
| D.E. Publicado em 10/04/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0050469-84.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento de natureza previdenciária, objetivando a concessão da aposentadoria por tempo de serviço, mediante o reconhecimento de atividade rural, sem registro em CTPS, sobreveio sentença de improcedência do pedido, condenando-se a parte autora no pagamento das verbas de sucumbência, ressalvada a gratuidade da justiça.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação pugnando pela reforma da sentença, para que seja julgado procedente o pedido, sustentando o cumprimento dos requisitos legais para a concessão do benefício.
Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Nos termos do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 e de acordo com a jurisprudência consubstanciada na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, é possível a comprovação do trabalho rural mediante a apresentação de início de prova documental, devendo esta ser complementada por prova testemunhal.
Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por intermédio de documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois isso importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade a prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Início de prova material, conforme a própria expressão traduz, não indica completude, mas, sim, começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da situação jurídica discutida, desde que associada a outros dados probatórios.
Sobre a extensão significativa da expressão "início de prova material", o Tribunal Regional Federal da Quarta Região bem enfrentou a questão, não limitando o aproveitamento da prova material ao ano ou à data em que foi produzido: AC nº 333.924/RS, Relator Desembargador Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON , j. 12/06/2001, DJ 11/07/2001, p. 454.
No caso concreto, há início de prova documental da condição de rurícola do autor, consistente na cópia da CTPS (fls. 26/28), na qual constam anotações de vínculos empregatícios rurais. Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tal documentação, em conjunto com a prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, é hábil ao reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como rurícola, conforme revelam as seguintes ementas de julgados:
"As anotações em certidões de registro civil, a declaração de produtor rural, a nota fiscal de produtor rural, as guias de recolhimento de contribuição sindical e o contrato individual de trabalho em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS, todos contemporâneos à época dos fatos alegados, se inserem no conceito de início razoável de prova material." (REsp 280402/SP, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJ 10/09/2001, p. 427).
Há, igualmente, início de prova documental da condição de rurícola dos genitores e do marido da parte autora, consistente na cópia da certidão de casamento da autora e nascimento do filho (fls. 09/10) e do recibo de pagamento de salário do marido (fl. 11), nas quais consta sua qualificação profissional como lavrador, bem assim das anotações de vínculos empregatícios rurais em CTPS dos genitores e do marido (fls. 12/23). O Superior Tribunal de Justiça, sensível à realidade social do trabalhador rural, pacificou o entendimento de ser extensível aos filhos a qualificação de trabalhador rural apresentada pelo genitor e pelo marido, constante de documento, conforme revelam as ementas de julgados:
"A jurisprudência desta Corte é uníssona no sentido da validade dos documentos em nome do pai do Autor para fins de comprovação da atividade laborativa rural em regime de economia familiar." (REsp n° 516656/CE, Relatora Ministra LAURITA VAZ, J. 23/09/2003, DJ 13/10/2003 p. 432).
"A certidão de casamento na qual consta a profissão de agricultor do marido constitui razoável início de prova material a corroborar os depoimentos testemunhais, não havendo como deixar de reconhecer o direito da parte autora à concessão da aposentadoria por idade" (AGRESP nº 496394/MS, Relator Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, j. 04/08/2005, DJ 05/09/2005, p. 454).
Por sua vez, as testemunhas Jose Maria de Oliveira e Francisco Vieira de Oliveira complementaram plenamente o início de prova documental apresentado ao asseverarem, perante o juízo de primeiro grau, sob o crivo do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, que a parte autora exerceu atividade rural desde os 10 (dez) anos de idade em uma Fazenda em Sarapúi e de 1970 a 1973 no Bairro do Cercado em Araçoiaba da Serra (fls. 54/55).
Contudo, é de se ressaltar que a autora nasceu em 04/10/1955 e pleiteia o reconhecimento de atividade rural, em regime de economia familiar, a partir do ano de 1965, quando contava com 10 (dez) anos de idade. Em que pese sabermos que o trabalhador que nasce na zona rural inicia muito cedo na atividade laborativa, principalmente aqueles que trabalham em regime de economia familiar, a prova dos autos não autoriza o reconhecimento da atividade rural a partir dessa data. Ademais, a Constituição Federal de 1946, art. 157, inciso IX, proibia qualquer trabalho aos menores de 14 (quatorze) anos.
Posteriormente, com a Constituição Federal de 1967, proibiu-se o trabalho de menores de 12 (doze) anos, nos termos do inciso X do artigo 165, de forma que se deve tomar como parâmetro para a admissão do trabalho rural tal limitação.
