
| D.E. Publicado em 25/05/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0045366-96.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): É firme a jurisprudência no sentido de que a legislação aplicável para a caracterização do denominado trabalho em regime especial é a vigente no período em que a atividade a ser considerada foi efetivamente exercida.
Para a verificação do tempo de serviço em regime especial, no caso, deve ser levada em conta a disciplina estabelecida pelos Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64.
Salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, a exigência de laudo técnico para a comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser obrigatória a partir de 05/03/1997, data da publicação do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou a Lei nº 9.032/95 e a MP 1.523/96, convertida na Lei nº 9.528/97.
Contudo, acompanhando posicionamento adotado nesta 10ª Turma, no sentido de que em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10/12/1997, entendo que a exigência de laudo técnico para a comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser exigência legal a partir de 11/12/1997, nos termos da referida lei, que alterou a redação do § 1º do artigo 58 da Lei nº 8.213/91. Neste sentido, precedentes do Superior Tribunal de Justiça: REsp nº 422616/RS, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 02/03/2004, DJ 24/05/2004, p. 323; REsp nº 421045/SC, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 06/05/2004, DJ 28/06/2004, p. 382.
Todavia, não se exige que a profissão do segurado seja exatamente uma daquelas descritas nos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, sendo suficiente para reconhecimento da atividade especial que o trabalhador esteja sujeito, em sua atividade, aos agentes agressivos descritos em referido anexo, na esteira de entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica dos fragmentos de ementas a seguir transcritos:
Ressalte-se que o artigo 58, § 1º, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.732, de 11/12/1998, dispõe que a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será efetuada nos termos da legislação trabalhista.
O art. 194 da CLT aduz que o fornecimento de Equipamento de Proteção Individual pelo empregador, aprovado pelo órgão competente do Poder Executivo, seu uso adequado e a consequente eliminação do agente insalubre são circunstâncias que tornam inexigível o pagamento do adicional correspondente. Portanto, retira o direito ao reconhecimento da atividade como especial para fins previdenciários.
Por sua vez, o art. 195 da CLT estabelece: A caracterização e a classificação da insalubridade e da periculosidade, segundo as normas do Ministério do Trabalho, far-se-ão através de perícia a cargo do Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho, registrado no Ministério do Trabalho.
A respeito da matéria, a Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sessão de julgamento realizada em 14/05/2014, em sede de recurso representativo da controvérsia (Recurso Especial Repetitivo 1.398.260/PR, Rel. Min. Herman Benjamin), firmou orientação no sentido de que o nível de ruído que caracteriza a insalubridade para contagem de tempo de serviço especial deve ser superior a 80 (oitenta) decibéis até a edição do Decreto nº 2.171/1997, de 05/03/1997, superior a 90 (noventa) decibéis entre a vigência do Decreto nº 2.171/1997 e a edição do Decreto nº 4.882/2003, de 18/11/2003, e após a entrada em vigor do Decreto nº 4.882/2003, ou seja, a partir de 19/11/2003, incide o limite de 85 (oitenta e cinco) decibéis, considerando o princípio tempus regit actum.
Ainda com relação à matéria, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar o ARE 664.335/SC, em 04/12/2014, publicado no DJe de 12/02/2015, da relatoria do Ministro LUIZ FUX, reconheceu a repercussão geral da questão constitucional nele suscitada e, no mérito, fixou o entendimento de que a eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria, quando o segurado estiver exposto ao agente nocivo ruído, bem assim que "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. (...) Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete.".
No presente caso, a parte autora demonstrou haver laborado em atividade especial nos períodos de 01/03/1970 a 22/11/1977, 01/08/1979 a 27/12/1983, 28/05/1984 a 20/06/1984, 07/08/1984 a 15/09/1985, 02/06/1986 a 30/12/1986, 06/01/1987 a 31/03/1989, 05/06/1998 a 08/11/1998, 18/11/1999 a 30/11/2002 e de 21/01/2003 a 07/07/2008. É o que comprova o laudo pericial elaborado em juízo (fls. 152/173), trazendo a conclusão de que a parte autora desenvolveu sua atividade profissional, nas funções de trabalhador rural no corte e plantação de cana-de-açúcar, motorista de caminhão, bem assim com exposição aos agentes agressivos ruído, frio (proveniente de câmaras frigoríficas) e a agentes biológicos (germes infecciosos parasitários humanos e/ou animais). Referidas atividades e agentes agressivos são classificados como especiais, conforme os códigos 1.1.2, 1.1.6, 1.3.1, 2.2.1 e 2.4.4 do Decreto nº 53.831/64 e códigos 1.1.2, 1.1.5 e 1.3.1 do Anexo I e 2.4.2 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79, em razão da habitual e permanente exposição aos agentes ali descritos.
