Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001248-61.2020.4.03.6343
Relator(a)
Juiz Federal ALESSANDRA DE MEDEIROS NOGUEIRA REIS
Órgão Julgador
9ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
11/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 16/11/2021
Ementa
E M E N T A
EMENTA:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. VIGILANTE, COM OU SEM O USO DE ARMA DE
FOGO. EM DATA POSTERIOR À LEI 9.032/1995 E AO DECRETO 2.172/1997, DESDE QUE
HAJA A COMPROVAÇÃO DA EFETIVA NOCIVIDADE DA ATIVIDADE, POR QUALQUER MEIO
DE PROVA ATÉ 5.3.1997, MOMENTO EM QUE SE PASSA A EXIGIR APRESENTAÇÃO DE
LAUDO TÉCNICO OU ELEMENTO MATERIAL EQUIVALENTE, PARA COMPROVAR A
PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE, EXPOSIÇÃO À ATIVIDADE NOCIVA,
QUE COLOQUE EM RISCO A INTEGRIDADE FÍSICA DO SEGURADO. TEMA 1031.
- Em relação ao período aos períodos reconhecidos como especiais na sentença, pela descrição
das atividades desenvolvidas pelo autor e descritas no PPP, entendo que restou demonstrado os
agentes de risco a saúde e integridade física do segurado aptos ao reconhecimento de tempo
especial.
- Possibilidade de cômputo de tempo de serviço especial referente ao período em que o segurado
esteve em gozo de auxílio-doença de natureza não acidentária, a jurisprudência consolidou-se
pelo reconhecimento de tal período como especial.
- A data da emissão do PPP marca o termo final para a contagem do período como especial, não
havendo qualquer alteração a ser feita na sentença.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Recurso de ambas as partes desprovidos. Sentença mantida por seus próprios fundamentos.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
9ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001248-61.2020.4.03.6343
RELATOR:25º Juiz Federal da 9ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: AGOSTINHO DA SILVA
Advogados do(a) RECORRIDO: PAULO ROBERTO INOCENCIO - SP91483-A, BENIGNA
GONCALVES - SP251879-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001248-61.2020.4.03.6343
RELATOR:25º Juiz Federal da 9ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: AGOSTINHO DA SILVA
Advogados do(a) RECORRIDO: PAULO ROBERTO INOCENCIO - SP91483-A, BENIGNA
GONCALVES - SP251879-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
[#I - RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto por ambas as partes em face da sentença que julgou procedente
em parte pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o
reconhecimento como especial dos períodos compreendidos entre 02/04/1995 a 03/04/1995
(“Protege S/A Prot. e Transp. de Valores”), 29/04/1995 a 31/08/1998 (“Magnesita Refratários
S/A”) e 01/04/2004 a 03/04/2018 (“Escolta Serviços de Vigilância e Segurança Ltda”) e
condenou o INSS a implantar o referido benefício em favor da parte autora.
O INSS se insurge contra o reconhecimento como especial dos períodos acima citados, em que
a parte autora exerceu a atividade de vigilante.
A parte autora se insurge contra o não reconhecimento como especial do período
compreendido entre 04/04/2018 a 08/02020 (DER), em que exerceu a atividade de vigilante.
Contrarrazões pela parte autora.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001248-61.2020.4.03.6343
RELATOR:25º Juiz Federal da 9ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: AGOSTINHO DA SILVA
Advogados do(a) RECORRIDO: PAULO ROBERTO INOCENCIO - SP91483-A, BENIGNA
GONCALVES - SP251879-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
II – VOTO
Consigno que o presente processo não comporta mais o sobrestamento, posto que houve
julgamento do Resp nº 1831371, em sistema repetitivo (tema 1031 do C. STJ).
Quanto ao pedido de concessão de efeito suspensivo ao recurso, observo que nas ações
intentadas no Juizado Especial, em caso de concessão de medida de urgência na sentença, o
recurso será recebido no efeito devolutivo, a teor do inciso VII do artigo 520 do Código de
Processo Civil.
Não vislumbro, dado o caso concreto, que o recebimento da presente apelação somente no
efeito devolutivo acarrete prejuízo inaceitável à Autarquia, até porque ela é, nitidamente, a parte
mais forte da relação processual em discussão, além do caráter alimentar do benefício
pleiteado pela recorrida.
