Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5644450-78.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
27/11/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 29/11/2019
Ementa
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO
DOS REQUISITOS LEGAIS.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- In casu, a alegada incapacidade da parte autora - com 22 anos na data do ajuizamento da
ação, em 11/5/17 - ficou plenamente caracterizada no presente feito, conforme parecer técnico
elaborado pelo Perito, datado de 17/8/17. Afirmou o esculápio encarregado do exame que o autor
é portador de “Linfoma não Hodgkin”, concluindo que o mesmo encontra-se total e
temporariamente incapacitado para o trabalho. Em resposta aos quesitos formulados, esclareceu
o esculápio que o demandante “está fazendo tratamento quimioterápico para linfoma”, estimando
o fim da incapacidade dentro de um ano, tendo em vista a “expectativa de transplante autólogo de
medula para este ano” (ID 61576138).Como bem asseverou a Ilustre Representante do parquet
Federal, “Conforme perícia médica, o autor foi diagnosticado em 26/7/2016 com neoplasia
maligna e expectativa de transplante autólogo de medula para aquele ano (2016), dessa forma, o
perito estimou o fim da incapacidade para 1 ano (fim de 2017). Todavia, conforme relatório
médico acostado aos autos, o apelado foi internado em 19/02/2018 recebendo a medula óssea
em 27/02/2018, ficando mais que comprovado que a incapacidade não cessou e que o apelado
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
continua em tratamento. Dessa forma, restou demonstrado o preenchimento do requisito de
impedimento de longo prazo exigido no art. 20 da referida lei, assim como o prazo mínimo de 2
(dois) anos, uma vez que o apelado encontra-se acometido pela doença desde 26/07/2016” (ID
91829564).Desse modo, embora o laudo pericial tenha concluído pela incapacidade total e
temporária da autora, tal fato não impede a concessão do benefício, tendo em vista que este deve
ser revisto a cada dois anos, nos termos do art. 21 da Lei nº 8.742/93, não exigindo que a
deficiência apresentada pela parte autora seja de caráter permanente.
III- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, o requisito da miserabilidade encontra-
se demonstrado no presente feito. O estudo social demonstra que o autor reside com seus
genitores, Sr. Israel e Sra. Marilena, e com seus irmãos, Eliel, estudante, e Adriela,
desempregada, em imóvel localizado “em área rural de difícil acesso (...) sem infraestrutura de
pavimentação asfáltica, sem rede de água e esgoto. A coleta de lixo é regular, passando duas
vezes por semana. A moradia é própria e em razoável estado de conservação, composta por três
quartos, cozinha, sala e dois banheiros. As mobílias são simples e em razoável estado de
conservação, compostas de sofá, estante, mesa com cadeiras, cama de sacal, cama de solteiro,
armário de cozinha, guarda-roupas. A casa possui também TV, geladeira e fogão” (ID 61576137).
A renda familiar é de R$ 250,00, proveniente do trabalho do genitor do demandante como
lavrador. Consta, ainda, do estudo social que o genitor do autor “está com problema na retina,
enxergando muito pouco” e que o “núcleo familiar recebe ajuda da congregação em que a família
frequenta e do ex-chefe do requerente” (ID 61576137). Dessa forma, pela análise de todo o
conjunto probatório dos autos, observo que o requisito da miserabilidade encontra-se
demonstrado no presente feito.
IV- A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros
moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora. Com relação aos índices
de atualização monetária e taxa de juros, deve ser observado o julgamento proferido pelo C.
Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947.
