Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5693927-70.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
06/11/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 08/11/2019
Ementa
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA IDOSA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS
LEGAIS.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- Cumpre ressaltar, primeiramente, que, o fato de o autor ser estrangeiro não é impeditivo ao
recebimento do benefício pleiteado, nos termos do art. 5º da Constituição Federal/88.
III- In casu, despicienda qualquer discussão quanto ao atendimento do requisito etário porquanto
os documentos acostados aos autos comprovam inequivocamente a idade avançada da parte
autora (77 anos) à época do ajuizamento da ação, em 23/11/15.
IV- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, o requisito da miserabilidade encontra-
se demonstrado no presente feito. Observa-se que o estudo social (elaborado em 24/10/18, data
em que o salário mínimo era de R$954,00), demonstra que o autor, paraguaio, com 79 anos de
idade à época, reside com sua esposa, brasileira, com 56 anos, sua filha Mabel, brasileira, com
22 anos, seu filho Daniel, brasileiro, com 18 anos, e com seu neto Tiago, com 10 anos, em casa
própria, adquirida há aproximadamente 10 anos, de madeira, com piso em cerâmica, sem forro,
pintada, composta por três quartos, sala, cozinha e banheiro, guarnecida por móveis simples e de
uso diário, em razoável estado de conservação e higiene. A renda mensal familiar é composta
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
unicamente pelo valor aproximado de R$1.000,00, recebido por seu filho, com o trabalho de
ajudante de pedreiro. Há, ainda, informação de que a esposa do autor recebeu auxílio doença por
um período, tendo sido o benefício interrompido há cerca de um ano. A filha Mabel realiza alguns
“bicos” esporadicamente em festas de aniversário, no entanto, não soube precisar o valor que
recebe. O casal possui outros quatro filhos, todos casados, que auxiliam o requerente com
alimentação, na medida do possível. A família recebe, ainda, R$40,00 proveniente do Programa
Bolsa Família e também uma cesta de alimentos da Igreja Católica. Possuem despesas mensais
de R$64,09 em água, R$133,71 em energia elétrica e, quanto à alimentação, não souberam
informar, já que adquirem aos poucos. O requerente relatou que “sofre com problemas no
coração (já foi submetido a processo cirúrgico), é hipertenso, sofre com problema de hérnia,
necessitando realizar cirurgia. Realiza acompanhamento médico no AME (Ambulatório Médico de
Especialidades) em Tupã – SP sempre que agendado”. Asseverou, ainda, a assistente social que
“A família apresenta precárias condições para suprir as necessidades básicas, principalmente em
relação à alimentação”.
V- O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação (19/1/16), na ausência de
pedido na esfera administrativa, conforme jurisprudência pacífica do C. STJ (REsp nº
828.828/SP, 5ª Turma, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 6/6/06, v.u., DJ 26/6/06).
VI- A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros
moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora. Com relação aos índices
de atualização monetária e taxa de juros, deve ser observado o julgamento proferido pelo C.
Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947.
VII- A verba honorária fixada à razão de 10% sobre o valor da condenação remunera
condignamente o serviço profissional prestado, nos termos do art. 85 do CPC/15 e precedentes
desta Oitava Turma. No que se refere à sua base de cálculo, considerando que o direito pleiteado
pela parte autora foi reconhecido somente no Tribunal, passo a adotar o posicionamento do C.
STJ de que os honorários devem incidir até o julgamento do recurso nesta Corte, in verbis: "Nos
termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça, o marco final da verba honorária deve
ser o decisum no qual o direito do segurado foi reconhecido, que no caso corresponde ao
acórdão proferido pelo Tribunal a quo." (AgRg no Recurso Especial nº 1.557.782-SP, 2ª Turma,
Relator Ministro Mauro Campbell Marques, j. em 17/12/15, v.u., DJe 18/12/15).
VIII- Deve ser deferida a antecipação dos efeitos do provimento jurisdicional final, já sob a novel
figura da tutela de urgência, uma vez que evidenciado nos presentes autos o preenchimento dos
requisitos do art. 300, do CPC/15.
IX- Apelação provida. Tutela de urgência concedida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5693927-70.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: LEOPOLDO OVELAR SARTORIO
Advogado do(a) APELANTE: DANIEL ANDRADE PINTO - SP331285-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5693927-70.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: LEOPOLDO OVELAR SARTORIO
Advogado do(a) APELANTE: DANIEL ANDRADE PINTO - SP331285-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social visando à concessão do
benefício previsto no art. 203, inc. V, da Constituição Federal de 1988, sob o fundamento de ser
pessoa idosa e não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua
família. Requer a concessão do benefício a partir da data da citação.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo julgou improcedente o pedido, sob o fundamento de que não ficou constatada a
miserabilidade.
