão
para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a
sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar.
Precedentes.
- No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o
próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do
menor. Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não
possua idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do
direito de ver reconhecido o exercício da atividade rural para fins do benefício previdenciário,
especialmente se considerarmos a dura realidade das lides do campo que obrigada ao trabalho
em tenra idade (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE
906.259, Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).
- Para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, não é possível reconhecer a atividade
rural sem registro, após o advento da Lei 8.213/1991 (24/07/1991), se não houver a
comprovação de recolhimento de contribuições previdenciárias, como é o caso em relação ao
período de 17.09.2002 a 30.04.2005, que não pode ser reconhecido. Assim, neste caso, o
período posterior a 24/07/1991 não pode ser considerado e fica, desde já, afastado.
- Embora as testemunhas arroladas tenham afirmado que o autor trabalhava na roça desde
criança, não souberam mencionar detalhes da atividade. Ademais, não há quaisquer
documentos comprobatórios do período anterior ao certificado de dispensa de incorporação
(com alistamento no ano de 1973), em nome próprio ou em nome de seus familiares, capazes
de comprovar a atividade rural de sua família, e assim presumir que o autor trabalhava em
regime de economia familiar. Dessa forma, reconhecida a atividade rural, sem registro,
desenvolvida pelo autor, no período de 01.01.1973 a 19.05.1973, independentemente do
recolhimento de contribuições previdenciárias, não podendo tal período ser computado para
efeito de carência, nos termos do art. 55, §2º, da Lei 8.213/1991.
- Para os períodos não reconhecidos, de 24.03.1969 a 31.12.1972 e 17.09.2002 a 30.04.2005,
considerando que o conjunto probatório foi insuficiente à comprovação da atividade rural, seria
o caso de se julgar improcedente a ação, uma vez que parte autora não se desincumbiu do
ônus probatório que lhe cabia, ex vi do art. 333, I, do CPC/2015. Entretanto, adota-se o
entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de recursos
repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973, no sentido de que a ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de constituição e
desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito
propiciando ao autor intentar novamente a ação caso reúna os elementos necessários (REsp
1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL , julgado em
16/12/2015, DJe 28/04/2016).
- Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180
contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem
a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos,
conforme dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir
que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido
trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou
integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação
contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para
fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em
regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o
labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao
agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as
condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de
proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
- O laudo técnico não contemporâneo não invalida suas conclusões a respeito do
reconhecimento de tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial, primeiro,
porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da
tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas
pelo trabalhador à época da execução dos serviços.
- Presume-se que as informações constantes do PPP são verdadeiras, não sendo razoável nem
proporcional prejudicar o trabalhador por eventual irregularidade formal de referido formulário,
seja porque ele não é responsável pela elaboração do documento, seja porque cabe ao Poder
Público fiscalizar a elaboração do PPP pelas empresas.
- Apresentando o segurado um PPP que indique sua exposição a um agente nocivo, e
inexistindo prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era efetivamente capaz
de neutralizar a nocividade do ambiente laborativo, a configurar uma dúvida razoável no
particular, deve-se reconhecer o labor como especial.
- Constando da perícia que o segurado ficava exposto a agente nocivo, seja pela simples
presença do agente no ambiente, ou porque estava acima do limite de tolerância, deve-se
concluir que tal exposição era, nos termos do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência
Social, habitual, não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da
prestação do serviço.
- A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações. Considerando tal
evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido
como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -,
reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997);
superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
- No caso, restou comprovado pelos PPP's que nos períodos de 15.06.1976 a 20.04.1981,
04.02.1985 a 10.01.1986, 03.02.1987 a 15.01.1988 e 01.07.1988 a 22.02.1995, o autor exerceu
atividade de ajudante de fundição, tratorista e motorista de caminhão, que permitem seus
enquadramentos nos termos dos itens 2.4.4 e 2.5.2 do Decreto 53.861/1964 e itens 2.4.2 e
2.5.1 do Decreto 83.080/1979, devendo, portanto, serem consideradas especiais, conforme
reconheceu a sentença. Além do enquadramento em razão da profissão, os períodos também
devem ser enquadrados como especiais em razão da exposição ao agente ruído, em
patamares superiores a 80 dB (88,5 e 86 dB), nos termos dos itens 1.1.5 e 1.1.6 dos Decretos
53.831/64 e 83.080/79.
- Considerando o tempo de serviço rural doravante reconhecido, bem como os períodos de
atividades especiais e os demais períodos constantes do CNIS, CTPS e contribuições
individuais colacionados aos autos, até a data do ajuizamento da ação, conclui-se que o autor
não faz jus ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, eis que reunia apenas 33
anos, 1 mês e 15 dias de tempo de serviço.
- Diante do parcial provimento do recurso do autor, com o deferimento parcial do pedido de
reconhecimento de trabalho rural e em condições especiais e com o indeferimento do pedido de
aposentadoria, a hipótese dos autos é de sucumbência recíproca, motivo pelo qual as despesas
processuais devem ser proporcionalmente distribuídas entre as partes, na forma do artigo 21,
do CPC/1973, não havendo como se compensar as verbas honorárias, por se tratar de verbas
de titularidade dos advogados e não da parte. Por tais razões, com base no artigo 20 do
CPC/1973, condenada a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios aos patronos
do INSS, fixados em 10% do valor atualizado da causa, considerando que não se trata de
causa de grande complexidade, mas sim repetitiva, o que facilita o trabalho realizado pelo
advogado, diminuindo o tempo exigido para o seu serviço. Suspensa a sua execução, no
entanto, por ser a parte autora beneficiária da Justiça Gratuita (art. 19 do CPC/1973).
- Dado parcial provimento à apelação do autor.
- Extinto o processo sem resolução do mérito quanto aos períodos de não reconhecidos de
24.03.1969 a 31.12.1972 e 17.09.2002 a 30.04.2005.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL
PROVIMENTO à apelação do autor, para condenar o INSS a averbar o labor rural, sem registro,
exceto para fins de carência, desempenhado no período de 01.01.1973 a 19.05.1973 e especial
nos intervalos de 15.06.1976 a 20.04.1981, 04.02.1985 a 10.01.1986, 03.02.1987 a 15.01.1988
e 01.07.1988 a 22.02.1995 para os períodos não reconhecidos, de 24.03.1969 a 31.12.1972 e
17.09.2002 a 30.04.2005, julgar extinto o processo sem resolução do mérito, em conformidade
com o art. 267, IV, do CPC/1973, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
