D.E. Publicado em 12/07/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento às apelações da autarquia e da parte autora, e não conhecer da remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0005986-54.2002.4.03.6107/SP
RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de ação ajuizada em 01/10/2002 por Luiz Paulo Zago em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social visando à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição desde a data de citação, mediante a declaração do tempo de serviço urbano exercido no período de julho/1968 a setembro/1975, bem como o reconhecimento da especialidade da atividade prestada no período de 10/04/78 a 15/07/96.
O requerimento de isenção de custas foi deferido (fls. 142), nos termos do art. 128 da Lei nº 8.213/91.
O Juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, para, reconhecendo o tempo de serviço urbano prestado no período de 17/07/68 a 17/09/75, condenar a autarquia à implantação do benefício de aposentadoria por tempo de serviço proporcional, a partir da citação, com o acréscimo de juros e correção monetária. Concedeu-se, ainda, a antecipação da tutela, para fins de implantação do benefício. Os honorários advocatícios foram fixados em 10% sobre o valor da condenação.
Inconformado, apelou o autor, sustentando que:
- o formulário DSS-8030 anexado a fls. 34 é claro ao descrever as atividades exercidas pelo apelante, bem como os serviços inerentes ao cargo ocupado;
- todas as atividades foram exercidas em estações ferroviárias, o que concede direito ao enquadramento por categoria profissional;
- o fato de a denominação do cargo não constar nominalmente dos Decretos Previdenciário não é óbice ao enquadramento, pois o rol de atividades é exemplificativo, e não exaustivo;
- foram anexados laudos solicitados pelo Sindicato da Categoria, que demonstram a existência da especialidade;
- o segurado não pode ser prejudicado pela ausência de laudo técnico pericial, pois o mesmo só foi exigido recentemente;
- não há sentido em se exigir laudo que, pela legislação da época, não era necessário para o reconhecimento da especialidade.
Também apelou o INSS, alegando que:
- para a comprovação do labor urbano, o autor juntou apenas Certidão de Funcionamento da Empresa Fotográfica e Certificado de Reservista;
- a Lei e a Jurisprudência são taxativos quanto à necessidade de comprovação de tempo de serviço mediante apresentação de documentos contemporâneos aos fatos, onde conste a data do início e o término da atividade, além de sua função, o que não se verifica em relação aos documentos juntados;
- há somente um documento relativo ao ano de 1970, sendo que o outro documento não prova o labor urbano, mas apenas a existência do estabelecimento;
- não é possível o reconhecimento de labor urbano sem registro em CTPS, e sem comprovação da atividade nos termos da lei e da jurisprudência;
A autarquia apresentou contrarrazões, afirmando que:
- a atividade exercida pelo apelante não se enquadra como especial;
- a legislação exige a exposição de forma permanente e habitual a fatores de risco, não ocasional nem intermitente;
- o formulário de fls. 34 atesta apenas os agentes agressivos intempéries e poeira, não havendo laudo pericial que ateste a existência dos fatores de risco;
- tais agentes agressivos se encontram na maioria dos locais de trabalho, o que não é suficiente para o reconhecimento da especialidade;
Por sua vez, em suas contrarrazões, assevera o autor que:
- diversamente do alegado pelo INSS, foram juntados documentos contemporâneos ao período de trabalho urbano, os quais corroborados por prova testemunhal;
- para a comprovação da atividade urbana, exige-se apenas começo ou indício de documento que leve a convicção do julgador;
- as fotografias tiradas à época servem também como início de prova material.
Submetida a sentença ao duplo grau de jurisdição, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
Inclua-se o presente feito em pauta de julgamento (art. 931, do CPC).
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0005986-54.2002.4.03.6107/SP
VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): No que se refere ao reconhecimento de tempo de serviço laborado em atividade urbana, dispõe o § 3º do artigo 55 da Lei 8.213/91, in verbis:
Da simples leitura do referido dispositivo legal, bem como da análise da legislação pertinente e da observância da jurisprudência dominante, depreende-se que para o reconhecimento do tempo de serviço é indispensável a existência de início de prova material, contemporânea à época dos fatos, corroborado por coerente e robusta prova testemunhal.