Passo à análise do mérito
A conversão de tempo de serviço deve obedecer, em cada período, às regras a seguir
expostas.
Inicialmente, a aposentadoria especial foi prevista pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60 (Lei
Orgânica da Previdência Social). Posteriormente, o artigo 26 do Decreto nº 77.077/76
(Consolidação das Leis da Previdência Social) manteve a previsão da aposentadoria
diferenciada em razão do grau de exposição da saúde do trabalhador, embora com
modificações. Esses dois diplomas deixaram a cargo do Poder Executivo a eleição das
atividades consideradas insalubres, penosas ou perigosas.
O Decreto n° 53.831/64 trouxe a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários. Os
critérios para classificação eram dois: grupo profissional ou exposição a agentes nocivos. Esse
decreto foi revogado pelo Decreto n° 62.755/68 e revigorado pela Lei n° 5.527/68.
Anos depois, o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes
físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria
especial. Seu Anexo I, classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos. O Anexo II,
trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Os decretos de 1964 e de 1979 vigeram concomitantemente. Assim, podem surgir situações de
conflito entre as disposições de um e de outro. Nesses casos, o conflito resolve-se pela
aplicação da regra favorável ao trabalhador.
A Lei nº 8.213/91, artigo 57, parágrafo 4º, manteve o duplo critério de caracterização de
atividades especiais, com regulamentação a cargo do Poder Executivo. Apesar das inovações
trazidas por essa lei, os anexos aos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79 continuaram em vigor,
por força dos artigos 295 do Decreto nº 357/91 e 292 do Decreto nº 611/92, ambos com
conteúdo idêntico.
A Lei 9.032, de 28.04.1995, alterou a redação do artigo 57, parágrafo 4º, da Lei nº 8.213/91. O
novo dispositivo deixou de prever a atividade especial em razão do grupo profissional,
mantendo apenas o critério de exposição a agentes agressivos. A intenção do legislador era
extinguir a aposentadoria especial pelo critério do grupo profissional.
Observe-se que a validade dos decretos acima mencionados não advinha apenas do artigo 57,
da Lei nº 8.213/91, mas também de seus artigos 58 e 152, os quais vigoraram com suas
redações originais até a entrada em vigor da Lei nº 9.528, de 10.12.1997. A manutenção
desses dois artigos dá margem à tese de que a conversão de atividade especial em comum,
por grupo profissional, foi possível mesmo após 28.04.1995. Nota-se, entretanto que as
espécies de aposentadoria especial estavam no artigo 57 da lei, e não nos artigos 58 e 152.
Desse modo, concluo que a conversão de atividade especial em razão do grupo profissional só
pode ser feita até 28.04.1995.
O Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, anexo IV, estabeleceu novo quadro de agentes nocivos
para a caracterização da atividade especial. Seu artigo 261 expressamente revogou os anexos
ao Decreto nº 83.080/79. A revogação do Decreto nº 53.831/64 foi tácita. Por fim, o quadro de
agentes nocivos do Decreto nº 2.172/97 foi revogado pelo Decreto nº 3.048/99.
Em 28.05.1998, a Medida Provisória nº 1.663-10, artigo 28, limitou a conversão de tempo de
atividade especial em comum até a data de sua edição e revogou o parágrafo 5º, do artigo 57,
da Lei nº 8.213/91. Essa Medida Provisória foi convertida, com alterações, na Lei nº 9.711, de
20.11.1998. Uma das mudanças mais importantes entre o texto da medida provisória e o texto
da lei foi a manutenção do § 5º, do artigo 57, da Lei nº 8.213/91, admitindo a conversão do
tempo especial em comum sem limitação temporal.
Em outras palavras: a conversão das atividades especiais em comuns é aceita após
28.05.1998, pois a regra do artigo 28 da Lei nº 9.711/97 é inócua em face do artigo 57, § 5º, da
Lei nº 8.213/91.