V- Apelação parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5644450-78.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ADRIEL BUENO
Advogado do(a) APELADO: MARCOS TADEU CONTESINI - SP61106-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5644450-78.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ADRIEL BUENO
Advogado do(a) APELADO: MARCOS TADEU CONTESINI - SP61106-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social visando à concessão do
benefício previsto no art. 203, inc. V, da Constituição Federal de 1988, sob o fundamento de ser
pessoa portadora de deficiência e não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo julgou procedente o pedido, concedendo o benefício requerido “a partir do
requerimento administrativo (DER do NB n. 701.881.453-8 03/11/2016 fl. 68/73), com a incidência
de correção monetária a partir do inadimplemento e juros de mora a contar da citação, atentando-
se aos limites da declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal nas ADIs
4.357 e 4.425, conjugados com manifestação do Superior Tribunal de Justiça no REsp
1.270.139/PR (sob o rito dos recursos especiais repetitivos) e 1.292.728/SC, a saber, correção
monetária calculada com base no IPCA e juros de mora estabelecidos pela lei vigente no período
(art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 seguida pela Lei 11.960/09, para os débitos não tributários; Taxa
SELIC para os débitos tributários). Quanto à modulação de efeitos nas prefaladas ADIs, está
fundamentada em razões político-econômicas e refere-se à fase de precatórios expedidos até
25.03.2015 porquanto já calculadas e afetadas verbas públicas para pagamento na ordem
cronológica. Não diz respeito, portanto, às condenações atuais, que seguem o regramento geral
estabelecido pelas Cortes Superiores, ao menos até o julgamento do denominado Tema 810 do
E. Supremo Tribunal Federal, com repercussão geral reconhecida (vide TJSP, Apelação nº
1004115-63.2015.8.26.0053, 5º Câmara de Direito Público, Rel. Des. Marcelo Berthe,
19.09.2016)” (ID 61576159). Os honorários advocatícios foram arbitrados em 10% sobre o valor
das parcelas vencidas até a sentença. Concedeu a tutela antecipada.
Inconformada, apelou a autarquia, requerendo em síntese:
- a improcedência do pedido, sob o fundamento de que não ficou comprovada a incapacidade de
logo prazo da parte autora. Caso não seja esse o entendimento, requer a incidência da correção
monetária e dos juros de mora nos termos da Lei n° 11.960/09.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pelo não provimento do recurso.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5644450-78.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ADRIEL BUENO
Advogado do(a) APELADO: MARCOS TADEU CONTESINI - SP61106-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Dispõe o art.
203, inc. V, da Constituição Federal, in verbis:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I -a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II -o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III -a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV -a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua
integração à vida comunitária;
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família, conforme dispuser a lei." (grifos meus)
Para regulamentar o dispositivo constitucional retro transcrito, foi editada a Lei nº 8.742 de
7/12/1993.
Cumpre ressaltar, ainda, que em 8/12/95 sobreveio o Decreto nº 1.744 regulamentando a Lei da
Assistência Social supramencionada.
Da leitura dos dispositivos legais, depreende-se que o benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF
é devido à pessoa portadora de deficiência ou considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que
não possua meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família.
Com relação ao requisito etário, observo que a idade de 70 (setenta) anos prevista no caput do
art. 20, da Lei nº 8.742/93, foi reduzida para 67 (sessenta e sete), conforme a Lei nº 9.720/98 e,
posteriormente, para 65 (sessenta e cinco), nos termos do art. 34 da Lei nº 10.741/2003.
No que concerne à incapacidade para a vida independente, conforme disposto no art. 20, da Lei
nº 8.742/93, não me parece ter sido o intuito do legislador conceituar pessoa portadora de
deficiência como aquela que necessita da assistência permanente de outra para a realização das
atividades básicas do ser humano. Nem seria razoável que o fizesse. Há de se entender como
incapacidade para a vida independente, sim, aquela que não dispõe de recursos para promover,
por seus próprios meios, condições para sobreviver com um mínimo de dignidade. Cumpre
registrar que a Súmula nº 30 da AGU, de 9 de junho de 2008, dispõe que: "A incapacidade para
prover a própria subsistência por meio do trabalho é suficiente para a caracterização da
incapacidade para a vidaindependente, conforme estabelecido no art. 203,V, da Constituição
Federal, e art. 20, II, da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993" (grifei). Ademais, a redação do
referido artigo foi alterada pela Lei nº 13.146/15: "Para efeito de concessão do benefício de
prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de
longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou
mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas."
No tocante ao segundo requisito, qual seja, a comprovação de a parte autora não possuir meios
de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, o Plenário do C. Supremo
Tribunal Federal, em sessão de 27/8/1998, havia julgado improcedente o pedido formulado na
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF, considerando constitucional o § 3º, do art. 20,
da Lei nº 8.742/93.
No entanto, o referido Plenário, em sessão de 18/4/2013, apreciando o Recurso Extraordinário nº
567.985/MT, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do mencionado
§ 3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/93, nos termos do voto do E. Ministro Gilmar Mendes, in verbis:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo
Tribunal Federal na ADI 1.232.
Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que 'considera-se incapaz de prover a manutenção da
pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4
(um quarto) do salário mínimo'.
O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal
declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei
10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que
criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro
a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações
socioeducativas.
O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
(STF, Recurso Extraordinário nº 567.985/MT, Plenário, Relator para acórdão Ministro Gilmar
Mendes, j. em 18/4/13)
Asseverou o E. Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, que "o critério de ¼ do salário mínimo
utilizado pela LOAS está completamente defasado e mostra-se atualmente inadequado para aferir
a miserabilidade das famílias que, de acordo com o art. 203, V, da Constituição, possuem o
direito ao benefício assistencial."
Quadra mencionar, adicionalmente, que o C. Superior Tribunal de Justiça também analisou a
questão da miserabilidade por ocasião do julgamento proferido no Recurso Especial Repetitivo
Representativo de Controvérsia nº 1.112.557-MG (2009/0040999-9), in verbis:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe
que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de
deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua
renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o
acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente ao cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior
a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar
7. Recurso Especial provido."
(STJ, REsp. nº 1.112.557/MG, 3ª Seção, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/09,
v.u., DJ 20/11/09)
Dessa forma, pacificou-se o entendimento no sentido de que a comprovação de a parte autora
possuir (ou não) meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família deve
ser analisada pelo magistrado, em cada caso, de acordo com as provas apresentadas nos autos.
Outrossim, nos termos do art. 34, do Estatuto do Idoso, deve-se descontar outro benefício no
valor de um salário mínimo já concedido a qualquer membro da família, para fins de cálculo da
renda familiar per capita a que se refere a LOAS.
Embora a lei refira-se a outro benefício assistencial, nada impede que se interprete a lei
atribuindo-se à expressão também o sentido de benefício previdenciário, de forma a dar-se
tratamento igual a casos semelhantes. A avaliação da hipossuficiência tem caráter puramente
econômico, pouco importando o nomen juris do benefício recebido: basta que seja no valor de um
salário mínimo. É o que se poderia chamar de simetria ontológica e axiológica em favor de um ser
humano que se ache em estado de penúria equivalente à miserabilidade de outrem.
Nesse sentido, aliás, já decidiu essa E. Terceira Seção conforme ementa abaixo transcrita, in
verbis:
"EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INVÁLIDA. CUMPRIMENTO DOS
REQUISITOS LEGAIS. PREVALÊNCIA DO VOTO VENCEDOR.
I - A extensão dos embargos é adstrita aos limites da divergência que, no caso dos autos, recai
unicamente sobre a verificação da hipossuficiência econômica da parte autora.
II - É de se manter a concessão do benefício assistencial à autora, hoje com 61 anos, total e
definitivamente incapaz para o trabalho, que vive com uma filha e o marido, já idoso, o qual
percebe aposentadoria no valor de um salário mínimo.
III - As testemunhas ouvidas afirmam enfaticamente que a autora reside em casa muito simples e
faz uso diário de medicamentos.
IV - O rigor na aplicação da exigência quanto à renda mínima, tornaria inócua a instituição desse
benefício de caráter social, tal o grau de penúria em que se deveriam encontrar os beneficiários,
além do que, faz-se necessário descontar o benefício de valor mínimo, a que teria direito a parte
autora, para o cálculo da renda mensal per capita.