Faz-se mister, portanto, estabelecer-se o que vem a ser início de prova material e, para tanto, peço venia para transcrever a lição do saudoso Professor Anníbal Fernandes, in verbis:
No que se refere ao reconhecimento da atividade especial, a jurisprudência é pacífica no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do princípio tempus regit actum (Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.310.034-PR).
Quanto aos meios de comprovação do exercício da atividade em condições especiais, até 28/4/95, bastava a constatação de que o segurado exercia uma das atividades constantes dos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. O rol dos referidos anexos é considerado meramente exemplificativo (Súmula nº 198 do extinto TFR).
Com a edição da Lei nº 9.032/95, a partir de 29/4/95 passou-se a exigir por meio de formulário específico a comprovação da efetiva exposição ao agente nocivo perante o Instituto Nacional do Seguro Social.
A Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, ao incluir o § 1º ao art. 58 da Lei nº 8.213/91, dispôs sobre a necessidade da comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes nocivos à saúde do segurado por meio de laudo técnico, motivo pelo qual considerava necessária a apresentação de tal documento a partir de 11/10/96.
No entanto, a fim de não dificultar ainda mais o oferecimento da prestação jurisdicional, passei a adotar o posicionamento no sentido de exigir a apresentação de laudo técnico somente a partir 6/3/97, data da publicação do Decreto nº 2.172, de 5/3/97, que aprovou o Regulamento dos Benefícios da Previdência Social. Nesse sentido, quadra mencionar os precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça: Incidente de Uniformização de Jurisprudência, Petição nº 9.194/PR, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, 1ª Seção, j. em 28/5/14, v.u., DJe 2/6/14; AgRg no AREsp. nº 228.590, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Turma, j. em 18/3/14, v.u., DJe 1º/4/14; bem como o acórdão proferido pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais no julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal nº 0024288-60.2004.4.03.6302, Relator para Acórdão Juiz Federal Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves, j. 14/2/14, DOU 14/2/14.
Por fim, observo que o art. 58 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, em seu § 4º, instituiu o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), sendo que, com a edição do Decreto nº 4.032/01, o qual alterou a redação dos §§ 2º e 6º e inseriu o § 8º ao art. 68 do Decreto nº 3048/99, passou-se a admitir o referido PPP para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos. Ademais, verifico que, com o advento do Decreto nº 8.123/13, o referido artigo assim dispôs:
Devo salientar também que o laudo (ou PPP) não contemporâneo ao exercício das atividades não impede a comprovação de sua natureza especial, desde que não tenha havido alteração expressiva no ambiente de trabalho.
Ademais, se em data posterior ao trabalho realizado foi constatada a presença de agentes nocivos, é de bom senso imaginar que a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era menor à época do labor, haja vista os avanços tecnológicos e a evolução da segurança do trabalho que certamente sobrevieram com o passar do tempo.
Quadra ressaltar, por oportuno, que o PPP é o formulário padronizado, redigido e fornecido pela própria autarquia, sendo que no referido documento não consta campo específico indagando sobre a habitualidade e permanência da exposição do trabalhador ao agente nocivo, diferentemente do que ocorria nos anteriores formulários SB-40, DIRBEN 8030 ou DSS 8030, nos quais tal questionamento encontrava-se de forma expressa e com campo próprio para aposição da informação. Dessa forma, não me parece razoável que a deficiência contida no PPP possa prejudicar o segurado e deixar de reconhecer a especialidade da atividade à míngua de informação expressa com relação à habitualidade e permanência.
Vale ressaltar que o uso de equipamentos de proteção individual - EPI não é suficiente para descaracterizar a especialidade da atividade, a não ser que comprovada a real efetividade do aparelho na neutralização do agente nocivo, sendo que, em se tratando, especificamente, do agente ruído, não há, no momento, equipamento capaz de neutralizar a nocividade gerada pelo referido agente agressivo. Nesse sentido, quadra mencionar o julgamento realizado, em sessão de 4/12/14, pelo Plenário do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do E. Ministro Luiz Fux, no qual foram fixadas duas teses, in verbis:
Observo, ainda, que a informação registrada pelo empregador no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a eficácia do EPI não tem o condão de descaracterizar a sujeição do segurado aos agentes nocivos. Conforme tratado na decisão proferida pelo C. STF na Repercussão Geral acima mencionada, a legislação previdenciária criou, com relação à aposentadoria especial, uma sistemática na qual é colocado a cargo do empregador o dever de elaborar laudo técnico voltado a determinar os fatores de risco existentes no ambiente de trabalho, ficando o Ministério da Previdência Social responsável por fiscalizar a regularidade do referido laudo. Ao mesmo tempo, autoriza-se que o empregador obtenha benefício tributário caso apresente simples declaração no sentido de que existiu o fornecimento de EPI eficaz ao empregado.
