Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5927116-55.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
09/03/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 12/03/2020
Ementa
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA E MISERABILIDADE NÃO
DEMONSTRADAS. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO AMPARO SOCIAL COMO
COMPLEMENTO DE RENDA.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- Para a comprovação da deficiência, foi realizada perícia judicial em 6/11/18, tendo sido
elaborado o respectivo parecer técnico. Afirmou o esculápio encarregado do exame, com base no
exame físico e análise da documentação médica apresentada, que a autora de 56 anos (nascida
em 22/9/62), grau de instrução 3ª série e diarista sem registro em CTPS, é portadora de
epicondilite no cotovelo direito, concluindo pela existência de incapacidade laborativa total e
temporária, estimando um período de 4 (quatro) meses para tratamento. Apresenta, ainda,
hipertensão arterial e ansiedade, passível de controle medicamentoso. Dessa forma, não ficou
caracterizado o impedimento de longo prazo (superior a dois anos), de natureza física, intelectual
ou sensorial, capaz de obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com os demais.
III- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, não ficou demonstrada a alegada
miserabilidade da parte autora. O estudo social revela que a autora reside com o marido José
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Roque Rosa, de 60 anos, em uma chácara alugada, construída em alvenaria, coberta por telhas
de cerâmica, com forro, piso em cerâmica, paredes bem pintadas, sem sinais de reparos ou
reformas recentes, oferecendo boas condições de habitação, constituída por cinco cômodos,
sendo dois dormitórios, sala, cozinha e banheiro. A casa é guarnecida por móveis e
eletrodomésticos em bom estado de conservação, mencionando TV de 32” tela plana, tanquinho
e centrífuga. A família possui um veículo Gol ano 2002 a gasolina, que estava no conserto. A
requerente possui quatro filhos a saber: Rose Aparecida Rosa, de 38 anos, casada e "do lar",
Rodrigo Rosa, de 31 anos, casado e serviços gerais, Rogério Rosa, de 27 anos, casado e
trabalha em posto de gasolina, ambos residentes na cidade de Taquarituba/SP, e Ricardo Rosa,
de 37 anos, casado, vendedor e residente em Itaberá/SP. Conforme informações da autora à
assistente social, os filhos auxiliam sempre, quando podem. A renda mensal é proveniente do
aluguel de uma casa que a família possui, localizada em bairro urbano da cidade de Taquarituba,
no valor de R$ 700,00, e da remuneração do marido, que recebe benefício no valor de um salário
mínimo por mês (R$ 998,00). As despesas mensais totalizam aproximadamente R$ 1.514,54,
sendo R$ 400,00 em aluguel, R$ 800,00 em mercado (incluindo produtos de higiene pessoal e
limpeza), R$ 44,54 em energia elétrica, R$ 70,00 em gás de cozinha. Não há gastos com água,
pois usam poço artesiano. Segundo a assistente social, a manutenção da demandante está
sendo realizada satisfatoriamente pela família.
IV- Há que se observar, ainda, que a assistência social a ser prestada pelo Poder Público possui
caráter subsidiário, restrita às situações de total impossibilidade de manutenção própria ou por
meio da família, não sendo possível ser utilizado o benefício assistencial como complementação
de renda.
V- Apelação da parte autora improvida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5927116-55.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: LUZIA APARECIDA DOS SANTOS ROSA
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO BALAZINA - SP300703-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5927116-55.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: LUZIA APARECIDA DOS SANTOS ROSA
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APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à concessão do
benefício previsto no art. 203, inc. V, da Constituição Federal de 1988, sob o fundamento de ser
pessoa portadora de deficiência e não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família. Pleiteia, ainda, a tutela de urgência.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita, e indeferida a
antecipação dos efeitos da tutela.
O Juízo a quo julgou improcedente o pedido, sob o fundamento da ausência de comprovação da
alegada deficiência, bem como do requisito da hipossuficiência. Condenou a parte autora no
pagamento de custas e despesas processuais, e honorários advocatícios, fixados estes em 10%
sobre o valor da causa, atualizado de acordo com a Tabela Prática do E. Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo, observada a gratuidade da justiça.
Inconformada, apelou a parte autora, sustentando em síntese:
- a existência de incapacidade laborativa, por estar acometida de graves doenças, fazendo uso
diário de medicamentos, consoante documentação médica acostada aos autos e
- o preenchimento do requisito da hipossuficiência, consoante estudo social.