Inconformada, apelou a parte autora, alegando em síntese:
- ter preenchido os requisitos exigidos para a concessão do benefício requerido, devendo ser
julgado procedente o pedido.
A parte autora, requer, ainda, a concessão da tutela de urgência.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pelo desprovimento da apelação.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5693927-70.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: LEOPOLDO OVELAR SARTORIO
Advogado do(a) APELANTE: DANIEL ANDRADE PINTO - SP331285-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Dispõe o art.
203, inc. V, da Constituição Federal, in verbis:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I -a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II -o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III -a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV -a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua
integração à vida comunitária;
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família, conforme dispuser a lei." (grifos meus)
Para regulamentar o dispositivo constitucional retro transcrito, foi editada a Lei nº 8.742 de
7/12/1993.
Cumpre ressaltar, ainda, que em 8/12/95 sobreveio o Decreto nº 1.744 regulamentando a Lei da
Assistência Social supramencionada.
Da leitura dos dispositivos legais, depreende-se que o benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF
é devido à pessoa portadora de deficiência ou considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que
não possua meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família.
Com relação ao requisito etário, observo que a idade de 70 (setenta) anos prevista no caput do
art. 20, da Lei nº 8.742/93, foi reduzida para 67 (sessenta e sete), conforme a Lei nº 9.720/98 e,
posteriormente, para 65 (sessenta e cinco), nos termos do art. 34 da Lei nº 10.741/2003.
No tocante ao segundo requisito, qual seja, a comprovação de a parte autora não possuir meios
de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, o Plenário do C. Supremo
Tribunal Federal, em sessão de 27/8/1998, havia julgado improcedente o pedido formulado na
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF, considerando constitucional o § 3º, do art. 20,
da Lei nº 8.742/93.
No entanto, o referido Plenário, em sessão de 18/4/2013, apreciando o Recurso Extraordinário nº
567.985/MT, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do mencionado
§ 3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/93, nos termos do voto do E. Ministro Gilmar Mendes, in verbis:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo
Tribunal Federal na ADI 1.232.
Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que 'considera-se incapaz de prover a manutenção da
pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4
(um quarto) do salário mínimo'.
O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal
declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei
10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que
criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro
a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações
socioeducativas.
O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
(STF, Recurso Extraordinário nº 567.985/MT, Plenário, Relator para acórdão Ministro Gilmar
Mendes, j. em 18/4/13)
Asseverou o E. Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, que "o critério de ¼ do salário mínimo
utilizado pela LOAS está completamente defasado e mostra-se atualmente inadequado para aferir
a miserabilidade das famílias que, de acordo com o art. 203, V, da Constituição, possuem o
direito ao benefício assistencial."
Quadra mencionar, adicionalmente, que o C. Superior Tribunal de Justiça também analisou a
questão da miserabilidade por ocasião do julgamento proferido no Recurso Especial Repetitivo
Representativo de Controvérsia nº 1.112.557-MG (2009/0040999-9), in verbis:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe
que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de
deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua
renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o
acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente ao cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior
a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar
7. Recurso Especial provido."
(STJ, REsp. nº 1.112.557/MG, 3ª Seção, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/09,
v.u., DJ 20/11/09)
Dessa forma, pacificou-se o entendimento no sentido de que a comprovação de a parte autora
possuir (ou não) meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família deve
ser analisada pelo magistrado, em cada caso, de acordo com as provas apresentadas nos autos.
Outrossim, nos termos do art. 34, do Estatuto do Idoso, deve-se descontar outro benefício no
valor de um salário mínimo já concedido a qualquer membro da família, para fins de cálculo da
renda familiar per capita a que se refere a LOAS.
Embora a lei refira-se a outro benefício assistencial, nada impede que se interprete a lei
atribuindo-se à expressão também o sentido de benefício previdenciário, de forma a dar-se
tratamento igual a casos semelhantes. A avaliação da hipossuficiência tem caráter puramente
econômico, pouco importando o nomen juris do benefício recebido: basta que seja no valor de um
salário mínimo. É o que se poderia chamar de simetria ontológica e axiológica em favor de um ser
humano que se ache em estado de penúria equivalente à miserabilidade de outrem.
Nesse sentido, aliás, já decidiu essa E. Terceira Seção conforme ementa abaixo transcrita, in
verbis:
"EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INVÁLIDA. CUMPRIMENTO DOS
REQUISITOS LEGAIS. PREVALÊNCIA DO VOTO VENCEDOR.
I - A extensão dos embargos é adstrita aos limites da divergência que, no caso dos autos, recai
unicamente sobre a verificação da hipossuficiência econômica da parte autora.
II - É de se manter a concessão do benefício assistencial à autora, hoje com 61 anos, total e
definitivamente incapaz para o trabalho, que vive com uma filha e o marido, já idoso, o qual
percebe aposentadoria no valor de um salário mínimo.
III - As testemunhas ouvidas afirmam enfaticamente que a autora reside em casa muito simples e
faz uso diário de medicamentos.
IV - O rigor na aplicação da exigência quanto à renda mínima, tornaria inócua a instituição desse
benefício de caráter social, tal o grau de penúria em que se deveriam encontrar os beneficiários,
além do que, faz-se necessário descontar o benefício de valor mínimo, a que teria direito a parte
autora, para o cálculo da renda mensal per capita.
V - O conceito de unidade familiar foi esclarecido com a nova redação do § 1º do artigo 21 da Lei
nº 9.720/98, que remete ao art. 16 da Lei nº 8.213/91.
VI - Há no conjunto probatório, elementos que induzem à convicção de que a autora está entre o
rol dos beneficiários descritos na legislação.
VII - Embargos infringentes não providos."
(EAC nº 2002.03.099.026301-6, Rel. Des. Federal Marianina Galante, j. em 22/9/04, DJU de
05/10/04, grifos meus)
Passo à análise do caso concreto.
In casu, cumpre ressaltar, primeiramente, que, o fato de o autor ser estrangeiro não é impeditivo
ao recebimento do benefício pleiteado, nos termos do art. 5º da Constituição Federal/88.
Nesse sentido, trago o seguinte precedente, in verbis:
"DIREITO ASSISTENCIAL. BENEFÍCIO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. ART. 203, V, DA CF/88.
MATÉRIA PRELIMINAR. CONDIÇÃO DE POBREZA NÃO DEMONSTRADA. AUSÊNCIA DE UM
DOS REQUISITOS ENSEJADORES DA CONCESSÃO DO AMPARO.
- Sentença condicionada ao reexame necessário. Condenação excedente a 60 (sessenta)
salários mínimos.
- A condição de estrangeiro não impede a concessão de benefício previdenciário de prestação
continuada, pois, de acordo com o artigo 5º da Constituição Federal é assegurado ao estrangeiro,
residente no país, o gozo dos direitos e garantias individuais em igualdade de condição com o
nacional. - Precedentes jurisprudenciais.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Requisito para a implementação do benefício de amparo assistencial não satisfeito; família
detentora de condições econômicas de prover a manutenção.
- Estudo social que demonstra inexistência de miserabilidade.
- Beneficiário da assistência judiciária gratuita, descabe a condenação do autor ao pagamento da
verba honorária e custas processuais. Precedentes da Terceira Seção desta Corte.
- Remessa oficial e apelação do INSS providas, para reformar a sentença e julgar improcedente o
pedido, revogando a tutela anteriormente concedida."
(TRF- 3ª Região, AC n.º 2004.61.04.006571-1, Rel. Des. Federal Therezinha Cazerta, Oitava
Turma, v.u., DJF3 CJ2 de 12/1/10)
Ainda, conforme bem asseverou o I. Representante do Parquet Federal, em seu parecer, “No
caso em apreço, há prova documental (ID n° 65511588) de que o postulante reside no Brasil com
a família desde 29.1.2008, como demostra contrato particular de venda e compra de imóvel,
portanto há mais de dez anos, donde se dessume que se trata de pessoa integrada à
comunidade nacional, e que hoje tem 80 anos. Ora, se ele vem vivendo no país, com prazo de
estada de residência regular indeterminado (ID n° 6551690), não é justo e nem plausível, num
Estado que projeta a construção de uma sociedade livre, justa e SOLIDÁRIA, submissa aos
princípios da dignidade da pessoa humana e da prevalência dos direitos humanos, voltada à
promoção do bem-estar de todos, sem discriminação, seja ele, nessa idade e diante das
circunstâncias de integração encimadas, deixado ao desabrigo, sem a garantia de um mínimo
existencial. Isto não é admissível, à luz de nossa Carta de Direitos, mormente considerados os
fatores concretos que devem ilustrar a decisão”.
Outrossim, despicienda qualquer discussão quanto ao atendimento do requisito etário porquanto
os documentos acostados aos autos comprovam inequivocamente a idade avançada da parte
autora (77 anos) à época do ajuizamento da ação, em 23/11/15.
Com relação à miserabilidade, observo que o estudo social (elaborado em 24/10/18, data em que
o salário mínimo era de R$954,00), demonstra que o autor, paraguaio, com 79 anos de idade à
época, reside com sua esposa, brasileira, com 56 anos, sua filha Mabel, brasileira, com 22 anos,
seu filho Daniel, brasileiro, com 18 anos, e com seu neto Tiago, com 10 anos, em casa própria,
adquirida há aproximadamente 10 anos, de madeira, com piso em cerâmica, sem forro, pintada,
composta por três quartos, sala, cozinha e banheiro, guarnecida por móveis simples e de uso
diário, em razoável estado de conservação e higiene. A renda mensal familiar é composta
unicamente pelo valor aproximado de R$1.000,00, recebido por seu filho, com o trabalho de
ajudante de pedreiro. Há, ainda, informação de que a esposa do autor recebeu auxílio doença por
um período, tendo sido o benefício interrompido há cerca de um ano. A filha Mabel realiza alguns
“bicos” esporadicamente em festas de aniversário, no entanto, não soube precisar o valor que
recebe. O casal possui outros quatro filhos, todos casados, que auxiliam o requerente com
alimentação, na medida do possível. A família recebe, ainda, R$40,00 proveniente do Programa
Bolsa Família e também uma cesta de alimentos da Igreja Católica. Possuem despesas mensais
de R$64,09 em água, R$133,71 em energia elétrica e, quanto à alimentação, não souberam
informar, já que adquirem aos poucos. O requerente relatou que “sofre com problemas no
coração (já foi submetido a processo cirúrgico), é hipertenso, sofre com problema de hérnia,
necessitando realizar cirurgia. Realiza acompanhamento médico no AME (Ambulatório Médico de
Especialidades) em Tupã – SP sempre que agendado”. Asseverou, ainda, a assistente social que
“A família apresenta precárias condições para suprir as necessidades básicas, principalmente em
relação à alimentação”.
Dessa forma, pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, observo que o requisito da
miserabilidade encontra-se demonstrado no presente feito.
Cumpre ressaltar que o benefício deve ser revisto a cada dois anos, haja vista a expressa
disposição legal prevista no art. 21 da Lei nº 8.742/93.
Ressalto, ainda, ser vedada a acumulação do benefício assistencial de prestação continuada com
qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica,
nos termos do art. 20, §4º, da Lei nº 8.742/93, devendo ser deduzidos na fase de execução do
julgado os pagamentos feitos pela autarquia na esfera administrativa.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação (19/1/16), na ausência de pedido
na esfera administrativa, conforme jurisprudência pacífica do C. STJ (REsp nº 828.828/SP, 5ª
Turma, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 6/6/06, v.u., DJ 26/6/06).
A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros
moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora.
Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, deve ser observado o
julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso
Extraordinário nº 870.947.
A verba honorária fixada à razão de 10% sobre o valor da condenação remunera condignamente
o serviço profissional prestado, nos termos do art. 85 do CPC/15 e precedentes desta Oitava
Turma.
No que se refere à sua base de cálculo, considerando que o direito pleiteado pela parte autora foi
reconhecido somente no Tribunal, passo a adotar o posicionamento do C. STJ de que os
honorários devem incidir até o julgamento do recurso nesta Corte, in verbis: "Nos termos da
Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça, o marco final da verba honorária deve ser o
decisum no qual o direito do segurado foi reconhecido, que no caso corresponde ao acórdão
proferido pelo Tribunal a quo." (AgRg no Recurso Especial nº 1.557.782-SP, 2ª Turma, Relator
Ministro Mauro Campbell Marques, j. em 17/12/15, v.u., DJe 18/12/15).
Por derradeiro, deve ser deferida a antecipação dos efeitos do provimento jurisdicional final, já
sob a novel figura da tutela de urgência, uma vez que evidenciado nos presentes autos o
preenchimento dos requisitos do art. 300, do CPC/15.
Inequívoca a existência da probabilidade do direito, tendo em vista o reconhecimento à percepção
do benefício pleiteado. Quanto ao perigo de dano, parece-me que, entre as posições
contrapostas, merece acolhida aquela defendida pela parte autora porque, além de desfrutar de
elevada probabilidade, é a que sofre maiores dificuldades de reversão. Outrossim, o perigo da
demora encontra-se evidente, tendo em vista o caráter alimentar do benefício, motivo pelo qual
concedo a tutela pleiteada, determinando ao INSS a implementação do benefício no prazo de 30
dias, sob pena de multa, a ser oportunamente fixada na hipótese de inadimplemento.
Ante o exposto, dou provimento à apelação para conceder à parte autora o benefício assistencial
ao idoso desde a data da citação, devendo a correção monetária, os juros de mora e os
honorários advocatícios incidir na forma acima indicada. Concedo a tutela antecipada,
determinando a implementação do amparo social ao idoso, com DIB em 19/1/16, no prazo de 30
dias.
É o meu voto.
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA IDOSA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS
LEGAIS.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- Cumpre ressaltar, primeiramente, que, o fato de o autor ser estrangeiro não é impeditivo ao
recebimento do benefício pleiteado, nos termos do art. 5º da Constituição Federal/88.
III- In casu, despicienda qualquer discussão quanto ao atendimento do requisito etário porquanto
os documentos acostados aos autos comprovam inequivocamente a idade avançada da parte
autora (77 anos) à época do ajuizamento da ação, em 23/11/15.
IV- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, o requisito da miserabilidade encontra-
se demonstrado no presente feito. Observa-se que o estudo social (elaborado em 24/10/18, data
em que o salário mínimo era de R$954,00), demonstra que o autor, paraguaio, com 79 anos de
idade à época, reside com sua esposa, brasileira, com 56 anos, sua filha Mabel, brasileira, com
22 anos, seu filho Daniel, brasileiro, com 18 anos, e com seu neto Tiago, com 10 anos, em casa
própria, adquirida há aproximadamente 10 anos, de madeira, com piso em cerâmica, sem forro,
pintada, composta por três quartos, sala, cozinha e banheiro, guarnecida por móveis simples e de
uso diário, em razoável estado de conservação e higiene. A renda mensal familiar é composta
unicamente pelo valor aproximado de R$1.000,00, recebido por seu filho, com o trabalho de
ajudante de pedreiro. Há, ainda, informação de que a esposa do autor recebeu auxílio doença por
um período, tendo sido o benefício interrompido há cerca de um ano. A filha Mabel realiza alguns
“bicos” esporadicamente em festas de aniversário, no entanto, não soube precisar o valor que
recebe. O casal possui outros quatro filhos, todos casados, que auxiliam o requerente com
alimentação, na medida do possível. A família recebe, ainda, R$40,00 proveniente do Programa
Bolsa Família e também uma cesta de alimentos da Igreja Católica. Possuem despesas mensais
de R$64,09 em água, R$133,71 em energia elétrica e, quanto à alimentação, não souberam
informar, já que adquirem aos poucos. O requerente relatou que “sofre com problemas no
coração (já foi submetido a processo cirúrgico), é hipertenso, sofre com problema de hérnia,
necessitando realizar cirurgia. Realiza acompanhamento médico no AME (Ambulatório Médico de
Especialidades) em Tupã – SP sempre que agendado”. Asseverou, ainda, a assistente social que
“A família apresenta precárias condições para suprir as necessidades básicas, principalmente em
relação à alimentação”.
V- O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação (19/1/16), na ausência de
pedido na esfera administrativa, conforme jurisprudência pacífica do C. STJ (REsp nº
828.828/SP, 5ª Turma, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 6/6/06, v.u., DJ 26/6/06).
VI- A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros
moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora. Com relação aos índices
de atualização monetária e taxa de juros, deve ser observado o julgamento proferido pelo C.
Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947.
VII- A verba honorária fixada à razão de 10% sobre o valor da condenação remunera
condignamente o serviço profissional prestado, nos termos do art. 85 do CPC/15 e precedentes
desta Oitava Turma. No que se refere à sua base de cálculo, considerando que o direito pleiteado
pela parte autora foi reconhecido somente no Tribunal, passo a adotar o posicionamento do C.
STJ de que os honorários devem incidir até o julgamento do recurso nesta Corte, in verbis: "Nos
termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça, o marco final da verba honorária deve
ser o decisum no qual o direito do segurado foi reconhecido, que no caso corresponde ao
acórdão proferido pelo Tribunal a quo." (AgRg no Recurso Especial nº 1.557.782-SP, 2ª Turma,
Relator Ministro Mauro Campbell Marques, j. em 17/12/15, v.u., DJe 18/12/15).
VIII- Deve ser deferida a antecipação dos efeitos do provimento jurisdicional final, já sob a novel
figura da tutela de urgência, uma vez que evidenciado nos presentes autos o preenchimento dos
requisitos do art. 300, do CPC/15.
IX- Apelação provida. Tutela de urgência concedida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação e conceder a tutela de urgência, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
