Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5107589-87.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
08/05/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 10/05/2019
Ementa
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO
OCORRÊNCIA. REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA COM ESPECIALISTA. DESNECESSIDADE.
IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO NÃO COMPROVADO.
I- Inicialmente, como bem asseverou a I. Representante do Parquet Federal em seu parecer, não
houve omissão do Sr. Perito no laudo pericial, considerando que anexou o teste ergométrico
realizado pela autora ao mesmo, onde constou expressamente não haver sido constatada
sintomatologia de insuficiência coronariana. A requerente também não acostou documentação
médica atestando o agravamento de suposta cardiopatia. Ademais, a perícia médica foi
devidamente realizada por Perito nomeado pelo Juízo a quo, tendo sido apresentado o respectivo
parecer técnico, motivo pelo qual não merece prosperar o pedido de realização de nova prova
pericial. O laudo encontra-se devidamente fundamentado e com respostas claras e objetivas,
sendo despicienda a realização de novo exame por profissional especializado nas moléstias
alegadas pela parte autora. O magistrado de primeira instância embasou o decisum na conclusão
do laudo pericial. Cumpre ressaltar ainda que, em face do princípio do poder de livre
convencimento motivado do juiz quanto à apreciação das provas, pode o magistrado, ao analisar
o conjunto probatório, concluir pela dispensa de outras provas. Nesse sentido já se pronunciou o
C. STJ (AgRg no Ag. n.º 554.905/RS, 3ª Turma, Relator Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j.
25/5/04, v.u., DJ 2/8/04).
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
II- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
III- Para a comprovação da deficiência, foi realizada perícia judicial em 30/10/17, tendo sido
elaborado o respectivo parecer técnico de fls. 63/150 (doc. 10596400 – págs. 1/88). Afirmou o
esculápio encarregado do exame, com base nos exames físico e clínico e análise da
documentação médica dos autos, que a autora de 36 anos e "do lar", não obstante tenha
diagnóstico de epilepsia, fibromialgia, depressão e síndrome do pânico, tais patologias "são
factíveis de controle não sendo geradoras de deficiências graves, que impeça a autora de exercer
suas atividades do dia a dia e da vida de relação e autonômica" (fls. 138 – doc. 10596400 – pág.
76). Assim, a requerente não logrou êxito em comprovar impedimento de longo prazo, de
natureza física, intelectual ou sensorial, capaz de obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade.
IV- Consigna-se que entre o laudo do perito oficial e os atestados e exames médicos
apresentados pela própria parte autora, há que prevalecer o primeiro, tendo em vista a
equidistância, guardada pelo Perito nomeado pelo Juízo, em relação às partes.
V- Anódina a análise da hipossuficiência do núcleo familiar, tendo em vista a circunstância de que
não ficou comprovado o impedimento de longo prazo, indispensável para a concessão do
benefício, em se tratando de requisitos cumulativos.
VI- Matéria preliminar rejeitada. No mérito, apelação da parte autora improvida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5107589-87.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: DULCELENE SANTOS COSTA
Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO JOSE GOMES ALVARENGA - SP255976-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5107589-87.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: DULCELENE SANTOS COSTA
Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO JOSE GOMES ALVARENGA - SP255976-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à concessão do
benefício previsto no art. 203, inc. V, da Constituição Federal de 1988, sob o fundamento de ser
pessoa portadora de deficiência e não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família. Pleiteia que o termo inicial seja fixado na data do requerimento
administrativo, e a concessão da tutela antecipada.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita, e indeferida a
antecipação dos efeitos da tutela.
O Juízo a quo julgou improcedente o pedido, sob o fundamento da ausência de constatação, na
perícia judicial, da alegada deficiência. Condenou a parte autora no pagamento de custas,
despesas processuais, e honorários advocatícios, arbitrados estes em R$ 1.000,00, suspensa a
exigibilidade nos termos do art. 98, § 3º, do CPC/15.