- Requer a reforma da R. sentença, para julgar procedente o pedido.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Parecer do Ministério Público Federal a fls. 146/149 (id. 107701381 – págs. 1/4) opinando pelo
desprovimento do recurso.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5927116-55.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: LUZIA APARECIDA DOS SANTOS ROSA
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO BALAZINA - SP300703-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Dispõe o art.
203, inc. V, da Constituição Federal, in verbis:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I -a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II -o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III -a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV -a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua
integração à vida comunitária;
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família, conforme dispuser a lei." (grifos meus)
Para regulamentar o dispositivo constitucional retro transcrito, foi editada a Lei nº 8.742 de
7/12/1993.
Cumpre ressaltar, ainda, que em 8/12/95 sobreveio o Decreto nº 1.744 regulamentando a Lei da
Assistência Social supramencionada.
Da leitura dos dispositivos legais, depreende-se que o benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF
é devido à pessoa portadora de deficiência ou considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que
não possua meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família.
Com relação ao requisito etário, observo que a idade de 70 (setenta) anos prevista no caput do
art. 20, da Lei nº 8.742/93, foi reduzida para 67 (sessenta e sete), conforme a Lei nº 9.720/98 e,
posteriormente, para 65 (sessenta e cinco), nos termos do art. 34 da Lei nº 10.741/2003.
No que concerne à incapacidade para a vida independente, conforme disposto no art. 20, da Lei
nº 8.742/93, não me parece ter sido o intuito do legislador conceituar pessoa portadora de
deficiência como aquela que necessita da assistência permanente de outra para a realização das
atividades básicas do ser humano. Nem seria razoável que o fizesse. Há de se entender como
incapacidade para a vida independente, sim, aquela que não dispõe de recursos para promover,
por seus próprios meios, condições para sobreviver com um mínimo de dignidade. Cumpre
registrar que a Súmula nº 30 da AGU, de 9 de junho de 2008, dispõe que: "A incapacidade para
prover a própria subsistência por meio do trabalho é suficiente para a caracterização da
incapacidade para a vidaindependente, conforme estabelecido no art. 203,V, da Constituição
Federal, e art. 20, II, da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993" (grifei). Ademais, a redação do
referido artigo foi alterada pela Lei nº 13.146/15: "Para efeito de concessão do benefício de
prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de
longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou
mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas."
No tocante ao segundo requisito, qual seja, a comprovação de a parte autora não possuir meios
de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, o Plenário do C. Supremo
Tribunal Federal, em sessão de 27/8/1998, havia julgado improcedente o pedido formulado na
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF, considerando constitucional o § 3º, do art. 20,
da Lei nº 8.742/93.
No entanto, o referido Plenário, em sessão de 18/4/2013, apreciando o Recurso Extraordinário nº
567.985/MT, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do mencionado
§ 3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/93, nos termos do voto do E. Ministro Gilmar Mendes, in verbis:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo
Tribunal Federal na ADI 1.232.
Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que 'considera-se incapaz de prover a manutenção da
pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4
(um quarto) do salário mínimo'.
O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal
declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei
10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que
criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro
a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações
socioeducativas.
O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
(STF, Recurso Extraordinário nº 567.985/MT, Plenário, Relator para acórdão Ministro Gilmar
Mendes, j. em 18/4/13)
Asseverou o E. Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, que "o critério de ¼ do salário mínimo
utilizado pela LOAS está completamente defasado e mostra-se atualmente inadequado para aferir
a miserabilidade das famílias que, de acordo com o art. 203, V, da Constituição, possuem o
direito ao benefício assistencial."
Quadra mencionar, adicionalmente, que o C. Superior Tribunal de Justiça também analisou a
questão da miserabilidade por ocasião do julgamento proferido no Recurso Especial Repetitivo
Representativo de Controvérsia nº 1.112.557-MG (2009/0040999-9), in verbis:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe
que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de
deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua
renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o
acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente ao cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior
a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido."
(STJ, REsp. nº 1.112.557/MG, 3ª Seção, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/09,
v.u., DJ 20/11/09)
Dessa forma, pacificou-se o entendimento no sentido de que a comprovação de a parte autora
possuir (ou não) meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família deve
ser analisada pelo magistrado, em cada caso, de acordo com as provas apresentadas nos autos.
Outrossim, nos termos do art. 34, do Estatuto do Idoso, deve-se descontar outro benefício no
valor de um salário mínimo já concedido a qualquer membro da família, para fins de cálculo da
renda familiar per capita a que se refere a LOAS.