Posteriormente, o art. 28 da lei nº 9.711/98 determinou o estabelecimento de critérios, pelo
Poder Executivo para conversão do tempo de trabalho exercido sob condições especiais
prejudiciais à saúde e integridade física até 28 de maio de 1998, condicionando a conversão à
implementação de percentual de tempo necessário à obtenção de aposentadoria especial.
Ocorre que, conforme disposto no Decreto nº 4.827/03, artigo 1º, § 2º, as regras de conversão
de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum aplicam-se ao
trabalho prestado em qualquer período".
Considerando-se que o art. 28 da Lei 9.711/98 delegou ao Poder Executivo a regulamentação
do trabalho exercido sob condições especiais, entendo que a expressão "qualquer período"
engloba todos os períodos anteriores à edição do decreto e posteriores a este, inclusive o
período laborado sob a égide do decreto anterior.
Portanto, o autor faz jus à conversão de tempo de atividade especial da seguinte forma: a) por
grupo profissional até 28.04.1995 e; b) por exposição a agentes nocivos até a presente data.
Superada a questão relativa à caracterização da atividade especial, passo ao exame de suas
formas de comprovação.
No que toca à forma de comprovação do caráter especial da atividade exercida tem-se que, até
a entrada em vigor da Lei nº 9.032/95, o reconhecimento do tempo de serviço em atividade
especial independia da demonstração de efetiva exposição ao risco. A mera identificação da
atividade ou a exposição a determinados agentes levavam à presunção da nocividade.
No caso de exercício de atividade profissional prejudicial à saúde do trabalhador, não se exigia
apresentação de laudo técnico. A comprovação do exercício da atividade era feita pela simples
apresentação de formulários criados pelo INSS e preenchidos pelo empregador, carteira de
trabalho ou outro elemento de prova.
Para conversão baseada na exposição a agentes nocivos as exigências também eram singelas.
Antes da entrada em vigor da Lei nº 9.032/95, em 29.04.1995, só havia necessidade de laudo
para prova de exposição aos agentes nocivos ruído e calor (REsp 639.066/RJ, Rel. Ministro
ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 20.09.2005, DJ 07.11.2005 p. 345).
Para os demais casos, bastava a apresentação dos formulários SB 4030, DISES/BE 5235,
DIRBEN 8030 e DSS 8030 indicando a exposição do segurado aos agentes agressivos
apontados nos decretos.
Quanto ao interregno compreendido entre 29.04.1995 e 05.03.1997, há divergências sobre a
obrigatoriedade do laudo técnico para comprovação de qualquer atividade especial. A partir de
1995, fica clara a intenção do legislador de tornar a prova da atividade especial mais rigorosa.
Todavia até 1997 a exigência não era inequívoca.
A apresentação de laudo só foi expressamente prevista pela Medida Provisória 1.523, de
11.10.1996, que alterou a redação do artigo 58, da Lei nº 8.213/91, e resultou, após várias
reedições, na Lei nº 9.528, de 10.12.1997. Nesse período, o único marco seguro da
obrigatoriedade do laudo reside no Decreto nº 2.172/97, artigo 66, § 2º, em vigor a partir de
06.03.1997. Por isso, reconheço a necessidade de laudo técnico a partir de 06.03.1997.
O Decreto nº 4.032, em vigor desde 27.11.2001, altera, mais uma vez, a disciplina da prova da
atividade especial. Dando cumprimento ao § 4º, do artigo 58, da Lei nº 8.213/91, esse decreto
alterou o artigo 68, § 2º, do Decreto nº 3.048/99. A partir de sua publicação, passa-se a exigir
perfil profissiográfico previdenciário - PPP para esse fim. Todavia, a exigência só foi
concretizada a partir de 01.01.2004 (Instrução Normativa Nº 99 Inss/Dc, de 05.12.2003,
publicada em 10.12.2003, artigo 148).
