
| D.E. Publicado em 19/02/2015 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar, dar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial e julgar prejudicada a apelação do autor, revogando a tutela concedida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0003004-26.2009.4.03.6106/SP
RELATÓRIO
A Exma. Senhora Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA (Relatora):
Ação ajuizada por Alziro Vieira dos Santos em 23.03.2009, objetivando o reconhecimento, como especial, dos períodos laborados em condições insalubres, de 01.01.1976 a 31.08.1988, trabalhado no meio rural, e de 01.03.1993 a 10.03.1995, trabalhado em atividade urbana, e sua conversão em tempo comum, bem como a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço integral, desde a data da citação.
Sentença de parcial procedência. Julgado extinto o processo, sem resolução do mérito, "no que se refere ao reconhecimento do caráter especial das atividades desenvolvidas de 01/03/1993 a 10/03/1995 (motorista)", com fulcro no art. 267, inciso VI, do CPC. Julgados parcialmente procedentes os demais pedidos, para condenar o INSS a implantar, em favor do autor, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data da citação (08.09.2009). Prestações em atraso corrigidas monetariamente a partir dos respectivos vencimentos, nos termos das Súmulas 148 e 204 do STJ e 08 do TRF da 3ª Região, e acrescidas de juros de mora desde a citação. Fixada a sucumbência recíproca. Custas ex lege. Concedida a antecipação dos efeitos da tutela. Sentença registrada em 30.08.2013, submetida ao reexame necessário.
É o relatório.
VOTO
A Exma. Senhora Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA (Relatora):
O trabalhador rural, antes da vigência da Lei Básica da Previdência Social, em 1991, não era obrigado a recolher contribuições, sendo beneficiário do PRORURAL, instituído pelas Leis Complementares 11/71 e 16/73, que possuía um plano limitado de cobertura social, inferior ao que era garantido aos trabalhadores urbanos.
Com efeito, a Lei n° 3.807/60, que dispunha sobre a Lei Orgânica da Previdência, expressamente excluiu os trabalhadores rurais do regime geral de previdência (artigo 3°, inciso II), o que foi mantido pelas legislações posteriores.
Nessa época, o rurícola não tinha direito à aposentadoria por tempo de serviço, mas tão-somente à aposentadoria por idade ou invalidez, bem como não podia se valer da contagem recíproca com o sistema urbano. Não havia, portanto, qualquer previsão sobre a possibilidade de contagem de tempo, menos ainda em condições insalubres.
Somente a partir da Constituição Federal de 1988, e com a edição das Leis nos 8.212/91 e 8.213/91, foi o trabalhador rural definitivamente integrado ao sistema previdenciário geral, com os mesmos direitos e obrigações dos empregados do setor urbano, tornando-se segurado obrigatório.
O atual sistema previdenciário admite a utilização do tempo rural laborado sob a égide do sistema anterior, para fins de concessão de benefícios, com algumas reservas, como é o caso do período de carência (para o qual se exige o recolhimento de contribuições).
O Decreto n° 53.831/64, código 2.2.1, relacionou os serviços/atividades profissionais dos trabalhadores na agropecuária, com campo de aplicação agricultura, como insalubres.
"Agropecuária", segundo definição do Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, é a "teoria e prática da agricultura e da agropecuária, considerando suas relações mútuas", "atividade ou indústria simultaneamente agrícola e pecuária".
Mencionado dispositivo legal gerou equivocadas interpretações no que se refere à possibilidade de se considerar o labor rural como de natureza especial.
Não é possível estender esse enquadramento a toda e qualquer atividade no campo, pois cada qual está sujeita a regime próprio.
Como mencionado, os trabalhadores rurais eram expressamente excluídos do regime geral de previdência.
A categoria profissional a que se refere o Decreto restringia-se aos trabalhadores que, mesmo exercendo atividades tipicamente rurais, estavam vinculados ao regime urbano, como os empregados de empresa agroindustrial ou agrocomercial.
O Decreto-lei nº 564, de 01 de maio de 1969, instituiu o Plano Básico da Previdência Social, para assegurar aos empregados não abrangidos pelo regime geral as prestações especificadas, dentre as quais, a aposentadoria por invalidez e por velhice. Incluiu entre os segurados obrigatórios desse regime, os empregados e trabalhadores avulsos do setor rural da agroindústria canavieira (artigo 2º, I), disposição que foi alterada pelo Decreto-lei nº 704, de 24 de julho de 1969, para definir como segurados obrigatórios os empregados do setor agrário da empresa agroindustrial. Dispensadas as empresas abrangidas pelo Plano Básico, da contribuição para o FUNRURAL.
Por ato do Ministro do Trabalho e Previdência Social, de acordo com o nível de organização das atividades e as condições econômicas da região, a empresa inicialmente inserida no Plano Básico poderia ser incluída no sistema geral da previdência social (Lei nº 3.807/60), dispensada da contribuição ao FUNRURAL (artigos 1º e 5º, do Decreto-lei nº 704/69).
Com a criação do PRORURAL pela Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, foi extinto o Plano Básico da Previdência Social, tendo as empresas contribuintes do PRORURAL sido redirecionadas ao extinto IAPI e ao INPS, à exceção das agroindústrias, anteriormente vinculadas - inclusive seu setor agrário -, que continuaram ligadas ao regime geral (artigos 27/29).
Por sua vez, a Lei Complementar nº 16, de 30 de outubro de 1973, estabeleceu que os "empregados que prestam exclusivamente serviço de natureza rural às empresas agroindustriais e agrocomerciais são considerados beneficiários do PRORURAL, ressalvado o disposto no parágrafo único deste artigo."
Excetuou da disposição os empregados que, desde a vigência da Lei Complementar nº 11/71, vinham sofrendo desconto de contribuições ao INSS, garantindo-lhes a manutenção da condição de segurados do regime geral (art. 4º, parágrafo único):
Igual garantia foi assegurada pelo Decreto nº 89.312, de 23 de janeiro de 1984, que dispôs no parágrafo 4º, do artigo 6º:
Sustentou-se, à época, que os empregados das empresas agroindustriais, envolvidos na cultura da matéria-prima utilizada pelo setor industrial próprio eram filiados ao regime geral por força da Súmula 196 STF que considerava a finalidade da empresa e não a natureza da atividade.
Considerando que os beneficiários do PRORURAL e do Plano Básico somente tinham direito à aposentadoria por velhice ou por invalidez, reservando-se a aposentadoria por tempo de serviço aos segurados do regime geral da previdência social, tem-se que este benefício somente é devido aos empregados de agroindústria que foram incluídos no regime geral, por ato do Ministro do Trabalho, ou por iniciativa da própria empresa, ainda que as contribuições respectivas não tenham sido vertidas regularmente. Pois, se eram devidas, a cargo do empregador, e não foram recolhidas, não cabe impor prejuízo ao empregado.
Portanto, a despeito do artigo 6º, parágrafo 4º, do Decreto nº 89.312/84, que assegura proteção do regime urbano ao empregado de empresa agroindustrial ou agrocomercial que presta serviço de natureza exclusivamente rural, somente se efetuadas contribuições a partir de 25.11.1971, é de se reconhecer o mesmo direito àqueles que, vinculados legalmente ao regime urbano, não computaram contribuições, por inércia de seus empregadores.
A conclusão somente se aplica àquelas categorias oficialmente incluídas no regime urbano, às quais se estenderão, por via de conseqüência, as normas pertinentes à aposentadoria especial, reconhecendo-lhes a natureza insalubre, penosa ou perigosa, segundo enquadramento nos anexos aos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79.
Ao contrário, se o trabalhador, ainda que registrado como empregado no setor agroindustrial, exercia atividade essencialmente rural, em empresa não incluída no regime urbano, na forma do Decreto-lei nº 704/69, não tem direito à contagem do respectivo tempo como especial, porque não efetuou as contribuições necessárias à proteção respectiva, e nem eram devidas pelo empregador, ausente o custeio indispensável à cobertura.
Nesse sentido:
Sobre o tema, trecho do voto do Desembargador Federal André Nekatschalow, in verbis:
Ressalte-se o entendimento perfilhado pelo Superior Tribunal de Justiça:
Dessarte, anteriormente à edição da Lei nº 8.213/91, impossível o enquadramento dos períodos trabalhados para fins de conversão como tempo especial. Após, com a equiparação do trabalhador rural ao urbano, viável se presentes os pressupostos legais, em especial que o desempenho laboral se relacione à agropecuária, conforme exige a descrição contida no código 2.2.1, do anexo ao Decreto-lei nº 53.831/64.
Certamente não serão os elementos naturais, atuando em níveis normais, que justificarão o enquadramento das atividades como especiais, reclamando a legislação a presença de agentes nocivos, acima dos níveis de tolerância.