Inconformada, apelou a parte autora, sustentando em síntese:
a) Preliminarmente:
- a nulidade da R. sentença por cerceamento de defesa, vez que o Perito não analisou os
problemas cardíacos dos quais padece a requerente, sendo indispensável a complementação do
laudo pericial;
- a nulidade da R. sentença por falta de motivação;
- ser portadora de epilepsia, com quadro de convulsões, incapacitando-a para o exercício de sua
atividade habitual, qual seja, o labor rural no corte de cana com manuseio de ferramenta cortante,
razão pela qual, ser necessária a realização de perícia por especialista em neurologia e
cardiologia e
- os prejuízos ocasionados pela não realização do estudo social.
b) No mérito:
- a necessidade de serem levadas em consideração suas várias moléstias e o fato de a cidade
onde reside ser uma localidade pequena, limitando a disponibilidade de vagas de emprego, na
aferição da incapacidade e
- a possibilidade de o julgador formar sua convicção por meio de outros elementos de prova
constantes dos autos.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Parecer do Ministério Público Federal a fls. 4/12 (doc. 35418180 – págs. 1/9), opinando pela
rejeição das preliminares e, no mérito, pelo desprovimento do recurso.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5107589-87.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: DULCELENE SANTOS COSTA
Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO JOSE GOMES ALVARENGA - SP255976-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Inicialmente,
como bem asseverou a I. Representante do Parquet Federal a fls. 5 (doc. 35418180 - pág. 2),
"(...) o d. perito não ignorou os alegados "problemas cardíacos" da parte autora (ID.10596400 –
p.2),inclusive anexou ao referido documento (laudo pericial) cópia da conclusão do teste
ergométrico apresentado pela autora (ID.1059640 – p.8), realizado no dia 8/02/2017, no qual
consta expressamente que não houve modificações significativas durante o exame e que a autora
não apresentou sintomatologia de insuficiência coronariana (ID.10596296 – p.7). Dessa forma,
desnecessária a complementação do laudo ou realização de outro por médico especialista, pois,
à exceção do teste ergométrico, a parte autora não juntou aos autos quaisquer outros
documentos que atestem o agravamento da suposta cardiopatia".
Ademais, observo que a perícia médica foi devidamente realizada por Perito nomeado pelo Juízo
a quo, tendo sido apresentado o respectivo parecer técnico, motivo pelo qual não merece
prosperar o pedido de realização de nova prova pericial. O laudo encontra-se devidamente
fundamentado e com respostas claras e objetivas, sendo despicienda a realização de novo
exame por profissional especializado nas moléstias alegadas pela parte autora.
O magistrado de primeira instância embasou o decisum na conclusão do laudo pericial. Cumpre
ressaltar ainda que, em face do princípio do poder de livre convencimento motivado do juiz
quanto à apreciação das provas, pode o magistrado, ao analisar o conjunto probatório, concluir
pela dispensa de outras provas. Nesse sentido já se pronunciou o C. STJ (AgRg no Ag. n.º
554.905/RS, 3ª Turma, Relator Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 25/5/04, v.u., DJ 2/8/04).
Passo, então, à análise do mérito.
Dispõe o art. 203, inc. V, da Constituição Federal, in verbis:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I -a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II -o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III -a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV -a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua
integração à vida comunitária;
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família, conforme dispuser a lei." (grifos meus)
Para regulamentar o dispositivo constitucional retro transcrito, foi editada a Lei nº 8.742 de
7/12/1993.
Cumpre ressaltar, ainda, que em 8/12/95 sobreveio o Decreto nº 1.744 regulamentando a Lei da
Assistência Social supramencionada.
Da leitura dos dispositivos legais, depreende-se que o benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF
é devido à pessoa portadora de deficiência ou considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que
não possua meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família.
Com relação ao requisito etário, observo que a idade de 70 (setenta) anos prevista no caput do
art. 20, da Lei nº 8.742/93, foi reduzida para 67 (sessenta e sete), conforme a Lei nº 9.720/98 e,
posteriormente, para 65 (sessenta e cinco), nos termos do art. 34 da Lei nº 10.741/2003.
No que concerne à incapacidade para a vida independente, conforme disposto no art. 20, da Lei
nº 8.742/93, não me parece ter sido o intuito do legislador conceituar pessoa portadora de
deficiência como aquela que necessita da assistência permanente de outra para a realização das
atividades básicas do ser humano. Nem seria razoável que o fizesse. Há de se entender como
incapacidade para a vida independente, sim, aquela que não dispõe de recursos para promover,
por seus próprios meios, condições para sobreviver com um mínimo de dignidade. Cumpre
registrar que a Súmula nº 30 da AGU, de 9 de junho de 2008, dispõe que: "A incapacidade para
prover a própria subsistência por meio do trabalho é suficiente para a caracterização da
incapacidade para a vidaindependente, conforme estabelecido no art. 203,V, da Constituição
Federal, e art. 20, II, da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993" (grifei). Ademais, a redação do
referido artigo foi alterada pela Lei nº 13.146/15: "Para efeito de concessão do benefício de
prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de
longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou
mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas."
No tocante ao segundo requisito, qual seja, a comprovação de a parte autora não possuir meios
de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, o Plenário do C. Supremo
Tribunal Federal, em sessão de 27/8/1998, havia julgado improcedente o pedido formulado na
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF, considerando constitucional o § 3º, do art. 20,
da Lei nº 8.742/93.
No entanto, o referido Plenário, em sessão de 18/4/2013, apreciando o Recurso Extraordinário nº
567.985/MT, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do mencionado
§ 3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/93, nos termos do voto do E. Ministro Gilmar Mendes, in verbis:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo
Tribunal Federal na ADI 1.232.
Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que 'considera-se incapaz de prover a manutenção da
pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4
(um quarto) do salário mínimo'.
O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal
declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei
10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que
criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro
a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações
socioeducativas.
O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
(STF, Recurso Extraordinário nº 567.985/MT, Plenário, Relator para acórdão Ministro Gilmar
Mendes, j. em 18/4/13)
Asseverou o E. Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, que "o critério de ¼ do salário mínimo
utilizado pela LOAS está completamente defasado e mostra-se atualmente inadequado para aferir
a miserabilidade das famílias que, de acordo com o art. 203, V, da Constituição, possuem o
direito ao benefício assistencial."
Quadra mencionar, adicionalmente, que o C. Superior Tribunal de Justiça também analisou a
questão da miserabilidade por ocasião do julgamento proferido no Recurso Especial Repetitivo
Representativo de Controvérsia nº 1.112.557-MG (2009/0040999-9), in verbis:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe
que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de
deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua
renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o
acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente ao cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior
a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido."
(STJ, REsp. nº 1.112.557/MG, 3ª Seção, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/09,
v.u., DJ 20/11/09)
Dessa forma, pacificou-se o entendimento no sentido de que a comprovação de a parte autora
possuir (ou não) meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família deve
ser analisada pelo magistrado, em cada caso, de acordo com as provas apresentadas nos autos.
Outrossim, nos termos do art. 34, do Estatuto do Idoso, deve-se descontar outro benefício no
valor de um salário mínimo já concedido a qualquer membro da família, para fins de cálculo da
renda familiar per capita a que se refere a LOAS.
Embora a lei refira-se a outro benefício assistencial, nada impede que se interprete a lei
atribuindo-se à expressão também o sentido de benefício previdenciário, de forma a dar-se
tratamento igual a casos semelhantes. A avaliação da hipossuficiência tem caráter puramente
econômico, pouco importando o nomen juris do benefício recebido: basta que seja no valor de um
salário mínimo. É o que se poderia chamar de simetria ontológica e axiológica em favor de um ser
humano que se ache em estado de penúria equivalente à miserabilidade de outrem.
Nesse sentido, aliás, já decidiu essa E. Terceira Seção conforme ementa abaixo transcrita, in
verbis:
"EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INVÁLIDA. CUMPRIMENTO DOS
REQUISITOS LEGAIS. PREVALÊNCIA DO VOTO VENCEDOR.
I - A extensão dos embargos é adstrita aos limites da divergência que, no caso dos autos, recai
unicamente sobre a verificação da hipossuficiência econômica da parte autora.
II - É de se manter a concessão do benefício assistencial à autora, hoje com 61 anos, total e
definitivamente incapaz para o trabalho, que vive com uma filha e o marido, já idoso, o qual
percebe aposentadoria no valor de um salário mínimo.
III - As testemunhas ouvidas afirmam enfaticamente que a autora reside em casa muito simples e
faz uso diário de medicamentos.
IV - O rigor na aplicação da exigência quanto à renda mínima, tornaria inócua a instituição desse
benefício de caráter social, tal o grau de penúria em que se deveriam encontrar os beneficiários,
além do que, faz-se necessário descontar o benefício de valor mínimo, a que teria direito a parte
autora, para o cálculo da renda mensal per capita.
V - O conceito de unidade familiar foi esclarecido com a nova redação do § 1º do artigo 21 da Lei
nº 9.720/98, que remete ao art. 16 da Lei nº 8.213/91.
VI - Há no conjunto probatório, elementos que induzem à convicção de que a autora está entre o
rol dos beneficiários descritos na legislação.
VII - Embargos infringentes não providos."
