
| D.E. Publicado em 08/03/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer da apelação da parte autora e lhe dar parcial provimento e conhecer da apelação do INSS e lhe negar provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0030240-30.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço especial, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
O pedido foi julgado parcialmente procedente para: (i) reconhecer como especiais as atividades desempenhadas pelo autor de 1º/6/1989 a 30/7/1991, de 1º/8/1991 a 1º/7/1995, de 3/8/1995 a 5/5/1997 e de 4/6/2003 a 1º/3/2004; (ii) conceder a aposentadoria especial, a partir do requerimento administrativo, caso possua tempo mínimo relativo ao benefício; (iii) fixar os consectários.
Inconformada, a parte autora interpôs apelação, na qual requer a total procedência do pedido, nos termos da inicial. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Também não resignada, a autarquia interpôs apelação, na qual alega a impossibilidade dos enquadramentos efetuados. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço das apelações, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, ressalto que vinha adotando a posição de que o enquadramento pela categoria profissional no rol dos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 também era possível até a entrada em vigor do referido Decreto n. 2.172/97. Entretanto, verifico que a jurisprudência majoritária, a qual passo a adotar, tanto nesta Corte quanto no e. STJ, assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/95). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Busca a parte autora o enquadramento dos seguintes períodos: de 16/2/1984 a 30/3/1986, de 1º/4/1986 a 1º/7/1995, de 3/8/1995 a 7/5/1999 e de 4/6/2003 a 1º/3/2004.
No caso, no tocante aos períodos de 16/2/1984 a 30/6/1986, trabalhado na função de "rurícola", em estabelecimento agrícola, não prospera a tese autoral.
Senão vejamos.
Com efeito, para o enquadramento na situação prevista no código 2.2.1 (trabalhadores na agropecuária) do anexo do Decreto n. 53.831/64, a jurisprudência prevê a necessidade de comprovação da efetiva exposição, habitual e permanente, aos possíveis agentes agressivos à saúde, o que não ocorreu.
Nessa esteira, a simples sujeição às intempéries da natureza (sol, chuva, frio, calor, poeira etc.), ou alegação de utilização de veneno (agrotóxicos), não possui o condão para caracterizar a lida no campo como insalubre ou perigosa.
Confira-se (g. n.):
Assim, entendo que o mourejo rural não deve ser enquadrado como especial.
Em relação aos períodos de 1º/4/1986 a 31/12/1987, consta formulário que descreve a ocupação profissional da parte autora como "frentista" em posto de revenda de combustíveis, fato que possibilita o enquadramento nos códigos 1.2.11 do anexo ao Decreto n. 53.831/64 e 1.2.10 do anexo ao Decreto n. 83.080/79.
De outra parte, em relação ao interstício de 1º/1/1988 a 31/5/1989, não é viável o enquadramento.
Isso porque a profissão de "auxiliar de almoxarife" não estava prevista nos decretos regulamentadores e pela descrição das atividades "receber, estocar, controlar e fornecer materiais de consumo, peças e componentes de veículos e máquinas, tintas e solventes", não é possível aferir a exposição habitual e permanente aos agentes nocivos.
Dessa forma, o lapso não pode ser enquadrado como especial.
Em relação aos intervalos de 1º/6/1989 a 30/7/1991 e de 1º/8/1991 a 1º/7/1995, a parte autora logrou demonstrar, via formulários e laudo, exposição habitual e permanente a ruído acima dos limites de tolerância previstos na norma em comento, bem como a exposição a agentes químicos (lubrificantes e solventes), devendo ser mantido os enquadramentos.
Outrossim, em relação ao intervalo de 3/8/1995 a 7/5/1999, depreende-se do PPP apresentado, a exposição habitual e permanente a agentes químicos (lubrificantes, óleo diesel, gasolina e graxas), fato que possibilita o enquadramento no código 1.0.17 do anexo do Decreto n. 3.048/99.
Com efeito, os riscos ocupacionais gerados pela exposição a hidrocarbonetos não requerem análise quantitativa e sim qualitativa.
Nesse diapasão, é a iterativa jurisprudência das cortes federais do País (g.n.):
Insta registrar, ainda, que em recente decisão exarada nos autos n. 5004737-08.2012.4.04.7108, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) firmou a tese de que a análise do caráter degradante do ofício em decorrência da exposição a agentes químicos previstos no Anexo XIII da NR 15, como os hidrocarbonetos aromáticos, é qualitativa e não se sujeita a limites de tolerância, independentemente do período de prestação do labor (cf. notícia veiculada em 27/7/2016 extraída do site do Conselho da Justiça Federal - http://www.cjf.jus.br/cjf/noticias/2016-1/julho/analise-da-exposicao-de-trabalhador-a-agentes-quimicos-deve-ser-qualitativa-e-nao-sujeita-a-limites-de-tolerancia).
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade do agente.
Por fim, em relação ao intervalo de 4/6/2003 a 1º/3/2004, a parte autora logrou demonstrar, via PPP, exposição habitual e permanente a ruído acima dos limites de tolerância previstos na norma em comento.
Dessa forma, somente os períodos de 1º/4/1986 a 31/12/1987, de 1º/6/1989 a 30/7/1991, de 1º/8/1991 a 1º/7/1995, de 3/8/1995 a 7/5/1999 e de 4/6/2003 a 1º/3/2004, devem ser enquadrados como especiais.
A parte autora não conta 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial e, desse modo, não faz jus ao benefício de aposentadoria especial.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria por tempo de serviço estava prevista no art. 202 da Constituição Federal, assim redigido:
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/91:
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos da aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer tempo, pleitear o benefício.
Àqueles, no entanto, que estavam em atividade e ainda não preenchiam os requisitos à época da Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito de idade mínima (53 anos para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um adicional de contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30 anos (homens) e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de "pedágio".
No caso dos autos, somados os períodos ora enquadrados (devidamente convertidos) aos lapsos incontroversos, a parte autora contava mais de 35 anos de serviço na data do requerimento administrativo (2/6/2016), conforme planilha anexa.
Ademais, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/91.
Em decorrência, concluo pelo preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral.
O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada é inferior a 95 pontos (MP 676/2015, convertida na Lei 13.183/2015).
Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, sendo vedada a compensação pela novel legislação, deverá ser observada a proporcionalidade à vista do vencimento e da perda de cada parte, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC. Assim, condeno o INSS a pagar honorários ao advogado da parte contrária, que arbitro em 7% (sete por cento) sobre o valor da condenação, a incidir sobre as prestações vencidas até a data da sentença, e também condeno a parte autora a pagar honorários de advogado ao INSS, fixados em 3% (três por cento) sobre a mesma base de cálculo.
Em relação à parte autora, fica suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, conheço da apelação da parte autora e lhe dou parcial provimento para também enquadrar os interstícios de 1º/4/1986 a 31/12/1987 e de 6/5/1997 a 7/5/1999 e conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo, e conheço da apelação do INSS e lhe nego provimento.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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