
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007512-38.2021.4.03.6318
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: CARLOS SANTOS DA SILVA
REPRESENTANTE: SONIA PEREIRA DOS SANTOS
Advogados do(a) APELANTE: PAULO CESAR GOMES - SP103019-A, TANIA MARIA DE ALMEIDA LIPORONI - SP79750-A,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007512-38.2021.4.03.6318
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: CARLOS SANTOS DA SILVA
REPRESENTANTE: SONIA PEREIRA DOS SANTOS
Advogados do(a) APELANTE: PAULO CESAR GOMES - SP103019-A, TANIA MARIA DE ALMEIDA LIPORONI - SP79750-A,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em demanda ajuizada objetivando o restabelecimento de benefício assistencial concedido ao deficiente, desde a data da cessação do NB 87/116.782.692-0, em 14/02/2021, bem como a declaração de inexistência do débito de R$ 69.603,66, relativo às parcelas pagas no período de 30/09/2015 a 31/01/2021.
O dispositivo da sentença foi assim estabelecido (ID 284665620):
III – DISPOSITIVO
Posto isso, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Novo Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado para o fim exclusivo declarar a inexigibilidade da devolução dos valores tidos pelo INSS como indevidamente recebidos pela parte autora no período de 30/09/2015 a 31/01/2021, relativo ao benefício assistencial E/NB 87/116.782.692-0.
Com o trânsito em julgado, dê-se ciência à CEABDJ para averbação definitiva da ordem de abstenção da cobrança.
Em razão da sucumbência recíproca (art. 86 do CPC), condeno a parte autora ao pagamento das custas proporcionais ao proveito econômico obtido pela parte ré e ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo no percentual mínimo de 5% (cinco por cento), na forma do § 3º do art. 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor do proveito econômico, de modo a possibilitar sua eventual majoração, nos termos do § 11 do mesmo dispositivo, e observado, ainda, seu § 5º, por ocasião da apuração do montante a ser pago. Sua exigibilidade, contudo, deverá ficar suspensa em razão do deferimento de gratuidade da justiça, nos termos do art. 98, § 3º do novo CPC. De outro lado, deixo de condenar a parte ré ao pagamento de custas, por isenção legal, mas a condeno ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo no percentual mínimo, na forma do § 3º do art. 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor do proveito econômico (valor exigido administrativamente – R$69.603,66 – Id. 274943592 - Pág. 49), de modo a possibilitar sua eventual majoração, nos termos do § 11 do mesmo dispositivo, e observado, ainda, seu § 5º, por ocasião da apuração do montante a ser pago.
Custas na forma da lei, observando-se que a autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do artigo 4º, inciso I, da Lei nº. 9.289/96, do artigo 24-A da Lei nº. 9.028/95, com a redação dada pelo artigo 3º da MP nº. 2.180-35/01, e do art. 8º, §1º, da Lei nº. 8.620/92.
Sentença não sujeita ao reexame necessário."
Apela a parte autora alega, em síntese, fazer jus ao restabelecimento do benefício assistencial por ser portadora de deficiência e não possuir meios de prover à própria subsistência ou de tê-la provida por sua família, que é composta por quatro pessoas, duas delas com distúrbios psíquicos, as quais sobrevivem com uma renda de apenas um salário mínimo mensal, valor insuficiente para o atendimento de suas necessidades básicas, passando por privações e necessidades.
Requer o provimento integral de seu recurso com a inversão dos ônus da sucumbência.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta E. Corte Regional.
Manifesta-se o r. Ministério Público Federal pelo provimento do recurso interposto pela parte autora.
É o relatório.
pat
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007512-38.2021.4.03.6318
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V O T O
A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora):
Cinge-se a controvérsia à análise dos requisitos para o restabelecimento de benefício assistencial concedido ao deficiente no período de 31/07/2000 a 01/03/2021.
O recurso de apelação preenche os requisitos de admissibilidade e merece ser conhecido nos termos em que devolvido, restringindo sua apreciação à matéria impugnada na apelação, em observância ao princípio “tantum devolutum quantum appellatum”.
