Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0002626-85.2020.4.03.6332
Relator(a)
Juiz Federal FABIO IVENS DE PAULI
Órgão Julgador
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
03/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/02/2022
Ementa
E M E N T A
ASSISTENCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LAUDO DESFAVORÁVEL. NÃO
SE VERIFICA A EXISTÊNCIA DE INCAPACIDADE OU DEFICIÊNCIA. INVIÁVEL A
CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO DA PARTE AUTORA A QUE SE NEGA
PROVIMENTO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0002626-85.2020.4.03.6332
RELATOR:43º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: FELIPE LOPES DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: MARCOS ROBERTO FERREIRA DE SOUZA - SP293440-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0002626-85.2020.4.03.6332
RELATOR:43º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: FELIPE LOPES DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: MARCOS ROBERTO FERREIRA DE SOUZA - SP293440-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso interposto pelo autor de sentença que julgou improcedente o pedido de
concessão de benefício assistencial.
Em suas razões recursais, aduz o autor, que preenche os requisitos para a obtenção do
benefício.
Requer o provimento do recurso, para que seja acolhido o pedido formulado na inicial. Pugna
pela reforma do julgado.
Subsidiariamente, requer a anulação da sentença “a fim de reabrir a instrução processual,
determinando a realização de nova perícia médica nos moldes estabelecidos pelo IF-BRA,
devendo ser analisada a existência da deficiência (de acordo com seu novo conceito) com
fundamento no CID-10 conjugado com o CIF”.
É o que cumpria relatar.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0002626-85.2020.4.03.6332
RELATOR:43º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: FELIPE LOPES DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: MARCOS ROBERTO FERREIRA DE SOUZA - SP293440-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
De início, importa recordar o que salientou o Juízo singular no que tange a análise do requisito
da deficiência:
" No caso dos autos, o laudo médico pericial produzido em juízo foi categórico ao afirmar que a
parte autora não apresenta impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual ou
sensorial que possam obstruir a sua participação plena e efetiva na sociedade (quesito 3.8),
bem como em afirmar a sua plena capacidade para o trabalho, a despeito de seus problemas
de saúde (evento 27).
Dessa forma, ausente o requisito da deficiência."
Não merece acolhida o pleito de anulação da sentença, pois a perícia foi validamente realizada,
em procedimento que observou o contraditório e a ampla defesa. A divergência entre a
conclusão do perito e as informações constantes dos documentos acostados aos autos não
invalida o laudo. Outrossim, é lícito ao juiz indeferir quesitos considerados desnecessários
diante dos dados já constantes do laudo técnico.
O benefício de prestação continuada, está previsto no art. 203, inciso V, da Constituição de
1988, e foi regulamentado pelo art. 20 da Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social -
LOAS), consistindo na garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao
idoso com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção
nem de tê-la provida por sua família. São requisitos para a sua concessão: de um lado, sob o
aspecto subjetivo, a deficiência ou a idade, e de outro lado, sob o aspecto objetivo, a
incapacidade de prover à própria subsistência ou de tê-la provida por seus familiares
(miserabilidade).
Pessoa com deficiência é aquela que tem impedimento de longo prazo, assim considerado
aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de dois anos, de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas
(art. 20, §§ 2º e 10 da Lei 8.742/93).
Nos termos do art. 20, §3º: “Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com
deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do
salário-mínimo”. O Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do RE 567985/MT,
reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, dessa disposição.
Entendeu-se que é possível a aferição da miserabilidade a partir de outros critérios, com
atenção para as Leis 10.836/2004, 10.689/2003, 10.219/01 e 9.533/97, que estabeleceram
critérios mais abrangentes para a concessão de outros benefícios assistenciais.
O art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/03, determina que o benefício assistencial concedido a
qualquer membro da família idoso não será computado para os fins do cálculo da renda familiar
per capita a que se refere a LOAS. O STF reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, para o fim de estender os efeitos da norma aos benefícios assistenciais
recebidos por deficientes e previdenciários, no valor de até um salário mínimo, percebido por
idosos (RE 580963/PR).
