Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2318948 / SP
0001781-47.2019.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/06/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO
RURAL. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. HONORÁRIOS.
- Recebida a apelação interposta pelo INSS, já que manejada tempestivamente, conforme
certificado nos autos, e com observância da regularidade formal, nos termos do Código de
Processo Civil/2015.
- A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da
comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30 anos, se mulher, além do cumprimento da
carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O
art. 4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser
considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da
previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
- Nos termos do artigo 55, §§2º e 3º, da Lei 8.213/1991, é desnecessário a comprovação do
recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no
período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço
rural, no entanto, tal período não será computado para efeito de carência (TRF3ª Região,
2009.61.05.005277-2/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.26.001346-4/SP, Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
2007.61.83.007818-2/SP. Des. Fed. Toru Yamamoto. DJ 09/04/2018; EDcl no AgRg no REsp
1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em
27/10/2015, DJe 05/11/2015; AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015,
DJe 04/12/2015).
- Foi garantida ao segurado especial a possibilidade do reconhecimento do tempo de serviço
rural, mesmo ausente recolhimento das contribuições, para o fim de obtenção de aposentadoria
por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1
(um) salário mínimo, e de auxílio-acidente. No entanto, com relação ao período posterior à
vigência da Lei 8.213/91, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural para fins de
aposentadoria por tempo de contribuição, cabe ao segurado especial comprovar o recolhimento
das contribuições previdenciárias, como contribuinte facultativo.
- Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem
admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº
8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo, podendo ser admitido início de prova
material sobre parte do lapso temporal pretendido, bem como tempo de serviço rural anterior à
prova documental, desde que complementado por idônea e robusta prova testemunhal. Nesse
passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão
para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a
sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar.
Precedentes.
- No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o
próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do
menor. Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não
possua idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do
direito de ver reconhecido o exercício da atividade rural para fins do benefício previdenciário,
especialmente se considerarmos a dura realidade das lides do campo que obrigada ao trabalho
em tenra idade (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE
906.259, Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).
- No caso, diante das provas produzidas, a atividade rural alegada restou satisfatoriamente
comprovada, até o ano de 1984.O autor era filho de lavradores, nasceu, foi criado e se casou,
tudo na zona rural, não sendo demais entender que desempenhou atividade campesina desde
muito jovem, como é comum acontecer nesse ambiente, em que toda a família, inclusive filhos
ainda em tenra idade, vão para o campo, em prol de suas subsistências. Nesse sentido, as
declarações das testemunhas, que em uníssono confirmaram o labor rural do autor,
complementado e reforçando as provas materiais.Por outro lado, não há provas materiais
posteriores ao ano de 1980, e a prova testemunhal confirmou a atividade rural do autor por
aproximadamente 06 anos após o ano de 1978, constando, ainda, pequeno vínculo urbano,
como auxiliar de marceneiro, no ano de 1979.
- Dessa forma, reconhece-se a atividade exercida como trabalhador rural pelo autor, no período
de 28/01/1970 a 28/02/1979 e de 15/09/1979 a 31/12/1984 (14 anos, 04 meses e 22 dias),
independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias, não podendo tal período
ser computado para efeito de carência, nos termos do art. 55, §2º, da Lei 8.213/1991.
- E para o período não reconhecido, de 01/01/1985 a 30/08/1986, considerando que o conjunto
probatório foi insuficiente à comprovação da atividade rural, adota-se o entendimento
consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de recursos repetitivos,
conforme art. 543-C, do CPC/1973, no sentido de que a ausência de conteúdo probatório eficaz
a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido
do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 485, IV, do NCPC ),
propiciando ao autor intentar novamente a ação caso reúna os elementos necessários (REsp
1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL , julgado em
16/12/2015, DJe 28/04/2016).
- Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180
contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem
a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos,
conforme dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir
que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido
trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou
integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação
contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para
fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em
regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o
labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao
agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as
condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de
proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
- No caso, restou comprovado pela CTPS do autor que, nos períodos em comento, mas até
28/04/1995, trabalhou na função de serviços gerais, para o estabelecimento de agropecuária de
Alício Vitor Pontes - Sítio São João . Deve portanto, referidos períodos serem considerados
como tempo especial, e convertidos em tempo comum, pelo fator de 1,40, pelo enquadramento
na categoria profissional prevista no item 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64, o qual prevê a
especialidade das atividades desempenhadas pelos trabalhadores na agropecuária , ou seja,
pelos prestadores de serviço da agricultura e da pecuária, de forma simultânea.
- Outrossim, esclarece-se que com a conversão do tempo especial reconhecido em tempo
comum, deve ser acrescido ao tempo de contribuição do autor o tempo de 03 anos, 02 meses e
23 dias.
- Em resumo, reconhece-se a natureza especial das atividades laborativas desempenhadas
pelo autor, nos períodos de 01/09/1986 a 31/08/1991, 02/04/1992 a 28/04/1995, que devem ser
convertidas em tempo comum, e devidamente enquadradas pelo INSS nos registros
previdenciários competentes.
-Considerando o tempo de serviço rural doravante reconhecido (14 anos, 04 meses e 22 dias),
o acréscimo decorrente da conversão dos períodos de atividades especiais em tempo comum
(03 anos, 02 meses e 23 dias), e o tempo reconhecido administrativamente (24 anos, 04meses
e 04 dias -fls. 44), verifica-se que o autor possuía na data do requerimento administrativo
(07/03/2017), o tempo total de 41 anos, 11 meses e 19 dias de tempo de contribuição e 27
anos, 06 meses e 27 dias de carência, fazendo jus, portanto, ao benefício de aposentadoria por
tempo de contribuição desde a DER, com renda mensal a ser calculada pelo INSS.
- Vencido o INSS na maior parte, a ele incumbe o pagamento das verbas de sucumbência de
forma integral. Fixo os honorários advocatícios em 10% do valor das prestações vencidas até a
data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
- Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela
Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação
do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral). Tal índice deve ser aplicado ao caso, até
porque o efeito suspensivo concedido em 24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de
declaração opostos contra o referido julgado para a modulação de efeitos para atribuição de
eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas quanto à definição do termo inicial da incidência do
IPCA-e, o que deverá ser observado na fase de liquidação do julgado. E, apesar da recente
decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o
INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto
com o julgado acima mencionado. Dessa forma, se a sentença determinou a aplicação de
critérios de juros de mora e correção monetária diversos daqueles adotados quando do
julgamento do RE nº 870.947/SE, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem
observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao
entendimento do Egrégio STF, em sede de repercussão geral.
- Assim, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária aplicam-se, (1) até a entrada
em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça
Federal; e, (2) na vigência da Lei nº 11.960/2009, considerando a natureza não-tributária da
condenação, os critérios estabelecidos pelo Egrégio STF, no julgamento do RE nº 870.947/SE,
realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam, (2.1) os juros
moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos
termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009;
e (2.2) a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-E..
- Apelação parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao
recurso interposto pelo autor, para reconhecer a atividade rural sem registro desempenhada
nos períodos de 28/01/1970 a 28/02/1979 e de 15/09/1979 a 31/12/1984, exceto para efeito de
carência, bem como a natureza especial das atividades laborativas desempenhadas nos
períodos de 01/09/1986 a 31/08/1991, 02/04/1992 a 28/04/1995, concedendo-lhe o benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo (
07/03/2017), invertendo-se os ônus da sucumbência, e mantendo o decreto de extinção do feito
sem julgamento do mérito, para o período de 01/01/1985 a 30/08/1986, com base no art. 485,
IV, do NCPC, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.