Benefício de prestação continuada
A Constituição da República em seu artigo 203, inciso V, prevê o benefício de amparo social no valor de um salário-mínimo, nos seguintes termos, in verbis:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...) V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A Lei n. 8.742, de 07/12/1993, denominada Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), deu eficácia às normas constitucionais criando o benefício de prestação continuada (BPC), também denominado benefício assistencial, na forma de seu artigo 20, in verbis:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei n. 12.435, de 2011) (Vide Lei n. 13.985, de 2020)
A LOAS está regulamentada, atualmente, pelo Decreto n. 6.214, de 26/09/2007.
Dos requisitos ao benefício assistencial
O artigo 20 da LOAS e o artigo 1º de seu decreto regulamentar estabelecem que são requisitos à concessão do amparo assistencial, a comprovação: (1) alternativamente, ser idoso com idade igual ou superior a 65 anos ou ser pessoa com deficiência; e (2) estar em situação de hipossuficiência econômica (miserabilidade), que se caracteriza pela ausência de condições para prover a própria subsistência ou tê-la provida por família.
1. Dos beneficiários
O benefício assistencial é devido a “brasileiros natos, naturalizados e estrangeiros residentes no País, atendidos os requisitos constitucionais e legais”, conforme foi pacificado pelo Colendo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do RE n. 587.970, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO, com repercussão geral, (Tribunal Pleno, j. 20/04/2017, publ. 22-09-2017).
Anote-se, ainda, que a concessão, a manutenção e a revisão do benefício assistencial depende da regularidade das inscrições no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico), consoante previsto em regulamento (§ 12 do art. 20 da LOAS, incluído pela Lei n. 13.846, de 18/06/2019).
Da qualidade de idoso
A pessoa idosa é considerada aquela com idade mínima de 65 anos, conforme o artigo 34 da Lei n. 10.741, de 01/10/2003 (Estatuto do Idoso).
Da qualidade de pessoa com deficiência
A pessoa com deficiência, segundo o artigo 20, § 2º, da LOAS, é aquela que tem “impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”, conforme a redação dada pela Lei n. 13.146, de 06/07/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência).
Ressalte-se que o impedimento de longo prazo é aquele que produz efeitos pelo prazo mínimo de dois anos, na forma do artigo 20, § 10º, da LOAS, incluído pela Lei n. 12.470, de 31/08/2011. Ainda, “para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação”, esse é o teor da Súmula 48 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU). (Redação alterada na sessão de 25/04/2019).
Esse tema foi enfrentado por esta Egrégia Décima Turma conforme o excerto da ementa que ora trazemos à colação:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIÊNCIA. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. REQUISITOS PREENCHIDOS. TERMO INICIAL MANTIDO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. POSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DE MULTA DIÁRIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA EM CASO DE ATRASO NO CUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. PRAZO EXÍGUO PARA IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO. AMPLIAÇÃO.
1. O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família.
2. Segundo a Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) "para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas". De acordo com a referida lei, entende-se por longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
3. Consoante perícia médica produzida é possível concluir que o estado clínico da parte autora implica a existência de impedimento de longo prazo, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, poderia obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, devendo, assim, ser considerada pessoa com deficiência para os efeitos legais.
(...)
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, APELAÇÃO CÍVEL - 0010184-23.2011.4.03.6139, Rel. Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, julgado em 30/11/2021, Intimação via sistema DATA: 03/12/2021)
2. Da situação de hipossuficiência econômica
Do núcleo familiar
O conceito de família para fins de obtenção do BPC está contido no artigo 20, § 1º, in verbis:
Art. 20 (...)§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei n. 12.435, de 2011)
Cabe anotar que a evolução do conceito de família, para fins de se avaliar a hipossuficiência econômica, passou pela unidade mononuclear sob o mesmo teto (redação original da LOAS); depois alcançou o conjunto de pessoas elencadas no artigo 16 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, desde que vivessem sob o mesmo teto (MP n. 1.473-34, de 11/08/1997, convertida na Lei n. 9.720, de 30/11/1998).