Desta forma, comprovado que o trabalhador esteve exposto a agentes nocivos, nos termos da
legislação vigente à época e aplicando este raciocínio ao serviço prestado em exposição a
ruído, teremos o seguinte:
1) até 28/04/1995 - Decreto n.º 53.831/64, anexos I e II do RBPS aprovado pelo Decreto n.º
83.080/79, dispensada apresentação de Laudo Técnico, exceto para ruído (nível de pressão
sonora elevado = acima de 80 decibéis);
2) de 29/04/1995 a 05/03/1997 - anexo I do Decreto n.º 83.080/79 e código “1.0.0” do anexo ao
Decreto n.º 53.831/64, dispensada a apresentação de Laudo Técnico em qualquer hipótese,
exceto para ruído (quando for ruído: nível de pressão sonora elevado = acima de 80 decibéis);
3) a partir de 06/03/1997 - anexo IV do Decreto n.º 2.172/97, substituído pelo Decreto n.º
3.048/99, exigida apresentação de Laudo Técnico em qualquer hipótese (quando ruído: nível de
pressão sonora elevado = acima de 90 decibéis).
4) a partir de 19/11/2003 - Decreto nº 4.882/03, será efetuado o enquadramento quando o Nível
de Exposição Normalizado - NEN se situar acima de 85 dB(A).
O INSS se insurge contra o reconhecimento como especial dos períodos compreendidos entre
02/04/1995 a 03/04/1995 (“Protege S/A Prot. e Transp. de Valores”), 29/04/1995 a 31/08/1998
(“Magnesita Refratários S/A”) e 01/04/2004 a 03/04/2018 (“Escolta Serviços de Vigilância e
Segurança Ltda”), em que a parte autora exerceu a atividade de vigilante.
Para comprovação da atividade especial nos períodos acima citados, a parte autora juntou aos
autos os seguintes documentos:
Período de 02/04/1995 a 03/04/1995 (“Protege S/A Prot. e Transp. de Valores”): a parte autora
apresentou PPP a fls. 41/42 do anexo 17, no qual há informação do exercício da atividade de
vigilante portando arma de fogo (item Descrição das Atividades). Conforme constou da
sentença: “Devido, portanto, o enquadramento do período de 02/04/1995 a 03/04/1995 como
tempo especial, uma vez que restou demonstrada a nocividade da atividade, conforme Tema
1031 do STJ”.
Período de 29/04/1995 a 31/08/1998 (“Magnesita Refratários S/A”): a parte autora apresentou
PPP a fls. 45/46 do anexo 17, no qual há informação do exercício da atividade de guarda
portando arma de fogo (item Descrição das Atividades). Assim, conforme constou da sentença:
“Devido, portanto, o enquadramento do período de 29/04/1995 a 31/08/1998 como tempo
especial, uma vez que restou demonstrada a nocividade da atividade, conforme Tema 1031 do
STJ”.
Período de 01/04/2004 a 03/04/2018 (“Escolta Serviços de Vigilância e Segurança Ltda”): a
parte autora apresentou PPP a fls. 49/50 do anexo 17, no qual há indicação do exercício da
atividade de vigilante portando arma de fogo no período de 01/04/2004 a 03/04/2018 (data da
emissão do PPP). Conforme constou da sentença: “Devido, portanto, o enquadramento do
período como tempo especial, uma vez que restou demonstrada a nocividade da atividade
desempenhada, conforme Tema 1031 do STJ.”
Conforme constou da sentença:....”devem ser reconhecidos como especiais os períodos de
26/07/2000 a 01/11/2007 e 02/11/2012 a 19/09/2019, considerando os PPP’s apresentados às
fls. 87-88 e 90-91 do ev. 02, emitidos em 02/09/2019 pela ex-empregadora do autor,
ALBATROZ SEGURANÇA E VIGILÂNCIA LTDA, os quais descrevem o exercício da atividade
de vigilante portando arma de fogo, o que é suficiente para demonstrar a permanente exposição
do autor à atividade nociva que colocasse em risco sua integridade física”.
De fato, em relação à matéria, o Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos
repetitivos, firmou a compreensão de que “é admissível o reconhecimento da especialidade da
atividade de Vigilante, com ou sem o uso de arma de fogo, em data posterior à Lei 9.032/1995 e
ao Decreto 2.172/1997, desde que haja a comprovação da efetiva nocividade da atividade, por
qualquer meio de prova até 5.3.1997, momento em que se passa a exigir apresentação de
laudo técnico ou elemento material equivalente, para comprovar a permanente, não ocasional
nem intermitente, exposição à atividade nociva, que coloque em risco a integridade física do
Segurado” (Tema Repetitivo 1031). A seguir transcrevo o julgado em comento:
“I. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. SISTEMÁTICA DE RECURSOS REPETITIVOS.
