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ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO. MISERABILIDADE NÃO...

Data da publicação: 09/08/2024, 19:22:27

ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO. MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO AMPARO SOCIAL COMO COMPLEMENTO DE RENDA. I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família. II- No tocante à deficiência da autora, ficou caracterizado o impedimento de longo prazo (superior a dois anos), de natureza física, intelectual ou sensorial, capaz de obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com os demais. III- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, não ficou demonstrada a hipossuficiência do núcleo familiar. O estudo social revela que a requerente de 39 anos, ensino fundamental incompleto e divorciada, reside há 2 anos com os dois filhos, Eduardo de 18 anos e estudante, e Rafael de 10 anos e estudante, em apartamento pertencente ao pai de seus filhos, construído em alvenaria, constituído por 5 (cinco) cômodos, sendo 2 quartos, sala, cozinha, banheiro e pequena área de serviço, com garagem coberta. O imóvel é revestido de piso cerâmico, com laje, área externa com acabamento, em condição favorável de habitualidade. É guarnecido, além dos móveis e eletrodomésticos básicos, por máquina de lavar roupas, TV de 29 polegadas LCD, geladeira frost free e um computador, todos em bom estado de conservação. A família não está inscrita em programas sociais. A renda mensal do núcleo familiar é proveniente da pensão alimentícia recebida pelos filhos, no valor de um salário mínimo (R$ 954,00). A requerente, atualmente, mantém tratamento psiquiátrico no CAPS de Aparecida/SP, fazendo uso de medicamentos de uso controlado. Segundo avaliação da própria assistente social, "Do ponto de vista da situação financeira, constatamos que com o orçamento familiar e possível manter as principais despesas. Do ponto de vista das condições de habitação, não há indícios de situações de vulnerabilidade ou insegurança, mas de tranquilidade e conforto". IV- Há que se observar, ainda, que a assistência social a ser prestada pelo Poder Público possui caráter subsidiário, restrita às situações de total impossibilidade de manutenção própria ou por meio da família, não sendo possível ser utilizado o benefício assistencial como complementação de renda. V- Apelação da parte autora improvida. (TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5183300-30.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA, julgado em 07/12/2021, Intimação via sistema DATA: 10/12/2021)



Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP

5183300-30.2020.4.03.9999

Relator(a)

Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA

Órgão Julgador
8ª Turma

Data do Julgamento
07/12/2021

Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 10/12/2021

Ementa


E M E N T A

ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO.
MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO AMPARO
SOCIAL COMO COMPLEMENTO DE RENDA.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- No tocante à deficiência da autora, ficou caracterizado o impedimento de longo prazo (superior
a dois anos), de natureza física, intelectual ou sensorial, capaz de obstruir sua participação plena
e efetiva na sociedade em igualdade de condições com os demais.
III- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, não ficou demonstrada a
hipossuficiência do núcleo familiar. O estudo social revela que a requerente de 39 anos, ensino
fundamental incompleto e divorciada, reside há 2 anos com os dois filhos, Eduardo de 18 anos e
estudante, e Rafael de 10 anos e estudante, em apartamento pertencente ao pai de seus filhos,
construído em alvenaria, constituído por 5 (cinco) cômodos, sendo 2 quartos, sala, cozinha,
banheiro e pequena área de serviço, com garagem coberta. O imóvel é revestido de piso
cerâmico, com laje, área externa com acabamento, em condição favorável de habitualidade. É
guarnecido, além dos móveis e eletrodomésticos básicos, por máquina de lavar roupas, TV de 29
polegadas LCD, geladeira frost free e um computador, todos em bom estado de conservação. A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos

família não está inscrita em programas sociais. A renda mensal do núcleo familiar é proveniente
da pensão alimentícia recebida pelos filhos, no valor de um salário mínimo (R$ 954,00). A
requerente, atualmente, mantém tratamento psiquiátrico no CAPS de Aparecida/SP, fazendo uso
de medicamentos de uso controlado. Segundo avaliação da própria assistente social, "Do ponto
de vista da situação financeira, constatamos que com o orçamento familiar e possível manter as
principais despesas. Do ponto de vista das condições de habitação, não há indícios de situações
de vulnerabilidade ou insegurança, mas de tranquilidade e conforto".
IV- Há que se observar, ainda, que a assistência social a ser prestada pelo Poder Público possui
caráter subsidiário, restrita às situações de total impossibilidade de manutenção própria ou por
meio da família, não sendo possível ser utilizado o benefício assistencial como complementação
de renda.
V- Apelação da parte autora improvida.

Acórdao

PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5183300-30.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: EDNA OLIVEIRA DOS SANTOS COELHO

CURADOR: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO

Advogado do(a) APELANTE: MARCIA DE OLIVEIRA MARTINS DOS SANTOS - SP124741-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS


OUTROS PARTICIPANTES:




PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5183300-30.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: EDNA OLIVEIRA DOS SANTOS COELHO
CURADOR: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO
Advogado do(a) APELANTE: MARCIA DE OLIVEIRA MARTINS DOS SANTOS - SP124741-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:



R E L A T Ó R I O

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em 13/10/16 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à
concessão do benefício previsto no art. 203, inc. V, da Constituição Federal de 1988, sob o
fundamento de ser pessoa portadora de deficiência e não possuir meios de prover a própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família. Pleiteia, ainda, a fixação do termo inicial na
data indeferimento do requerimento administrativo, bem como a tutela de urgência.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita, e indeferida a
antecipação dos efeitos da tutela.
O Juízo a quo, em 28/9/18, julgou improcedente o pedido, sob o fundamento da ausência de
comprovação do requisito da hipossuficiência. Condenou a demandante ao pagamento de
custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios da parte adversa, fixados
estes em 10% sobre o valor da causa, ficando suspensa a exigibilidade.
Inconformada, apelou a parte autora, sustentando em síntese:
- haver sido constatada a deficiência na perícia judicial, sem haver a possibilidade de ingresso
no mercado de trabalho;
- que a renda auferida ser decorrente de pensão alimentícia, portanto, de caráter transitório, não
sendo suficiente para cobrir as despesas de sua residência e com medicamentos e
- a necessidade de ser levado em consideração o caráter social do benefício.
- Requer a reforma da R. sentença, para julgar procedente o pedido.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Parecer do Ministério Público Federal a fls. 219/222 (id. 132476142 – págs. 1/4), em que,
preliminarmente, requer a intimação do advogado para promover a juntada de procuração
outorgada pelo curador da autora e o respectivo termo de curatela, e, não se concretizando tal
medida, a nomeação de curador especial. No mérito, opina pelo desprovimento do recurso.
Apesar de intimada a I. Procuradora, nos termos do requerido pela I. Representante do Parquet
Federal, não houve a regularização da representação processual da demandante.
Foi oficiada a Defensoria Pública da União neste Estado de São Paulo, solicitando a nomeação
de curador especial à parte autora.
Petição da DPU informando sua atuação como curadora especial.
É o breve relatório.



PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5183300-30.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: EDNA OLIVEIRA DOS SANTOS COELHO
CURADOR: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO

Advogado do(a) APELANTE: MARCIA DE OLIVEIRA MARTINS DOS SANTOS - SP124741-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:



V O T O


O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Dispõe o art.
203, inc. V, da Constituição Federal, in verbis:

"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I -a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II -o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III -a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV -a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua
integração à vida comunitária;
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei." (grifos meus)