Atualmente, a LOAS expressamente autoriza a utilização de outros elementos probatórios da
condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade (art. 20, §11,
introduzido pela Lei 13.146/15). Nesse sentido, o critério que deve nortear o exame do requisito
econômico é o da efetiva necessidade do auxílio (TNU, PEDILEF 2008709500006325). Por isso
mesmo, a presunção de miserabilidade que decorre do enquadramento no critério da renda per
capita do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 pode ser afastada por outros elementos de prova
(TNU, PEDILEF 50004939220144047002, representativo de controvérsia).
A propósito da alegada deficiência, consta do laudo pericial o que segue:
"Discussão
Fundamentado única e exclusivamente nos documentos a mim apresentados e nas
informações obtidas durante a entrevista e exame físico do periciando, passo aos seguintes
comentários.
Os documentos médicos apresentados descrevem G800, Paralisia cerebral quadriplágica
espástica; G820, Paraplegia flácida.
Ante o exposto, noto que o periciando apresenta relatos dos diagnósticos acima elencados,
sendo que refere que quando nasceu foi acometido de meningite e ficou com sequelas nas
pernas. Daí, quando começou a estudar, sofria muito bullying por isso e acabou abandonando
os estudos. Informa que vive de favor e, às vezes, a sua irmã o ajuda – sic. Ao ser questionado
sobre o que o incapacita para o trabalho, responde que é porque não tem muito apoio nas
pernas para conseguir carregar muito peso – sic. Nesse sentido, apresenta documentos que
corroboram em parte os eventos narrados, incluindo a meningite e as sequelas em membros
inferiores (vide página quatro do arquivo 11 dos autos). Porém, carece de elementos que
fundamentem a incapacidade alegada. Isso, porque se encontra nessa situação desde tenra
idade e já está adaptado às suas limitações físicas, sendo que consegue deambular mancando
(sem apoio), permanecer em ortostase etc. Ainda, a parte superior do seu corpo, incluindo o
tronco e os membros superiores, apresentam função preservada. Também, consegue realizar
as atividades da vida diária (vestir-se, comer, tomar banho etc.) sem ajuda de terceiros, tanto
que informa morar sozinho – sic. Por fim, ao exame físico pericial, verifico a presença de
deambulação sem apoio mancando, mas com boa capacidade funcional dos membros
superiores e cognição mantida.
Desse modo, concluo que não foi constatada incapacidade para as suas atividades habituais,
nem para as atividades da vida independente.
Conclusão
1-Não foi constatada incapacidade para as suas atividades laborais habituais;
2-Não há incapacidade para as atividades da vida independente.”.
Diante do que apontou o perito, não é viável a concessão do benefício, pois o autor, embora
apresente a condição alegada, não é pessoa com deficiência ou incapacitada para suas
atividades habituais. Nesse contexto, devem ser acolhidos os fundamentos expostos pelo Juízo
de origem que, no essencial, assinalou:
" (...)são requisitos constitucionais cumulativos para a obtenção do benefício: (i) a deficiência ou
idade avançada; e (ii) a necessidade (hipossuficiência econômica).
No tocante ao primeiro requisito, a Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência)
deu nova redação ao art. 20, §2º, da Lei nº 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social) , de
modo a adequar o conceito de pessoa com deficiência àquele previsto pela Convenção
Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (promulgada pelo Decreto nº
6.949/09), nos seguintes termos:
Art. 20, §2º Para efeitos de concessão do benefício de prestação continuada, considera -se
pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Dessa forma, em consonância com o art. 2º, §1º, da Lei nº 13.146/2015, a avaliação da
deficiência deve considerar diversos aspectos, envolvendo os impedimentos das funções e
estruturas do corpo, os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais, a limitação no
desempenho de atividades e a restrição da participação da pessoa.