(EAC nº 2002.03.099.026301-6, Rel. Des. Federal Marianina Galante, j. em 22/9/04, DJU de
05/10/04, grifos meus)
Passo à análise do caso concreto.
Para a comprovação da deficiência, foi realizada perícia judicial em 30/10/17, tendo sido
elaborado o respectivo parecer técnico de fls. 63/150 (doc. 10596400 – págs. 1/88). Afirmou o
esculápio encarregado do exame, com base nos exames físico e clínico e análise da
documentação médica dos autos, que a autora de 36 anos e "do lar", não obstante tenha
diagnóstico de epilepsia, fibromialgia, depressão e síndrome do pânico, tais patologias "são
factíveis de controle não sendo geradoras de deficiências graves, que impeça a autora de exercer
suas atividades do dia a dia e da vida de relação e autonômica" (fls. 138 – doc. 10596400 – pág.
76). Assim, a requerente não logrou êxito em comprovar impedimento de longo prazo, de
natureza física, intelectual ou sensorial, capaz de obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade.
Deixo consignado que entre o laudo do perito oficial e os atestados e exames médicos
apresentados pela própria parte autora, há que prevalecer o primeiro, tendo em vista a
equidistância, guardada pelo Perito nomeado pelo Juízo, em relação às partes.
No tocante à hipossuficiência do núcleo familiar, entendo ser tal discussão inteiramente anódina,
tendo em vista a circunstância de que, conforme o acima exposto, não ficou comprovado o
impedimento de longo prazo, indispensável para a concessão do benefício, em se tratando de
requisitos cumulativos.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação da parte
autora.
É o meu voto.
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO
OCORRÊNCIA. REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA COM ESPECIALISTA. DESNECESSIDADE.
IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO NÃO COMPROVADO.
I- Inicialmente, como bem asseverou a I. Representante do Parquet Federal em seu parecer, não
houve omissão do Sr. Perito no laudo pericial, considerando que anexou o teste ergométrico
realizado pela autora ao mesmo, onde constou expressamente não haver sido constatada
sintomatologia de insuficiência coronariana. A requerente também não acostou documentação
médica atestando o agravamento de suposta cardiopatia. Ademais, a perícia médica foi
devidamente realizada por Perito nomeado pelo Juízo a quo, tendo sido apresentado o respectivo
parecer técnico, motivo pelo qual não merece prosperar o pedido de realização de nova prova
pericial. O laudo encontra-se devidamente fundamentado e com respostas claras e objetivas,
sendo despicienda a realização de novo exame por profissional especializado nas moléstias
alegadas pela parte autora. O magistrado de primeira instância embasou o decisum na conclusão
do laudo pericial. Cumpre ressaltar ainda que, em face do princípio do poder de livre
convencimento motivado do juiz quanto à apreciação das provas, pode o magistrado, ao analisar
o conjunto probatório, concluir pela dispensa de outras provas. Nesse sentido já se pronunciou o
C. STJ (AgRg no Ag. n.º 554.905/RS, 3ª Turma, Relator Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j.
25/5/04, v.u., DJ 2/8/04).
II- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
III- Para a comprovação da deficiência, foi realizada perícia judicial em 30/10/17, tendo sido
elaborado o respectivo parecer técnico de fls. 63/150 (doc. 10596400 – págs. 1/88). Afirmou o
esculápio encarregado do exame, com base nos exames físico e clínico e análise da
documentação médica dos autos, que a autora de 36 anos e "do lar", não obstante tenha
diagnóstico de epilepsia, fibromialgia, depressão e síndrome do pânico, tais patologias "são
factíveis de controle não sendo geradoras de deficiências graves, que impeça a autora de exercer
suas atividades do dia a dia e da vida de relação e autonômica" (fls. 138 – doc. 10596400 – pág.
76). Assim, a requerente não logrou êxito em comprovar impedimento de longo prazo, de
natureza física, intelectual ou sensorial, capaz de obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade.
IV- Consigna-se que entre o laudo do perito oficial e os atestados e exames médicos
apresentados pela própria parte autora, há que prevalecer o primeiro, tendo em vista a
equidistância, guardada pelo Perito nomeado pelo Juízo, em relação às partes.
V- Anódina a análise da hipossuficiência do núcleo familiar, tendo em vista a circunstância de que
não ficou comprovado o impedimento de longo prazo, indispensável para a concessão do
benefício, em se tratando de requisitos cumulativos.
VI- Matéria preliminar rejeitada. No mérito, apelação da parte autora improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação da
parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