Notório que o sistema criado pela legislação é falho e incapaz de promover a real comprovação de que o empregado esteve, de fato, absolutamente protegido contra o fator de risco. A respeito, é precisa a observação do E. Ministro Luís Roberto Barroso, ao sustentar que "considerar que a declaração, por parte do empregador, acerca do fornecimento de EPI eficaz consiste em condição suficiente para afastar a aposentadoria especial, e, como será desenvolvido adiante, para obter relevante isenção tributária, cria incentivos econômicos contrários ao cumprimento dessas normas" (Normas Regulamentadoras relacionadas à Segurança do Trabalho).
Exata, ainda, a manifestação do E. Ministro Marco Aurélio, ao invocar o princípio da primazia da realidade, segundo o qual uma verdade formal não pode se sobrepor aos fatos que realmente ocorrem - sobretudo em hipótese na qual a declaração formal é prestada com objetivos econômicos.
Logo, se a legislação previdenciária cria situação que resulta, na prática, na inexistência de dados confiáveis sobre a eficácia ou não do EPI, não se pode impor ao segurado - que não concorre para a elaboração do laudo, nem para sua fiscalização - o dever de fazer prova da ineficácia do equipamento de proteção que lhe foi fornecido. Caberá, portanto, ao INSS o ônus de provar que o trabalhador foi totalmente protegido contra a situação de risco, pois não se pode impor ao empregado - que labora em condições nocivas à sua saúde - a obrigação de suportar individualmente os riscos inerentes à atividade produtiva perigosa, cujos benefícios são compartilhados por toda a sociedade.
Ressalto, adicionalmente, que a Corte Suprema, ao apreciar a Repercussão Geral acima mencionada, afastou a alegação, suscitada pelo INSS, de ausência de prévia fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial. O E. Relator, em seu voto, deixou bem explicitada a regra que se deve adotar ao afirmar: "Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, pois existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria especial da figura do incentivo (art. 22, II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não consubstancia a concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88). Corroborando o supra esposado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal considera que o art. 195, § 5º, da CRFB/88, contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela própria constituição".
Com relação à conversão de tempo especial em comum, parece de todo conveniente traçar um breve relato de sua evolução histórica na ordenação jurídica brasileira.
Inicialmente, observo que a aposentadoria especial foi instituída pelo art. 31 da Lei nº 3.807, de 26/8/60 (Lei Orgânica da Previdência Social).
A Lei nº 6.887/80 acrescentou o § 4º ao art. 9º, da Lei nº 5.890/73, dispondo: "O tempo de serviço exercido alternadamente em atividades comuns e em atividades que, na vigência desta Lei, sejam ou venham a ser consideradas penosas, insalubres ou perigosas, será somado, após a respectiva conversão segundo critérios de equivalência a serem fixados pelo Ministério da Previdência Social, para efeito de aposentadoria de qualquer espécie."
Após diversas alterações legislativas, a Lei nº 8.213/91 dispôs sobre a aposentadoria especial em seus artigos 57 e 58.
A possibilidade de conversão do tempo especial em comum havia sido revogada pela edição do art. 28, da Medida Provisória nº 1.663 de 28/5/98. No entanto, o referido dispositivo legal foi suprimido quando da conversão na Lei nº 9.711/98, razão pela qual, forçoso reconhecer que permanece em vigor a possibilidade dessa conversão. Ademais, a questão ficou pacificada com a edição do Decreto nº 4.827, de 3/9/03, que incluiu o § 2º ao art. 70 do Decreto nº 3.048/99, estabelecendo que "As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período." Nesse sentido, cabe ressaltar que o C. Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento no sentido de ser possível a conversão de tempo especial em comum no período anterior a 1º/1/81, bem como posterior à edição do art. 28, da Medida Provisória nº 1.663 de 28/5/98.