A noção legal de pessoa com deficiência deve, ainda, ser interpretada em consonância com as
demais normas do ordenamento jurídico que integram o sistema de proteção à pessoa
Assinado digitalmente por PAULO MARCOS RODRIGUES DE ALMEIDA:10412 Documento Nº
2021/633200054399-32948 Consulte a autenticidade em http://web.trf3.jus.br/autenticacaojef
com deficiência e à luz da finalidade constitucional do benefício assistencial, que é prover o
beneficiário de capacidade econômica mínima à preservação da vida com dignidade.
Nesse passo, a ideia de incapacidade para o trabalho, tal como desenvolvida no Direito
Previdenciário, não é suficiente para atender à amplitude da noção legal de deficiência, não se
exigindo, em rigor, que a pessoa esteja incapacitada para o trabalho, mas que, em razão de
impedimentos de diversas ordens, não tenha meios de se sustentar por si só, dependendo de
terceiros para sua subsistência.
No caso dos autos, o laudo médico pericial produzido em juízo foi categórico ao afirmar que a
parte autora não apresenta impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual ou
sensorial que possam obstruir a sua participação plena e efetiva na sociedade (quesito 3.8),
bem como em afirmar a sua plena capacidade para o trabalho, a despeito de seus problemas
de saúde (evento 27).
Dessa forma, ausente o requisito da deficiência.
Nesse contexto, ausente o requisito constitucional da deficiência, revela-se, desde já, a
impossibilidade de acolhimento do pedido inicial, sendo irrelevante a análise da hipossuficiência
econômica.
A hipótese é, pois, de improcedência da demanda."
Assim, todas as questões discutidas no recurso foram corretamente apreciadas pelo Juízo de
Primeiro Grau.
Diante disso, devem ser adotados, neste acórdão, os fundamentos já expostos na sentença
recorrida, a qual deve ser mantida, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95.
O Supremo Tribunal Federal, em sucessivos julgados (cf. ARE 736.290 AgR/SP, Primeira
Turma, Rel. Min. Rosa Weber, DJE 15/08/2013; AI 749.969 AgR/RJ, Primeira Turma, Rel. Min.
Ricardo Lewandowski, DJE 08/10/2008; AI 749.963 AgR/RJ, Segunda Turma, Rel. Min. Eros
Grau, DJE 24/09/2009), afirmou que a regra veiculada pelo art. 46, da Lei n. 9.099/95, não
infringe o devido processo legal, a ampla defesa, o contraditório e o dever de fundamentação
das decisões judiciais (arts. 5º, LIV, LV, 93, IX, da Constituição da República de 1988), se “a
jurisdição foi prestada mediante decisão suficientemente motivada” (AI 651.364 AgR/RJ,
Primeira Turma, Rel. Min. Menezes Direito, DJE 25/09/2008).
Recorrente condenado ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o
valor da causa atualizado. O pagamento dos honorários advocatícios ficará suspenso até que a
parte possa efetuá-lo sem prejuízo do sustento próprio ou da família em razão de ser
beneficiária de gratuidade judiciária (art. 98, § 3º do CPC/2015 c/c art. 1.046, § 2º do mesmo
Codex e art. 1º da Lei 10.259/2001).
É o voto.
E M E N T A
ASSISTENCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LAUDO DESFAVORÁVEL.
NÃO SE VERIFICA A EXISTÊNCIA DE INCAPACIDADE OU DEFICIÊNCIA. INVIÁVEL A
CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO DA PARTE AUTORA A QUE SE NEGA
PROVIMENTO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a 15ª Turma
Recursal do Juizado Especial Federal da 3ª Região, Seção Judiciária do Estado de São Paulo,
por unanimidade, negar provimento ao recurso interposto, nos termos do voto do Juiz Federal
Relator. Participaram do julgamento os Juízes Federais Fábio Ivens de Pauli, Luciana Jacó
Braga e Rodrigo Oliva Monteiro.
São Paulo, 28 de janeiro de 2022, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