Portanto, a norma acima não pode ser flexibilizada a ponto de ser reconhecida atividade laboral à criança, pois se a autora quando ainda contava com 10 (dez) anos de idade, acompanhando seus pais na execução de algumas tarefas, isto não o caracteriza como trabalhador rural ou empregado, tampouco caracteriza trabalho rural em regime de economia familiar, pois seria banalização do comando constitucional. Assim, devemos tomar como base a idade de 12 (doze) anos, início da adolescência, pois caso contrário se estaria a reconhecer judicialmente a exploração do trabalho infantil. Além disso, não é factível que um menor de 12 (doze) anos, ainda na infância, portanto, possua vigor físico suficiente para o exercício pleno da atividade rural, sendo sua participação nas lides rurais de caráter limitado, secundário, não se podendo conceber o seu eventual auxílio como período de efetivo labor rural.
Desse modo, nos termos do artigo 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91, e em estrita observância à Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, deve ser reconhecido o exercício de trabalho rural, em regime de economia familiar, no período compreendido entre 04/10/1967 (data em que completou 12 anos de idade) e 31/12/1973, de acordo com o depoimento das testemunhas.
O trabalho rural no período anterior à vigência da Lei nº 8.213/91 poderá ser computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme disposição expressa do artigo 55, § 2º, do citado diploma legal.
Por outro lado, não restou comprovado o exercício da atividade rural, sem registro em CTPS, nos demais períodos postulados na petição inicial, pois as testemunhas foram vagas e imprecisas com relação a estes períodos.
Com efeito, a testemunha Jose Maria de Oliveira somente corrobora o exercício da atividade rural da parte autora desde quando era criança, após este período disse que trabalharam juntos para Kazuo em Sarapuí e que ultimamente a autora trabalha para um e outro, entrentanto, não soube precisar datas (fl. 54).
A testemunha Francisco Vieira de Oliveira afirmou que trabalhou com a parte autora de 1970 a 1973 no Bairro do Cercado em Araçoiaba da Serra como volantes. Asseverou que a autora continuou a trabalhar depois desse período, todavia, não soube dizer onde e para quem e muito menos explicar como obteve essa informação, sendo que atualmente trabalha em uma chácara no Bairro São João em Sarapuí sem saber a quanto tempo (fl. 55).
Por fim, Laura Bispo Araújo de Souza conheceu a autora em 1993 quando ela trabalhava como braçal em um sítio no Bairro da Várzea de Baixo, mas não soube precisar por quanto tempo nem onde a autora trabalhou após esse período (fl. 56).
Assim, não tendo sido produzida prova oral para ampliar a eficácia probatória do documento referente à atividade rural exercida pela parte autora nos demais períodos postulados na petição inicial, não há como ser reconhecido o período de trabalho rural para fins previdenciários. Esse, também, é o entendimento do egrégio Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o início de prova material que não estiver corroborado por prova testemunhal colhida no curso da instrução processual sob o crivo do contraditório, não se mostra hábil ao reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como rurícola, conforme revelam o seguinte julgado:
"A certidão de casamento constante dos autos não está apta a comprovar o exercício da atividade rural visto que não está corroborada por provas testemunhais do alegado trabalho rural do Autor pelo período imediatamente anterior ao requerimento da aposentadoria." (REsp nº 590015/CE, Relatora Ministra LAURITA VAZ, j. 18/12/2003, DJ 16/02/2004, p. 344).
Por outro lado, computando-se o tempo de serviço comum anotado em CTPS (fls. 26/28), com o tempo de serviço rural, ora reconhecido, o somatório do tempo de serviço da parte autora, na data do ajuizamento da ação, é inferior a 30 (trinta) anos, bem assim seu período contributivo é insuficiente para o cumprimento da carência legal de 180 (cento e oitenta) contribuições, o que não autoriza a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, nos termos dos arts. 53, inc. I, 28 e 29 da Lei nº 8.213/91.
Assim, não cumprido requisito legal, é indevida a concessão do benefício pleiteado.
No caso a parte autora decaiu de maior parte do pedido, relativo à concessão do benefício. Com supedâneo em entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal Federal (STF; Ag. Reg. no Rec. Ext. nº 313.348/RS, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, j. 15/04/2003, DJU 16/05/2003, p. 616), a parte autora não está sujeita às verbas de sucumbência, por ser beneficiária da Assistência Judiciária Gratuita.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para reconhecer a atividade rural no período de 04/10/1967 a 31/12/1973, nos termos da fundamentação.
Desembargadora Federal
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