A questão relativa ao fator de conversão foi objeto de julgamento pelo C. Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.151.363/MG (2009/0145685-8). O E. Relator Ministro Jorge Mussi, em seu voto, bem explicitou a regra que se deve adotar ao asseverar: "Importa notar que a legislação em vigor na ocasião da prestação do serviço regula a caracterização e a comprovação da atividade sob condições especiais, conforme dispõe o § 1º supra. Ou seja, observa-se o regramento da época do trabalho para a prova da exposição aos agentes agressivos à saúde: se pelo mero enquadramento da atividade nos anexos dos Regulamentos da Previdência, se mediante as anotações de formulários do INSS ou, ainda, pela existência de laudo assinado por médico do trabalho. Diversamente, no tocante aos efeitos da prestação laboral vinculada ao Sistema Previdenciário, a obtenção de benefício fica submetida às regras da legislação em vigor na data do requerimento. Por essa razão, o § 2º deixa expresso que as regras de conversão do art. 70 aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período. Isso é possível porque a adoção deste ou daquele fator de conversão depende, tão somente, do tempo de contribuição total exigido em lei para a aposentadoria integral, ou seja, deve corresponder ao valor tomado como parâmetro, numa relação de proporcionalidade, o que corresponde a um mero cálculo matemático. Explica-se: O fator de conversão é o resultado da divisão do numero máximo de tempo comum (35 para homem e 30 para mulher) pelo número máximo de tempo especial (15, 20 e 25). Ou seja, o fator a ser aplicado ao tempo especial laborado pelo homem para convertê-lo em comum será 1,40, pois 35/25=1,40. Se o tempo for trabalhado por uma mulher, o fator será de 1,20, pois 30/25=1,20. Se o tempo especial for de 15 ou 20 anos, a regra será a mesma. Trata-se de regra matemática pura e simples e não de regra previdenciária. Observando-se os Decretos ns. 53.831/1964 e 83.080/1979, os quais traziam a lista de agentes nocivos e atividades insalubres, extrai-se a informação de que, em ambos os decretos, o tempo máximo de exposição aos agentes a que esteve exposto o recorrido (ruído e frio) era de 25 anos. Todavia, o tempo de serviço comum, para efeito de aposentadoria, constante daqueles decretos, era de, no máximo, 30 anos; portanto, o fator de conversão utilizado nessa hipótese era de 1,2. Destarte, o índice de 1,2 para conversão de tempo especial em aposentadoria comum com 30 anos de contribuição e o índice de 1,4 em relação à aposentadoria com 35 anos têm a mesma função. Converter para comum o tempo de serviço especial relativo à atividade com limite de 25 anos utilizando o fator de 1,2 seria prejudicial ao segurado (homem), porquanto a norma de regência exige, como tempo de contribuição, os 35 anos, como é de notório conhecimento.(...) Nesse contexto, com a alteração dada pelo Decreto n. 4.827/2003 ao Decreto n. 3.048/99, a Previdência Social, na via administrativa, passou a converter os períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época pelas novas regras da tabela definida no artigo 70, que, para o tempo de serviço especial correspondente a 25 anos utiliza como fator de conversão, para homens, o multiplicador 1, 40. É o que se denota do artigo 173 da Instrução Normativa n. 20/2007". (grifos meus)
Quanto à aposentadoria por tempo de contribuição, para os segurados que cumpriram os requisitos anteriormente à vigência da Emenda Constitucional nº 20/98, devem ser observadas as disposições dos artigos 52 e 53, da Lei nº 8.213/91, em atenção ao princípio tempus regit actum:
Havendo a necessidade de utilização do período posterior à referida Emenda, deverão ser observadas as alterações realizadas pela referida Emenda aos artigos 201 e 202 da Constituição Federal de 1988, que extinguiu a aposentadoria proporcional por tempo de serviço no âmbito do regime geral de previdência social.