Para regulamentar o dispositivo constitucional retro transcrito, foi editada a Lei nº 8.742 de
7/12/1993.
Cumpre ressaltar, ainda, que em 8/12/95 sobreveio o Decreto nº 1.744 regulamentando a Lei da
Assistência Social supramencionada.
Da leitura dos dispositivos legais, depreende-se que o benefício previsto no art. 203, inc. V, da
CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou considerada idosa e, em ambas as hipóteses,
que não possua meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família.
Com relação ao requisito etário, observo que a idade de 70 (setenta) anos prevista no caput do
art. 20, da Lei nº 8.742/93, foi reduzida para 67 (sessenta e sete), conforme a Lei nº 9.720/98 e,
posteriormente, para 65 (sessenta e cinco), nos termos do art. 34 da Lei nº 10.741/2003.
No que concerne à incapacidade para a vida independente, conforme disposto no art. 20, da Lei
nº 8.742/93, não me parece ter sido o intuito do legislador conceituar pessoa portadora de
deficiência como aquela que necessita da assistência permanente de outra para a realização
das atividades básicas do ser humano. Nem seria razoável que o fizesse. Há de se entender
como incapacidade para a vida independente, sim, aquela que não dispõe de recursos para
promover, por seus próprios meios, condições para sobreviver com um mínimo de dignidade.
Cumpre registrar que a Súmula nº 30 da AGU, de 9 de junho de 2008, dispõe que: "A
incapacidade para prover a própria subsistência por meio do trabalho é suficiente para a

caracterização da incapacidade para a vidaindependente, conforme estabelecido no art. 203,V,
da Constituição Federal, e art. 20, II, da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993" (grifei).
Ademais, a redação do referido artigo foi alterada pela Lei nº 13.146/15: "Para efeito de
concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela
que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual,
em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
No tocante ao segundo requisito, qual seja, a comprovação de a parte autora não possuir meios
de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, o Plenário do C.
Supremo Tribunal Federal, em sessão de 27/8/1998, havia julgado improcedente o pedido
formulado na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF, considerando constitucional o
§ 3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/93.
No entanto, o referido Plenário, em sessão de 18/4/2013, apreciando o Recurso Extraordinário
nº 567.985/MT, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do
mencionado § 3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/93, nos termos do voto do E. Ministro Gilmar
Mendes, in verbis:

"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo
Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232.
Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que 'considera-se incapaz de prover a manutenção da
pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a
1/4 (um quarto) do salário mínimo'.
O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal
declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a

Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01,
que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio
financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a
ações socioeducativas.
O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias
mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da
Lei 8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
(STF, Recurso Extraordinário nº 567.985/MT, Plenário, Relator para acórdão Ministro Gilmar
Mendes, j. em 18/4/13)

Asseverou o E. Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, que "o critério de ¼ do salário mínimo
utilizado pela LOAS está completamente defasado e mostra-se atualmente inadequado para
aferir a miserabilidade das famílias que, de acordo com o art. 203, V, da Constituição, possuem
o direito ao benefício assistencial."
Quadra mencionar, adicionalmente, que o C. Superior Tribunal de Justiça também analisou a
questão da miserabilidade por ocasião do julgamento proferido no Recurso Especial Repetitivo
Representativo de Controvérsia nº 1.112.557-MG (2009/0040999-9), in verbis:

"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO
SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98,
dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas
portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja
família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para
o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse

dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente ao cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de
se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade,
ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita
inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido."
(STJ, REsp. nº 1.112.557/MG, 3ª Seção, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/09,
v.u., DJ 20/11/09)

Dessa forma, pacificou-se o entendimento no sentido de que a comprovação de a parte autora
possuir (ou não) meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família deve
ser analisada pelo magistrado, em cada caso, de acordo com as provas apresentadas nos
autos.
Outrossim, nos termos do art. 34, do Estatuto do Idoso, deve-se descontar outro benefício no
valor de um salário mínimo já concedido a qualquer membro da família, para fins de cálculo da
renda familiar per capita a que se refere a LOAS.
Embora a lei refira-se a outro benefício assistencial, nada impede que se interprete a lei
atribuindo-se à expressão também o sentido de benefício previdenciário, de forma a dar-se
tratamento igual a casos semelhantes. A avaliação da hipossuficiência tem caráter puramente
econômico, pouco importando o nomen juris do benefício recebido: basta que seja no valor de
um salário mínimo. É o que se poderia chamar de simetria ontológica e axiológica em favor de
um ser humano que se ache em estado de penúria equivalente à miserabilidade de outrem.
Nesse sentido, aliás, já decidiu essa E. Terceira Seção conforme ementa abaixo transcrita, in
verbis:

"EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INVÁLIDA. CUMPRIMENTO
DOS REQUISITOS LEGAIS. PREVALÊNCIA DO VOTO VENCEDOR.
I - A extensão dos embargos é adstrita aos limites da divergência que, no caso dos autos, recai
unicamente sobre a verificação da hipossuficiência econômica da parte autora.
II - É de se manter a concessão do benefício assistencial à autora, hoje com 61 anos, total e
definitivamente incapaz para o trabalho, que vive com uma filha e o marido, já idoso, o qual
percebe aposentadoria no valor de um salário mínimo.
III - As testemunhas ouvidas afirmam enfaticamente que a autora reside em casa muito simples
e faz uso diário de medicamentos.
IV - O rigor na aplicação da exigência quanto à renda mínima, tornaria inócua a instituição

desse benefício de caráter social, tal o grau de penúria em que se deveriam encontrar os
beneficiários, além do que, faz-se necessário descontar o benefício de valor mínimo, a que teria
direito a parte autora, para o cálculo da renda mensal per capita.
V - O conceito de unidade familiar foi esclarecido com a nova redação do § 1º do artigo 21 da
Lei nº 9.720/98, que remete ao art. 16 da Lei nº 8.213/91.
VI - Há no conjunto probatório, elementos que induzem à convicção de que a autora está entre
o rol dos beneficiários descritos na legislação.
VII - Embargos infringentes não providos."
(EAC nº 2002.03.099.026301-6, Rel. Des. Federal Marianina Galante, j. em 22/9/04, DJU de
05/10/04, grifos meus)

Passo à análise do caso concreto.
Para a comprovação da deficiência, foi realizada perícia médica judicial em 7/5/17, tendo sido
elaborado o respectivo parecer técnico pelo Perito e juntado a fls. 152/153 (id. 126117578 –
págs. 1/2). Afirmou o esculápio encarregado do exame, com base no exame clínico e análise da
documentação médica dos autos, que a autora nascida em 4/6/79, separada há 3 anos,
possuindo 2 filhos com 17 e 9 anos, cuja irmã Cleodete de Oliveira Rosa pretende sua curatela,
possui antecedente de internação em hospital psiquiátrico há 9 anos, por quase um ano, sendo
portadora de esquizofrenia, apresentando déficit cognitivo global importante e histórico de
alucinações e ideias delirantes, com pragmatismo reduzido, concluindo o expert pela
constatação da incapacidade absoluta e permanente de gerir seus encargos civis. Assim, ficou
caracterizado o impedimento de longo prazo (superior a dois anos), de natureza física,
intelectual ou sensorial, capaz de obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com os demais.
Com relação à miserabilidade, o estudo social (elaborado em 2/8/18, data em que o salário
mínimo era de R$ 954,00) demonstra que a requerente de 39 anos, ensino fundamental
incompleto e divorciada há aproximadamente 3 anos, reside há 2 anos com os dois filhos,
Eduardo de 18 anos e estudante, e Rafael de 10 anos e estudante, em apartamento
pertencente ao pai de seus filhos, localizado em rua pavimentada, dotada de fornecimento de
água, energia elétrica, transporte público próximo e coleta de lixo, construído em alvenaria,
constituído por 5 (cinco) cômodos, sendo 2 quartos, sala, cozinha, banheiro e pequena área de
serviço, com garagem coberta. O imóvel é revestido de piso cerâmico, com laje, área externa
com acabamento, em condição favorável de habitualidade. É guarnecido, além dos móveis e
eletrodomésticos básicos, por máquina de lavar roupas, TV de 29 polegadas LCD, geladeira
frost free e um computador, todos em bom estado de conservação. A família não está inscrita
em programas sociais. A renda mensal do núcleo familiar é proveniente da pensão alimentícia
recebida pelos filhos, no valor de um salário mínimo. Os gastos mensais totalizam R$ 565,00,
sendo R$ 40,00 em água/esgoto (saneamento), R$ 120,00 em energia elétrica, R$ 300,00 em
alimentação, R$ 55,00 gás e R$ 50,00 em remédios. A requerente, atualmente, mantém
tratamento psiquiátrico no CAPS de Aparecida/SP, fazendo uso de medicamentos de uso
controlado. Segundo avaliação da própria assistente social, "Do ponto de vista da situação
financeira, constatamos que com o orçamento familiar e possível manter as principais

