
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5061871-67.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: TEREZA DE JESUS PAULA MARQUES
Advogado do(a) APELADO: TAKESHI SASAKI - SP48810-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5061871-67.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: TEREZA DE JESUS PAULA MARQUES
Advogado do(a) APELADO: TAKESHI SASAKI - SP48810-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
“Art. 3º. Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural, em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência:
I– até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991;
II – de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e
III – de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo e respectivo inciso I ao trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que comprovar a prestação de serviço de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de emprego”.
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO.
REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991.
REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)
Art. 55. (...)
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. ATIVIDADE URBANA DO CÔNJUGE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL DESCARACTERIZADO. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO LEGAL. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DESNECESSIDADE DE VALORAÇÃO DOS DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS. SÚMULA N. 149 DO E. STJ. IMPEDIMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO REGULAR DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TÍTULO JUDICIAL QUE ORA SE RESCINDE. IMPOSSIBILIDADE. NATUREZA ALIMENTAR E BOA-FÉ. REVELIA. NÃO APLICAÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA.
(...)
II - A r. decisão rescindenda reconheceu o direito da então autora ao benefício de aposentadoria rural por idade com base na existência de início de prova material, consistente na certidão de casamento em que o marido consta como lavrador (11.09.1977), corroborado pelos depoimentos testemunhais.
III - Da análise dos documentos que compuseram os autos subjacentes, verifica-se que o cônjuge da então autora ostentava vários vínculos empregatícios de natureza urbana por tempo relevante (14.03.1978 a 31.03.1981; 01.04.1981 a 03.03.1983; 20.02.1987 a 11.1987 e 02.04.1990 a 10.10.1995), tendo sido contemplado, posteriormente, com o benefício de auxílio-doença a partir de 12.12.2001, convertido em aposentado por invalidez, na condição de comerciário/contribuinte individual, a contar de 13.09.2002.
IV - Considerando que a autora implementou o quesito etário somente em 2008 (nascida em 24.12.1953, completou 55 anos de idade em 24.12.2008), é de se concluir que a r. decisão rescindenda adotou interpretação não condizente com o art. 143 c/c o art. 55, §3º, ambos da Lei n. 8.213/91, na medida em que o documento reputado como início de prova material do labor rural (certidão de casamento) restou esmaecido ante a constatação de que o cônjuge exerceu, após o enlace matrimonial, atividades tipicamente urbanas, não bastando, portanto, a comprovação por prova exclusivamente testemunhal.
(...)
VI - A certidão de casamento em que o marido consta como lavrador (11.09.1977) não se presta como início de prova material do labor rural, tendo em vista o longo histórico de trabalho urbano empreendido por ele (extrato do CNIS).
VII - No que tange ao pedido de reconhecimento de atividade rural, é de se reconhecer que não foi apresentado documento indispensável ao ajuizamento da ação, ou seja, início de prova material no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário (24.12.2008), restando inócua a análise da prova testemunhal colhida em juízo.
VIII - Como o § 3º do art. 55 da Lei n. 8.213/91 versa sobre matéria probatória, é processual a natureza do aludido dispositivo legal, razão pela qual nos feitos que envolvam o reconhecimento de tempo de serviço a ausência nos autos do respectivo início de prova material constitui um impedimento para o desenvolvimento regular do processo, caracterizando-se, consequentemente, essa ausência, como um pressuposto processual, ou um suposto processual, como prefere denominar o sempre brilhante Professor Celso Neves. A finalidade do § 3º do art. 55 da Lei n. 8.213/91 e da Súmula 149 do E. STJ é evitar a averbação de tempo de serviço inexistente, resultante de procedimentos administrativos ou judiciais promovidos por pessoas que não exerceram atividade laborativa.
IX - A finalidade do legislador e da jurisprudência ao afastar a prova exclusivamente testemunhal não foi criar dificuldades inúteis para a comprovação do tempo de serviço urbano ou rural e encontra respaldo na segunda parte do art. 400 do CPC de 1973, atual artigo 443 do Novo CPC.