ATIVIDADE ESPECIAL. VIGILANTE, COM OU SEM O USO DE ARMA DE FOGO.
II. POSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO PELA VIA DA JURISDIÇÃO, COM APOIO
PROCESSUAL EM QUALQUER MEIO PROBATÓRIO MORALMENTE LEGÍTIMO, APÓS O
ADVENTO DA LEI 9.032/1995, QUE ABOLIU A PRÉ-CLASSIFICAÇÃO PROFISSIONAL PARA
O EFEITO DE RECONHECIMENTO DA SITUAÇÃO DE NOCIVIDADE OU RISCO À SAÚDE
DO TRABALHADOR, EM FACE DA ATIVIDADE LABORAL. SUPRESSÃO PELO DECRETO
2.172/1997. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 57 E 58 DA LEI 8.213/1991.
III. ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER MERAMENTE
EXEMPLIFICATIVO, DADA A INESGOTABILDIADE REAL DA RELAÇÃO DESSES FATORES.
AGENTES PREJUDICIAIS NÃO PREVISTOS NA REGRA POSITIVA ENUNCIATIVA.
REQUISITOS PARA A CARACTERIZAÇÃO DA NOCIVIDADE. EXPOSIÇÃO PERMANENTE,
NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE A FATORES DE RISCO (ART. 57, § 3o., DA LEI
8.213/1991).
IV. RECURSO ESPECIAL DO INSS PARCIALMENTE CONHECIDO PARA NEGAR
PROVIMENTO À PARTE CONHECIDA.
1. É certo que no período de vigência dos Decretos 53.831/1964 e 83.080/1979 a especialidade
da atividade se dava por presunção legal, de modo que bastava a informação acerca da
profissão do Segurado para lhe assegurar a contagem de tempo diferenciada.
Contudo, mesmo em tal período se admitia o reconhecimento de atividade especial em razão
de outras profissões não previstas nestes decretos, exigindo-se, nessas hipóteses provas
cabais de que a atividade nociva era exercida com a exposição aos agentes nocivos ali
descritos.
2. Neste cenário, até a edição da Lei 9.032/1995, nos termos dos Decretos 53.080/1979 e
83.080/1979, admite-se que a atividade de Vigilante, com ou sem arma de fogo, seja
considerada especial, por equiparação à de Guarda.
3. A partir da vigência da Lei 9.032/1995, o legislador suprimiu a possibilidade de
reconhecimento de condição especial de trabalho por presunção de periculosidade decorrente
do enquadramento na categoria profissional de Vigilante. Contudo, deve-se entender que a
vedação do reconhecimento por enquadramento legal não impede a comprovação da
especialidade por outros meios de prova. Aliás, se fosse proclamada tal vedação, se estaria
impedindo os julgadores de proferir julgamentos e, na verdade, implantando na jurisdição a
rotina burocrática de apenas reproduzir com fidelidade o que a regra positiva contivesse. Isso
liquidaria a jurisdição previdenciária e impediria, definitivamente, as avaliações judiciais sobre a
justiça do caso concreto.
4. Desse modo, admite-se o reconhecimento da atividade especial de Vigilante após a edição
da Lei 9.032/1995, desde que apresentadas provas da permanente exposição do Trabalhador à
atividade nociva, independentemente do uso de arma de fogo ou não.
5. Com o advento do Decreto 2.172/1997, a aposentadoria especial sofre nova alteração, pois o
novo texto não mais enumera ocupações, passando a listar apenas os agentes considerados
nocivos ao Trabalhador, e os agentes assim considerados seriam, tão-somente, aqueles
classificados como químicos, físicos ou biológicos. Não traz o texto qualquer referência a
atividades perigosas, o que à primeira vista, poderia ao entendimento de que está excluída da
legislação a aposentadoria especial pela via da periculosidade. Essa conclusão, porém, seria a
negação da realidade e dos perigos da vida, por se fundar na crença - nunca confirmada - de
que as regras escritas podem mudar o mundo e as vicissitudes do trabalho, os infortúnios e os
acidentes, podem ser controlados pelos enunciados normativos.
