APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000780-67.2018.4.03.6121
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ARILDO RIBEIRO MENDES
Advogados do(a) APELADO: THAIS CARDOSO CIPRIANO - SP383826-A, LUIS GUSTAVO DE CASTRO - SP345530-A, NILSON MANOEL DA SILVA - SP401729-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000780-67.2018.4.03.6121
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ARILDO RIBEIRO MENDES
Advogados do(a) APELADO: THAIS CARDOSO CIPRIANO - SP383826-A, LUIS GUSTAVO DE CASTRO - SP345530-A, NILSON MANOEL DA SILVA - SP401729-A
OUTROS PARTICIPANTES:
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos,
sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
(grifei)
Campo de Aplicação - Eletricidade - Operações em locais com eletricidade em condições de perigo de vida. Serviços e Atividades Profissionais - Trabalhos permanentes em instalações ou equipamentos elétricos com risco de acidentes - Eletricistas, cabistas, montadores e outros; Classificação - Perigoso; Tempo e Trabalho Mínimo - 25 anos; Observações - Jornada normal ou especial fixada em lei em serviços expostos a tensão superior a 250 volts (...).
Induvidoso que não basta a simples menção à eletricidade, sendo necessário comprovar que havia o perigo de exposição à tensão superior a 250 volts, no desempenho da atividade.
Muito se debateu acerca da possibilidade de enquadramento por exposição à eletricidade após a edição do Decreto n.º 2.172/1997, que deixou de arrolar o agente em questão.
A matéria foi examinada sob o rito do art. 543-C, REsp 1.306.113/SC (DJe 07/03/2013), sob a relatoria do Min. Herman Benjamin, que assim concluiu:
Com efeito, e sob interpretação sistemática do tema, não há como atribuir aos arts. 57 e 58 da Lei 8.213/1991 a intenção do legislador de exaurir o rol de agentes nocivos ensejadores da aposentadoria especial, não podendo ser ignoradas as situações consideradas pela técnica médica e pela legislação correlata como prejudiciais à saúde do trabalhador, sem olvidar a necessária comprovação do trabalho permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais.
Superada, portanto, a discussão até então existente, pela consolidação da jurisprudência no sentido de reconhecer o caráter exemplificativo do rol de atividades especiais constantes dos regulamentos de benefícios da Previdência Social.
Não obstante, o Manual de Aposentadoria Especial do INSS, atualizado pelo Despacho Decisório nº 479/DIRSAT/INSS, de 25 de setembro de 2018 (ou seja, posterior ao referido decisum), segue orientando que “a eletricidade permanece como possibilidade de condição especial de trabalho até 5 de março de 1997. Após esta data, este agente é excluído para fins de enquadramento de tempo especial” (p. 60).
Dessa forma, o reconhecimento das condições especiais do labor realizado com exposição a tal agente, após 05/03/1997, vem exigindo provocação jurisdicional.
Acerca do enquadramento por exposição à eletricidade, estabelece o referido Manual ser “importante salientar que o reconhecimento de tempo especial considera o equipamento ou instalação energizada ou suscetível de energizar-se por falha humana ou defeito do equipamento ou instalação elétrica” (p. 61). Reconhece, portanto, a própria autarquia, que o manuseio de fontes de tensões elétricas, em potencial, é suficiente para o enquadramento da atividade, reunidos os demais requisitos.
Por outro lado, em se tratando de agente perigoso, o uso de EPI eficaz não impede o enquadramento, tendo em vista a impossibilidade de total neutralização, conforme precedentes desta 8ª Turma (AC 5010539-06.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal David Diniz, e-DJF3 Judicial 1 de 05/05/2020; AC 0002493-49.2015.4.03.6128, Des. Federal Luiz Stefanini, e-DJF3 Judicial 1 de 23/04/2018).
Quanto à configuração da nocividade, não se exige que a exposição a tensões elétricas superiores a 250 volts seja ininterrupta, porém que faça parte da rotina do segurado no desempenho do seu trabalho, nos termos do entendimento firmado pela Turma Nacional de Uniformização (Tema 210):
Para aplicação do artigo 57, §3.º, da Lei n.º 8.213/91 à tensão elétrica superior a 250 V, exige-se a probabilidade da exposição ocupacional, avaliando-se, de acordo com a profissiografia, o seu caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independente de tempo mínimo de exposição durante a jornada.
DO CASO DOS AUTOS
A controvérsia restringe-se ao reconhecimento do caráter especial do seguinte interstício:
Período de 6/3/1997 a 19/7/2017
Empregador:
Bandeirante Energias do Brasil.Funções:
Eletricista Construção de Estação III, Eletricista de Manutenção de Estação III, Eletricista de Manutenção de Estações PI, Eletricista de Manutenção de Estações Lt PI, Eletricista de Manutenção Se e LtPI, Eletricista de Manutenção Sr; Técnico Eletrotécnica – Estudos e Projetos Jr e Técnico em Eletrotécnica – Construção e Construção e Manutenção AtJr.Prova:
PPP comprova a exposição à eletricidade acima de 250 volts (Id. 105156145, pp. 2 a 13).Conclusão:
Possível o reconhecimento como especial do período em questão. Fundamento legal: Decreto n° 53.831/64, código 1.1.8.
De rigor, portanto, a manutenção da sentença no tocante ao período de atividade especial reconhecido.
Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data do vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do Ministro Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a rejeição dos embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019.
Nos termos do art. 4.º, inciso I, da Lei Federal n.º 9.289/1996, o INSS está isento do pagamento de custas processuais nas ações de natureza previdenciária ajuizadas nesta Justiça Federal, assim como o está naquelas aforadas na Justiça do estado de São Paulo, por força do art. 6.º da Lei Estadual n.º 11.608/2003, c. c. o art. 1.º, § 1.º, da mesma Lei n.º 9.289/1996, circunstância que não o exime, porém, de arcar com as custas e as despesas processuais em restituição à parte autora, em decorrência da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Posto isso, dou parcial provimento à apelação para estabelecer os critérios de incidência de correção monetária, conforme fundamentação supra.
É o voto.
AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. ELETRICIDADE. RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL.
- Frente à significativa alteração que a EC n.º 20/98 promoveu no ordenamento jurídico, foram definidas normas de transição entre o regramento constitucional anterior e o atual no tocante aos requisitos necessários à obtenção da aposentadoria por tempo de serviço.
- A regra de transição para a aposentadoria integral restou ineficaz, na medida em que para concessão de tal benefício não se exige idade ou "pedágio".
- Cumpridos os requisitos previstos no artigo 201, § 7.°, inciso I, da CF, quais sejam, trinta e cinco anos de trabalho, se homem, ou trinta anos, se mulher, além da carência prevista no artigo 142, da Lei n.º 8.213/91, antes ou depois da EC n.º 20/98 e, independentemente da idade com que conte à época, fará jus à percepção da aposentadoria por tempo de contribuição, atual denominação da aposentadoria por tempo de serviço.
- A EC n.º 103/2019 alterou a redação do § 7.º do art. 201 da Constituição Federal e estabeleceu, relativamente à aposentadoria por tempo de contribuição, quatro regras de transição para os segurados que, na data de sua entrada em vigor, já se encontravam filiados ao RGPS.
- É assegurada a aposentadoria por tempo de contribuição, nos moldes estabelecidos pela EC n.º 20/98, ao segurado que, até a data da entrada em vigor do novo regramento, tiver vertido 35 anos de contribuição, se homem, ou 30 anos de contribuição, se mulher.
- A aposentadoria especial é devida aos segurados que trabalhem sob efeito de agentes nocivos, em atividades penosas, insalubres ou perigosas.
- Para o trabalho exercido até o advento da Lei n.º 9.032/95, bastava o enquadramento da atividade especial de acordo com a categoria profissional a que pertencia o trabalhador, segundo os agentes nocivos constantes nos róis dos Decretos n.º 53.831/64 e n.º 83.080/79, cuja relação é considerada como meramente exemplificativa.
- Com a promulgação da Lei n.º 9.032/95 passou-se a exigir a efetiva exposição aos agentes nocivos, para fins de reconhecimento da agressividade da função, através de formulário específico, nos termos da lei.
- Somente a partir da publicação do Decreto n.º 2.172/97 tornou-se legitimamente exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários SB-40 ou DSS-8030.
- Legislação aplicável à época em que foram prestadas as atividades, e não a do momento em que requerida a aposentadoria ou implementadas as condições legais necessárias.
- A partir de 1/1/2004, o PPP constitui-se no único documento exigido para fins de comprovação da exposição a agentes nocivos, em substituição ao formulário e ao laudo técnico pericial.
- O PPP que contemple períodos laborados até 31/12/2003 mostra-se idôneo à comprovação da atividade insalubre, dispensando-se a apresentação dos documentos outrora exigidos.
- A deficiência nas informações constantes do PPP, no tocante à habitualidade e permanência da exposição a agentes nocivos e à eficácia do EPI, não faz prova, por si só, em desfavor do segurado.
- Possibilidade da conversão do tempo especial em comum, sem a limitação temporal prevista no art. 28 da Lei n.° 9.711/98, mas observado o limite de 12/11/2019, véspera da data de entrada em vigor da EC n.º 103/2019.
- É garantido ao segurado que exerce suas atividades em condições especiais o cômputo do período em gozo de auxílio-doença como tempo de serviço especial.
- O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento realizado sob o rito do art. 543-C do CPC, sedimentou o caráter meramente exemplificativo das normas regulamentadoras que estabelecem as atividades e os agentes nocivos, reiterando a possibilidade de enquadramento do trabalho exposto à eletricidade após o Decreto n.º 2.172/97, que a suprimiu do rol de agentes (REsp 1.306.113/SC)
- Admite-se como especial a atividade realizada com exposição ao agente nocivo eletricidade, desde que a tensão elétrica seja superior a 250 volts.
- Inteligência do disposto no Decreto nº 53.381/64, item 1.1.8.
- Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data do vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do Ministro Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a rejeição dos embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019.
- Nos termos do art. 4.º, inciso I, da Lei Federal n.º 9.289/1996, o INSS está isento do pagamento de custas processuais nas ações de natureza previdenciária ajuizadas nesta Justiça Federal, assim como o está naquelas aforadas na Justiça do estado de São Paulo, por força do art. 6.º da Lei Estadual n.º 11.608/2003, c. c. o art. 1.º, § 1.º, da mesma Lei n.º 9.289/1996, circunstância que não o exime, porém, de arcar com as custas e as despesas processuais em restituição à parte autora, em decorrência da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
- Apelação a que se dá parcial provimento para estabelecer os critérios de incidência de correção monetária, conforme fundamentação supra.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.