Embora a lei refira-se a outro benefício assistencial, nada impede que se interprete a lei
atribuindo-se à expressão também o sentido de benefício previdenciário, de forma a dar-se
tratamento igual a casos semelhantes. A avaliação da hipossuficiência tem caráter puramente
econômico, pouco importando o nomen juris do benefício recebido: basta que seja no valor de um
salário mínimo. É o que se poderia chamar de simetria ontológica e axiológica em favor de um ser
humano que se ache em estado de penúria equivalente à miserabilidade de outrem.
Nesse sentido, aliás, já decidiu essa E. Terceira Seção conforme ementa abaixo transcrita, in
verbis:
"EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INVÁLIDA. CUMPRIMENTO DOS
REQUISITOS LEGAIS. PREVALÊNCIA DO VOTO VENCEDOR.
I - A extensão dos embargos é adstrita aos limites da divergência que, no caso dos autos, recai
unicamente sobre a verificação da hipossuficiência econômica da parte autora.
II - É de se manter a concessão do benefício assistencial à autora, hoje com 61 anos, total e
definitivamente incapaz para o trabalho, que vive com uma filha e o marido, já idoso, o qual
percebe aposentadoria no valor de um salário mínimo.
III - As testemunhas ouvidas afirmam enfaticamente que a autora reside em casa muito simples e
faz uso diário de medicamentos.
IV - O rigor na aplicação da exigência quanto à renda mínima, tornaria inócua a instituição desse
benefício de caráter social, tal o grau de penúria em que se deveriam encontrar os beneficiários,
além do que, faz-se necessário descontar o benefício de valor mínimo, a que teria direito a parte
autora, para o cálculo da renda mensal per capita.
V - O conceito de unidade familiar foi esclarecido com a nova redação do § 1º do artigo 21 da Lei
nº 9.720/98, que remete ao art. 16 da Lei nº 8.213/91.
VI - Há no conjunto probatório, elementos que induzem à convicção de que a autora está entre o
rol dos beneficiários descritos na legislação.
VII - Embargos infringentes não providos."
(EAC nº 2002.03.099.026301-6, Rel. Des. Federal Marianina Galante, j. em 22/9/04, DJU de
05/10/04, grifos meus)
Passo à análise do caso concreto.
Para a comprovação da deficiência, foi realizada perícia judicial em 6/11/18, tendo sido elaborado
o parecer técnico de fls. 64/70 (id. 85301962 – págs. 3/9). Afirmou o esculápio encarregado do
exame, com base no exame físico e análise da documentação médica apresentada, que a autora
de 56 anos (nascida em 22/9/62), grau de instrução 3ª série e diarista sem registro em CTPS, é
portadora de epicondilite no cotovelo direito, concluindo pela existência de incapacidade
laborativa total e temporária, estimando um período de 4 (quatro) meses para tratamento.
Apresenta, ainda, hipertensão arterial e ansiedade, passível de controle medicamentoso. Dessa
forma, não ficou caracterizado o impedimento de longo prazo (superior a dois anos), de natureza
física, intelectual ou sensorial, capaz de obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com os demais.
Com relação à miserabilidade, observo que o estudo social (elaborado em 9/2/19, data em que o
salário mínimo era de R$ 998,00) demonstra que a autora reside com o marido José Roque Rosa,
de 60 anos, em uma chácara alugada, construída em alvenaria, coberta por telhas de cerâmica,
com forro, piso em cerâmica, paredes bem pintadas, sem sinais de reparos ou reformas recentes,
oferecendo boas condições de habitação, constituída por cinco cômodos, sendo dois dormitórios,
sala, cozinha e banheiro. A casa é guarnecida por móveis e eletrodomésticos em bom estado de
conservação, mencionando TV de 32” tela plana, tanquinho e centrífuga. A família possui um
veículo Gol ano 2002 a gasolina, que estava no conserto. A requerente possui quatro filhos a
saber: Rose Aparecida Rosa, de 38 anos, casada e "do lar", Rodrigo Rosa, de 31 anos, casado e
serviços gerais, Rogério Rosa, de 27 anos, casado e trabalha em posto de gasolina, ambos
residentes na cidade de Taquarituba/SP, e Ricardo Rosa, de 37 anos, casado, vendedor e
residente em Itaberá/SP. Conforme informações da autora à assistente social, os filhos auxiliam
sempre, quando podem. A renda mensal é proveniente do aluguel de uma casa que a família
possui, localizada em bairro urbano da cidade de Taquarituba, no valor de R$ 700,00, e da
remuneração do marido, que recebe benefício no valor de um salário mínimo por mês (R$
998,00). As despesas mensais totalizam aproximadamente R$ 1.514,54, sendo R$ 400,00 em
aluguel, R$ 800,00 em mercado (incluindo produtos de higiene pessoal e limpeza), R$ 44,54 em
energia elétrica, R$ 70,00 em gás de cozinha. Não há gastos com água, pois usam poço
artesiano. Segundo a assistente social, a manutenção da demandante está sendo realizada
satisfatoriamente pela família.