6. Contudo, o art. 57 da Lei 8.213/1991 assegura, de modo expresso, o direito à aposentadoria
especial ao Segurado que exerça sua atividade em condições que coloquem em risco a sua
saúde ou a sua integridade física, dando impulso aos termos dos arts. 201, § 1o. e 202, II da
Constituição Federal. A interpretação da Lei Previdenciária não pode fugir dessas diretrizes
constitucionais, sob pena de eliminar do Direito Previdenciário o que ele tem de específico,
próprio e típico, que é a primazia dos Direitos Humanos e a garantia jurídica dos bens da vida
digna, como inalienáveis Direitos Fundamentais.
7. Assim, o fato de os decretos não mais contemplarem os agentes perigosos não significa que
eles - os agentes perigosos - tenham sido banidos das relações de trabalho, da vida laboral ou
que a sua eficácia agressiva da saúde do Trabalhador tenha sido eliminada.
Também não se pode intuir que não seja mais possível o reconhecimento judicial da
especialidade da atividade, já que todo o ordenamento jurídico-constitucional, hierarquicamente
superior, traz a garantia de proteção à integridade física e à saúde do Trabalhador.
8. Corroborando tal assertiva, a Primeira Seção desta Corte, no julgamento do 1.306.113/SC,
fixou a orientação de que a despeito da supressão do agente nocivo eletricidade, pelo Decreto
2.172/1997, é possível o reconhecimento da especialidade da atividade submetida a tal agente
perigoso, desde que comprovada a exposição do Trabalhador de forma permanente, não
ocasional, nem intermitente. Esse julgamento deu amplitude e efetividade à função de julgar e a
entendeu como apta a dispensar proteções e garantias, máxime nos casos em que a legislação
alheou-se às poderosas e invencíveis realidades da vida.
9. Seguindo essa mesma orientação, é possível reconhecer a possibilidade de caracterização
da atividade de Vigilante como especial, com ou sem o uso de arma de fogo, mesmo após
5.3.1997, desde que comprovada a exposição do Trabalhador à atividade nociva, de forma
permanente, não ocasional, nem intermitente, com a devida e oportuna comprovação do risco à
integridade física do Trabalhador.
10. Firma-se a seguinte tese: é admissível o reconhecimento da especialidade da atividade de
Vigilante, com ou sem o uso de arma de fogo, em data posterior à Lei 9.032/1995 e ao Decreto
2.172/1997, desde que haja a comprovação da efetiva nocividade da atividade, por qualquer
meio de prova até 5.3.1997, momento em que se passa a exigir apresentação de laudo técnico
ou elemento material equivalente, para comprovar a permanente, não ocasional nem
intermitente, exposição à atividade nociva, que coloque em risco a integridade física do
Segurado.
11. Análise do caso concreto: No caso dos autos, o Tribunal reconhece haver comprovação da
especialidade da atividade, a partir do conjunto probatório formado nos autos, especialmente o
perfil profissiográfico do Segurado. Nesse cenário, não é possível acolher a pretensão do
recursal do INSS que defende a necessidade de comprovação do uso de arma de fogo para
caracterização do tempo especial.
12. Recurso Especial do INSS parcialmente conhecido, para, na parte conhecida, se negar
provimento.” (REsp 1831371/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA
SEÇÃO, julgado em 09/12/2020, DJe 02/03/2021) – grifo nosso
No que se refere à possibilidade de cômputo de tempo de serviço especial referente ao período
em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença de natureza não acidentária, a
jurisprudência consolidou-se pelo reconhecimento de tal período como especial, conforme
ementa a seguir transcrita:
[...] POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL, PARA FINS DE
APOSENTADORIA, PRESTADO NO PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE EM GOZO
DE AUXÍLIO-DOENÇA DE NATUREZA NÃO ACIDENTÁRIA. [...]