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LEI 8.742/1993. CONCEITO DE FAMÍLIA PARA AFERIÇÃO DA RENDA PER CAPITA. EXCLUSÃO DA RENDA DO FILHO CASADO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 20, § 1o. DA LEI 12.435/2011 (LOAS). AGRAVO INTERNO DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A Constituição Federal prevê, em seu art. 203, caput e inciso V, a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. A Lei 12.435/2011 alterou o § 1o. do art. 20 da LOAS, determinando que § 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
3. O critério da família reside no estado civil, vez que as pessoas que possuírem vínculo matrimonial ou de união estável fazem parte de outro grupo familiar, e seus rendimentos são direcionados a este, mesmo que resida sobre o mesmo teto, para efeito de aferição da renda mensal per capita nos termos da Lei.
4. Agravo Interno do INSS a que se nega provimento.
(STJ, AgInt REsp 1.718.668/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, DJe de 26/03/2019).
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.RENDA MENSAL PER CAPITA.CONCEITO DE FAMÍLIA. ART. 20, § 1º, DA LEI N. 8.742/93, ALTERADO PELA LEI N. 12.435/2011. PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
I - Na origem, cuida-se de ação ajuizada em desfavor do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS objetivando a concessão do benefício da assistência social à pessoa com deficiência. Foram interpostos recursos especiais pelo beneficiário e pelo Ministério Público Federal.
II - O Tribunal de origem negou o benefício assistencial pleiteado por entender que a renda mensal, proveniente da aposentadoria por invalidez do cunhado e do salário do sobrinho da parte autora, é suficiente para prover o seu sustento, afastando, assim, a condição de miserabilidade.
III - O conceito de renda mensal da família contido na Lei n. 8.472/1991 deve ser aferido levando-se em consideração a renda das pessoas do grupo familiar indicado no § 1º do citado art. 20 que compartilhem a moradia com aquele que esteja sob vulnerabilidade social (idoso, com 65 anos ou mais, ou pessoa com deficiência), qual seja: '[...] o requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto'.
IV - Portanto, entende-se que 'são excluídas desse conceito as rendas das pessoas que não habitem sob o mesmo teto daquele que requer o benefício social de prestação continuada e das pessoas que com ele coabitem, mas que não sejam responsáveis por sua manutenção socioeconômica'.
(REsp n. 1.538.828/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Primeira Turma, julgado em 17/10/2017, DJe 27/10/2017.)
Da composição da renda
O cômputo da renda para fins de aferição da situação de hipossuficiência não pode indicar outros benefícios sociais, segundo o que foi preconizado pelo artigo 20, § 4º, da LOAS, in verbis:
Art. 20 (...)§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei n. 12.435, de 2011)
Essa regra, no entanto, foi alterada pelo parágrafo único do artigo 34 da Lei n. 10.741, de 01/10/2003, o Estatuto do Idoso, que excluiu do cômputo da renda familiar o benefício assistencial concedido a qualquer membro da família idoso.
Verificada a ocorrência de discriminação quanto ao cálculo da renda para fins de portadores de deficiência, que não tinham sido contemplados, o C. STF decretou, no julgamento do RE 580.963/PR, Rel. Ministro GILMAR MENDES, a inconstitucionalidade por omissão parcial da referida norma, sem pronúncia de nulidade. Eis o excerto da ementa que trago à colação, in verbis:
(...) 4. A inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. O Estatuto do Idoso dispõe, no art. 34, parágrafo único, que o benefício assistencial já concedido a qualquer membro da família não será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS. Não exclusão dos benefícios assistenciais recebidos por deficientes e de previdenciários, no valor de até um salário mínimo, percebido por idosos. Inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo. Omissão parcial inconstitucional. 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. 6. Recurso extraordinário a que se nega provimento.
(RE 580963, Relator Ministro GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, Processo Eletrônico Repercussão Geral – Mérito, publ. 14/11/2013)
Nessa linha de intelecção, o C. STJ assentou, no julgamento do REsp 1.355.052, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, o teor do Tema 640/STJ: “Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93”, (j. 25/02/2015, DJe 05/11/2015, transitado em 16/12/2015).