X - A interpretação teleológica dos dispositivos legais que versam sobre a questão em exame leva à conclusão que a ausência nos autos de documento tido por início de prova material é causa de extinção do feito sem resolução do mérito, com base no art. 485, IV, do Novo CPC, pois o art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91 e a Súmula 149 do E. STJ, ao vedarem a prova exclusivamente testemunhal em tais casos, criaram um óbice de procedibilidade nos processos que envolvam o reconhecimento de tempo de serviço, que a rigor acarretaria o indeferimento da inicial, nos termos dos arts. 320 e 321 do atual CPC.
XI - Carece a autora da ação subjacente de comprovação material sobre o exercício de atividade rural por ela desempenhado (art. 39, I, da Lei nº 8.213/91), restando prejudicada a apreciação do pedido de reconhecimento da atividade rural.
XII - Cabe ressalvar que os valores recebidos por força de título judicial gerador do benefício de aposentadoria rural por idade (NB 41/150.848.253-2), que ora se rescinde, não se sujeitam à restituição, pois possuem natureza claramente alimentar, tendo como destinação o atendimento de necessidades básicas da ora ré. Importante salientar que a percepção do benefício em comento decorreu de decisão judicial, com trânsito em julgado, não se vislumbrando, no caso concreto, qualquer ardil ou manobra da parte autora na ação subjacente com o escopo de atingir tal desiderato, evidenciando-se, daí, a boa-fé, consagrada no art. 113 do Código Civil.
XIII - Em face da ocorrência de revelia, não há ônus de sucumbência a suportar.
XIV - Ação rescisória cujo pedido se julga procedente. Processo subjacente que se julga extinto, sem resolução do mérito. Tutela que se concede em maior extensão.
(TERCEIRA SEÇÃO, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 10396 - 0008699-33.2015.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal SERGIO NASCIMENTO, j.09/06/2016, e-DJF3 Judicial 1 17/06/2016 ).
Postas as balizas, passa-se ao exame do caso dos autos.
De pronto, verifica-se o cumprimento pela parte autora do requisito etário em 06/10/2017, incumbindo-lhe, pois, demonstrar atividade campestre no período em que se deseja ver declarado pela autarquia federal.
A parte autora anexou aos autos razoável início de prova material, conforme segue:
- histórico escolar da autora, da escola Serviço Social da Indústria - SESI, dos anos de 1971 a 1975;
- certidão de casamento, realizado em 24/01/1981, entre a autora e João Carlos Marques;
- certidão de nascimento de Adriano Marques (filho), nascido em 1980. Consta a profissão de lavrador em nome do pai/marido da requerente;
- certidão de óbito de Antônio de Paula (genitor da autora). Constou a profissão de lavrador, quando do falecimento, ocorrido em 04/2007;
- Declaração Cadastral de Produtor (DECAP) de 1999 - declaração emitida para cancelamento/ término de contrato a partir de 04/06/1999
- Pedido de Talonário de Produtor - PTP, em nome do marido da autora, de 1997;
- nota fiscal de produtor de venda de goiaba em 1997;
- contrato de arrendamento feito com João Carlos Marques, marido da autora, de gleba de terras com 1,2 hectares para explorar plantação de goiaba. Contrato válido entre 05/1997 a 04/1999. Firmado em 05/1997;
- Matrícula nº 479, de 08/06/1976, do Cartório de Registro e Imóveis de Mirandópolis/SP, referente à Fazenda Santa Filomena, com 348,91,30 hectares;
- Certidão relativa ao Sítio Santa Luzia na Fazenda Girandina, com 14,76,20 hectares;
- Matrícula nº 1.351, de 02/12/1977, do CRI de Mirandópolis/SP, referente ao Sítio São José.
Ainda, a parte autora juntou aos autos também a Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS (ID 7247531), que possui os seguintes registros:
- Agro-pecuária Santa Rosa de Mirandópolis, trabalhadora rural, de 29/06/1989 a 28/10/1989;
- Alcomira S/A, trabalhador rural, de 17/05/1994 a 30/09/1994;
- Agro-pecuária Santa Rosa de Mirandópolis, trabalhador rural, de 03/05/2000 a 09/09/2000;
- Agropec. Santa Rosa de Mirandópolis, trabalhador rural, de 08/05/2001 a 18/10/2001;
- Franco Bras Agr (FBA), trabalhador cultivo de açúcar e álcool, de 19/04/2002 a 09/12/2003;
- FBA - Franco Brasil - Faz. Guanabara, trabalhador da fabricação de álcool, de 10/04/2004 a 10/12/2004;
- Mundial Usina de Álcool e Açúcar, trabalhador cultivo de cana-de-açúcar, de 22/02/2005 a 07/12/2005;
- Mundial-Açúcar e Álcool, trabalhador rural, de 10/04/2006 a 28/12/2009;
- COSAN, trabalhador rural, de 15/03/2010 a 26/10/2011;
- RAIZEN Energia, trabalhador rural, de 14/03/2012 a 04/01/2013.
Como início de prova material, a autora trouxe aos autos cópia do contrato de arrendamento para a plantação de goiabas, entre 1997 a 1999, o pedido de talonário de produtor – PTP em nome do marido da esposa, a nota fiscal de venda da goiaba em nome do marido, além de outros documentos como a declaração cadastral de produtor – DECAP.
Quanto à CTPS da parte autora, corroborada pelo seu extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS (ID 7247590) demonstram que a autora claramente laborou em atividade rural ao longo dos anos, bastando as testemunhas complementarem o período de carência da requerente.
Outrossim, é sabido que a qualificação do cônjuge pode ser estendida à parte requerente, bastando, para tanto, serem corroboradas por robusta prova testemunhal (STJ, REsp 175.822/SP, Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, DJ 26.10.1998). Além do mais, a jurisprudência não exige a comprovação documental ano a ano da atividade rural relativa a todo o período de carência do benefício. Desta maneira, os documentos em nome do marido servem para demonstrar como prova material no presente caso.
Além disso, em documento emitido pela própria Autarquia Federal, a autora possui registro em sistema previdenciário 122 meses de carência em atividade rural (ID 7247516).
Resulta evidenciada a presença de princípios de prova documental do labor rural.
O conjunto probatório é corroborado pelas provas orais colhidas em audiência, extraídas da r. sentença do Juízo de primeiro grau.
No mais, as testemunhas ouvidas em audiência, sob o crivo do contraditório comprovaram, de forma coerente e harmônica que a autora sempre laborou como rurícola.
Nesse contexto, a prova testemunhal produzida favorece o pleito autoral, sendo coesa e harmônica no que tange à prestação do trabalho rural pelo interregno necessário ao reconhecimento do tempo de serviço alegado na exordial, resultando na procedência parcial do pedido pleiteado.
Destarte, há que se manter a sentença, visto que é de rigor declarar como efetivo exercício de atividade rural o período compreendido entre os anos de 1980 a 2000.
Ante o exposto,
nego provimento à apelação,
nos termos da fundamentação.É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR TESTEMUNHOS.
I. Conjunto probatório documental demonstrou início de prova material.
II. A atividade rural comprovada por meio de prova material corroborada por prova testemunhal (Súmula nº 149 do STJ e Recursos Repetitivos nºs 1.348.633 e 1.321.493).
III. Entendimento uniforme de que as contribuições previdenciárias são desnecessárias, contanto que se comprove o efetivo exercício de labor rural. Precedente do STJ.
IV. Requisitos legais para o reconhecimento do tempo de serviço de atividade rural pleiteado foram preenchidos.
V. Apelação não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