despesas. Do ponto de vista das condições de habitação, não há indícios de situações de
vulnerabilidade ou insegurança, mas de tranquilidade e conforto" (fls. 189 – id. 126117619 –
pág. 7).
Como bem asseverou o I. Representante do Parquet Federal a fls. 139 (id. 139318308 – pág.
4), "(...) Tais circunstâncias vão de encontro à alegação de que a apelante está em situação de
miserabilidade, e de total desamparo, a justificar a alegação de que ela não em condições de
manter a própria subsistência ou de tê-la mantida pela família".
Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, não ficou demonstrada a situação de
hipossuficiência do núcleo familiar.
Há que se observar, ainda, que a assistência social a ser prestada pelo Poder Público possui
caráter subsidiário, restrita às situações de total impossibilidade de manutenção própria ou por
meio da família, não sendo possível ser utilizado o benefício assistencial como
complementação de renda.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
É o meu voto.

E M E N T A

ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO.
MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO AMPARO
SOCIAL COMO COMPLEMENTO DE RENDA.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- No tocante à deficiência da autora, ficou caracterizado o impedimento de longo prazo
(superior a dois anos), de natureza física, intelectual ou sensorial, capaz de obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com os demais.
III- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, não ficou demonstrada a
hipossuficiência do núcleo familiar. O estudo social revela que a requerente de 39 anos, ensino
fundamental incompleto e divorciada, reside há 2 anos com os dois filhos, Eduardo de 18 anos
e estudante, e Rafael de 10 anos e estudante, em apartamento pertencente ao pai de seus
filhos, construído em alvenaria, constituído por 5 (cinco) cômodos, sendo 2 quartos, sala,
cozinha, banheiro e pequena área de serviço, com garagem coberta. O imóvel é revestido de
piso cerâmico, com laje, área externa com acabamento, em condição favorável de
habitualidade. É guarnecido, além dos móveis e eletrodomésticos básicos, por máquina de lavar
roupas, TV de 29 polegadas LCD, geladeira frost free e um computador, todos em bom estado
de conservação. A família não está inscrita em programas sociais. A renda mensal do núcleo
familiar é proveniente da pensão alimentícia recebida pelos filhos, no valor de um salário
mínimo (R$ 954,00). A requerente, atualmente, mantém tratamento psiquiátrico no CAPS de
Aparecida/SP, fazendo uso de medicamentos de uso controlado. Segundo avaliação da própria
assistente social, "Do ponto de vista da situação financeira, constatamos que com o orçamento

familiar e possível manter as principais despesas. Do ponto de vista das condições de
habitação, não há indícios de situações de vulnerabilidade ou insegurança, mas de
tranquilidade e conforto".
IV- Há que se observar, ainda, que a assistência social a ser prestada pelo Poder Público
possui caráter subsidiário, restrita às situações de total impossibilidade de manutenção própria
ou por meio da família, não sendo possível ser utilizado o benefício assistencial como
complementação de renda.
V- Apelação da parte autora improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


Resumo Estruturado

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