No tocante ao reconhecimento da atividade rural, como de natureza especial, anoto que em regra, não se considera especial a atividade na lavoura, a justificar a contagem diferenciada para fins previdenciários, eis que a atividade rural, por si só, não caracteriza a insalubridade.
Contudo, diversa é a situação dos autos, eis que se trata de trabalhador rural, com registro em carteira profissional, na função de cultivador/cortador de cana-de-açúcar, sendo que os métodos de trabalhos são voltados à produção agrícola em escala industrial com intensa utilização de defensivos e exigência de alta produtividade dos trabalhadores. Há que se dar tratamento isonômico para fins previdenciários, à vista dos demais trabalhadores ocupados na agropecuária, atividade especial, prevista nos decretos previdenciários que regulam matéria.
Neste sentido vem decidindo esta eg. Turma: AC Nº 0014928-19.2014.4.03.9999/SP, Relatoria Desembargador Federal Sérgio Nascimento, j. 24/06/2014, DJ 30/07/2014.
Por fim, as atividades ou operações executadas no interior de câmaras frigoríficas, ou em locais que apresentem condições similares, que exponham os trabalhadores ao frio, sem a proteção adequada, serão consideradas insalubres, conforme dispõe o Anexos 9, da NR 15, da Portaria 3214/78.
Além disso, a atividade que envolve agentes biológicos em trabalhos e operações em contato permanente com carnes, glândulas, vísceras, sangue, ossos, couros, pelos e dejeções de animais portadores de doenças infectocontagiosas (carbunculose, brucelose, tuberculose), é considerada insalubre em grau máximo, conforme dispõe o Anexo 14, da NR 15, da Portaria 3214/78.
Outrossim, a alegação de parcialidade do perito judicial deve ser rejeitada, uma vez que o laudo pericial juntado aos autos apresenta-se completo e suficiente para a constatação da insalubridade da atividade laborativa desenvolvida pela parte autora, constituindo prova técnica e precisa, elaborado de forma a propiciar às partes e ao Juiz o real conhecimento do objeto da perícia, descrevendo de forma clara e inteligível as suas conclusões, bem como as razões em que se fundamenta, e, por fim, respondendo aos quesitos apresentados pelas partes.
No presente caso, o laudo pericial, produzido por profissional de confiança do Juízo e equidistante dos interesses em confronto, fornece elementos suficientes para a formação da convicção do magistrado a respeito da questão.
De outra parte, não há falar em ausência de prévia fonte de custeio para o reconhecimento da atividade especial e sua conversão em tempo de serviço comum, haja vista que a obrigação do desconto e o recolhimento das contribuições no que tange à figura do empregado são de responsabilidade exclusiva de seu empregador, inclusive no tocante ao recolhimento do Seguro de Acidente do Trabalho, cabendo ao INSS fiscalizar e exigir o cumprimento de tal obrigação.
Assim, na data do requerimento administrativo, a parte autora alcançou mais de 25 (vinte e cinco) anos de tempo de serviço especial, sendo, portanto, devida a aposentadoria especial, conforme o artigo 57 da Lei nº 8.213/91.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (25/06/2008), nos termos do artigo 57, § 2º c.c artigo 49, inciso II, da Lei n.º 8.213/91.
A prescrição quinquenal somente alcança as prestações não pagas nem reclamadas na época própria, não atingindo o fundo de direito, devendo ser observada no presente caso. Neste sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica a seguir:
Considerando que o termo inicial do benefício foi fixado em 25/06/2008 (data do requerimento administrativo - fl. 36 e 89) e a ação foi ajuizada em 25/11/2008, não há que se falar em parcelas prescritas.
Os juros de mora e a correção monetária deverão observar o disposto na Lei nº 11.960/09 (STF, Repercussão Geral no Recurso Extraordinário 870.947, 16/04/2015, Rel. Min. Luiz Fux).
Em virtude da sucumbência, arcará o INSS com os honorários advocatícios, ora arbitrados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento sufragado pela 10ª Turma desta Corte Regional. Ressalte-se que a base de cálculo sobre a qual incidirá mencionado percentual será composta das prestações vencidas entre o termo inicial do benefício e a data desta decisão, em consonância com a Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Na hipótese, considera-se a data desta decisão como termo final da base de cálculo dos honorários advocatícios em virtude de somente aí, com a reforma da sentença de improcedência, haver ocorrido a condenação do INSS.
Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para reconhecer a atividade especial também no período de 01/03/1970 a 22/11/1977 e condenar o INSS a conceder o benefício de aposentadoria especial, desde o requerimento administrativo, com correção monetária, juros de mora e verba honorária, nos termos da fundamentação.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
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| Data e Hora: | 16/05/2017 17:51:17 |
