Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0002908-20.2014.4.03.6111
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
25/03/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 30/03/2020
Ementa
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. CONSTATAÇÃO DA PERÍCIA MÉDICA
PSIQUIÁTRICA. CAPACIDADE PARA O EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORATIVA E DOS
ATOS DA VIDA CIVIL.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- Para a comprovação da incapacidade, foi realizada perícia médica psiquiátrica. No respectivo
parecer técnico, foi constatada a capacidade laborativa do autor, inclusive para o exercício dos
atos da vida civil. "Necessidade de se esclarecer que, segundo os critérios diagnósticos do
CID10, "...não se deve fazer diagnóstico de esquizofrenia quando existe uma doença cerebral
manifesta, intoxicação por droga ou abstinência de droga".". Consigna-se que entre o laudo do
perito oficial e os atestados e exames médicos apresentados pela própria parte autora, há que
prevalecer o primeiro, tendo em vista a equidistância, guardada pelo Perito nomeado pelo Juízo,
em relação às partes.
III- Na constatação socioeconômica realizada, foi verificada a internação do requerente, não
residindo com qualquer membro da família, bem como não auferir renda.
IV- Não preenchidos, de forma cumulativa, os requisitos necessários para a concessão do
benefício previsto no art. 203 da Constituição Federal, consoante dispõe a Lei nº 8.742/93, impõe-
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
se o indeferimento do pedido.
V- Apelação da parte autora improvida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0002908-20.2014.4.03.6111
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: CLAYTON BATISTA DOS SANTOS
REPRESENTANTE: CESAR MANOEL DE MENEZES
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO DE SANTIS - SP120377-A,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0002908-20.2014.4.03.6111
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: CLAYTON BATISTA DOS SANTOS
REPRESENTANTE: CESAR MANOEL DE MENEZES
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO DE SANTIS - SP120377-A,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em 30/6/14 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à
concessão do benefício previsto no art. 203, inc. V, da Constituição Federal de 1988, sob o
fundamento de ser pessoa portadora de deficiência e não possuir meios de prover a própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família. Pleiteia que o termo inicial seja fixado na data do
requerimento administrativo em 19/12/12, bem como a concessão da tutela antecipada.
Foi indeferido o pleito de antecipação dos efeitos da tutela, tendo sido postergada a análise da
justiça gratuita.
Após a juntada da certidão de hipossuficiência econômica, foram deferidos à parte autora os
benefícios da assistência judiciária gratuita.
Foi determinada a realização da constatação das condições econômicas do núcleo familiar, tendo
sido certificado o cumprimento do respectivo mandado (fls. 114 – id. 90257536 – p. 109).
Cópia do prontuário médico do autor, enviado pela Clínica de Repouso Dom Bosco Ltda., de
Tupã/SP, foi anexado a fls. 115/153 (id. 90257536 – p. 110/148).
Conforme despacho de fls. 172/173 (id. 90257536 – p. 167/168), convertido o julgamento em
diligência para a realização de perícia médica indireta por meio de análise do prontuário médico.
A fls. 181 (id. 90257536 – p. 176), foi noticiado o fechamento da clínica onde estava internado o
autor, com a informação de que se encontra em sua casa, motivo pelo qual, requereu a
designação de perícia médica.
Foram juntados aos autos o laudo pericial judicial e o parecer técnico complementar.
O Juízo a quo, em 7/5/19, julgou improcedente o pedido, sob o fundamento da ausência de
comprovação do requisito da deficiência. "E não configurada a incapacidade laboral do autor,
torna-se despiciendo inquirir sobre o quesito miserabilidade" (fls. 233 – id. 90257548 – p. 7).
Condenou a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor
atribuído à causa, atualizado, fixando suspensa a exigibilidade, nos termos do art. 98, § 3º, do
CPC/15.
Inconformada, apelou a parte autora, sustentando em síntese:
- a existência de incapacidade mental para viver em sociedade muito antes de haver ingressado
com a presente ação, não se justificando o fato de não haver completado dois anos de
internação.
- Requer a reforma da R. sentença, para ser julgado procedente o pedido, com o reconhecimento
do preenchimento dos requisitos legais para a concessão do benefício assistencial no período de
19/12/12 até 11/11/16.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Parecer do Ministério Público Federal a fls. 254/256 (id. 122610834 – p. 1/3), opinando pelo
desprovimento do recurso.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0002908-20.2014.4.03.6111
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: CLAYTON BATISTA DOS SANTOS
REPRESENTANTE: CESAR MANOEL DE MENEZES
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO DE SANTIS - SP120377-A,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Dispõe o art.