Transcrevo o §7º do art. 201 da Carta Magna com a nova redação:
Por sua vez, o art. 9º de referida Emenda criou uma regra de transição, ao estabelecer:
Contudo, no que tange à aposentadoria integral, cumpre ressaltar que, na redação do Projeto de Emenda à Constituição, o inciso I do §7º do art. 201, da Constituição Federal, associava tempo mínimo de contribuição (35 anos, para homem e 30 anos, para mulher) à idade mínima de 60 anos e 55 anos, respectivamente. Não sendo aprovada a exigência da idade mínima quando da promulgação da Emenda nº 20, a regra de transição para a aposentadoria integral restou inócua, uma vez que, no texto permanente (art. 201, §7º, inc. I), a aposentadoria integral será concedida levando-se em conta somente o tempo de contribuição.
Quadra mencionar que, havendo o cômputo do tempo de serviço posterior a 28/11/99, devem ser observados os dispositivos constantes da Lei nº 9.876/99 no que se refere ao cálculo do valor do benefício, consoante o julgamento realizado, em 10/9/08, pelo Tribunal Pleno do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário nº 575.089, de Relatoria do Exmo. Ministro Ricardo Lewandowski.
Passo à análise do caso concreto.
In casu, a parte autora visa comprovar o exercício de atividade urbana prestada para empresa "Foto Rápido 5 Minutos" no período de julho/1968 a setembro/1975, tendo juntado aos autos os seguintes documentos:
1. Certidão da Prefeitura Municipal de Araçatuba, expedida em 14/12/95, em que é atestado que "A contribuinte Virginia Centenaro, estabelecida à Rua Duque de Caxias, 161-A, nesta cidade de Araçatuba, com atividade de fotografias rápidas de 5 minutos, iniciou suas atividades em 20.03.67, conforme requerimento nº 1.378/67. Tendo encerrado em 30/06/77 conforme requerimento nº 9.310/77." (fls. 28);
2. Certificado de Reservista, datado de 10/12/70, em que consta que o autor exercia a profissão de "Fotógrafo" (fls. 29);
3. Fotografias antigas, em "preto e branco", retratando pessoas em frente ao estabelecimento "Foto 5 Minutos" (fls. 30/31).
Com relação à prova testemunhal produzida, cumpre-me observar o quanto segue:
1. O Sr. Rubens Rosa afirmou: "moro em Araçatuba desde 1960, aproximadamente. Atualmente, estou aposentado, mas fui vendedor comercial. Conheço o autor, porque ele trabalhou com minha sogra, Virgínia Centenário, que era dona de uma loja 'Foto 5 Minutos'. O autor era funcionário único da loja. Essa loja durou aproximadamente entre dez e quinze anos. O autor também trabalhou, recentemente, fazendo companhia, um senhor idoso que morava próximo à minha casa. O autor chegou a tirar foto minha. As fotos que ele tirava eram para documentos, 3x4." (fls. 178). Também informou que "não reconhece as pessoas constantes das fotos de fls. 30/31; o local é a loja ('Foto') de minha sogra, que é falecida há cerca de dez anos." (fls. 178).
2. A Srª. Aglacir dos Santos Leite Rosa afirmou: "sou filha de Virgínia Centenário, que era dona de uma loja 'Foto 5 Minutos', que ficava, inicialmente, na Rua Princesa Izabel e depois mudou-se para a Rua Duque de Caxias. Essa loja durou 'muitos anos', porque minha mãe mexia com salão de beleza e com o 'Foto', onde eram tiradas fotos para documentos, apenas 3x4. Quem trabalhava no Foto eram minha mãe e o autor. A máquina era fácil de lidar, mas as fotos 'saiam horríveis'. O autor trabalhou nessa loja, desde 1968, porque me casei nessa mesma época, até 1975, aproximadamente. O autor saiu da loja porque o movimento 'caiu' e ele foi trabalhar na 'Ferrovia'; além disso, nós queríamos que minha mãe parasse de trabalhar, tendo em vista que os 'líquidos' que havia na máquina eram 'muito fortes', faziam mal. O autor era funcionário, ganhava salário, mas não sei se ele era registrado. A depoente não sabe dizer quem são as pessoas constantes nas fotos de fls. 30/31, acha que um deles, o de cabelos compridos, é Paulo, mas não tem certeza" (fls. 180). Declarou, também, que "nas fotos mencionadas acima, reconhece o local onde funcionava o 'Foto', na Rua Duque de Caxias" (fls. 180).
Diante deste contexto, entendo cabível o reconhecimento da atividade urbana.