V - O conceito de unidade familiar foi esclarecido com a nova redação do § 1º do artigo 21 da Lei
nº 9.720/98, que remete ao art. 16 da Lei nº 8.213/91.
VI - Há no conjunto probatório, elementos que induzem à convicção de que a autora está entre o
rol dos beneficiários descritos na legislação.
VII - Embargos infringentes não providos."
(EAC nº 2002.03.099.026301-6, Rel. Des. Federal Marianina Galante, j. em 22/9/04, DJU de
05/10/04, grifos meus)
Passo à análise do caso concreto.
In casu, a alegada incapacidade da parte autora - com 22 anos na data do ajuizamento da ação,
em 11/5/17 - ficou plenamente caracterizada no presente feito, conforme parecer técnico
elaborado pelo Perito, datado de 17/8/17. Afirmou o esculápio encarregado do exame que o autor
é portador de “Linfoma não Hodgkin”, concluindo que o mesmo encontra-se total e
temporariamente incapacitado para o trabalho. Em resposta aos quesitos formulados, esclareceu
o esculápio que o demandante “está fazendo tratamento quimioterápico para linfoma”, estimando
o fim da incapacidade dentro de um ano, tendo em vista a “expectativa de transplante autólogo de
medula para este ano” (ID 61576138).
Como bem asseverou a Ilustre Representante do parquet Federal, “Conforme perícia médica, o
autor foi diagnosticado em 26/7/2016 com neoplasia maligna e expectativa de transplante
autólogo de medula para aquele ano (2016), dessa forma, o perito estimou o fim da incapacidade
para 1 ano (fim de 2017). Todavia, conforme relatório médico acostado aos autos, o apelado foi
internado em 19/02/2018 recebendo a medula óssea em 27/02/2018, ficando mais que
comprovado que a incapacidade não cessou e que o apelado continua em tratamento. Dessa
forma, restou demonstrado o preenchimento do requisito de impedimento de longo prazo exigido
no art. 20 da referida lei, assim como o prazo mínimo de 2 (dois) anos, uma vez que o apelado
encontra-se acometido pela doença desde 26/07/2016” (ID 91829564).
Desse modo, embora o laudo pericial tenha concluído pela incapacidade total e temporária da
autora, tal fato não impede a concessão do benefício, tendo em vista que este deve ser revisto a
cada dois anos, nos termos do art. 21 da Lei nº 8.742/93, não exigindo que a deficiência
apresentada pela parte autora seja de caráter permanente.
Com relação à miserabilidade, observo que o estudo social, demonstra que o autor reside com
seus genitores, Sr. Israel e Sra. Marilena, e com seus irmãos, Eliel, estudante, e Adriela,
desempregada, em imóvel localizado “em área rural de difícil acesso (...) sem infraestrutura de
pavimentação asfáltica, sem rede de água e esgoto. A coleta de lixo é regular, passando duas
vezes por semana. A moradia é própria e em razoável estado de conservação, composta por três
quartos, cozinha, sala e dois banheiros. As mobílias são simples e em razoável estado de
conservação, compostas de sofá, estante, mesa com cadeiras, cama de sacal, cama de solteiro,
armário de cozinha, guarda-roupas. A casa possui também TV, geladeira e fogão” (ID 61576137).
A renda familiar é de R$ 250,00, proveniente do trabalho do genitor do demandante como
lavrador. Consta, ainda, do estudo social que o genitor do autor “está com problema na retina,
enxergando muito pouco” e que o “núcleo familiar recebe ajuda da congregação em que a família
frequenta e do ex-chefe do requerente” (ID 61576137).
Dessa forma, pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, observo que o requisito da
miserabilidade encontra-se demonstrado no presente feito.
Cumpre ressaltar que o benefício deve ser revisto a cada dois anos, haja vista a expressa
disposição legal prevista no art. 21 da Lei nº 8.742/93.
Ressalto, ainda, ser vedada a acumulação do benefício assistencial de prestação continuada com
qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica,
nos termos do art. 20, §4º, da Lei nº 8.742/93, devendo ser deduzidos na fase de execução do
julgado os pagamentos feitos pela autarquia na esfera administrativa.