203, inc. V, da Constituição Federal, in verbis:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I -a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II -o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III -a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV -a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua
integração à vida comunitária;
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família, conforme dispuser a lei." (grifos meus)
Para regulamentar o dispositivo constitucional retro transcrito, foi editada a Lei nº 8.742 de
7/12/1993.
Cumpre ressaltar, ainda, que em 8/12/95 sobreveio o Decreto nº 1.744 regulamentando a Lei da
Assistência Social supramencionada.
Da leitura dos dispositivos legais, depreende-se que o benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF
é devido à pessoa portadora de deficiência ou considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que
não possua meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família.
Com relação ao requisito etário, observo que a idade de 70 (setenta) anos prevista no caput do
art. 20, da Lei nº 8.742/93, foi reduzida para 67 (sessenta e sete), conforme a Lei nº 9.720/98 e,
posteriormente, para 65 (sessenta e cinco), nos termos do art. 34 da Lei nº 10.741/2003.
No que concerne à incapacidade para a vida independente, conforme disposto no art. 20, da Lei
nº 8.742/93, não me parece ter sido o intuito do legislador conceituar pessoa portadora de
deficiência como aquela que necessita da assistência permanente de outra para a realização das
atividades básicas do ser humano. Nem seria razoável que o fizesse. Há de se entender como
incapacidade para a vida independente, sim, aquela que não dispõe de recursos para promover,
por seus próprios meios, condições para sobreviver com um mínimo de dignidade. Cumpre
registrar que a Súmula nº 30 da AGU, de 9 de junho de 2008, dispõe que: "A incapacidade para
prover a própria subsistência por meio do trabalho é suficiente para a caracterização da
incapacidade para a vidaindependente, conforme estabelecido no art. 203,V, da Constituição
Federal, e art. 20, II, da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993" (grifei). Ademais, a redação do
referido artigo foi alterada pela Lei nº 13.146/15: "Para efeito de concessão do benefício de
prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de
longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou
mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas."
No tocante ao segundo requisito, qual seja, a comprovação de a parte autora não possuir meios
de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, o Plenário do C. Supremo
Tribunal Federal, em sessão de 27/8/1998, havia julgado improcedente o pedido formulado na
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF, considerando constitucional o § 3º, do art. 20,
da Lei nº 8.742/93.
No entanto, o referido Plenário, em sessão de 18/4/2013, apreciando o Recurso Extraordinário nº
567.985/MT, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do mencionado
§ 3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/93, nos termos do voto do E. Ministro Gilmar Mendes, in verbis:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo
Tribunal Federal na ADI 1.232.
Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que 'considera-se incapaz de prover a manutenção da
pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4
(um quarto) do salário mínimo'.
O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal
declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei
10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que
criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro
a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações
socioeducativas.
O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
(STF, Recurso Extraordinário nº 567.985/MT, Plenário, Relator para acórdão Ministro Gilmar
Mendes, j. em 18/4/13)
Asseverou o E. Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, que "o critério de ¼ do salário mínimo
utilizado pela LOAS está completamente defasado e mostra-se atualmente inadequado para aferir
a miserabilidade das famílias que, de acordo com o art. 203, V, da Constituição, possuem o
direito ao benefício assistencial."
Quadra mencionar, adicionalmente, que o C. Superior Tribunal de Justiça também analisou a
questão da miserabilidade por ocasião do julgamento proferido no Recurso Especial Repetitivo
Representativo de Controvérsia nº 1.112.557-MG (2009/0040999-9), in verbis:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe
que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de
deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua
renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o
acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente ao cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior
a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido."
(STJ, REsp. nº 1.112.557/MG, 3ª Seção, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/09,
v.u., DJ 20/11/09)
Dessa forma, pacificou-se o entendimento no sentido de que a comprovação de a parte autora
possuir (ou não) meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família deve
ser analisada pelo magistrado, em cada caso, de acordo com as provas apresentadas nos autos.
