Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2099371 / SP
0034724-59.2015.4.03.9999
Relator(a) para Acórdão
DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO
Relator(a)
DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
24/06/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/07/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO
RURAL. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. HONORÁRIOS.
- A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da
comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30 anos, se mulher, além do cumprimento da
carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O
art. 4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser
considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da
previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
- Nos termos do artigo 55, §§2º e 3º, da Lei 8.213/1991, é desnecessário a comprovação do
recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no
período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço
rural, no entanto, tal período não será computado para efeito de carência (TRF3ª Região,
2009.61.05.005277-2/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
2007.61.26.001346-4/SP, Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.83.007818-2/SP. Des. Fed. Toru Yamamoto. DJ 09/04/2018; EDcl no AgRg no REsp
1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em
27/10/2015, DJe 05/11/2015; AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015,
DJe 04/12/2015).
- Foi garantida ao segurado especial a possibilidade do reconhecimento do tempo de serviço
rural, mesmo ausente recolhimento das contribuições, para o fim de obtenção de aposentadoria
por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1
(um) salário mínimo, e de auxílio-acidente. No entanto, com relação ao período posterior à
vigência da Lei 8.213/91, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural para fins de
aposentadoria por tempo de contribuição, cabe ao segurado especial comprovar o recolhimento
das contribuições previdenciárias, como contribuinte facultativo.
- Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem
admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº
8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo, podendo ser admitido início de prova
material sobre parte do lapso temporal pretendido, bem como tempo de serviço rural anterior à
prova documental, desde que complementado por idônea e robusta prova testemunhal. Nesse
passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão
para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a
sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar.
Precedentes.
- No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o
próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do
menor. Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não
possua idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do
direito de ver reconhecido o exercício da atividade rural para fins do benefício previdenciário,
especialmente se considerarmos a dura realidade das lides do campo que obrigada ao trabalho
em tenra idade (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE
906.259, Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).
- No caso, pelas provas produzidas, a atividade rural sem registro foi comprovada. O autor era
filho de lavrador, nasceu, foi criado e se casou, tudo na zona rural, não sendo demais entender
que desempenhou atividade campesina desde criança, como é comum acontecer nesse
ambiente, em que toda a família, inclusive filhos ainda em tenra idade, vão para o campo em
prol de suas subsistências. Nesse sentido, as declarações das testemunhas, que em uníssono
confirmaram o labor rural do autor, complementado e reforçando as provas materiais. Em
reforço, os vínculos trabalhistas exercidos todos na área agrícola, inicialmente como trabalhador
braçal, comprovando que a atividade rural sempre permeou a vida laborativa do autor.
- Dessa forma, deve ser reconhecida a atividade exercida como trabalhador rural pelo autor, em
regime de economia familiar, no período de 01/01/1968 a 28/06/1975 (07 anos e 06 meses),
independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias, exceto para efeito de
carência, nos termos do art. 55, §2º, da Lei 8.213/1991.
- Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180
contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem
a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos,
conforme dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir
que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido
trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou
integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação
contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para
fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em
regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o
labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao
agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as
condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de
proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
- O laudo técnico não contemporâneo não invalida suas conclusões a respeito do
reconhecimento de tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial, primeiro,
porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da
tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas
pelo trabalhador à época da execução dos serviços.
- Constando da perícia que o segurado ficava exposto a agente nocivo, seja pela simples
presença do agente no ambiente , ou porque estava acima do limite de tolerância, deve-se
concluir que tal exposição era, nos termos do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência
Social, habitual, não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da
prestação do serviço.
- A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações. Considerando tal
evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido
como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -,
reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997);
superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
- No caso, inicialmente observa-se que, até 28.04.1995, o enquadramento como atividade
especial poderia ser feito com base na categoria profissional, não havendo necessidade de
produzir provas da exposição ao agente nocivo, havendo uma presunção da nocividade. No
caso, restou comprovado pela CTPS, Registro de Empregado, Formulário expedido pela
empresa, e Laudo Pericial, que de 01/10/1981 a 20/05/1985, 01/09/1985 a 15/03/1989,
01/06/1989 a 04/02/1992, 01/06/1992 a 28/04/1995, o autor exerceu atividade de motorista de
caminhão, no transporte de carga, que permite seu enquadramento nos termos do item 2.4.4 do
Decreto 53.861/1964 e item 2.4.2 do Decreto 83.080/1979, devendo, portanto, serem
consideradas especiais, conforme reconheceu a sentença.
- De qualquer forma, o Laudo Pericial comprovou a intensidade do ruído a que o autor esteve
exposto no desempenho de suas funções. E embora a empresa não possuísse mais os
caminhões que o autor dirigia na época ou laudo pericial, não há porque não acatar as
considerações do expert, que é Engenheiro de Segurança do Trabalho, perito de confiança do
Juízo, tendo se valido de medições feitas em modelos similares da Volkswagen e Mercedes
Bens, sendo constadas pequenas variações de intensidade.
- A habitualidade e permanência da função de motorista do autor também é induvidosa. Embora
o formulário de fls. 79 (apenso) expedido pela empresa tenha consignado que o autor também
executava serviços gerais na propriedade, como carpa manual, jardinagem, lavagem, etc. Tal
formulário se contrapõe com os demais documentos expedidos por este mesmo empregador,
nos quais há clara descrição da atividade de motorista do autor, de forma exclusiva. Concluo,
assim, que se o autor executava outras atividades, além da de motorista, estas sim eram
ocasionais e não a de motorista, que era indissociável de sua prestação do serviço.
-Dito tudo isso, somente é possível reconhecer a natureza especial das atividades do autor,
pelo ruído, de 01/10/1981 a 20/05/1985, 01/09/1985 a 15/03/1989, 01/06/1989 a 04/02/1992,
01/06/1992 a 03/06/1996, 01/08/1996 a 05/03/1997, já que nesses períodos a intensidade
medida foi maior que 80 dB, e nos período de 19/11/2003 a 25/09/2008, considerando que a
variação do ruído poderia atingir 85,35, portanto, acima do limite máximo de tolerância para
esta época (acima de 85 dB).
- Deve ser afastada a especialidade reconhecida na sentença nos períodos de 06/03/1997 a
31/08/1999 e 01/06/2000 a 18/11/2003, já que a intensidade medida foi menor que 90 dB.
- Em resumo, reconhece-se a natureza especial das atividades laborativas do autor, nos
períodos de 01/10/1981 a 20/05/1985, 01/09/1985 a 15/03/1989, 01/06/1989 a 04/02/1992,
01/06/1992 a 03/06/1996, 01/08/1996 a 05/03/1997, 19/11/2003 a 25/09/2008, as quais devem
ser enquadradas nos registros previdenciários competentes, e convertidas em tempo comum,
pelo fator 1,40, gerando um acréscimo no tempo de contribuição de 07 anos, 08 meses e 19
dias.
- Somando-se o tempo de contribuição incontroverso (29 anos, 09 meses e 08 dias), o tempo
de serviço rural (07 anos e 06 meses) e o acréscimo decorrente da conversão do tempo
especial em comum (07 anos, 08 meses e 19 dias especial) reconhecidos judicialmente, é fácil
perceber que na data do requerimento administrativo (02/01/2009) o autor possuía mais de 35
anos de tempo de contribuição e 180 meses de carência, fazendo jus, portanto, à aposentadoria
por tempo de contribuição integral.
- Observa-se que a r. sentença considerou como termo inicial do benefício, a data do
ajuizamento da ação (03/07/2009). Nos recursos interpostos, o autor requer seja a data inicial
alterada para a data do requerimento administrativo (02/01/2009) e o INSS, a data da sentença
(11/11/2014).
- O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo, observada
a prescrição quinquenal.
- Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela
Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação
do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral). Tal índice deve ser aplicado ao caso, até
porque o efeito suspensivo concedido em 24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de
declaração opostos contra o referido julgado para a modulação de efeitos para atribuição de
eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas quanto à definição do termo inicial da incidência do
IPCA-e, o que deverá ser observado na fase de liquidação do julgado. E, apesar da recente
decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o
INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto
com o julgado acima mencionado. Dessa forma, se a sentença determinou a aplicação de
critérios de juros de mora e correção monetária diversos daqueles adotados quando do
julgamento do RE nº 870.947/SE, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem
observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao
entendimento do Egrégio STF, em sede de repercussão geral.
- Assim, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária aplicam-se, (1) até a entrada
em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça
Federal; e, (2) na vigência da Lei nº 11.960/2009, considerando a natureza não-tributária da
condenação, os critérios estabelecidos pelo Egrégio STF, no julgamento do RE nº 870.947/SE,
realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam, (2.1) os juros
moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos
termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009;
e (2.2) a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-E..
- Vencidos autor e réu, fixo a sucumbência recíproca, devendo as despesas e honorários serem
recíproca e proporcionalmente distribuídos e compensados ente as partes, nos termos do art.
21 do CPC/1973, respeitadas as isenções legais do réu e o benefício da Justiça Gratuita
concedido ao autor.
- Por fim, havendo pedido expresso da parte autora, considerando as evidências coligidas nos
autos, nos termos supra fundamentado, a idade do autor (62 anos), bem como o caráter
alimentar do benefício, que está relacionado à sobrevivência de quem o pleiteia, deve ser
concedida a tutela antecipada.
- Reexame necessário e apelações das partes parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao
reexame necessário e ao recurso do INSS e dar parcial provimento ao recurso interposto pelo
autor e, de ofício, especificar a forma de cálculo dos juros e da correção monetária, sendo que o
Des. Federal Toru Yamamoto, o Des. Federal Paulo Domingues e o Des. Federal David Dantas
davam parcial provimento à apelação da parte autora, em maior extensão, e davam parcial
provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, em menor extensão, fixando o termo inicial
do benefício na data do requerimento administrativo.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.