Atualmente, perdeu o sentido a discussão acerca da aplicação do artigo 34 do Estatuto do Idoso para fins da composição da renda, porquanto a Lei n. 13.982, de 02/04/2020, incluiu o § 14 ao artigo 20 da LOAS, prevendo expressamente a exclusão de benefício assistencial ou previdenciário de um salário-mínimo na composição da renda para fins de concessão de BPC. Eis o teor in verbis:
Art. 20 (...)§ 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo.
Portanto, conforme o entendimento jurisprudencial firmado pelas Cortes Superiores, recente positivado pelo legislador, deve ser excluído do cômputo da renda per capita o valor proveniente de benefício assistencial ou previdenciário no valor de até um salário-mínimo, recebido por idoso ou pessoa com deficiência, pertencente ao núcleo familiar.
Da condição de miserabilidade
A definição legal de hipossuficiência, para fins de concessão do BPC, foi também marcada por discussões que conduziram à evolução legislativa e jurisprudencial.
Diversas alterações legais foram verificadas quanto à fixação da renda mensal per capta máxima, inicialmente, na dicção originária do § 3º do artigo 20 da LOAS, era exigida a renda inferior a ¼ (um quarto) do salário-mínimo.
Na esfera judicial, esse parâmetro foi confrontado por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI 1.232-1/DF, a qual foi julgada improcedente pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, que declarou a constitucionalidade do § 3º do artigo 20 da Lei n. 8.742/1993. (ADI 1232, Relator p/ Acórdão: Min. NELSON JOBIM, Tribunal Pleno, j. 27/08/1998).
Entretanto, diversas leis editadas posteriormente fixaram parâmetros mais favoráveis, conduzindo à conclusão lógica no sentido de que o Poder Legislativo havia suplantado o limite de um quarto do salário-mínimo, permeando, assim, a análise judicial dos pedidos pela interpretação sistemática, para fins de observar a ordem jurídica como um todo coeso.
Nessa senda, o Colendo STJ pacificou o entendimento quanto à possibilidade de admitir distintos parâmetros para aferição da condição de miserabilidade, cristalizando o Tema 185/STJ: “A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo”. (REsp 1.112.557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Terceira Seção, j. 28/10/2009, transitado em julgado em 21/03/2014).
A persistência dos debates conduziu o Colendo STF a declarar a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º do artigo 20 da LOAS, no julgamento do RE 567.985, sob os auspícios da repercussão geral, cuja excerto da ementa pedimos licença para transcrever:
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento.
(RE 567.985, Relator p/ Acórdão Ministro GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, j. 18/04/2013, publ. 03/10/2013)
O precedente emanado ensejou a tese do Tema 27/STF:“É inconstitucional o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, que estabelece a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo como requisito obrigatório para concessão do benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 203, V, da Constituição”.
Prosseguindo, novas alterações do artigo 20 da LOAS foram verificadas. A Lei n. 13.981, de 23/03/2020, majorou o critério objetivo para 1/2 (meio) salário-mínimo. Todavia, teve a sua eficácia suspensa pelo C. STF, por liminar concedida na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 662. A Lei n. 13.982, de 02/04/2020, alterando novamente o § 3º do artigo 20 da LOAS, fez retornar a sua redação original.
A Lei n. 13.146, de 06/07/2015, incluiu o § 11 ao artigo 20 da Lei n. 8.742/1993, possibilitando a utilização de outros parâmetros aptos à avaliação da renda per capta familiar e, consequentemente, da miserabilidade. Eis o teor da norma inserta:
Art. 20 (...) § 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento.
Além disso, em complemento à definição dos critérios de concessão do benefício assistencial, a Lei n. 14.176, de 22/06/2021, acrescentou o § 11-A ao artigo 20 da Lei n. 8.742/1993, concedendo expressamente licença normativa ao regulamento para fins de ampliar o limite da renda per capta até ½ (meio) salário-mínimo, in verbis:
Art. 20 (...) § 11-A. O regulamento de que trata o § 11 deste artigo poderá ampliar o limite de renda mensal familiar per capita previsto no § 3º deste artigo para até 1/2 (meio) salário-mínimo, observado o disposto no art. 20-B desta Lei. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021).