9. [...] o Segurado faz jus à percepção de benefício por incapacidade temporária, independente
de sua natureza, sem que seu recebimento implique em qualquer prejuízo na contagem de seu
tempo de atividade especial, o que permite a fixação da seguinte tese: O Segurado que exerce
atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou
previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial. [...]
(REsp 1723181 RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 26/06/2019, DJe 01/08/2019) (REsp 1759098 RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES
MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/06/2019, DJe 01/08/2019)
Por fim, quanto às demais impugnações apresentadas pelo INSS, tais como: ausência de
habitualidade e utilização de EPI, etc., devem ser afastadas por este Juízo, tendo em vista que
o INSS não comprovou qualquer vício formal capaz de retirar a validade dos formulários e não
produziu qualquer prova contrária aos seus conteúdos, não havendo porque afastar as
conclusões a que chegou o técnico responsável pela emissão do referido formulário.
Conclui-se assim, que as alegações do INSS não devem ser acolhidas, devendo ser mantidos
os períodos especiais reconhecidos na sentença de primeiro grau.
Passo agora à análise do recurso interposto pela parte autora, a qual se insurge contra o não
reconhecimento como especial do período compreendido entre 04/04/2018 a 08/02020 (DER –
“Escolta Serviços de Vigilância e Segurança Ltda”), ou seja, período posterior à data da
emissão do PPP até a DER.
Conforme constou da sentença: ...” Tocante ao período posterior à emissão do PPP, invoco o
Tema 36/2019 - TRU da 3ª Região”.
De fato, entendo que a data da emissão do PPP marca o termo final para a contagem do
período como especial, não havendo qualquer alteração a ser feita na sentença.
Sendo assim, na quadra da fundamentação supra, não há respaldo jurídico para o acolhimento
do pleito da parte autora, devendo ser mantida a sentença prolatada nos autos.
Verifica-se assim, que as impugnações apresentadas pelas partes, na esteira do entendimento
acima exposto, não devem ser acolhidas.
Ante o exposto, nego provimento aos recursos interpostos pelas partes mantendo a sentença
recorrida nos termos do artigo 46 da Lei 9.099/90.
Sem condenação em custas e honorários advocatícios, ante o disposto no art. 55, da Lei nº
9.099/95.
É o voto.
E M E N T A
EMENTA:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. VIGILANTE, COM OU SEM O USO DE ARMA DE
FOGO. EM DATA POSTERIOR À LEI 9.032/1995 E AO DECRETO 2.172/1997, DESDE QUE
HAJA A COMPROVAÇÃO DA EFETIVA NOCIVIDADE DA ATIVIDADE, POR QUALQUER
MEIO DE PROVA ATÉ 5.3.1997, MOMENTO EM QUE SE PASSA A EXIGIR APRESENTAÇÃO
DE LAUDO TÉCNICO OU ELEMENTO MATERIAL EQUIVALENTE, PARA COMPROVAR A
PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE, EXPOSIÇÃO À ATIVIDADE
NOCIVA, QUE COLOQUE EM RISCO A INTEGRIDADE FÍSICA DO SEGURADO. TEMA 1031.
- Em relação ao período aos períodos reconhecidos como especiais na sentença, pela
descrição das atividades desenvolvidas pelo autor e descritas no PPP, entendo que restou
demonstrado os agentes de risco a saúde e integridade física do segurado aptos ao
reconhecimento de tempo especial.
- Possibilidade de cômputo de tempo de serviço especial referente ao período em que o
segurado esteve em gozo de auxílio-doença de natureza não acidentária, a jurisprudência
consolidou-se pelo reconhecimento de tal período como especial.
- A data da emissão do PPP marca o termo final para a contagem do período como especial,
não havendo qualquer alteração a ser feita na sentença.
- Recurso de ambas as partes desprovidos. Sentença mantida por seus próprios fundamentos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Vistos, relatados e
discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a 9ª Turma Recursal dos
Juizados Especiais Federais da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por
unanimidade, negar provimento aos recursos nos termos do voto da Relatora. Participaram do
julgamento os Excelentíssimos Juízes Federais Alessandra de Medeiros Nogueira Reis, Marisa
Regina Amoroso Quedinho Cassetari e Ricardo Geraldo Rezende Silveira., nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