Tratando-se de simples atividade rural, conforme já assentou o Egrégio Superior Tribunal de Justiça, anotando-se decisões monocráticas desse jaez, não podem ser caracterizadas como especial:
Pelo exposto, depreende-se que a atividade de trabalhador rural, por si só, não enseja seu reconhecimento como especial, sendo necessária, para tanto, a comprovação do desempenho de atividade laborativa relacionada à agropecuária ou da efetiva exposição a agentes nocivos, nos moldes da legislação vigente à época da prestação do serviço.
Por fim, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de recurso especial representativo de controvérsia (recurso repetitivo), nos termos do artigo 543-C, §1º, do Código de Processo Civil, em 23.03.2011, decidiu a questão.
Assentou, por unanimidade, a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois, a partir da última edição da MP n° 1.663, parcialmente convertida na Lei n° 9.711/98, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido §5° do art. 57 da Lei n° 8.213/91.
Segue a ementa:
Pacificada, portanto, a matéria.
A controvérsia recai sobre o reconhecimento da natureza especial do período de 01.01.1976 a 31.08.1988, em que o autor prestou serviços no meio rural, e que pode assim ser desmembrado:
* de 01.01.1976 a 30.07.1979, laborado como trabalhador rural, na empresa Oswaldo Cruz Monteiro - Fazenda Boa Vista. O formulário de fls. 60-62 informa que o postulante "trabalhou na lavoura de arroz, milho e algodão", executando "serviços de preparação do solo, plantio e colheita, principalmente de arroz, milho e algodão". Atesta que, no exercício de suas funções, o autor ficava exposto, de modo habitual e permanente, a "intempéries naturais, tais como: chuva, calor, poeira";
* de 10.08.1979 a 10.06.1986, laborado como trabalhador rural, na empresa Ernesto Giacomini - Sítio Santo Antônio. O formulário de fls. 63-65 informa que o postulante "trabalhou na lavoura de milho", executando "serviços de preparação do solo, plantio e colheita de milho". Atesta que, no exercício de suas funções, o autor ficava exposto, de modo habitual e permanente, a "intempéries naturais, tais como: chuva, calor, poeira";
* de 02.07.1986 a 30.08.1988, laborado como trabalhador rural, na empresa Natal Dumbra - Sítio Alvorada. O formulário de fls. 66-68 informa que o postulante "trabalhou na lavoura de milho e arroz", laborando "com trator na preparação do solo, plantio e colheita de milho e arroz". Atesta que, no exercício de suas funções, o autor ficava exposto, de modo habitual e permanente, a "intempéries naturais, tais como: chuva, calor, poeira".
Desse modo, por todos os ângulos que se analise, mostra-se incabível o reconhecimento, como especial, das atividades desenvolvidas no interregno de 01.01.1976 a 31.08.1988, não subsistindo o direito do autor ao acréscimo de 40% no cálculo do tempo de serviço laborado na lavoura, o qual deverá ser computado como tempo comum.
Por fim, com relação ao recolhimento de contribuições previdenciárias, mister a observância do artigo 55, § 2°, da Lei n° 8.213/91, que preceitua: "O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o regulamento".
Desse dispositivo legal, depreende-se que a atividade rural desempenhada em data anterior a novembro de 1991 pode ser considerada para averbação do tempo de serviço, sem necessidade de recolhimento de contribuições previdenciárias, exceto para fins de carência.
A partir do advento da Lei 8.213/91, cabe ao segurado especial o recolhimento de contribuições previdenciárias facultativas, se pretender o cômputo do tempo de serviço rural para fins de obtenção de outros benefícios que não os arrolados no inciso I do artigo 39.
Nesse sentido, inclusive, a Súmula n.º 272 do Superior Tribunal de Justiça, que expressamente determina que o segurado especial somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço se recolher as contribuições facultativas.
Dessa forma, o reconhecimento de período posterior, sem contribuições previdenciárias facultativas, servirá somente para futura concessão de aposentadoria por idade ou por invalidez, auxílio-doença, auxílio-reclusão ou pensão, ficando vedado o aproveitamento do referido período para os demais fins previdenciários.
Assim, o tempo laborado no campo, sem registro profissional, corresponde a 12 anos e 08 meses.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
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| Data e Hora: | 02/02/2015 22:29:37 |
