
| D.E. Publicado em 30/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0006028-25.2009.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o enquadramento de tempo de serviço especial, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para (i) reconhecer insalubres os lapsos de 1/5/1979 a 28/2/1987 e de 1/4/1987 a 31/7/1990 e (ii) conceder ao autor o benefício postulado, sob o coeficiente de 94% do salário-de-benefício, sem aplicação do fator previdenciário, da data do requerimento administrativo (25/2/1998) até seu óbito (19/5/2013), bem como (iii) condenar o réu a pagar as diferenças, respeitada a quinquenal, acrescida dos consectários.
Decisão submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a autarquia interpôs apelação, na qual alega, em síntese, a impossibilidade do enquadramento efetuado na condição de dentista autônomo, diante da ausência de comprovação da habitualidade e permanência do labor; até porque essa categoria não contribui para o financiamento da aposentadoria especial. Sustenta, ainda, a incidência do fator previdenciário no caso em contenda. Subsidiariamente, pugna por modificação da data de início do benefício e dos consectários. Prequestionou a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta E. Corte.
É o relatório.
Decido.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação interposta e da remessa oficial, porque presentes os requisitos de admissibilidade.
Passo ao exame das razões recursais.
Trata-se de pleito originalmente intentado pelo autor, ora falecido, visando à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, após o reconhecimento da natureza insalubre dos lapsos indicados na exordial, na profissão de dentista autônomo.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições prejudiciais.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
In casu, aduz o autor laborar como dentista autônomo de 1/5/1979 a 31/7/1990, sujeito a condições nocivas à saúde.
Com efeito, constato a presença de farta documentação comprobatória da aludida profissão, consubstanciada em: (a) carteira de identificação como cirurgião dentista, indicando sua inscrição no respectivo conselho de classe (6/5/1977); (b) diploma de graduação no curso de odontologia (1977); (c) alvarás de licença e funcionamento (1980 a 1990); (d) laudo radiométrico realizado no consultório do ex-segurado, apontando a existência de aparelho de Raio-X (1995); (e) declarações de Imposto de Renda (anos 1979 a 1989); (f) guias de contribuição sindical (1980 a 1986 e de 1989 a 1990); (g) registro de serviços tomados de terceiros (1985 a 1991); (h) certificados de curso de extensão na área (1979, 1980 e 1984); (i) recolhimentos previdenciários (5/79 a 2/87; 4/87 a 7/90).
Ademais, a prova oral corroborou o labor especial durante o período vindicado.
Nesse panorama, entendo devidamente comprovada a atividade profissional de dentista autônomo do ex-segurado, o qual presumivelmente permaneceu exposto a agentes patogênicos no desempenho diário da ocupação laborativa, fato que possibilita o enquadramento na forma dos códigos 2.1.3 dos anexos ao Decreto n. 53.831/64 e n. 83.080/79.
Por outro lado, não se sustenta a alegação do INSS de ausência de prévia fonte de custeio para pagamento da aposentadoria especial ao segurado autônomo, pois a lei não faz distinção entre o segurado empregado e o contribuinte individual para fins de concessão desse benefício.
Ademais, o art. 195, caput e incisos, da Carta da República, remete a toda sociedade o financiamento da seguridade social (princípio da solidariedade), de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como das contribuições sociais do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei.
Insta ressaltar, ainda, tratar-se de benefício previdenciário previsto na própria Constituição (art. 201, § 1º c/c art. 15 da EC n. 20/98), hipótese em que sua concessão independe de identificação da fonte de custeio, necessária à criação de benefício novo, o que não é o caso.
Nessa linha, trago à liça o seguinte precedente:
Nesse diapasão, os interstícios de 1/5/1979 a 28/2/1987 e de 1/4/1987 a 31/7/1990 reconhecidos na sentença, como especiais, devem ser mantidos.
Da aposentadoria por tempo de serviço
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria por tempo de serviço estava prevista no artigo 202 da Constituição Federal, assim redigido:
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/91:
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos da aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer tempo, pleitear o benefício.
Àqueles, no entanto, que estavam em atividade e ainda não preenchiam os requisitos à época da Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito de idade mínima (53 anos para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um adicional de contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30 anos (homens) e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de "pedágio".
No caso vertente, o requisito da carência restou preenchido em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/91.
Quanto ao tempo de serviço, somados os períodos citados à contagem administrativa levada a efeito na DER: 25/2/1998, a parte autora reúne mais de 30 (trinta) anos de profissão, suficientes à concessão da aposentadoria por tempo de serviço, nos termos dos artigos 52 e 53, inciso II, da Lei n. 8.213/91, com base nas regras vigentes anteriormente à EC 20/98.
Não incide, no caso, o fator previdenciário no cálculo da RMI, porquanto trata-se de benefício requerido anteriormente à entrada em vigor da Lei nº 9.876/99.
Consectários
O benefício é devido do requerimento (25/2/1998) até o óbito do segurado (19/5/2003).
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, observado o disposto na Lei n. 11.960/2009, consoante Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 16/4/2015, Rel. Min. Luiz Fux.
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do antigo CC e 219 do CPC, até a vigência do novo CC (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do novo CC e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, serem fixados no percentual de 0,5% ao mês, observadas as alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09, pela MP n. 567, de 03 de maio de 2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012, e por legislação superveniente.
Em relação às parcelas vencidas antes da citação, os juros são devidos desde então de forma global e, para as vencidas depois da citação, a partir dos respectivos vencimentos, de forma decrescente.
Os honorários advocatícios ficam mantidos em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante § 3º do artigo 20 do CPC/1973, orientação desta Turma e nova redação da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados por ocasião da liquidação do julgado.
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido desrespeito algum à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação e DOU PARCIAL PROVIMENTO à remessa oficial apenas para ajustar os critérios de incidência dos consectários. No mais, mantida a r. decisão recorrida.
Intimem-se.
Juiz Federal Convocado
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| Nº de Série do Certificado: | 2DBCF936DB18581E |
| Data e Hora: | 17/08/2016 13:46:36 |
