D.E. Publicado em 19/02/2015 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e à remessa oficial, tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002336-39.2006.4.03.6113/SP
RELATÓRIO
A Exma. Senhora Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA (Relatora):
Ação ajuizada por JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA, em 28.06.2006, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, a partir do requerimento administrativo (17.06.2005), mediante o reconhecimento da atividade rural desenvolvida em regime de economia familiar no período de 08.09.1976 a 30.01.1981, bem assim do exercício de atividades desenvolvidas em condições especiais nos períodos de 03.12.1996 a 06.04.1997, 07.04.1997 a 08.06.1999, 01.09.1999 a 07.06.2001 e de 01.06.2001 a 30.04.2005.
Sentença de parcial procedência para reconhecer o tempo de serviço rural no período de 08.091.1976 a 30.01.1981, assim como as atividades exercidas sob condições especiais, no período de 01.06.2001 a 01.04.2005, concedendo a aposentadoria integral por tempo de serviço, a partir de 17.06.2005. Condenou o INSS, também, no pagamento das diferenças apuradas acrescidas de juros de 1% ao mês, a partir da citação. Fixou honorários advocatícios devidos pelo réu em 10% sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença, a teor do disposto na Súmula n. 111 do STJ. Concedida a tutela antecipada. Sem custas. Não submeteu a sentença ao reexame necessário.
Em suas razões recursais, pugna o INSS pela reforma integral da sentença.
Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
A Exma. Senhora Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA (Relatora):
O autor pleiteia a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, a partir do requerimento administrativo (17.05.2005), mediante o reconhecimento da atividade rural desenvolvida em regime de economia familiar no período de 08.09.1976 a 30.01.1981, bem assim do exercício de atividades desenvolvidas em condições especiais nos períodos de 03.12.1996 a 06.04.1997, 07.04.1997 a 08.06.1999, 01.09.1999 a 07.06.2001 e de 01.06.2001 a 30.04.2005.
REMESSA OFICIAL
Sentença não submetida ao duplo grau de jurisdição, nos termos do artigo 475, inciso I, do Código de Processo Civil; examino se é caso de conhecer da remessa oficial.
Em ações em que o objetivo é somente o reconhecimento de tempo de serviço, diante de sentença de procedência do pedido, aferia-se se o valor do direito controvertido excedia a 60 (sessenta) salários mínimos. Considerava-se, para aplicação do § 2º do artigo 475 do Código de Processo Civil, o valor atualizado da causa quando do julgamento.
Podia-se questionar a adequação de tal juízo, porquanto era comum e visível que o valor atribuído à causa não correspondia à realidade do pedido, ao valor do bem de vida pretendido; dava-se à causa, por exemplo, o usado "mil reais".
Não se via impugnação do valor da causa pela Fazenda Pública que, uma vez mantido, restringia o Tribunal ao exame do alegado por meio de apelação. Ordinariamente ficava o julgador tolhido de examinar desvios que viessem do primeiro grau, porque, com o baixo valor atribuído pelo autor, da remessa oficial não se chegava a conhecer diante do valor de alçada adotado pelo legislador.
O reexame necessário é condição de eficácia da sentença, recurso não é. Seu fim é defender a pessoa de direito público de ilegalidades ou erros eventualmente cometidos pelo juiz de primeiro grau.
A regra geral é o cabimento do reexame necessário de sentença proferida contra a Fazenda Pública. O parágrafo 2º do artigo 475 é exceção.
Predomina o entendimento de que definir o correto valor da causa é questão de ordem pública.
Na doutrina, o posicionamento compilado por Gilson Amaro de Souza, in "Do valor da causa", Ed. Sugestões Literárias, 1987, p. 141:
A respeito, disserta Cândido Rangel Dinarmarco:
O valor da causa não pode ser aleatório ou injustificado, a teor do disposto nos artigos 258 a 261, do Código de Processo Civil, que estabelecem parâmetros a serem seguidos pela parte autora. De ver que o artigo 258 refuta que se atribua valor simbólico, sem fundamentação, quando dispõe que "A toda causa será atribuído um valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico imediato".