Nesse diapasão, superada está a questão relacionada à limitação do critério de avaliação socioeconômica, cuja ampliação ao limite de ½ (meio) salário-mínimo encontra supedâneo legal.
Dos elementos probatórios
O artigo 20-B da LOAS, incluído pela Lei n. 14.176, de 22/06/2021, estabeleceu que para ampliação do critério de aferição da renda familiar mensal per capita, prevista no § 11 do mesmo artigo, devem ser avaliados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade e da situação de vulnerabilidade. São eles:
I – o grau da deficiência;
II – a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária; e.
III – o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 desta Lei exclusivamente com gastos médicos, com tratamentos de saúde, com fraldas, com alimentos especiais e com medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo SUS, ou com serviços não prestados pelo Suas, desde que comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida.
O exame da condição da pessoa com deficiência e do grau de impedimento está a cargo do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), por meio de perícia médica e social, observando-se, inclusive, a avaliação biopsicossocial, nos termos do artigo 2º, §§ 1º e 2º, da Lei n. 13.146, de 06/07/2015, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, bem assim do artigo 20, § 6º, e 20-B, § 3º, e 40-B da LOAS.
Ainda quanto aos gastos familiares, o comprometimento do orçamento do núcleo familiar será definido em ato normativo conjunto do Ministério da Cidadania, da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia e do INSS, a partir de valores médios dos gastos realizados pelas famílias, facultando-se ao interessado a possibilidade de comprovação de que os gastos efetivos ultrapassam os valores médios, conforme dispõe o artigo 20-B, § 4º, da LOAS.
Da data do início do benefício (DIB)
No que diz respeito à data de início do benefício (DIB), é cediço que a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no sentido de que a implantação do benefício tem como termo inicial a data do requerimento administrativo.
Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. TERMO INICIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. ENTENDIMENTO PACÍFICO DO STJ.
1. Cuida-se de inconformismo com acórdão do Tribunal de origem que entendeu devida a concessão do benefício assistencial ao deficiente, considerando como termo inicial o requerimento administrativo.
2. É assente o entendimento do STJ no sentido de que, na existência de requerimento administrativo, este deve ser o marco inicial para o pagamento do benefício discutido, sendo irrelevante que tenha a comprovação da implementação dos requisitos se verificado apenas em âmbito judicial.
3. A propósito: "Nos termos da jurisprudência do STJ, o benefício previdenciário de cunho acidental ou o decorrente de invalidez deve ser concedido a partir do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir da citação. A fixação do termo a quo a partir da juntada do laudo em juízo estimula o enriquecimento ilícito do INSS, visto que o benefício é devido justamente em razão de incapacidade anterior à própria ação judicial." (REsp 1.411.921/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 15/10/2013, DJe 25/10/2013). No mesmo sentido: AgInt no REsp 1.611.325/RN, Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 24/03/2017; AgInt no REsp 1.601.268/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 30/6/2016; AgInt no REsp 1.790.912/PR, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 17/10/2019. REsp 1.731.956/PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 29/5/2018.
4. Recurso Especial não provido.
(REsp 1851145/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/02/2020, DJe 13/05/2020)
PREVIDENCIÁRIO. APLICABILIDADE DO ART. 557 DO CPC. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. TERMO INICIAL. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO QUANDO JÁ PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
I - O presente feito decorre de ação de concessão de benefício de prestação continuada objetivando a concessão do benefício previsto no art. 203, V, da Constituição Federal de 1988, sob o fundamento de ser pessoa portadora de deficiência e não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Na sentença, julgou-se improcedente o pedido. No Tribunal Regional Federal da 3ª Região, a sentença foi reformada.