O Certificado de Reservista, datado de 10/12/70, descreve que o autor exercia a profissão de Fotógrafo, e constitui início de prova material. A certidão de fls. 28, apesar de nada dizer a respeito da profissão do autor, revela que verdadeiramente existia a empresa na qual o autor alega ter sido empregado (Foto 5 Minutos), demonstrando, ainda, que o estabelecimento pertencia à Srª. Virginia Centenaro.
Por sua vez, as testemunhas, parentes da proprietária da empresa Foto 5 Minutos - tratando-se, portanto, de pessoas próximas aos fatos -, relataram que o autor era empregado único do estabelecimento, confirmando que o mesmo exerceu a atividade de fotógrafo. Registro que os depoimentos se mostraram consistentes e dignos de credibilidade.
Quanto às fotos de fls. 30/31, não há como afirmar, com segurança, se a pessoa retratada em frente ao estabelecimento Foto 5 minutos é ou não o autor, apesar de certas semelhanças físicas. Não obstante, as testemunhas confirmaram que se tratava do estabelecimento de propriedade da Srª Virginia Centenaro.
Ademais, não procede a alegação da autarquia de que a comprovação de atividade urbana deve ser feita por documento em que conste data de início e término da atividade, admitindo a lei e a jurisprudência o reconhecimento do labor urbano com base em início de prova material aliado a prova testemunhal. Neste sentido:
Desta forma, havendo, no presente caso, início de prova material corroborado por prova testemunhal idônea, não merece acolhida o apelo do INSS.
Vale dizer que, em se tratando de segurado empregado, compete ao empregador o recolhimento das contribuições previdenciárias, conforme dispõe o artigo 30, inciso I, alíneas "a" e "b", da Lei nº 8.212/91, enquanto àquele somente cabe o ônus de comprovar o exercício da atividade laborativa, o que ocorreu no caso vertente.
Observo, contudo, que a sentença merece ser parcialmente reformada com relação ao período reconhecido.
Conforme se extrai do Certificado de Reservista de fls. 29, o autor foi matriculado perante as Forças Armadas em 13/07/70 e licenciado em 10/12/70. Logo, incabível o reconhecimento do labor urbano neste interstício.
Assim, impõe-se a reforma da sentença, para que o reconhecimento da atividade urbana ocorra em relação aos períodos de 17/07/68 a 12/07/70 e 11/12/70 a 17/09/75.
No tocante à pretensão de reconhecimento do caráter especial da atividade prestada no período de 10/04/78 a 15/07/96, apresenta o autor formulário DSS-8030 com as seguintes informações:
1) Período: 10/04/78 a 15/07/96
Empresa: Ferrovia Novoeste S.A.
Atividades/funções: Agente de estação
Agente(s) nocivo(s): Intempéries e poeira, e serviços de telefonia.
Provas: Formulário DSS-8030 de fls. 34.
Enquadramento legal: Códigos 2.4.3 e 2.4.5 do Decreto nº 53.831/64.
Registro que a empresa não possuía laudo técnico com relação à atividade exercida pelo autor.
Assim, a questão que ora se põe cuida de saber se a função de agente de estação pode ser reconhecida como especial por meio de enquadramento por categoria profissional.
No formulário apresentado, as atividades exercidas pelo autor na função de agente de estação são assim descritas: "COORDENOU E EXECUTOU OPERAÇÕES REFERENTES A TROCA DE STAFF (APARELHO ELÉTRICO DE TELEFONIA), APARELHO DE SELETIVO, OPERAÇÃO DE CRUZAMENTO NO PÁTIO (EXECUTAR MANOBRAS NOS CRUZAMENTOS - OPERAÇÃO CHAVES DE MUDANÇA DE VIA), ORIENTAÇÃO E EXECUÇÃO DE MANOBRAS NO PÁTIO, CORTES DE VEÍCULOS, CONFERÊNCIA DE VAGÕES, ACOMPANHAMENTO DO SERVIÇO DE FORMAÇÃO DE TRENS, CONTROLE DE DESPACHO DE MERCADORIA" (fls. 34).
Como se extrai do trecho transcrito, o autor, em sua função de agente de estação, acumulava diversos tipos de atividades de naturezas distintas. Entre suas principais responsabilidades, o autor operava equipamentos de telefonia, bem como orientava e executava atividades de manobras de veículos na linha férrea.
Destaco que, consoante sólido entendimento jurisprudencial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região - que entendo merecer acolhida -, a função de agente de estação deve ser reconhecida como especial, em razão da execução de atividades de telefonia, que submetem o trabalhador a fatores de risco, conforme se extrai dos precedentes que ora colaciono:
Devido notar que, no presente caso, o próprio formulário DSS-8030 apresentado, ao descrever os agentes nocivos, indica expressamente que o autor encontrava-se exposto "às intempéries e poeira e serviços de telefonia" (fls. 34, grifos meus).
Outrossim, segundo a jurisprudência desta E. Corte, a atividade de manobrador possui natureza especial, por similaridades às funções descritas no Código 2.4.3 do Decreto nº 53.831/64 (Transporte Ferroviário: Maquinistas, guarda-freios, trabalhadores na via permanente):
Note-se que o autor, entre suas atividades, realizava operações assim descritas: "OPERAÇÃO DE CRUZAMENTO NO PÁTIO (EXECUTAR MANOBRAS NOS CRUZAMENTOS - OPERAÇÃO CHAVES DE MUDANÇA DE VIA), ORIENTAÇÃO E EXECUÇÃO DE MANOBRAS NO PÁTIO, CORTES DE VEÍCULOS, CONFERÊNCIA DE VAGÕES, ACOMPANHAMENTO DO SERVIÇO DE FORMAÇÃO DE TRENS, CONTROLE DE DESPACHO DE MERCADORIA" (fls. 34).
Desta forma, cabível o reconhecimento do caráter especial da função de agente de estação por meio de enquadramento por categorial profissional, de acordo com o previsto nos Códigos 2.4.3 e 2.4.5 do Decreto nº 53.831/64, na medida de que se trata de cargo em que há o acúmulo de diferentes atividades de caráter especial (telefonista e manobrador).
Ressalto, contudo, que só é cabível o enquadramento até a data de 28/04/95, quando passou a ser exigida a comprovação de efetiva exposição a agentes nocivos.
Quanto à habitualidade da exposição, esclareço que o formulário DSS-3080 apresentado declara que o autor "estava exposto aos agentes nocivos de modo habitual e permanente" (fls. 34). Ainda que assim não fosse, "A exigência de habitualidade e permanência da exposição sob agentes nocivos somente foi trazida pela Lei 9.032/95" (AgRg no AREsp nº 8.440/PR, Sexta Turma, Rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira, v.u., j. 27/08/13, DJe 09/09/13).
Logo, deve ser reconhecida a especialidade da atividade exercida no período de 10/04/78 a 28/04/95.
Quanto ao tempo de atividade, observo que, convertendo o período especial declarado nos presentes autos em comum (10/04/78 a 28/04/95) e somando-o aos demais períodos trabalhados (fls. 43), perfaz o requerente o total de 38 anos, 1 mês e 26 dias de tempo de serviço até 16/12/98, fazendo, portanto, jus à obtenção de aposentadoria por tempo de serviço integral de acordo com as regras vigentes anteriormente à entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 20/98.
Deixo de me pronunciar sobre o termo inicial e consectários legais, à míngua de recurso das partes sobre tais matérias.
Por fim, o § 3º do art. 496 do CPC, de 2015, dispõe não ser aplicável a remessa necessária "quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a: I) 1.000 (mil) salários mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público".
No tocante à aplicação imediata do referido dispositivo, peço vênia para transcrever os ensinamentos do Professor Humberto Theodoro Júnior, na obra "Curso de Direito Processual Civil", Vol. III, 47ª ed., Editora Forense, in verbis:
Observo que o valor da condenação não excede a 1.000 (um mil) salários mínimos, motivo pelo qual a R. sentença não está sujeita ao duplo grau obrigatório.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS para restringir o reconhecimento do tempo de serviço urbano aos períodos de 17/07/68 a 12/07/70 e 11/12/70 a 17/09/75, dou parcial provimento à apelação da parte autora para reconhecer a atividade especial no período de 10/04/78 a 28/04/95 e conceder a aposentadoria por tempo de serviço integral e não conheço da remessa oficial.
É o meu voto.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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