Ainda que se trate de ação de cunho meramente declaratório, o valor da causa deve corresponder à expressão econômica do bem de vida almejado.
A propósito, julgado do Superior Tribunal de Justiça, próprio de ação declaratória, in verbis:
O autor pleiteia o reconhecimento de significativo lapso temporal, e teve sua pretensão acolhida em 1ª Instância.
A declaração do período reconhecido gera benefício econômico à autora, ainda que não imediato.
A resumir que, diante da sentença proferida, porque de valor incerto a obrigação imposta ao INSS, não se podendo estimar se inferior ou igual a 60 (sessenta) salários mínimos, fica ela sujeita à obrigatoriedade do reexame necessário, nos termos do artigo 475, inciso I, do Código de Processo Civil. E, de outro modo analisando, considerando a repercussão econômica que possa beneficiar a autora, inclusive em relação ao recebimento de valores atrasados em eventual pedido de aposentadoria, decerto se terá valor superior a 60 salários mínimos.
Destarte, conheço da remessa oficial , tida por interposta .
COMPROVAÇÃO DO TEMPO RURAL
O artigo 55, § 3º, da Lei n° 8.213/91, dispõe sobre a obrigatoriedade de início de prova documental para a comprovação de tempo de serviço, para fins previdenciários, sendo insuficiente a produção de prova exclusivamente testemunhal, a qual, por si só, não é válida à demonstração do desempenho do trabalho tido como realizado.
A lei previdenciária, ao exigir início razoável de prova material, não viola a legislação processual em vigor, pois o artigo 400 do Código de Processo Civil preceitua ser sempre válida a prova testemunhal, desde que a lei não disponha de forma diversa. Assim, havendo em lei especial disposição expressa acerca da exigência de documentação para comprovar tempo de serviço, incabível seu reconhecimento baseado tão somente nos depoimentos prestados por testemunhas.
Especificamente a respeito do reconhecimento da atividade de natureza rural, a orientação de há muito conferida pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da imprestabilidade da prova exclusivamente testemunhal (Súmula 149) apresenta-se preservada em decisões recentes, consoante se observa da ementa do acórdão tirado do julgamento do REsp 1.133.863/RN, sob a sistemática do artigo 543-C do diploma processual (3ª Seção, rel. Desembargador Convocado do TJ/SP Celso Limongi, DJe de 15.4.2011), reafirmando-se as premissas em questão, in verbis:
Objetivando comprovar suas alegações de exercício de atividade rural, o autor juntou aos autos:
* Declaração de exercício de atividade rural do autor, firmada por Deoclécio Deodato Diniz Neto, no período de 1976 a 1981, como parceiro rural, datado de 28.06.2005;
* Ficha de filiação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Franca, com admissão em 08.09.1976;
* Declaração de exercício de atividade rural do Sindicato dos Empregados Rurais de Franca, como trabalhador rural no período de 08.09.1976 a 30.01.1981, datada de 05.09.2005;
* Carteira de identificação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Franca, com data de filiação ilegível;
* Certidão expedida em 28.04.1997 pelo 1º Registro de Imóveis da Comarca de Franca, certificando ao propriedade rural em nome de Deoclécio Deodato Diniz;
Com efeito, as declarações firmadas pelo autor e por terceiros perante o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Franca, porém não homologadas pelo Ministério Público - nas quais se afirma que o postulante trabalhou como lavrador no estabelecimento denominado Fazenda Arvoredo, no período de 1976 a 1981 -, não podem ser consideradas como início de prova documental, equivalendo a simples depoimentos unilaterais reduzidos a termo e não submetidos ao crivo do contraditório. Estão, portanto, em patamar inferior à prova testemunhal colhida em juízo, por não garantirem a bilateralidade de audiência.
Os documentos, ainda, são extemporâneos à época dos fatos, porquanto subscritos em 28.06.2005 e 05.09.2005, pouco antes da propositura da ação, o que sugere que foram produzidos apenas com o intuito de instruir a inicial.
Os documentos indicando que os supostos ex-empregadores do autor eram proprietários de imóvel rural não têm aptidão para comprovar a alegada atividade agrícola do empregado, visto que não evidenciam a prestação de serviços, tampouco os interregnos em que ela teria ocorrido.
Ficha de filiação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Franca, SP, demonstra o exercício de labor agrícola pelo postulante.
Nesse ínterim, em que pese a documentação supra, amealhada pelo autor com o objetivo específico de atender à exigência, segundo as balizas estabelecidas pelos dispositivos que regem a matéria na Lei 8.213/91 e em parâmetros consolidados na jurisprudência, de necessidade de apresentação de indicativo material razoável do trabalho campesino, a limitação da força probante dos depoimentos tomados em audiência impõe o reconhecimento da procedência apenas parcial do pleito originalmente formulado.
Isso porque, apesar de a prova testemunhal (fls. 186) referir a existência de atividade rural, para a extensão por todo o período apontado na inicial a partir do documento trazido, de forma a atestar o reconhecimento do tempo de serviço nos termos em que pretendido, não tem toda a serventia reclamada, esbarrando na deficiência dos relatos colhidos pelo juízo a quo, os quais, na hipótese dos autos, de maneira demasiadamente vaga, informam acerca do labor rural desenvolvido pelo autor.
Insatisfeita, à toda evidência, a necessidade de comprovação do desempenho da função para fins de averbação na totalidade de tempo de serviço na condição de rurícola, reconhece-se como trabalhado, pois, nesse sentido, apenas o período devidamente corroborado pela prova testemunhal, correspondente, in casu, aos períodos de 08.09.1976 a 31.12.1976, já que a vagueza dos relatos não permite avançar o reconhecimento para além do indicativo material consubstanciado na qualificação como lavrador constante dos autos.
Por fim, com relação ao recolhimento de contribuições previdenciárias dos períodos não registrados, mister a observância do artigo 55, § 2°, da Lei n° 8.213/91, que preceitua: "O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o regulamento".
Desse dispositivo legal, depreende-se que a atividade rural desempenhada em data anterior a novembro de 1991 pode ser considerada para averbação do tempo de serviço, sem necessidade de recolhimento de contribuições previdenciárias, exceto para fins de carência.
A partir do advento da Lei 8.213/91, cabe ao segurado especial o recolhimento de contribuições previdenciárias facultativas, se pretender o cômputo do tempo de serviço rural para fins de obtenção de outros benefícios que não os arrolados no inciso I do artigo 39.
Nesse sentido, inclusive, a Súmula n.º 272 do Superior Tribunal de Justiça, que expressamente determina que o segurado especial somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço se recolher as contribuições facultativas.
Dessa forma, o reconhecimento de período posterior, sem contribuições previdenciárias facultativas, servirá somente para futura concessão de aposentadoria por idade ou por invalidez, auxílio-doença, auxílio-reclusão ou pensão, ficando vedado o aproveitamento do referido período para os demais fins previdenciários.
APOSENTADORIA ESPECIAL
Exigia-se para a concessão de aposentadoria especial, desde a Lei Orgânica da Previdência Social de 1960, o trabalho do segurado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos pelo menos, conforme a atividade profissional, em serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos. Ato do Chefe do Poder Executivo trataria de explicitar quais os serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
A Lei nº 8.213/91, em seus artigos 57 e 58, conservou o arquétipo legislativo originário, dispondo que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física seria objeto de lei própria.
O campo de aplicação dos agentes nocivos associava-se ao serviço prestado, chegando-se à atividade profissional e final classificação em serviço penoso, insalubre ou perigoso. O rol de agentes nocivos era exaustivo, mas exemplificativas as atividades listadas sujeitas à exposição pelo segurado.
Daí que para a concessão da aposentadoria especial era suficiente que o segurado comprovasse o exercício das funções listadas nos anexos trazidos pela lei. Também, é fato, porque impossível listar todas as atividades profissionais, perícia judicial era admitida para constatar que a atividade profissional do segurado, não inscrita nos anexos, classificava-se em perigosa, insalubre ou penosa. A jurisprudência assim caminhou, culminando com a edição da Súmula 198 do Tribunal Federal de Recursos.
Quiçá diante do aumento da concessão de aposentadorias, facilitado pelo caminho que o legislador, jurisprudência e súmula consagraram para a constatação de que a atividade profissional estava exposta a agentes nocivos prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado, veio a Lei nº 9.032, de 28 de abril de 1995. E alterou o modelo.
De ver que a redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 dispunha que "A aposentadoria especial será devida ... conforme a atividade profissional"; a Lei nº 9.032/95, por sua vez, estatuiu que "A aposentadoria especial será devida ... conforme dispuser a lei".
Os parágrafos 3º e 4º do referido artigo rematam a ideia:
A dizer que o simples enquadramento da atividade profissional, conforme o disposto nos anexos do decreto regulamentador - isto é, a concessão da aposentadoria especial com base na presunção de que certa categoria estaria sujeita a certo e correspondente agente nocivo - não mais era bastante. O segurado deveria comprovar, realmente, que estava exposto a agentes insalubres, penosos ou perigosos. E tal comprovação foi organizada pelo INSS por meio de formulário próprio, o SB 40.
Eficácia plena as alterações impostas pela Lei nº 9.032/95 somente alcançaram com o advento da MP 1.523/96, convertida na Lei nº 9.528, de 10 de dezembro de 1997. De modo a sacramentar a necessidade de efetiva exposição a agentes nocivos, prova a ser feita por meio de formulário e laudo.
A redação do artigo 58, com os devidos destaques:
E o Poder Executivo definiu a relação dos agentes nocivos por meio do Decreto nº 2.172/1997.
Do que se extrai o seguinte: funções exercidas até a promulgação da Lei nº 9.032/95, ou seja, até 28 de abril de 1995, suficiente o simples exercício da profissão, fazendo-se o enquadramento conforme o disposto nos anexos dos regulamentos; de 29 de abril até a publicação da Medida Provisória 1.523/96, ou seja, até 13 de outubro de 1996, fazia-se a prova da efetiva exposição por meio de formulário próprio; de 14 de outubro em diante necessários o formulário e correspondente laudo técnico. Síntese que leva em conta o período em que foram exercidas as atividades, de forma a que as modificações da legislação valham sempre para frente, pouco importando o requerimento posterior do benefício, cuidando-se de normas reguladoras dos meios de prova do direito previamente adquirido, atinentes, portanto, à forma, não à matéria.
USO DO EPI
Questão que surgiu dizia respeito a saber se a utilização de Equipamento de Proteção Individual (EPI) descaracterizaria o tempo de serviço especial prestado.
Antes da vigência da Lei nº 9.732/98, o uso do EPI não descaracterizava o enquadramento da atividade sujeita a agentes agressivos à saúde ou à integridade física. Tampouco era obrigatória, para fins de aposentadoria especial, a menção expressa à sua utilização no laudo técnico pericial.
Contudo, em relação às atividades exercidas a partir da data da publicação da Lei nº 9.732/98, é indispensável a elaboração de laudo técnico de que conste "informação sobre a existência de tecnologia de proteção coletiva ou individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo". Na hipótese de o laudo atestar expressamente a neutralização do agente nocivo, a utilização de EPI afastará o enquadramento do labor desempenhado como especial.
TEMPO ESPECIAL EM COMUM - CONVERSÃO
Com a Lei nº 6.887, de 10.12.1980, permitiu-se a conversão do tempo de serviço especial em comum e vice-versa; também a Lei nº 8.213/91, em sua redação original, por meio do § 3º de seu artigo 57; mais adiante, o acréscimo do parágrafo 5º ao artigo 57, pela Lei nº 9.032, de 18 de abril de 1995, expressamente permitia apenas a conversão do tempo especial em comum, vedando a conversão de tempo comum para especial.
Veio a Medida Provisória 1.663-10, de 28 de maio de 1998, e revogou expressamente o § 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, daí que não mais se admitia a conversão de atividade especial para comum. Também assim as Medidas Provisórias 1.663-11 e 1.663-12, mantendo a revogação e nada mais.
Outro rumo deu-se com a edição da Medida Provisória 1.663-13, de 26 de agosto de 1998, que, a par de nela ainda constar a revogação expressa do § 5º do artigo 57 (art. 31), trouxe nova disposição em seu artigo 28, no sentido de que o Poder Executivo estabeleceria critérios para a conversão do tempo de trabalho exercido até 28 de maio de 1998.
Tais critérios surgiram com o Decreto nº 2.782, de 14 de setembro de 1998, que nada mais fez senão permitir que fosse convertido em comum o tempo de trabalho especial exercido até 28 de maio de 1998, porém, desde que o segurado tivesse completado, até aquela data, pelo menos vinte por cento do tempo necessário para a obtenção da aposentadoria especial.
A MP 1.663-14, de 24 de setembro de 1998, manteve a redação do artigo 28, vindo, em 20 de novembro de 1998, a edição da Lei nº 9.711/98, que convalidou os atos praticados com base na Medida Provisória nº 1.663-14, de 24 de setembro de 1998. A Lei nº 9.718 também trouxe o texto do artigo 28, mas não revogou expressamente o parágrafo 5º do artigo 57 da lei nº 8.213/91.
Questão que surgiu, então, dizia respeito à manutenção ou não do parágrafo 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, porquanto não revogado categoricamente. Vale dizer, pretendia-se fazer uso da conversão do tempo especial em comum sem o limite determinado pela legislação, isto é, possível a conversão sem restrições, de modo a que o tempo de trabalho especial exercido após 28 de maio de 1998 também pudesse ser convertido em comum.
O Superior Tribunal de Justiça chegou a decidir a questão a favor do INSS. A propósito, ementa de acórdão da lavra da Ministra Laurita Vaz:
Não lograra êxito a tese de que o § 1º do artigo 201 da Constituição da República, com a redação dada pela EC nº 20/98, ao ressalvar a adoção de requisitos e critérios diferenciados para as atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, daria azo para que se entendesse que não somente o trabalho prestado até 28 de maio de 1998 pudesse ser convertido em comum.
Ganhara corpo o entendimento de que o teor do § 1º do artigo 201 não tem o poder de manter vigorante o § 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91. A Lei nº 9.711/98, quando convalidou a MP 1.663-14, que revogara o § 5º do artigo 57, teria acabado mesmo por revogar a regra que autorizava a conversão do tempo sem limitação temporal; ainda, nítida a oposição entre normas de igual hierarquia, o artigo 28 da Lei nº 9.711/98 e o § 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, daí que a norma posterior teria derrogado a anterior.
Não obstante, considerei outros elementos, sem confrontar o posicionamento firmado pelo Tribunal Superior.
Firmei meu juízo a partir da redação do § 1º do artigo 201: "É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar". Mais propriamente pela parte final do dispositivo, "nos termos definidos em lei complementar".
A Emenda Constitucional 20/98 dispôs em seu artigo 15: "Até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1º, da Constituição Federal, seja publicada, permanece em vigor o disposto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213/91, de 24 de julho de 1991, na redação vigente à data da publicação desta Emenda".
Há, ao que se vê, manifesta primazia dada pelo legislador constitucional aos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 e abandono da limitação imposta pelo artigo 28 da Lei nº 9.718/98. Sublinhe-se, escolha feita posteriormente à edição da Lei nº 9.711, esta de 20 de novembro de 1998, porquanto a Emenda Constitucional 20 data de 15 de dezembro de 1998.
O que significa que o regramento para a conversão do tempo especial em comum está nos artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios, se, até o momento, não houve a edição da necessária lei complementar.
A confirmar que assim deve ser concorrem o Decreto nº 4.827, de 3 de setembro de 2003, e a Instrução Normativa INSS/PRES nº 20, de 10 de outubro de 2007.
O artigo 1º do Decreto nº 4.827/2003 deu nova redação ao artigo 70 do Regulamento da Previdência Social. Antes, o caput do artigo 70 vedava expressamente a conversão de tempo de atividades sob condições especiais em tempo de atividade comum, com a ressalva do tempo trabalhado até 28 de maio de 1998. Com o Decreto 4.827 o artigo 70 passou a ter a seguinte redação:
Desaparece a vedação dando margem à conversão do tempo especial em comum, aplicando-se as regras de conversão ao trabalho prestado em qualquer período.
Não é outra a direção dada pela Instrução Normativa INSS/PRES nº 20, de 10 de outubro de 2007, ao estabelecer critérios a serem adotados pela área de Benefícios. Seu teor:
É de se notar sua necessária correlação com o Decreto 4.827/2003, também no sentido de ajustar-se à conversão sem limitação temporal. Vale destacar as expressões "conforme a legislação vigente à época da prestação do serviço" e "qualquer que seja o período trabalhado".
Resumindo: possibilidade da conversão do tempo especial em comum, sem a limitação temporal prevista no artigo 28 da Lei n° 9.711/98, ante o disposto no artigo 15, da EC 20/98, que determinou a adoção da disciplina prevista nos artigos 57 e 58, da Lei nº 8.213/91, até a edição de lei complementar.
Por fim, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de recurso especial representativo de controvérsia (recurso repetitivo), nos termos do artigo 543-C, §1º, do Código de Processo Civil, em 23.03.2011, decidiu a questão.
Assentou, por unanimidade, a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois, a partir da última edição da MP n° 1.663, parcialmente convertida na Lei n° 9.711/98, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido §5° do art. 57 da Lei n° 8.213/91.
Segue a ementa:
Pacificada, portanto, a matéria.
O CASO
O presente recurso diz respeito ao reconhecimento da especialidade das condições de trabalho no período:
- de 01.06.2001 a 01.04.2005, laborado na empresa Colifran Construções e Comércio Ltda., exercendo a função de varredor, no setor de varrição. O Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP (fls. 52-54) atesta que o autor desenvolvia a atividade de "varrer vias públicas utilizando-se de vassoura e pá, colocando o lixo dentro de carrinho com saco de lixo", ficando exposto a vento sol chuva e frio.
Referido interregno, todavia, não pode ser declarado como trabalhado em condições especiais, visto que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP não especifica os agentes nocivos a que o autor ficava exposto no exercício do labor, sendo impossível concluir-se pelo cumprimento da exigência contida nos Decretos n°s 53.831/64 e 83.080/79 no que tange às condições ambientais para o reconhecimento da natureza insalubre do labor.
Assim, somando-se com os períodos de tempo de serviço rural e comum, concluo que o segurado, até o advento da Emenda Constitucional 20, de 15.12.1998, soma 23 anos, 8 meses e 17 dias de tempo de serviço, insuficientes para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição proporcional.
Possuindo menos de 30 anos de tempo de serviço até a entrada em vigor da Emenda Constitucional n.º 20/98, necessária a submissão à regra de transição, a qual impõe limite de idade e o cumprimento de pedágio exigido em seu artigo 9º, inciso I e § 1º.
Isso porque, para os filiados ao Regime Geral da Previdência Social até a sua publicação, referida emenda constitucional estabeleceu requisitos que, se atendidos cumulativamente, possibilitam aposentadoria proporcional aos trinta anos até mesmo quando não atingido o limite de tempo em 15.12.1998, nos seguintes termos:
Considerando-se que, no período de 16.12.1998 a 17.06.2005, o autor contribuiu por 6 anos, 3 meses e 29 dias, não cumpriu o período adicional, que era de 8 anos, 9 meses e 18 dias, não obstante tenha preenchido o requisito da idade de 53 anos.
Em vista da sucumbência recíproca (artigo 21, caput, do Código de Processo Civil), cada parte terá o ônus de pagar os honorários advocatícios de seus respectivos patronos, bem assim dividir as custas processuais, respeitada a gratuidade conferida à autora e a isenção de que é beneficiário o réu.
Posto isso, dou parcial provimento à apelação e à remessa oficial, tida por interposta, para restringir o reconhecimento da atividade rural apenas no período de 08.09.1976 a 31.12.1976, observando-se o parágrafo 2º, do artigo 55 c.c. artigo 39, incisos I e II, da Lei nº 8.213/91, bem como para excluir o reconhecimento de exercício de atividade especial no período de 01.06.2001 a 01.04.2005, deixando de conceder a aposentadoria por tempo de contribuição. Revogo a tutela antecipada concedida. Fixada sucumbência recíproca.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
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