A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros
moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora.
Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, deve ser observado o
julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso
Extraordinário nº 870.947.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação para fixar a correção monetária e os juros
moratórios na forma acima indicada.
É o meu voto.
E M E N T A
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO
DOS REQUISITOS LEGAIS.
I- O benefício previsto no art. 203, inc. V, da CF é devido à pessoa portadora de deficiência ou
considerada idosa e, em ambas as hipóteses, que não possua meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
II- In casu, a alegada incapacidade da parte autora - com 22 anos na data do ajuizamento da
ação, em 11/5/17 - ficou plenamente caracterizada no presente feito, conforme parecer técnico
elaborado pelo Perito, datado de 17/8/17. Afirmou o esculápio encarregado do exame que o autor
é portador de “Linfoma não Hodgkin”, concluindo que o mesmo encontra-se total e
temporariamente incapacitado para o trabalho. Em resposta aos quesitos formulados, esclareceu
o esculápio que o demandante “está fazendo tratamento quimioterápico para linfoma”, estimando
o fim da incapacidade dentro de um ano, tendo em vista a “expectativa de transplante autólogo de
medula para este ano” (ID 61576138).Como bem asseverou a Ilustre Representante do parquet
Federal, “Conforme perícia médica, o autor foi diagnosticado em 26/7/2016 com neoplasia
maligna e expectativa de transplante autólogo de medula para aquele ano (2016), dessa forma, o
perito estimou o fim da incapacidade para 1 ano (fim de 2017). Todavia, conforme relatório
médico acostado aos autos, o apelado foi internado em 19/02/2018 recebendo a medula óssea
em 27/02/2018, ficando mais que comprovado que a incapacidade não cessou e que o apelado
continua em tratamento. Dessa forma, restou demonstrado o preenchimento do requisito de
impedimento de longo prazo exigido no art. 20 da referida lei, assim como o prazo mínimo de 2
(dois) anos, uma vez que o apelado encontra-se acometido pela doença desde 26/07/2016” (ID
91829564).Desse modo, embora o laudo pericial tenha concluído pela incapacidade total e
temporária da autora, tal fato não impede a concessão do benefício, tendo em vista que este deve
ser revisto a cada dois anos, nos termos do art. 21 da Lei nº 8.742/93, não exigindo que a
deficiência apresentada pela parte autora seja de caráter permanente.
III- Pela análise de todo o conjunto probatório dos autos, o requisito da miserabilidade encontra-
se demonstrado no presente feito. O estudo social demonstra que o autor reside com seus
genitores, Sr. Israel e Sra. Marilena, e com seus irmãos, Eliel, estudante, e Adriela,
desempregada, em imóvel localizado “em área rural de difícil acesso (...) sem infraestrutura de
pavimentação asfáltica, sem rede de água e esgoto. A coleta de lixo é regular, passando duas
vezes por semana. A moradia é própria e em razoável estado de conservação, composta por três
quartos, cozinha, sala e dois banheiros. As mobílias são simples e em razoável estado de
conservação, compostas de sofá, estante, mesa com cadeiras, cama de sacal, cama de solteiro,
armário de cozinha, guarda-roupas. A casa possui também TV, geladeira e fogão” (ID 61576137).
A renda familiar é de R$ 250,00, proveniente do trabalho do genitor do demandante como
lavrador. Consta, ainda, do estudo social que o genitor do autor “está com problema na retina,
enxergando muito pouco” e que o “núcleo familiar recebe ajuda da congregação em que a família
frequenta e do ex-chefe do requerente” (ID 61576137). Dessa forma, pela análise de todo o
conjunto probatório dos autos, observo que o requisito da miserabilidade encontra-se
demonstrado no presente feito.
IV- A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros
moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora. Com relação aos índices
de atualização monetária e taxa de juros, deve ser observado o julgamento proferido pelo C.
Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947.
V- Apelação parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