Ademais, as fotografias do interior e exterior do imóvel acostadas ao estudo social a fls. 81/100
(id. 85301964 – págs. 8/27), não condizem com a situação de hipossuficiência alegada.
Dessa forma, não ficou demonstrado o requisito da miserabilidade. Quadra ressaltar que, no
presente caso, foi levado em consideração todo o conjunto probatório apresentado nos autos, não
se restringindo ao critério da renda mensal per capita.
Há que se observar, ainda, que a assistência social a ser prestada pelo Poder Público possui
caráter subsidiário, restrita às situações de total impossibilidade de manutenção própria ou por
meio da família, não sendo possível ser utilizado o benefício assistencial como complementação
de renda.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
É o meu voto.
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA E MISERABILIDADE NÃO
DEMONSTRADAS. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO AMPARO SOCIAL COMO
COMPLEMENTO DE RENDA.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- Para a comprovação da deficiência, foi realizada perícia judicial em 6/11/18, tendo sido
elaborado o respectivo parecer técnico. Afirmou o esculápio encarregado do exame, com base no
exame físico e análise da documentação médica apresentada, que a autora de 56 anos (nascida
em 22/9/62), grau de instrução 3ª série e diarista sem registro em CTPS, é portadora de
epicondilite no cotovelo direito, concluindo pela existência de incapacidade laborativa total e
temporária, estimando um período de 4 (quatro) meses para tratamento. Apresenta, ainda,
hipertensão arterial e ansiedade, passível de controle medicamentoso. Dessa forma, não ficou
caracterizado o impedimento de longo prazo (superior a dois anos), de natureza física, intelectual
ou sensorial, capaz de obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com os demais.
III- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, não ficou demonstrada a alegada
miserabilidade da parte autora. O estudo social revela que a autora reside com o marido José
Roque Rosa, de 60 anos, em uma chácara alugada, construída em alvenaria, coberta por telhas
de cerâmica, com forro, piso em cerâmica, paredes bem pintadas, sem sinais de reparos ou
reformas recentes, oferecendo boas condições de habitação, constituída por cinco cômodos,
sendo dois dormitórios, sala, cozinha e banheiro. A casa é guarnecida por móveis e
eletrodomésticos em bom estado de conservação, mencionando TV de 32” tela plana, tanquinho
e centrífuga. A família possui um veículo Gol ano 2002 a gasolina, que estava no conserto. A
requerente possui quatro filhos a saber: Rose Aparecida Rosa, de 38 anos, casada e "do lar",
Rodrigo Rosa, de 31 anos, casado e serviços gerais, Rogério Rosa, de 27 anos, casado e
trabalha em posto de gasolina, ambos residentes na cidade de Taquarituba/SP, e Ricardo Rosa,
de 37 anos, casado, vendedor e residente em Itaberá/SP. Conforme informações da autora à
assistente social, os filhos auxiliam sempre, quando podem. A renda mensal é proveniente do
aluguel de uma casa que a família possui, localizada em bairro urbano da cidade de Taquarituba,
no valor de R$ 700,00, e da remuneração do marido, que recebe benefício no valor de um salário
mínimo por mês (R$ 998,00). As despesas mensais totalizam aproximadamente R$ 1.514,54,
sendo R$ 400,00 em aluguel, R$ 800,00 em mercado (incluindo produtos de higiene pessoal e
limpeza), R$ 44,54 em energia elétrica, R$ 70,00 em gás de cozinha. Não há gastos com água,
pois usam poço artesiano. Segundo a assistente social, a manutenção da demandante está
sendo realizada satisfatoriamente pela família.
IV- Há que se observar, ainda, que a assistência social a ser prestada pelo Poder Público possui
caráter subsidiário, restrita às situações de total impossibilidade de manutenção própria ou por
meio da família, não sendo possível ser utilizado o benefício assistencial como complementação
de renda.
V- Apelação da parte autora improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA