
| D.E. Publicado em 09/02/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001263-74.2010.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de apelação interposta pela parte autora (fls. 664/679) em face da r. sentença (fls. 656/661) que julgou parcialmente procedente pedido para reconhecer a especialidade do labor desempenhado entre 29/06/1982 e 27/09/1984 e entre 12/12/1998 e 07/10/2005, fixando verba honorária em 10% do valor da causa. Sustenta ter direito ao reconhecimento dos demais períodos controversos laborados em condições especiais, além do período urbano não assentado administrativamente pelo ente público, de modo que seja concedida sua aposentadoria.
Subiram os autos sem contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Primeiramente, recebo o recurso de apelação interposto pela parte autora sob a égide da sistemática instituída pelo Código de Processo Civil de 2015 e, em razão de sua regularidade formal (atestada pela certidão de fls. 684), possível se mostra a apreciação da pretensão nele veiculada, o que passa a ser feito a partir de agora. Cumpre salientar, por oportuno, que, como a autarquia previdenciária não manejou apelo em face da r. sentença, restam incontroversos os períodos de especialidade do labor nela assentados (de 29/06/1982 a 27/09/1984 e de 12/12/1998 a 07/10/2005).
DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO
A aposentadoria por tempo de serviço foi assegurada no art. 202, da Constituição Federal, que dispunha, em sua redação original:
A regulamentação da matéria sobreveio com a edição da Lei de Benefícios, de 24 de julho de 1991, que tratou em vários artigos da aposentadoria por tempo serviço. Nesse contexto, o benefício em tela será devido, na forma proporcional, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo masculino (art. 52, da Lei nº 8.213/91). Comprovado o exercício de mais de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria em tela na forma integral (art. 53, I e II, da Lei nº 8.213/91).
A Lei nº 8.213/91 estabeleceu período de carência de 180 (cento e oitenta) contribuições, revogando o § 8º do art. 32 da Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS (que fixava, para a espécie, período de carência de 60 - sessenta - meses). Destaque-se que a Lei nº 9.032/95, reconhecendo a necessidade de disciplinar a situação dos direitos adquiridos e ainda da expectativa de direito que possuíam os filiados ao regime previdenciário até 24 de julho de 1991 (quando publicada com vigência imediata a Lei nº 8.213/91), estabeleceu regra de transição aplicável à situação desses filiados, prevendo tabela progressiva de períodos de carência mínima para os que viessem a preencher os requisitos necessários às aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial, desde o ano de 1991 (quando necessárias as 60 - sessenta - contribuições fixadas pela LOPS) até o ano de 2.011 (quando se exige 180 - cento e oitenta - contribuições).
A Emenda Constitucional nº 20/1998, que instituiu a reforma da previdência, estabeleceu o requisito de tempo mínimo de contribuição de 35 (trinta e cinco) anos para o segurado e de 30 (trinta) anos para a segurada, extinguindo o direito à aposentadoria proporcional e criando o fator previdenciário (tudo a tornar mais vantajosa a aposentação tardia). Importante ser dito que, para os filiados ao regime até sua publicação e vigência (em 15 de dezembro de 1998), foi assegurada regra de transição, de forma a permitir a aposentadoria proporcional - para tanto, previu-se o requisito de idade mínima de 53 (cinquenta e três) anos para os homens e de 48 (quarenta e oito) anos para as mulheres e um acréscimo de 40% (quarenta por cento) do tempo que faltaria para atingir os 30 (trinta) ou 35 (trinta e cinco) anos necessários nos termos da nova legislação.
Tal Emenda, em seu art. 9º, também previu regra de transição para a aposentadoria integral, estabelecendo idade mínima nos termos acima tratados e percentual de 20% (vinte por cento) do tempo faltante para a aposentação. Contudo, tal regra, opcional, teve seu sentido esvaziado pelo próprio Constituinte derivado, que a formulou de maneira mais gravosa que a regra permanente das aposentadorias integrais (que não exige idade mínima nem tempo adicional).
DO TEMPO EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS
O tempo de serviço prestado sob condições especiais poderá ser convertido em tempo de atividade comum independente da época trabalhada (art. 70, § 2º, do Decreto nº 3.048/99). Desta forma, não prevalece mais qualquer tese de limitação temporal de conversão, seja em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887/80, seja em períodos posteriores à Lei nº 9.711/98, sendo certo que o art. 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91, foi elevado à posição de Lei Complementar pelo art. 15, da Emenda Constitucional nº 20/98, de modo que somente por Lei Complementar poderá ser alterado.
Importante ser consignado que, na conversão do tempo especial em comum, aplica-se a legislação vigente à época da prestação laboral; na ausência desta e na potencial agressão à saúde do trabalhador, deve ser dado o mesmo tratamento para aquele que hoje tem direito à concessão da aposentadoria (STF, RE 392.559/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 07.02.06).
