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ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO. MISERABILIDADE NÃO...

Data da publicação: 09/08/2024, 11:07:08

ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO. MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO AMPARO SOCIAL COMO COMPLEMENTO DE RENDA. I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família. II- No tocante à deficiência do autor, ficou caracterizado o impedimento de longo prazo (superior a dois anos), de natureza física, intelectual ou sensorial, capaz de obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com os demais. III- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, não ficou demonstrada a hipossuficiência do núcleo familiar. O estudo social revela que o requerente de 49 anos reside com a irmã e curadora Anali de 36 anos e serviços gerais, o cunhado Samuel dos Santos de 38 anos e pedreiro informal, e a sobrinha de 2 anos e 7 meses. A casa é própria, construída em alvenaria, com laje e piso de revestimento em cerâmica, telhas de barro, constituída por 4 (quatro) cômodos, sendo 2 dormitórios, banheiro e cozinha conjugada com a sala, guarnecida além dos móveis e eletrodomésticos básicos, de cama de casal Box, geladeira Duplex, freezer, micro-ondas, 2 TVs de 32” e 20” e máquina de lavar roupas, possuindo, ainda, o veículo CORSA ano 1990. A renda mensal do núcleo familiar é proveniente da remuneração da irmã na empresa UNIPAC, no valor de R$ 1.400,00, e do trabalho informal do cunhado como pedreiro, no valor aproximado de R$ 300,00. Os gastos mensais totalizam R$ 1.430,00, sendo R$ 900,00 em alimentação, R$ 60,00 em água/esgoto, R$ 140,00 em energia elétrica, R$ 80,00 em gás e R$ 250,00 em farmácia. Contudo, as fotografias juntadas ao estudo mostram um lar aconchegante, paredes com pintura bem-acabada tanto do exterior como do interior da casa, móveis e eletrodomésticos novos e ventilador de teto em um dos quartos, não condizente com a alegada vulnerabilidade social. IV- Como bem asseverou a I. Representante do Parquet Federal, "(...) documentos carreados aos autos pela autarquia previdenciária evidenciaram que a irmã do autor recebia, ao tempo do estudo social, remuneração que atingia, de fato, a quantia de R$ 2.336,40 (id. 165445564, p. 3) e seu cunhado recolhia contribuição previdenciária de forma individual sobre um salário mínimo (id.165445563, p. 3), revelando situação diversa da relatada à assistente social.". V- Há que se observar, ainda, que a assistência social a ser prestada pelo Poder Público possui caráter subsidiário, restrita às situações de total impossibilidade de manutenção própria ou por meio da família, não sendo possível ser utilizado o benefício assistencial como complementação de renda. VI- Apelação da parte autora improvida. (TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5132824-51.2021.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA, julgado em 09/11/2021, Intimação via sistema DATA: 10/11/2021)



Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP

5132824-51.2021.4.03.9999

Relator(a)

Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA

Órgão Julgador
8ª Turma

Data do Julgamento
09/11/2021

Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 10/11/2021

Ementa


E M E N T A

ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO.
MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO AMPARO
SOCIAL COMO COMPLEMENTO DE RENDA.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- No tocante à deficiência do autor, ficou caracterizado o impedimento de longo prazo (superior a
dois anos), de natureza física, intelectual ou sensorial, capaz de obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com os demais.
III- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, não ficou demonstrada a
hipossuficiência do núcleo familiar. O estudo social revela que o requerente de 49 anos reside
com a irmã e curadora Anali de 36 anos e serviços gerais, o cunhado Samuel dos Santos de 38
anos e pedreiro informal, e a sobrinha de 2 anos e 7 meses. A casa é própria, construída em
alvenaria, com laje e piso de revestimento em cerâmica, telhas de barro, constituída por 4
(quatro) cômodos, sendo 2 dormitórios, banheiro e cozinha conjugada com a sala, guarnecida
além dos móveis e eletrodomésticos básicos, de cama de casal Box, geladeira Duplex, freezer,
micro-ondas, 2 TVs de 32” e 20” e máquina de lavar roupas, possuindo, ainda, o veículo CORSA
ano 1990. A renda mensal do núcleo familiar é proveniente da remuneração da irmã na empresa
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos

UNIPAC, no valor de R$ 1.400,00, e do trabalho informal do cunhado como pedreiro, no valor
aproximado de R$ 300,00. Os gastos mensais totalizam R$ 1.430,00, sendo R$ 900,00 em
alimentação, R$ 60,00 em água/esgoto, R$ 140,00 em energia elétrica, R$ 80,00 em gás e R$
250,00 em farmácia. Contudo, as fotografias juntadas ao estudo mostram um lar aconchegante,
paredes com pintura bem-acabada tanto do exterior como do interior da casa, móveis e
eletrodomésticos novos e ventilador de teto em um dos quartos, não condizente com a alegada
vulnerabilidade social.
IV- Como bem asseverou a I. Representante do Parquet Federal, "(...) documentos carreados aos
autos pela autarquia previdenciária evidenciaram que a irmã do autor recebia, ao tempo do
estudo social, remuneração que atingia, de fato, a quantia de R$ 2.336,40 (id. 165445564, p. 3) e
seu cunhado recolhia contribuição previdenciária de forma individual sobre um salário mínimo
(id.165445563, p. 3), revelando situação diversa da relatada à assistente social.".
V- Há que se observar, ainda, que a assistência social a ser prestada pelo Poder Público possui
caráter subsidiário, restrita às situações de total impossibilidade de manutenção própria ou por
meio da família, não sendo possível ser utilizado o benefício assistencial como complementação
de renda.
VI- Apelação da parte autora improvida.

Acórdao

PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5132824-51.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: JAIMISON CABRAL

Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE DO NASCIMENTO ROCHA - SP361579-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS


OUTROS PARTICIPANTES:




PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5132824-51.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: JAIMISON CABRAL
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE DO NASCIMENTO ROCHA - SP361579-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

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R E L A T Ó R I O

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em 19/10/19 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando ao
restabelecimento do benefício previsto no art. 203, inc. V, da Constituição Federal de 1988, sob
o fundamento de ser pessoa portadora de deficiência e não possuir meios de prover a própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família. Pleiteia, ainda, a fixação do termo inicial desde
a data da suspensão, bem como a tutela de urgência.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita, e indeferida a
antecipação dos efeitos da tutela.
O Juízo a quo, em 6/4/21, julgou improcedente o pedido, sob o fundamento da ausência de
comprovação do requisito da hipossuficiência. Deixou de condenar o demandante ao
pagamento de encargos de sucumbência, conforme entendimento deste Tribunal.
Inconformada, apelou a parte autora, sustentando em síntese:
- haver sido constatada a deficiência na perícia judicial;
- residir de favor com a irmã, suas duas filhas e o cunhado, que se encontra atualmente
desempregado, e, mesmo este fazendo "bicos", não consegue obter renda suficiente para a
subsistência de toda família, sendo a remuneração da irmã a única renda do núcleo familiar e
- a manifestação favorável do Ministério Público Estadual.
- Requer a reforma da R. sentença, para julgar procedente o pedido, vez que preenchidos os
requisitos legais.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Parecer do Ministério Público Federal a fls. 176/183 (id. 169718039 – págs. 1/8), opinando pelo
desprovimento do recurso.
É o breve relatório.





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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5132824-51.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: JAIMISON CABRAL
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE DO NASCIMENTO ROCHA - SP361579-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

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V O T O


O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Dispõe o art.
203, inc. V, da Constituição Federal, in verbis:

"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I -a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II -o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III -a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV -a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua
integração à vida comunitária;
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei." (grifos meus)

Para regulamentar o dispositivo constitucional retro transcrito, foi editada a Lei nº 8.742 de
7/12/1993.
Cumpre ressaltar, ainda, que em 8/12/95 sobreveio o Decreto nº 1.744 regulamentando a Lei da
Assistência Social supramencionada.
Da leitura dos dispositivos legais, depreende-se que o benefício previsto no art. 203, inc. V, da
CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou considerada idosa e, em ambas as hipóteses,
que não possua meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família.
Com relação ao requisito etário, observo que a idade de 70 (setenta) anos prevista no caput do
art. 20, da Lei nº 8.742/93, foi reduzida para 67 (sessenta e sete), conforme a Lei nº 9.720/98 e,
posteriormente, para 65 (sessenta e cinco), nos termos do art. 34 da Lei nº 10.741/2003.
No que concerne à incapacidade para a vida independente, conforme disposto no art. 20, da Lei
nº 8.742/93, não me parece ter sido o intuito do legislador conceituar pessoa portadora de
deficiência como aquela que necessita da assistência permanente de outra para a realização
das atividades básicas do ser humano. Nem seria razoável que o fizesse. Há de se entender
como incapacidade para a vida independente, sim, aquela que não dispõe de recursos para
promover, por seus próprios meios, condições para sobreviver com um mínimo de dignidade.
Cumpre registrar que a Súmula nº 30 da AGU, de 9 de junho de 2008, dispõe que: "A
incapacidade para prover a própria subsistência por meio do trabalho é suficiente para a
caracterização da incapacidade para a vidaindependente, conforme estabelecido no art. 203,V,
da Constituição Federal, e art. 20, II, da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993" (grifei).
Ademais, a redação do referido artigo foi alterada pela Lei nº 13.146/15: "Para efeito de
concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela

que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual,
em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
No tocante ao segundo requisito, qual seja, a comprovação de a parte autora não possuir meios
de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, o Plenário do C.
Supremo Tribunal Federal, em sessão de 27/8/1998, havia julgado improcedente o pedido
formulado na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF, considerando constitucional o
§ 3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/93.
No entanto, o referido Plenário, em sessão de 18/4/2013, apreciando o Recurso Extraordinário
nº 567.985/MT, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do
mencionado § 3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/93, nos termos do voto do E. Ministro Gilmar
Mendes, in verbis:

"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo
Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232.
Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que 'considera-se incapaz de prover a manutenção da
pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a
1/4 (um quarto) do salário mínimo'.
O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal
declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a
Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01,
que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio
financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a
ações socioeducativas.

O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias
mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da
Lei 8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
(STF, Recurso Extraordinário nº 567.985/MT, Plenário, Relator para acórdão Ministro Gilmar
Mendes, j. em 18/4/13)

Asseverou o E. Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, que "o critério de ¼ do salário mínimo
utilizado pela LOAS está completamente defasado e mostra-se atualmente inadequado para
aferir a miserabilidade das famílias que, de acordo com o art. 203, V, da Constituição, possuem
o direito ao benefício assistencial."
Quadra mencionar, adicionalmente, que o C. Superior Tribunal de Justiça também analisou a
questão da miserabilidade por ocasião do julgamento proferido no Recurso Especial Repetitivo
Representativo de Controvérsia nº 1.112.557-MG (2009/0040999-9), in verbis:

"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO
SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98,
dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas
portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja
família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para
o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente ao cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de
se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de

tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade,
ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita
inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido."
(STJ, REsp. nº 1.112.557/MG, 3ª Seção, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/09,
v.u., DJ 20/11/09)

Dessa forma, pacificou-se o entendimento no sentido de que a comprovação de a parte autora
possuir (ou não) meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família deve
ser analisada pelo magistrado, em cada caso, de acordo com as provas apresentadas nos
autos.
Outrossim, nos termos do art. 34, do Estatuto do Idoso, deve-se descontar outro benefício no
valor de um salário mínimo já concedido a qualquer membro da família, para fins de cálculo da
renda familiar per capita a que se refere a LOAS.
Embora a lei refira-se a outro benefício assistencial, nada impede que se interprete a lei
atribuindo-se à expressão também o sentido de benefício previdenciário, de forma a dar-se
tratamento igual a casos semelhantes. A avaliação da hipossuficiência tem caráter puramente
econômico, pouco importando o nomen juris do benefício recebido: basta que seja no valor de
um salário mínimo. É o que se poderia chamar de simetria ontológica e axiológica em favor de
um ser humano que se ache em estado de penúria equivalente à miserabilidade de outrem.
Nesse sentido, aliás, já decidiu essa E. Terceira Seção conforme ementa abaixo transcrita, in
verbis:

"EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INVÁLIDA. CUMPRIMENTO
DOS REQUISITOS LEGAIS. PREVALÊNCIA DO VOTO VENCEDOR.
I - A extensão dos embargos é adstrita aos limites da divergência que, no caso dos autos, recai
unicamente sobre a verificação da hipossuficiência econômica da parte autora.
II - É de se manter a concessão do benefício assistencial à autora, hoje com 61 anos, total e
definitivamente incapaz para o trabalho, que vive com uma filha e o marido, já idoso, o qual
percebe aposentadoria no valor de um salário mínimo.
III - As testemunhas ouvidas afirmam enfaticamente que a autora reside em casa muito simples
e faz uso diário de medicamentos.
IV - O rigor na aplicação da exigência quanto à renda mínima, tornaria inócua a instituição
desse benefício de caráter social, tal o grau de penúria em que se deveriam encontrar os
beneficiários, além do que, faz-se necessário descontar o benefício de valor mínimo, a que teria
direito a parte autora, para o cálculo da renda mensal per capita.
V - O conceito de unidade familiar foi esclarecido com a nova redação do § 1º do artigo 21 da

Lei nº 9.720/98, que remete ao art. 16 da Lei nº 8.213/91.
VI - Há no conjunto probatório, elementos que induzem à convicção de que a autora está entre
o rol dos beneficiários descritos na legislação.
VII - Embargos infringentes não providos."
(EAC nº 2002.03.099.026301-6, Rel. Des. Federal Marianina Galante, j. em 22/9/04, DJU de
05/10/04, grifos meus)

Passo à análise do caso concreto.
Para a comprovação da deficiência, foi realizada perícia médica judicial em 30/9/20, tendo sido
elaborado o respectivo parecer técnico pela Perita e juntado a fls. 100/104 (id. 165445548 –
págs. 1/5). Afirmou a esculápia encarregada do exame, com base no exame clínico e análise da
documentação médica dos autos, que o autor nascido em 10/5/70, com pais falecidos, sendo o
10º filho de uma prole de 14, é portador de quadro de transtorno mental decorrente de lesão e
disfunção cerebrais, tipo transtorno cognitivo grave – CID10 F06.8. Concluiu a expert, sob o
ponto de vista psiquiátrico, que se encontra incapaz de exercer toda e qualquer função laboral
e/ou de praticar os atos da vida civil, desde 1996. Assim, ficou caracterizado o impedimento de
longo prazo (superior a dois anos), de natureza física, intelectual ou sensorial, capaz de obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com os demais.
Impende salientar que se encontra acostada a fls. 23 (id. 165445493 – pág. 2), cópia da
Certidão de Interdição do autor Jaimison Cabral, decretada por sentença proferida em 6/4/06,
transitada em julgado em 12/5/06, tendo sido nomeada curadora definitiva, a irmã Anali de
Souza Cabral.
Com relação à miserabilidade, o estudo social (elaborado em 26/11/19, data em que o salário
mínimo era de R$ 998,00) demonstra que o requerente de 49 anos, ensino fundamental
incompleto, reside com a irmã e curadora Anali de 36 anos, ensino médio completo e serviços
gerais, o cunhado Samuel dos Santos de 38 anos, ensino médio completo, que trabalha por dia
sem vínculo empregatício, e a sobrinha Alice de 2 anos e 7 meses, em casa própria, construída
em alvenaria, com laje e piso de revestimento em cerâmica, telhas de barro, constituída por 4
(quatro) cômodos, sendo 2 dormitórios, banheiro e cozinha conjugada com a sala, guarnecida
além dos móveis e eletrodomésticos básicos, de cama de casal Box, geladeira Duplex, freezer,
micro-ondas, 2 TVs de 32” e 20” e máquina de lavar roupas. A família é atendida pelo Programa
da Saúde da Família Municipal, e possui o veículo CORSA ano 1990. A renda mensal do núcleo
familiar é proveniente da remuneração da irmã na empresa UNIPAC, no valor de R$ 1.400,00, e
do trabalho informal do cunhado como pedreiro, no valor aproximado de R$ 300,00. Os gastos
mensais totalizam R$ 1.430,00, sendo R$ 900,00 em alimentação, R$ 60,00 em água/esgoto,
R$ 140,00 em energia elétrica, R$ 80,00 em gás e R$ 250,00 em farmácia.
Contudo, as fotografias juntadas ao estudo socioeconômico (fls. 68/70 – id. 165445516 – págs.
12/14), mostram um lar aconchegante, paredes com pintura bem-acabada tanto do exterior
como do interior da casa, móveis e eletrodomésticos novos e conservados, e ventilador de teto
em um dos quartos, não condizente com a alegada vulnerabilidade social.
Como bem asseverou a I. Representante do Parquet Federal a fls. 182 (id. 169718039 – pág.
7), "(...) documentos carreados aos autos pela autarquia previdenciária evidenciaram que a irmã

