Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5000428-55.2018.4.03.6139
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
22/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 26/08/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL E PROVA
TESTEMUNHAL. INSTRUÇÃO NORMATIVA nº 118/2005-INSS-DC. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE SERVIÇO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. VERBA HONORÁRIA.
- Existindo início razoável de prova material e prova testemunhal idônea, é admissível o
reconhecimento de tempo de serviço prestado por rurícola sem o devido registro em CTPS, em
regime de economia familiar (AR 43/40 / SP, Relator Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, j.
26/09/2018, DJe 04/10/2018).
- Cabe ressaltar que a própria autarquia previdenciária adota orientação segundo a qual a
aceitação de um único documento está restrita à prova do ano a que ele se referir, conforme
inciso III do artigo 374 da Instrução Normativa nº 118/2005-INSS-DC.
- O período de atividade rural anterior à vigência da Lei nº 8.213/91 deve ser computado como
tempo de serviço, mas não pode ser considerado para efeito de carência (art. 55, § 2º).
- O somatório do tempo de serviço do autor, considerando os períodos de atividade especial e o
tempo de serviço comum, na data da publicação da EC 20/98, é inferior a 30 (trinta) anos, de
maneira que é aplicável ao caso dos autos a regra de transição prevista no artigo 9º da referida
Emenda Constitucional, pois a parte autora não possuía direito adquirido ao benefício de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
aposentadoria por tempo de serviço na data da sua publicação, em 16/12/1998.
- Entretanto, mesmo computando-se o tempo de serviço posterior a 15/12/1998, devidamente
registrado em CTPS, não restou comprovado o cumprimento do acréscimo do tempo de serviço
(pedágio) exigido pela Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998.
- Portanto, a parte autora não faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
serviço postulado.
- Apelação da parte autora parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000428-55.2018.4.03.6139
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: SEBASTIAO ELOI DA MOTTA
Advogado do(a) APELANTE: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA -
SP139855-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000428-55.2018.4.03.6139
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: SEBASTIAO ELOI DA MOTTA
Advogado do(a) APELANTE: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA -
SP139855-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento,
de natureza previdenciária, objetivando a concessão da aposentadoria por tempo de serviço,
mediante o reconhecimento de atividade rural, sem registro em CTPS, sobreveio sentença de
improcedência do pedido, deixando-se de condenar a parte autora nas verbas de sucumbência.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação pugnando pela reforma da sentença,
para que seja julgado procedente o pedido, sustentando o cumprimento dos requisitos legais para
a concessão do benefício.
Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000428-55.2018.4.03.6139
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: SEBASTIAO ELOI DA MOTTA
Advogado do(a) APELANTE: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA -
SP139855-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Recebo o recurso, haja vista que
tempestivo, nos termos do artigo 1.010 do novo Código de Processo Civil.
Nos termos do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 e de acordo com a jurisprudência
consubstanciada na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, é possível a comprovação do
trabalho rural mediante a apresentação de início de prova documental, devendo esta ser
complementada por prova testemunhal.
Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, não
significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por intermédio de
documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois isso importaria em se exigir
que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade
a prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Início de prova material, conforme a própria expressão traduz, não indica completude, mas, sim,
começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da
situação jurídica discutida, desde que associada a outros dados probatórios.
Sobre a extensão significativa da expressão "início de prova material", o Tribunal Regional
Federal da Quarta Região bem enfrentou a questão, não limitando o aproveitamento da prova
material ao ano ou à data em que foi produzido: AC nº 333.924/RS, Relator Desembargador
Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON, j. 12/06/2001, DJ 11/07/2001, p. 454.
No caso, há início de prova documental da condição de rurícola da parte autora,
consubstanciado, dentre outros documentos, na cópia das certidões de nascimento dos filhos (Id
19260639, páginas 01/02), do título eleitoral (Id 19260642, página 07) e da certidão expedida pelo
Juízo da 53ª Zona Eleitoral – Itapeva – SP (Id 19260642, página 08), nas quais está qualificado
profissionalmente como lavrador.
Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tal documentação, em conjunto
com a prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, é hábil ao reconhecimento de
tempo de serviço trabalhado como rurícola, conforme revelam as seguintes ementas de julgados:
"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADORA RURAL. DOCUMENTO NOVO.
CERTIDÕES DE NASCIMENTO DOS FILHOS DA AUTORA ONDE O GENITOR CONSTA
COMO LAVRADOR. CONDIÇÃO ESTENDIDA À ESPOSA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL
SUFICIENTE. INFORMAÇÕES CONFIRMADAS POR ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL.
PEDIDO RESCISÓRIO PROCEDENTE.
1. Diante da especialíssima situação dos trabalhadores rurais, esta Corte Superior elasteceu o
conceito de "documento novo", para efeito de ajuizamento de ação rescisória onde se busca
demonstrar a existência de início de prova material do labor campesino. Precedentes.
2. Se nas certidões de nascimento dos filhos da autora consta o genitor de ambos como
"lavrador", pode-se presumir que ela, esposa, também desempenhava trabalho no meio rural,
conforme os vários julgados deste Sodalício sobre o tema, nos quais se reconhece que "a
condição de rurícola da mulher funciona como extensão da qualidade de segurado especial do
marido. Se o marido desempenhava trabalho no meio rural, em regime de economia domiciliar, há
a presunção de que a mulher também o fez, em razão das características da atividade - trabalho
em família, em prol de sua subsistência". (AR 2.544/MS, Relatora Excelentíssima Ministra MARIA
THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).
3. Reconhecido que a autora cumpriu o prazo de carência exigido pelos artigos 48 e 49 da Lei n.
8.213/1991, qual seja, 180 (cento e oitenta) meses de labor campesino, tendo em vista os
documentos novos admitidos nesta ação rescisória e a robusta prova testemunhal colhida nos
autos originais e não refutada na instância ordinária, deve ser afastada a incidência da Súmula n.
149/STJ.
4. Ação rescisória procedente." (AR 43/40 / SP, Relator Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, j.
26/09/2018, DJe 04/10/2018);
"As anotações em certidões de registro civil, a declaração de produtor rural, a nota fiscal de
produtor rural, as guias de recolhimento de contribuição sindical e o contrato individual de
trabalho em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS, todos contemporâneos à época
dos fatos alegados, se inserem no conceito de início razoável de prova material." (REsp
280402/SP, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJ 10/09/2001, p. 427).
Por sua vez, a prova testemunhal complementou plenamente o início de prova documental
apresentado ao asseverar, perante o juízo de primeiro grau, sob o crivo do contraditório, da ampla
defesa e do devido processo legal, que a parte autora exerceu a alegada atividade rural desde
quando a conheceram na cidade de Itaberá (mídia digital).
Note-se também que o fato de o Autor ter exercido atividade urbana em pequenos períodos (Id
19260639, página 04) não impede o reconhecimento do trabalho rural, uma vez que o conjunto
probatório carreado aos autos demonstra que a sua atividade predominante era como rurícola.
Nesse sentido, já decidiu este Egrégio Tribunal que: "o fato do autor ter exercido atividades
urbanas em determinado período, não afasta seu direito ao benefício como trabalhador rural, uma
vez que restou provado que a sua atividade predominante era como rurícola" (AC n.º
94030725923/SP, Relatora Desembargadora SUZANA CAMARGO, julgado em 16/02/1998, DJ
09/06/1998, p. 260).
Entretanto, cabe ressaltar que a própria autarquia previdenciária adota orientação segundo a qual
a aceitação de um único documento está restrita à prova do ano a que ele se referir, conforme
inciso III do artigo 374 da Instrução Normativa nº 118/2005-INSS-DC.
Assim, se, por um lado, não foi produzida a prova testemunhal para comprovar o exercício de
atividade rural, por outro lado, a ausência desta prova, não se mostra apta para ilidir a atividade
rural documentalmente comprovada.
Vale acrescentar, a esse respeito, o seguinte aresto:
"PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL. CONCESSÃO DE
APOSENTADORIA. EXISTÊNCIA DE PROVA EXCLUSIVAMENTE DOCUMENTAL.
POSSIBILIDADE.
1. A comprovação do tempo de serviço rural pode ser feita apenas por documentos escritos; o
que a Lei 8.213/91, Art. 55, § 3º, não permite é a prova exclusivamente testemunhal (Súmula
149/STJ).
(...)"
(STJ, RESP 254144, 5ª Turma, Relator Ministro Edson Vidigal, DJ de 14/08/2000, p. 200).
Desse modo, nos termos do artigo 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91, e em estrita observância à
Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, deve ser reconhecido o exercício de trabalho rural
no período de 01/01/1978 a 31/12/1978 (certidão de nascimento), 01/01/1982 (ano que o autor foi
residir em Itaberá, de acordo com o depoimento pessoal) a 12/08/1983 e de 04/01/1984 a
30/01/1987.
O trabalho rural no período anterior à vigência da Lei nº 8.213/91 poderá ser computado
independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito
de carência, conforme disposição expressa do artigo 55, § 2º, do citado diploma legal.
O período em que a parte autora trabalhou com registro em CTPS (Id 19260639, páginas 03/14,
Id 19260642, páginas 01/06) é suficiente para garantir-lhe o cumprimento do período de carência
de 180 (cento e oitenta) meses de contribuição, na data do requerimento administrativo, nos
termos do art. 142 da Lei nº 8.213/91.
Por outro lado, computando-se a atividade rural nos períodos de 01/01/1978 a 31/12/1978,
01/01/1982 a 12/08/1983 e de 04/01/1984 a 30/01/1987, com o tempo de serviço comum (Id
19260639, páginas 03/14, Id 19260642, páginas 01/06), o somatório do tempo de serviço da parte
autora, na data da publicação da EC 20/98, é inferior a 30 (trinta) anos, totalizando 18 (dezoito)
anos, 02 (dois) meses e 09 (nove) dias de tempo de serviço, de maneira que é aplicável ao caso
dos autos a regra de transição prevista no artigo 9º da referida Emenda Constitucional, pois a
parte autora não possuía direito adquirido ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço na
data da sua publicação, em 16/12/1998.
Entretanto, computando-se o tempo de serviço posterior a 15/12/1998, devidamente registrado
em CTPS, o somatório do tempo de serviço totaliza 32 (trinta e dois) anos, 09 (nove) meses e 25
(vinte e cinco) dias, no requerimento administrativo, não restando comprovado o cumprimento do
acréscimo do tempo de serviço (pedágio) exigido pela Emenda Constitucional nº 20, de 15 de
dezembro de 1998, que no presente caso perfaz 34 (trinta e quatro) anos, 08 (oito) meses e 19
(dezenove) dias.
Portanto, a parte autora não faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
serviço postulado.
No caso não há falar em sucumbência recíproca, pois a parte autora decaiu de maior parte do
pedido, relativo à concessão do benefício.
Assim, condeno a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, que arbitro em 10%
sobre o valor da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Novo Código de Processo Civil/2015,
observando-se a suspensão de exigibilidade prevista no § 3º do art. 98 do mesmo diploma legal.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para
reconhecer a atividade rural nos períodos de 01/01/1978 a 31/12/1978, 01/01/1982 a 12/08/1983
e de 04/01/1984 a 30/01/1987, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL E PROVA
TESTEMUNHAL. INSTRUÇÃO NORMATIVA nº 118/2005-INSS-DC. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE SERVIÇO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. VERBA HONORÁRIA.
- Existindo início razoável de prova material e prova testemunhal idônea, é admissível o
reconhecimento de tempo de serviço prestado por rurícola sem o devido registro em CTPS, em
regime de economia familiar (AR 43/40 / SP, Relator Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, j.
26/09/2018, DJe 04/10/2018).
- Cabe ressaltar que a própria autarquia previdenciária adota orientação segundo a qual a
aceitação de um único documento está restrita à prova do ano a que ele se referir, conforme
inciso III do artigo 374 da Instrução Normativa nº 118/2005-INSS-DC.
- O período de atividade rural anterior à vigência da Lei nº 8.213/91 deve ser computado como
tempo de serviço, mas não pode ser considerado para efeito de carência (art. 55, § 2º).
- O somatório do tempo de serviço do autor, considerando os períodos de atividade especial e o
tempo de serviço comum, na data da publicação da EC 20/98, é inferior a 30 (trinta) anos, de
maneira que é aplicável ao caso dos autos a regra de transição prevista no artigo 9º da referida
Emenda Constitucional, pois a parte autora não possuía direito adquirido ao benefício de
aposentadoria por tempo de serviço na data da sua publicação, em 16/12/1998.
- Entretanto, mesmo computando-se o tempo de serviço posterior a 15/12/1998, devidamente
registrado em CTPS, não restou comprovado o cumprimento do acréscimo do tempo de serviço
(pedágio) exigido pela Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998.
- Portanto, a parte autora não faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
serviço postulado.
- Apelação da parte autora parcialmente provida.
ACÓRDÃOVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima
Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento a apelacao da parte autora, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
