Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5001113-25.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
28/09/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 30/09/2021
Ementa
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA IDOSA. RESTABELECIMENTO. MISERABILIDADE NÃO COMPROVADA.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- In casu, despicienda qualquer discussão quanto ao atendimento do requisito etário porquanto
os documentos acostados aos autos comprovam inequivocamente a idade avançada da parte
autora (74 anos) à época do ajuizamento da ação.
III- Com relação à alegada miserabilidade, o estudo social e o conjunto probatório constante nos
autos não demonstraram a hipossuficiência econômica da parte autora e de sua família.
IV- Apelação do INSS provida. Recurso adesivo da parte autora prejudicado. Tutela antecipada
revogada.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001113-25.2018.4.03.9999
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MIGUEL DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: IVANA MARIA BORBA - MS16142-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001113-25.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MIGUEL DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: IVANA MARIA BORBA - MS16142-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social visando ao
restabelecimento do benefício previsto no art. 203, inc. V, da Constituição Federal de 1988, sob
o fundamento de ser pessoa idosa (74 anos à época do ajuizamento da ação) e não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Alegou, em síntese,
que percebia o benefício, mas que o mesmo foi cessado indevidamente em outubro de 2014,
em razão de supostas irregularidades por ter sido inscrito como microempreendedor desde
01/2012. Alega que nunca foi empresário e que se recorda que assinou alguns documentos em
sua residência, mas que provavelmente foi vítima de alguma fraude.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo julgou procedente o pedido, restabelecendo o benefício assistencial desde a
cessação (outubro/14), acrescido de correção monetária e juros moratórios conforme os índices
oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança. Os honorários
advocatícios foram arbitrados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da
prolação da sentença. Sem custas. Por fim, concedeu a tutela antecipada.
Inconformada, apelou a autarquia, alegando em síntese:
- o não preenchimento do requisito da hipossuficiência, devendo ser julgado improcedente o
pedido.
- Caso não seja acolhida a alegação acima mencionada, requer que o termo inicial do benefício
seja fixado a partir da juntada do laudo médico e a redução dos honorários advocatícios.
Adesivamente recorreu a parte autora, requerendo em síntese:
- que a correção monetária e os juros moratórios observem o Manual de Cálculos da Justiça
Federal, com as alterações da Resolução nº 267/13 do C. CJF e a majoração dos honorários
advocatícios para 15% das sobre o valor devido entre o termo inicial e a efetiva implantação do
benefício.
Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos a esta E. Corte.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pelo provimento da apelação do INSS, ficando
prejudicado o recurso adesivo da parte autora.
É o breve relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001113-25.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MIGUEL DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: IVANA MARIA BORBA - MS16142-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Dispõe o art.
203, inc. V, da Constituição Federal, in verbis:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I -a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II -o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III -a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV -a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua
integração à vida comunitária;
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei." (grifos meus)
Para regulamentar o dispositivo constitucional retro transcrito, foi editada a Lei nº 8.742 de
7/12/1993.
Cumpre ressaltar, ainda, que em 8/12/95 sobreveio o Decreto nº 1.744 regulamentando a Lei da
Assistência Social supramencionada.
Da leitura dos dispositivos legais, depreende-se que o benefício previsto no art. 203, inc. V, da
CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou considerada idosa e, em ambas as hipóteses,
que não possua meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família.
Com relação ao requisito etário, observo que a idade de 70 (setenta) anos prevista no caput do
art. 20, da Lei nº 8.742/93, foi reduzida para 67 (sessenta e sete), conforme a Lei nº 9.720/98 e,
posteriormente, para 65 (sessenta e cinco), nos termos do art. 34 da Lei nº 10.741/2003.
No tocante ao segundo requisito, qual seja, a comprovação de a parte autora não possuir meios
de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, o Plenário do C.
Supremo Tribunal Federal, em sessão de 27/8/1998, havia julgado improcedente o pedido
formulado na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF, considerando constitucional o
§ 3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/93.
No entanto, o referido Plenário, em sessão de 18/4/2013, apreciando o Recurso Extraordinário
nº 567.985/MT, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do
mencionado § 3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/93, nos termos do voto do E. Ministro Gilmar
Mendes, in verbis:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo
Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232.
Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que 'considera-se incapaz de prover a manutenção da
pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a
1/4 (um quarto) do salário mínimo'.
O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal
declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a
Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01,
que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio
financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a
ações socioeducativas.
O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias
mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da
Lei 8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
(STF, Recurso Extraordinário nº 567.985/MT, Plenário, Relator para acórdão Ministro Gilmar
Mendes, j. em 18/4/13)
Asseverou o E. Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, que "o critério de ¼ do salário mínimo
utilizado pela LOAS está completamente defasado e mostra-se atualmente inadequado para
aferir a miserabilidade das famílias que, de acordo com o art. 203, V, da Constituição, possuem
o direito ao benefício assistencial."
Quadra mencionar, adicionalmente, que o C. Superior Tribunal de Justiça também analisou a
questão da miserabilidade por ocasião do julgamento proferido no Recurso Especial Repetitivo
Representativo de Controvérsia nº 1.112.557-MG (2009/0040999-9), in verbis:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO
SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98,
dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas
portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja
família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para
o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente ao cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de
se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade,
ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita
inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar
7. Recurso Especial provido."
(STJ, REsp. nº 1.112.557/MG, 3ª Seção, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/09,
v.u., DJ 20/11/09)
Dessa forma, pacificou-se o entendimento no sentido de que a comprovação de a parte autora
possuir (ou não) meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família deve
ser analisada pelo magistrado, em cada caso, de acordo com as provas apresentadas nos
autos.
Outrossim, nos termos do art. 34, do Estatuto do Idoso, deve-se descontar outro benefício no
valor de um salário mínimo já concedido a qualquer membro da família, para fins de cálculo da
renda familiar per capita a que se refere a LOAS.
Embora a lei refira-se a outro benefício assistencial, nada impede que se interprete a lei
atribuindo-se à expressão também o sentido de benefício previdenciário, de forma a dar-se
tratamento igual a casos semelhantes. A avaliação da hipossuficiência tem caráter puramente
econômico, pouco importando o nomen juris do benefício recebido: basta que seja no valor de
um salário mínimo. É o que se poderia chamar de simetria ontológica e axiológica em favor de
um ser humano que se ache em estado de penúria equivalente à miserabilidade de outrem.
Nesse sentido, aliás, já decidiu essa E. Terceira Seção conforme ementa abaixo transcrita, in
verbis:
"EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INVÁLIDA. CUMPRIMENTO
DOS REQUISITOS LEGAIS. PREVALÊNCIA DO VOTO VENCEDOR.
I - A extensão dos embargos é adstrita aos limites da divergência que, no caso dos autos, recai
unicamente sobre a verificação da hipossuficiência econômica da parte autora.
II - É de se manter a concessão do benefício assistencial à autora, hoje com 61 anos, total e
definitivamente incapaz para o trabalho, que vive com uma filha e o marido, já idoso, o qual
percebe aposentadoria no valor de um salário mínimo.
III - As testemunhas ouvidas afirmam enfaticamente que a autora reside em casa muito simples
e faz uso diário de medicamentos.
IV - O rigor na aplicação da exigência quanto à renda mínima, tornaria inócua a instituição
desse benefício de caráter social, tal o grau de penúria em que se deveriam encontrar os
beneficiários, além do que, faz-se necessário descontar o benefício de valor mínimo, a que teria
direito a parte autora, para o cálculo da renda mensal per capita.
V - O conceito de unidade familiar foi esclarecido com a nova redação do § 1º do artigo 21 da
Lei nº 9.720/98, que remete ao art. 16 da Lei nº 8.213/91.
VI - Há no conjunto probatório, elementos que induzem à convicção de que a autora está entre
o rol dos beneficiários descritos na legislação.
VII - Embargos infringentes não providos."
(EAC nº 2002.03.099.026301-6, Rel. Des. Federal Marianina Galante, j. em 22/9/04, DJU de
05/10/04, grifos meus)
Passo à análise do caso concreto.
In casu, despicienda qualquer discussão quanto ao atendimento do requisito etário porquanto
os documentos acostados aos autos comprovam inequivocamente a idade avançada da parte
autora (74 anos) à época do ajuizamento da ação.
O autor requer o restabelecimento do benefício assistencial NB nº 88/134.188.164-1, percebido
de 21/2/06 a 29/9/14, cessado com data retroativa a 3/1/12, sob o fundamento de que o autor
não preenchia mais o requisito da miserabilidade desde a referida data, uma vez que foi
constatada a existência de registro de microempreendedor individual em seu nome (ID
1717191, p.13/14 e ID 1717192, p.46/47).
Com relação à miserabilidade, o estudo social (ID 1717192, p.26/29) realizado em 23/3/15
relata que o autor é viúvo há 28 anos, reside sozinho em um imóvel alugado, composto de
quatro cômodos (dois quartos, cozinha, sala) e um banheiro. Ainda, verifica-se das fotos do
imóvel que o autor possui veículo automotor (ID. 1717192 p.29). Segundo o autor, este não
possui renda fixa e sobrevive de alguns trabalhos esporádicos (venda de galinhas, frutas e
verduras) e da ajuda de vizinhos e amigos. Por sua vez, as despesas mensais fixas declaradas
perfazem R$ 1.422,00.
No que tange ao registro de microempreendedor individual que gerou a cessação de seu
benefício (ID. 1717191 p.13/14), o autor afirmou à Assistente Social que: “[...] vendia calçados
para ajudar na mantença e assim poder contar com um dinheiro a mais no final do mês, no
entanto, não sabia que havia uma empresa em seu nome, somente se recorda de ter assinado
alguns documentos para um homem em sua residência que não se recorda ao certo o seu
nome, e por ser analfabeto não leu os papéis, e saiu prejudicado, pois além de perder o
benefício não tem mais condições de comprar os calçados para revender.” (ID. 1717191 p.27,
grifos meus).
Não obstante as informações acima destacadas, verifica-se que conforme informação prestada
pela Junta Comercial do Estado de Mato Grosso do Sul (ID 1717192, p.34) e Certificado da
Condição de Microempreendedor Individual extraído do Portador do Microempreendedor
Individual (juntado pelo Ministério Público Federal nos autos), o registro em nome do autor foi
efetivado em 3/1/12. Ademais, a partir de 1º/1/12, o autor passou a contribuir para o RGPS
como contribuinte individual (extrato CNIS juntado pelo Ministério Público Federal) e que, logo
após receber do INSS o Ofício de Defesa nº 055/06.021.130/2014, datado de 9/6/14,
comunicando os indícios de irregularidades na manutenção do benefício assistencial (ID
1717192, p.13), o autor cessou o pagamento das contribuições em 31/7/14 (extrato CNIS
juntado pelo Ministério Público Federal) e promoveu a baixa do registro em 3/9/14 (ID 1717192,
p.20/21).
Ademais, como bem asseverou o D. Representante do Parquet Federal: “embora o autor
MIGUEL DE SOUZA alegue ignorância por ser analfabeto (ID. 1717192 – p.11/12), constata-se
que ele possui Carteira Nacional de Habilitação (CNH) (ID.1717192 p.09), cuja expedição exige
que o condutor saiba “ler e escrever”, conforme art.70, §1º, da Lei nº 5.108/66 (antigo CTB,
vigente à época da 1ª habilitação do autor) e art.140, II, da Lei nº 9.503/97 (atual CTB). No
mais, cabe destacar que, mesmo após a cessação do benefício assistencial, o autor MIGUEL
DE SOUZA relata que, com seu trabalho e ajuda de terceiros (sem mencionar seus 3 filhos),
mantém despesas mensais fixas que somam R$ 1.422,00, montante esse superior ao valor do
benefício assistencial pretendido. Dessa forma, considerando as circunstâncias do caso em
concreto, conclui-se que a decisão administrativa que cassou o benefício assistencial NB nº
88/134.188.164-1 é correta, bem como que o autor MIGUEL DE SOUZA não apresentou provas
idôneas para afastá-la ou para comprovar a alegada situação de miserabilidade atual”(grifos
meus).
Portanto, no presente caso, não ficou comprovado que a parte autora não possui condições de
prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Dessa forma, pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, observo que o requisito da
hipossuficiência não se encontra demonstrado no presente feito.
Deixo de analisar a questão da devolução de valores recebidos de boa fé, tendo em vista que
não há notícias nos autos de que o autor recebeu cobrança dos valores decorrentes do
benefício cessado administrativamente.
Tendo em vista a improcedência do pedido, fica prejudicado o recurso adesivo do autor.
Arbitro os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade ficará
suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC, por ser a parte autora beneficiária da justiça
gratuita.
Ante o exposto, dou provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido,
revogando a tutela antecipada anteriormente concedida e julgo prejudicado o recurso adesivo
da parte autora.
É o meu voto.
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA IDOSA. RESTABELECIMENTO. MISERABILIDADE NÃO
COMPROVADA.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- In casu, despicienda qualquer discussão quanto ao atendimento do requisito etário porquanto
os documentos acostados aos autos comprovam inequivocamente a idade avançada da parte
autora (74 anos) à época do ajuizamento da ação.
III- Com relação à alegada miserabilidade, o estudo social e o conjunto probatório constante nos
autos não demonstraram a hipossuficiência econômica da parte autora e de sua família.
IV- Apelação do INSS provida. Recurso adesivo da parte autora prejudicado. Tutela antecipada
revogada. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS, revogar a tutela antecipada e julgar
prejudicado o recurso adesivo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