Cumpre salientar que a conversão do tempo de trabalho em atividades especiais era concedida com base na categoria profissional classificada de acordo com os anexos dos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79, sendo que, a partir da Lei nº 9.032/95, faz-se necessário comprovar o exercício da atividade prejudicial à saúde por meios de formulários ou de laudos. É pacífico o entendimento jurisprudencial de que o rol de atividades consideradas insalubres, perigosas ou penosas é meramente exemplificativo (portanto, não exaustivo), motivo pelo qual a ausência do enquadramento da atividade tida por especial não é óbice à concessão de aposentadoria especial, consoante o entendimento da Súmula 198, do extinto TFR: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento".
Portanto, o reconhecimento de outras atividades insalubres, penosas e perigosas é admissível, caso exercidas sob ditas condições especiais; porém, tais especialidades não se presumem (como ocorre com aquelas categorias arroladas na legislação pertinente).
A partir de 10 de dezembro de 1997, com a edição da Lei nº 9.528, passou-se a ser necessária a apresentação de laudo técnico para a comprovação de atividade insalubre, documento este que deve demonstrar efetiva exposição do segurado ao agente nocivo, mediante formulário estabelecido pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, com base em laudo técnico do ambiente de trabalho, expedido por médico do trabalho ou por engenheiro de segurança do trabalho, com exceção de ruído (que sempre exigiu a apresentação de referido laudo para caracterizá-lo como agente agressor). Registro, por oportuno, que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP substitui o laudo técnico em comento, sendo, assim, documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador.
Destaque-se que a extemporaneidade do documento (formulário, laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP) não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho sob condições especiais, pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual à constatada na data de elaboração de tais documentos (tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho somente melhoram com a evolução tecnológica).
Saliente-se que os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79 têm aplicação simultânea até 05 de março de 1997, de modo que, verificada divergência entre tais diplomas, deve prevalecer a regra mais benéfica (como, por exemplo, ocorre na constatação de insalubridade em razão de ruído com intensidade igual ou superior a 80 dB, que atrai a incidência do Decreto nº 53.831/64).
Especificamente com relação ao agente agressivo ruído, importante ser dito que até 05 de março de 1997 entendia-se insalubre a atividade desempenhada exposta a 80 dB ou mais. Posteriormente, o Decreto nº 2.172/97 revogou os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, passando a considerar insalubre o labor desempenhado com nível de ruído superior a 90 dB. Mais tarde, em 18 de novembro de 2003, o Decreto nº 4.882/03 reduziu tal patamar para 85 dB. Ressalte-se que o C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp 1.398.260/PR (representativo da controvérsia - Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª Seção, DJe de 05/12/2014), firmou entendimento no sentido da impossibilidade de retroação do limite de 85 dB para alcançar fatos praticados sob a égide do Decreto nº 2.172/97.
O E. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Agravo em RE nº 664.335/RS (com repercussão geral da questão constitucional reconhecida), pacificou o entendimento de que, havendo prova da real eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI (vale dizer, efetiva capacidade de neutralizar a nocividade do labor), não há que se falar em respaldo constitucional à concessão de aposentadoria especial. Todavia, em caso de dúvida em relação à neutralização da nocividade, assentou que a Administração e o Poder Judiciário devem seguir a premissa do reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial, pois o uso do EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submeteu - destaque-se que se enfatizou, em tal julgamento, que a mera informação da empresa sobre a eficácia do EPI não é suficiente para descaracterizar a especialidade do tempo de serviço para fins de aposentadoria. Ainda em indicado precedente, analisando a questão sob a ótica do agente agressivo ruído, o Supremo estabeleceu que não se pode garantir a eficácia real do EPI em eliminar os efeitos agressivos ao trabalhador, destacando que são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, não abrangendo apenas perdas auditivas, pelo que é impassível de controle, seja pelas empresas, seja pelos trabalhadores.
Por fim, no tocante à alegada necessidade de prévia fonte de custeio, em se tratando de empregado, sua filiação ao sistema previdenciário é obrigatória, bem como o recolhimento das contribuições respectivas, cabendo ao empregador vertê-las, nos termos do art. 30, I, da Lei nº 8.212/91. Dentro desse contexto, o trabalhador não pode ser penalizado se tais recolhimentos não foram efetuados corretamente, porquanto a autarquia previdenciária possui meios próprios para receber seus créditos.
DA COMPROVAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO
A comprovação do tempo de serviço opera-se de acordo com os arts. 55 e 108, ambos da Lei nº 8.213/91, sendo sempre necessário início de prova material, afastada a prova exclusivamente testemunhal, exceto por motivo de força maior ou de caso fortuito. Nesse contexto, são hábeis para tal finalidade os documentos relativos ao exercício de atividade nos períodos a serem contados e contemporâneos aos fatos a comprovar, com menção das datas de início e de término, e, quando for caso de trabalhador avulso, a duração do trabalho e a condição em que foi prestado. Quando da ausência de prova documental contemporânea, admite-se declaração do empregador, atestado de empresa ainda existente, certificado ou certidão de entidade oficial dos quais constem os dados previstos no caput do art. 62 do Decreto nº 3.048/99, desde que extraídos de registros efetivamente existentes e acessíveis à fiscalização da autarquia previdenciária.
Prescreve o art. 62, § 1º, Decreto nº 3.048/99, alterado pelos Decretos nºs 4.079/02 e 4.729/03:
DO CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS
Da atividade especial: Pugna a parte autora pelo reconhecimento como especial do labor exercido entre 13/05/1991 e 31/08/1992, entre 07/01/1993 e 11/12/1998 e entre 08/10/2005 e 06/12/2005. Cumpre analisar os interregnos separadamente, devendo ser consignada a impossibilidade de se levar em conta material produzido no bojo de demanda trabalhista intentada para fins de recebimento de adicional de insalubridade (fls. 183/259, 351/459 e 625/630) na justa medida em que a aferição realizada em demanda laboral tem como base elementos ínsitos à legislação trabalhista, que não se confundem com os requisitos dispostos na legislação previdenciária para que determinado período seja tido como de atividade especial, o que faz com que não possa ser usada a prova produzida em demanda trabalhista.
- Período de 13/05/1991 a 31/08/1992: Verifica-se, de acordo com a declaração acostada às fls. 133, 523, 531, 593 e 636, que o então empregador da parte autora é expresso em sustenta a ausência de laudo técnico individual atinente ao lapso cujo reconhecimento da especialidade do labor se requer, havendo apenas a menção a índice de ruído (de 81,43 dB) relativo ao ano de 2002. Desta feita, diante da ausência de prova acerca do alegado (ônus que cabia à parte autora desempenhar, nos termos dos arts. 333, I, do Código de Processo Civil de 1973, e 373, I, do Código de Processo Civil), o período em comento deverá ser computado, para fins de contagem de tempo de serviço, em sua forma simples.
- Período de 07/01/1993 a 11/12/1998: Verifica-se, de acordo com o PPP de fls. 542/544, que a parte autora não estava exposta a qualquer agente agressivo no lapso em tela, motivo pelo qual o período em comento deverá ser computado, para fins de contagem de tempo de serviço, em sua forma simples. Destaque-se a impossibilidade de se levar em conta o PPP de fls. 134/135, 524/525 e 594/595 para o fim pugnado pela parte autora, uma vez que tal expediente foi atualizado para a versão do PPP acostada às fls. 542/544.
- Período de 08/10/2005 a 06/12/2005: Verifica-se, de acordo com o PPP de fls. 542/544, que a parte autora laborava submetida ao agente agressivo ruído em intensidade de 88 dB, limite este superior ao tolerado pela legislação de regência aplicável à época, motivo pelo qual faz jus ao reconhecimento da especialidade vindicada (com a consequente conversão em tempo comum).
Do labor urbano: Pugna a parte autora pelo reconhecimento de atividade levada a efeito no meio urbano no interregno de 24/03/1971 a 31/05/1972. Com efeito, compulsando os autos, reconheço, como início de prova material, a CTPS de fls. 11 (ainda que de difícil leitura), corroborada pelo documento emitido pelo sindicato da categoria atinente ao ano de 1972 (fls. 25, 177 e 517) no qual consta a menção ao empregador e à parte autora. Nesse contexto, reconheço como efetivamente laborado no meio urbano o lapso de 24/03/1971 a 31/05/1972.
DO CASO CONCRETO
Somados os períodos incontroversos (r. sentença e fls. 611/615) com o ora reconhecido como especial e com o de atividade comum urbana, perfaz a parte autora 35 anos e 14 dias de tempo de serviço, conforme planilha que ora se determina a juntada, suficientes para conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, na forma integral, a partir do requerimento administrativo (06/12/2005 - fls. 115, 156, 159/160, 580, 619/620 e 648). Afastada a ocorrência de prescrição quinquenal uma vez que não houve o transcurso de mais de 05 (cinco) anos entre a data do requerimento administrativo (06/12/2005 - fls. 115, 156, 159/160, 580, 619/620 e 648) e o momento de ajuizamento desta demanda (04/02/2010 - fls. 02).
CONSECTÁRIOS
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados na forma prevista no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, sem prejuízo da aplicação da legislação superveniente, observando-se, ainda, quanto à correção monetária, o disposto na Lei n.º 11.960/2009, consoante a Repercussão Geral reconhecida no RE n.º 870.947, em 16.04.2015, Rel. Min. Luiz Fux.
A Autarquia Previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, I, da Lei n.º 9.289, de 04.07.1996, do art. 24-A da Lei n.º 9.028, de 12.04.1995, com a redação dada pelo art. 3º da Medida Provisória n.º 2.180- 35 /2001, e do art. 8º, § 1º, da Lei n.º 8.620, de 05.01.1993.
Sucumbente, deve o INSS arcar com os honorários advocatícios, fixados no percentual de 12% (doze por cento), calculados sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, consoante o art. 85, § 3º, I, e § 11, do Código de Processo Civil, observada a Súm. 111/STJ.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação da parte autora, nos termos anteriormente expendidos.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
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