Outrossim, nos termos do art. 34, do Estatuto do Idoso, deve-se descontar outro benefício no
valor de um salário mínimo já concedido a qualquer membro da família, para fins de cálculo da
renda familiar per capita a que se refere a LOAS.
Embora a lei refira-se a outro benefício assistencial, nada impede que se interprete a lei
atribuindo-se à expressão também o sentido de benefício previdenciário, de forma a dar-se
tratamento igual a casos semelhantes. A avaliação da hipossuficiência tem caráter puramente
econômico, pouco importando o nomen juris do benefício recebido: basta que seja no valor de um
salário mínimo. É o que se poderia chamar de simetria ontológica e axiológica em favor de um ser
humano que se ache em estado de penúria equivalente à miserabilidade de outrem.
Nesse sentido, aliás, já decidiu essa E. Terceira Seção conforme ementa abaixo transcrita, in
verbis:
"EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INVÁLIDA. CUMPRIMENTO DOS
REQUISITOS LEGAIS. PREVALÊNCIA DO VOTO VENCEDOR.
I - A extensão dos embargos é adstrita aos limites da divergência que, no caso dos autos, recai
unicamente sobre a verificação da hipossuficiência econômica da parte autora.
II - É de se manter a concessão do benefício assistencial à autora, hoje com 61 anos, total e
definitivamente incapaz para o trabalho, que vive com uma filha e o marido, já idoso, o qual
percebe aposentadoria no valor de um salário mínimo.
III - As testemunhas ouvidas afirmam enfaticamente que a autora reside em casa muito simples e
faz uso diário de medicamentos.
IV - O rigor na aplicação da exigência quanto à renda mínima, tornaria inócua a instituição desse
benefício de caráter social, tal o grau de penúria em que se deveriam encontrar os beneficiários,
além do que, faz-se necessário descontar o benefício de valor mínimo, a que teria direito a parte
autora, para o cálculo da renda mensal per capita.
V - O conceito de unidade familiar foi esclarecido com a nova redação do § 1º do artigo 21 da Lei
nº 9.720/98, que remete ao art. 16 da Lei nº 8.213/91.
VI - Há no conjunto probatório, elementos que induzem à convicção de que a autora está entre o
rol dos beneficiários descritos na legislação.
VII - Embargos infringentes não providos."
(EAC nº 2002.03.099.026301-6, Rel. Des. Federal Marianina Galante, j. em 22/9/04, DJU de
05/10/04, grifos meus)
Passo à análise do caso concreto.
Para a comprovação da alegada incapacidade, foi realizada perícia judicial em 11/12/17,
conforme parecer técnico juntado a fls. 190/196 (id. 90257536 – p. 185/191). Afirmou a esculápia
encarregada do exame, com base na avaliação cuidadosa da história clínica, exame psíquico,
relatórios e atestados médicos, e leitura do processo, que o autor nascido em 3/10/81, sob o
ponto de vista médico-psiquiátrico, é portador de Síndrome de Dependência de Múltiplas
Substâncias Psicoativas (CID10 – F 19.2), concluindo, sob o ponto de vista médico-psiquiátrico,
que atualmente "encontra-se CAPAZ de exercer toda e qualquer atividade laboral incluindo a
habitual e/ou exercer os atos da vida cível (sic). O periciado, no ato da perícia médica, foi o único
informante dos dados colhidos da sua história clínica, se encontrando lúcido, atento, orientado em
tempo e espaço e memória preservada. Apresentou fala de conteúdo lógico, negando alteração
do senso percepção. Desta forma, não há motivos de interdição do mesmo visto a existência de
plena crítica da realidade e condições de gerir os atos se sua própria vida. Da mesma forma que
NÃO há justificativa para sua interdição, NÃO há incapacidade para o trabalho. Necessidade de
se esclarecer que, segundo os critérios diagnósticos do CID10, "...não se deve fazer diagnóstico
de esquizofrenia quando existe uma doença cerebral manifesta, intoxicação por droga ou
abstinência de droga"." (fls. 194 – id. 90257536 – p. 189).