do autor recebia, ao tempo do estudo social, remuneração que atingia, de fato, a quantia de R$
2.336,40 (id. 165445564, p. 3) e seu cunhado recolhia contribuição previdenciária de forma
individual sobre um salário mínimo (id.165445563, p. 3), revelando situação diversa da relatada
à assistente social.".
Dessa forma, pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, não ficou demonstrada a
situação de hipossuficiência do núcleo familiar.
Há que se observar, ainda, que a assistência social a ser prestada pelo Poder Público possui
caráter subsidiário, restrita às situações de total impossibilidade de manutenção própria ou por
meio da família, não sendo possível ser utilizado o benefício assistencial como
complementação de renda.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
É o meu voto.


E M E N T A

ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO.
MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO AMPARO
SOCIAL COMO COMPLEMENTO DE RENDA.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- No tocante à deficiência do autor, ficou caracterizado o impedimento de longo prazo (superior
a dois anos), de natureza física, intelectual ou sensorial, capaz de obstruir sua participação
plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com os demais.
III- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, não ficou demonstrada a
hipossuficiência do núcleo familiar. O estudo social revela que o requerente de 49 anos reside
com a irmã e curadora Anali de 36 anos e serviços gerais, o cunhado Samuel dos Santos de 38
anos e pedreiro informal, e a sobrinha de 2 anos e 7 meses. A casa é própria, construída em
alvenaria, com laje e piso de revestimento em cerâmica, telhas de barro, constituída por 4
(quatro) cômodos, sendo 2 dormitórios, banheiro e cozinha conjugada com a sala, guarnecida
além dos móveis e eletrodomésticos básicos, de cama de casal Box, geladeira Duplex, freezer,
micro-ondas, 2 TVs de 32” e 20” e máquina de lavar roupas, possuindo, ainda, o veículo
CORSA ano 1990. A renda mensal do núcleo familiar é proveniente da remuneração da irmã na
empresa UNIPAC, no valor de R$ 1.400,00, e do trabalho informal do cunhado como pedreiro,
no valor aproximado de R$ 300,00. Os gastos mensais totalizam R$ 1.430,00, sendo R$ 900,00
em alimentação, R$ 60,00 em água/esgoto, R$ 140,00 em energia elétrica, R$ 80,00 em gás e
R$ 250,00 em farmácia. Contudo, as fotografias juntadas ao estudo mostram um lar
aconchegante, paredes com pintura bem-acabada tanto do exterior como do interior da casa,
móveis e eletrodomésticos novos e ventilador de teto em um dos quartos, não condizente com a
alegada vulnerabilidade social.

IV- Como bem asseverou a I. Representante do Parquet Federal, "(...) documentos carreados
aos autos pela autarquia previdenciária evidenciaram que a irmã do autor recebia, ao tempo do
estudo social, remuneração que atingia, de fato, a quantia de R$ 2.336,40 (id. 165445564, p. 3)
e seu cunhado recolhia contribuição previdenciária de forma individual sobre um salário mínimo
(id.165445563, p. 3), revelando situação diversa da relatada à assistente social.".
V- Há que se observar, ainda, que a assistência social a ser prestada pelo Poder Público possui
caráter subsidiário, restrita às situações de total impossibilidade de manutenção própria ou por
meio da família, não sendo possível ser utilizado o benefício assistencial como
complementação de renda.
VI- Apelação da parte autora improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


Resumo Estruturado

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