II - Esta Corte consolidou o entendimento de que havendo requerimento administrativo, como no caso, este é o marco inicial dos efeitos financeiros do benefício assistencial. Nesse sentido: REsp n. 1610554/SP, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 18/4/2017, DJe 2/5/2017; REsp n. 1615494/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 1/9/2016, DJe 6/10/2016 e Pet n. 9.582/RS, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 16/9/2015.
III - Correta, portanto, a decisão que deu provimento ao recurso especial do Ministério Público Federal.
IV - Agravo interno improvido.
(AgInt no REsp 1662313/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/03/2019, DJe 27/03/2019)
Entretanto, tendo sido indeferido o pedido pelo INSS, a revisão do ato administrativo está sujeita à prescrição quinquenal:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022, II, DO CPC/2015. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA N. 284/STF. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. RETROAÇÃO AO PRIMEIRO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. IMPOSSIBILIDADE. TRANSCORRIDOS MAIS DE CINCO ANOS ENTRE O INDEFERIMENTO ADMINISTRATIVO E O AJUIZAMENTO DA AÇÃO. PRECEDENTES.
(...)
II - Acórdão regional em conformidade com o entendimento jurisprudencial desta Corte no sentido de que o termo inicial do benefício assistencial de prestação continuada, previsto no art. 20 da Lei n. 8.742/93, é a data do requerimento administrativo, e, na ausência deste, da data da citação.
III - Hipótese que a parte recorrente objetiva a retroação do benefício desde o primeiro requerimento administrativo, o que não é possível, visto que, conforme entendimento jurisprudencial desta Corte, entende-se que a revisão do ato administrativo que indeferiu o benefício assistencial está sujeita à prescrição quinquenal prevista no art. 1º do Decreto n. 20.910/32. Precedentes: AgRg no REsp 1576098/DF, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 1/3/2016, DJe 8/3/2016; e REsp 1731956/PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 22/5/2018, DJe 29/5/2018.
IV - No caso dos autos, a presente ação foi ajuizada, em 19/8/2012, após o decurso do prazo prescricional de cinco anos a contar do primeiro requerimento administrativo, formulado em 5/4/2007, o que torna inviável a retroação do benefício a essa data.
V - Recurso especial improvido.
(REsp 1746544/RJ, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/02/2019, DJe 14/02/2019)
Do Caso Concreto
Trata-se de pedido de concessão de benefício assistencial ao deficiente.
Da análise da perícia médica observa-se que o autor apresenta quadro clínico que prejudica sua capacidade de comunicação e interação social limitando suas atividades da vida diária, suas funções sociais, concentração, persistência e ritmo, verifica-se incapacidade laboral permanente e parcial para as atividades que exijam complexidade intelectual.
O perito médico assim concluiu (ID 284665580):
"(...) Documentos médicos apresentados na perícia:
Atestado médico de 22 de abril de 2021 assinado por Michele G. Teles de Almeida, CRMSP 152390, “...paciente é portador de deficiência intelectual moderada CID-10 F71.0 e epilepsia G40, apresenta dificuldade de aprendizagem e é incapaz para a vida independente e para os atos da vida civil...”.
Atestado médico de 6 de dezembro de 2021 assinado por José Humberto U. Jacinto, CRMSP 67832, “...paciente é portador de epilepsia G40 e deficiência intelectual moderada CID-10 F72...”. (...)
Conclusão: Tendo em vista o exame clínico realizado, foi observado que CARLOS SANTOS DA SILVA apresenta incapacidade laboral permanente e parcial para as atividades que exijam complexidade intelectual."
Desta forma, exsurge evidente a deficiência para fins assistenciais, nos termos do artigo 20, § 2º, da LOAS.
No que tange à hipossuficiência econômica, o estudo social, realizado em 04/05/2022, trouxe as seguintes constatações (ID 284665573):
I - O autor reside com a genitora, uma irmã (32) também com aparente retardo mental e um irmão (21) que tendo concluído o ensino médio, ainda não acessou o mercado de trabalho. A casa onde residem é própria e dividida com outros familiares, que formam outros núcleos e abriga ainda edícula onde reside uma das irmãs com duas crianças, também com problemas psicológicos, segundo a genitora. O imóvel localiza-se em bairro periférico, distante do centro da cidade com infraestrutura completa e equipamento de saúde em média distância. Os móveis e eletrodomésticos que guarnecem a residência são apenas os básicos.
II - A renda familiar provém do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez no valor de um salário mínimo (R$ 1.212,00), recebido pela genitora, que está onerado por empréstimo consignado na proporção de 51% (sic), perfazendo o valor líquido de R$ 630,00. Segundo a curadora do autor, sobrevivem principalmente de doações e ajudas de entidades filantrópicas. A renda per capita é de R$ 157,50.
III - As despesas mensais declaradas são com energia elétrica – R$300,30 (comprovante apresentado); água- R$210,30 (comprovante apresentado); gás de cozinha – R$115,00 (bimestral), alimentação - R$600,00 (estimado). Existem diversos boletos de água e luz sem pagamento.
IV - Consta ainda do estudo social que "a mãe/curadora do autor que o mesmo é o quinto integrante de prole de 7, onde três são portadores de necessidades especiais, sendo o mesmo portador de retardo mental moderado e epilepsia. Informa que o mesmo, durante a infância e adolescência, frequentou a APAE-Franca, porém devido á incapacidade cognitiva não foi alfabetizado e nem teve condições para ser profissionalizado. A genitora, analfabeta e com histórico laboral de serviços de baixa complexidade é separada de fato há dois anos, e a única provedora do núcleo."
V - Concluiu a assistente social que o autor encontra-se em situação de fragilidade econômica e vulnerabilidade social.
Além disso, conforme constou no estudo social, o núcleo familiar sobrevive de forma modesta, com uma renda familiar equivalente a um salário mínimo vigente (R$ 1.212,00), proveniente da aposentadoria por invalidez recebida pela genitora, do qual é descontado o equivalente a 51% a título de empréstimo consignado, sobrando líquido apenas R$ 630,00, o que não é suficiente para o atendimento das necessidades básicas do autor.
Na presente hipótese, considerando-se a renda mensal declarada, exsurge que a família sobrevive com a renda per capta de R$ 157,50, inferior a 1/4 do salário mínimo, o que caracteriza a condição de hipossuficiência econômica e vulnerabilidade social.
A esse respeito, assinale-se ainda a conclusão do Parecer exarado pelo Parquet Federal:
"(...) II.2.2. CONCLUSÃO ACERCA DA MISERABILIDADE
Assim, fica evidente que, a única renda familiar não supre as necessidades básicas da autora que, inclusive, necessita de doações de alimentos para sua subsistência.
Desse modo, é caso de deferimento do benefício, pois há presunção de miserabilidade, nos termos da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça.
Embora o e. magistrado tenha informado que a renda do irmão do autor Denis, Santos da Silva, seria de R$ 1420,00, não há nenhuma comprovação nos autos, nem pelo INSS e nem pelo laudo social. Pelo contrário, o laudo social informa desemprego."
Destarte, diante do conteúdo probatório dos autos, evidenciam-se preenchidos os requisitos legais necessários à concessão do benefício assistencial.
De acordo com os elementos probatórios, o termo inicial do benefício assistencial deve ser fixado na data da cessação do NB 87/116782692-0, em 14/02/2021, porque nessa data já se apresentam elementos suficientes à demonstração do direito à percepção do benefício assistencial.
As prestações vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
Atente-se que os valores pagos, na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de benefícios inacumuláveis no período, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Custas e despesas processuais
A Autarquia Previdenciária é isenta do pagamento de custas e emolumentos no âmbito da Justiça Federal e nas ações processadas perante a Justiça Estadual de São Paulo, por força doartigo 4º, I, da Lei Federal n. 9.289/1996, e do artigo 6º da Lei Estadual paulista n. 11.608/2003.
A isenção, por sua vez, não a exime do reembolso das despesas judiciais eventualmente recolhidas pela parte vencedora, desde que devidamente comprovada nos autos, consoante o parágrafo único do referido artigo 4º da Lei n. 9.289/1996.
Quanto às demandas aforadas noEstado de Mato Grosso do Sul, a isenção prevista nas Leis Estaduais sul-mato-grossenses ns. 1.135/1991 e 1.936/1998 foi revogada pela Lei Estadual n. 3.779/2009 (art. 24, §§ 1º e 2º), razão pela qual cabe ao INSS o ônus do pagamento das custas processuais naquele Estado.
Por fim, caberá à parte vencida arcar com as despesas processuais e as custas somente ao final, na forma do artigo 91 do CPC.
Consectários legais
A correção monetária e os juros de mora incidirão conforme a legislação de regência, observando-se os critérios preconizados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, que refere a aplicação da EC n. 113/2021.
Quanto aos juros, destaque-se que são devidos até a data da expedição do ofício precatório ou da requisição de pequeno valor (RPV), conforme o Tema 96/STF, cristalizado pelo C. STF no julgamento do RE n. 579.431, observando-se, a partir de então, o teor da Súmula Vinculante 17/STF.
Dos honorários advocatícios
Em razão da sucumbência, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em patamar mínimo sobre o valor da condenação, observadas as normas do artigo 85, §§ 3º e 5º, do CPC.
Os honorários advocatícios, conforme a Súmula 111 do C. STJ e o Tema 1105/STJ, incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência; porém, tendo em vista que a pretensão da requerente apenas foi deferida nesta sede recursal, a condenação da verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data do presente acórdão.
Da tutela antecipada
Consoante o entendimento desta E. Décima Turma, cabe a concessão da tutela antes do trânsito em julgado do acórdão. Precedentes: AC 5045516-79.2018.4.03.9999, AC 5290088-68.2020.4.03.9999, AC 5147690-98.2020.4.03.9999 e AC 5001378-27.2018.4.03.9999.
Concedo a antecipação da tutela, com fundamento nos artigos 300, ‘caput’, 302, e, 536, ‘caput’ e 537 e parágrafos, todos do CPC, a fim de determinar ao INSS imediata implantação da benesse aqui deferida, em face do caráter alimentar do benefício.
Determino a remessa desta decisão à D. Autoridade Administrativa por meio eletrônico, para cumprimento da ordem judicial no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, sobre pena de multa diária, a ser oportunamente fixada na hipótese de descumprimento.
Benefício: Benefício assistencial
DIB:14/02/2021 (DCB)
Comunique-se ao INSS.
Dispositivo
Ante o exposto, dou provimento à apelação da parte autora, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ASSISTENCIAL. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LOAS. DEFICIENTE. DEFICIÊNCIA E MISERABILIDADE CONFIGURADAS. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. DEVIDA O RESTABELECIMENTO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição da República Federativa do Brasil, consiste na “garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família” (artigo 20, 'caput', da Lei n. 8.742/1993).
- No que tange à deficiência, o laudo médico pericial constatou que o autor apresenta quadro clínico que prejudica sua capacidade de comunicação e interação social limitando suas atividades da vida diária, suas funções sociais, concentração, persistência e ritmo, verificando-se incapacidade laboral permanente e parcial para as atividades que exijam complexidade intelectual, exsurgindo evidente a deficiência para fins assistenciais.
- Quanto à hipossuficiência econômica, conforme constou no estudo social, o núcleo familiar sobrevive de forma modesta, com uma renda familiar equivalente a um salário mínimo vigente (R$ 1.212,00), proveniente da aposentadoria por invalidez recebida pela genitora, do qual é descontado o equivalente a 51% a título de empréstimo consignado, sobrando líquido apenas R$ 630,00, o que não é suficiente para o atendimento das necessidades básicas do autor.
- Presentes os requisitos estabelecidos no artigo 20 da Lei n. 8.742/1993, é devido o benefício assistencial.
- O termo inicial do benefício deve ser fixado na data de cessação do benefício assistencial, porque nessa data já se apresentam elementos suficientes à demonstração do direito à percepção do benefício assistencial.
- Apelação da parte autora provida.