Em laudo complementar de fls. 210/212 (id. 90257537 – p. 9/11), datado de 22/10/18, a expert
ratificou seu parecer técnico. Atestou a incapacidade total e temporária no período de 17/12/14 a
11/11/16, enfatizando, ainda, que, "Baseada nos dados colhidos no ato pericial realizado na data
de 11.12.2017, o periciado relatou realizar tratamento médico psiquiátrico de forma irregular no
CAPS-AD de Marília desde a data de 21.11.2016, comparecendo de 02 a 03 vezes por mês. O
encaminhamento do periciado Clayton Batista dos Santos para o tratamento médico psiquiátrico
no CAPS-AD de Marília, a meu ver, seria na tentativa da obtenção de conscientização da
necessidade de se manter em abstinência do uso das múltiplas substâncias psicoativas, fato que
até o momento do ato pericial não havia obtido ("fuma uma maconha de vez em quando"). Esta
perita, com o acima informado, esclarece que a realização de tratamento médico psiquiátrico
especializado em dependência química, em regime ambulatorial, MESMO SE FOSSE
REALIZADO DE FORMA REGULAR, não incapacitaria o periciado Clayton Batista dos Santos do
exercício de atividade laborativa, a qual poderia e deveria ser realizada em concomitância com o
tratamento médico psiquiátrico." Assim, não demonstrada a deficiência incapacitante.
Deixo consignado que entre o laudo do perito oficial e os atestados e exames médicos
apresentados pela própria parte autora, há que prevalecer o primeiro, tendo em vista a
equidistância, guardada pelo Perito nomeado pelo Juízo, em relação às partes.
No tocante à miserabilidade, observa-se do laudo de constatação (elaborado em 25/7/16, data em
que o salário mínimo era de R$ 880,00), que o autor não reside no endereço indicado há
aproximadamente dois anos. À Oficiala de Justiça, relatou o irmão e representante legal Cesar
Manoel de Menezes, que o requerente, há quase 2 (dois) anos, encontra-se internado
compulsoriamente na Clínica Dom Bosco (pelo SUS), na cidade de Tupã/SP, para tratamento de
esquizofrenia e dependência química. Refere que o autor "nunca trabalhou; sempre dependeu da
falecida mãe, que era aposentada e dele, que trabalhava; o Sr. César disse que está
desempregado desde Dezembro e seu seguro desemprego já acabou, por isso não está
conseguindo suprir algumas necessidades do autor na clínica, quais sejam: agasalhos e produtos
de higiene Que o mesmo pediu. Afirmou que antes de perder o emprego, gastava em média R$
200,00 (duzentos reais) por mês com o autor. Disse que quando a mãe deles faleceu, em
19/02/2012, o autor, que já usava maconha, mas ficou depressivo e passou a usar drogas mais
pesadas, sendo que para tanto, roubava objetos de • dentro da casa; ficou muito debilitado e
magro; tinha alucinações; tentou matar o próprio irmão. César, quando este o prendeu em casa
para não se drogar. O representante legal teme que o mesmo volte pra casa e queira mais
dinheiro ou atente contra sua vida." (fls. 114 – id. 90257536 – p. 109).
No entanto, em se tratando de requisitos cumulativos, não tendo sido constatada a deficiência,
não há como possa ser deferido o benefício assistencial.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
É o meu voto.
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. CONSTATAÇÃO DA PERÍCIA MÉDICA
PSIQUIÁTRICA. CAPACIDADE PARA O EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORATIVA E DOS
ATOS DA VIDA CIVIL.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- Para a comprovação da incapacidade, foi realizada perícia médica psiquiátrica. No respectivo
parecer técnico, foi constatada a capacidade laborativa do autor, inclusive para o exercício dos
atos da vida civil. "Necessidade de se esclarecer que, segundo os critérios diagnósticos do
CID10, "...não se deve fazer diagnóstico de esquizofrenia quando existe uma doença cerebral
manifesta, intoxicação por droga ou abstinência de droga".". Consigna-se que entre o laudo do
perito oficial e os atestados e exames médicos apresentados pela própria parte autora, há que
prevalecer o primeiro, tendo em vista a equidistância, guardada pelo Perito nomeado pelo Juízo,
em relação às partes.
III- Na constatação socioeconômica realizada, foi verificada a internação do requerente, não
residindo com qualquer membro da família, bem como não auferir renda.
IV- Não preenchidos, de forma cumulativa, os requisitos necessários para a concessão do
benefício previsto no art. 203 da Constituição Federal, consoante dispõe a Lei nº 8.742/93, impõe-
se o indeferimento do pedido.
V- Apelação da parte autora improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA