
| D.E. Publicado em 29/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017196-41.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Inicialmente, recebo o recurso de apelação da parte autora, haja vista que tempestivo, nos termos do artigo 1.010 do novo Código de Processo Civil.
Busca a parte autora o reconhecimento do trabalho exercido em condições especiais e a posterior conversão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço em aposentadoria especial.
Há de se distinguir, de início, a aposentadoria especial prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de serviço, prevista no art. 52 da Lei nº 8.213/91. A primeira pressupõe o exercício de atividade considerada especial pelo tempo de 15, 20 ou 25 (quinze, vinte ou vinte e cinco) anos, e, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57). A segunda pressupõe tanto o exercício de atividade especial como o exercício de atividade comum, sendo que o período de atividade laborado em atividade especial sofre a conversão em atividade comum, aumentando, assim, o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da EC nº 20/98.
É firme a jurisprudência no sentido de que a legislação aplicável para a caracterização do denominado trabalho em regime especial é a vigente no período em que a atividade a ser considerada foi efetivamente exercida.
Para a verificação do tempo de serviço em regime especial, no caso, deve ser levada em conta a disciplina estabelecida pelos Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64.
Salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, a exigência de laudo técnico para a comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser obrigatória a partir de 05/03/1997, data da publicação do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou a Lei nº 9.032/95 e a MP 1.523/96, convertida na Lei nº 9.528/97.
Contudo, acompanhando posicionamento adotado nesta 10ª Turma, no sentido de que em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10/12/1997, entendo que a exigência de laudo técnico para a comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser exigência legal a partir de 11/12/1997, nos termos da referida lei, que alterou a redação do § 1º do artigo 58 da Lei nº 8.213/91. Neste sentido, precedentes do Superior Tribunal de Justiça: REsp nº 422616/RS, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 02/03/2004, DJ 24/05/2004, p. 323; REsp nº 421045/SC, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 06/05/2004, DJ 28/06/2004, p. 382.
Todavia, não se exige que a profissão do segurado seja exatamente uma daquelas descritas nos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, sendo suficiente para reconhecimento da atividade especial que o trabalhador esteja sujeito, em sua atividade, aos agentes agressivos descritos em referido anexo, na esteira de entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica dos fragmentos de ementas a seguir transcritos:
Ressalte-se que o artigo 58, § 1º, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.732, de 11/12/1998, dispõe que a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será efetuada nos termos da legislação trabalhista.
O art. 194 da CLT aduz que o fornecimento de Equipamento de Proteção Individual pelo empregador, aprovado pelo órgão competente do Poder Executivo, seu uso adequado e a consequente eliminação do agente insalubre são circunstâncias que tornam inexigível o pagamento do adicional correspondente. Portanto, retira o direito ao reconhecimento da atividade como especial para fins previdenciários.
Por sua vez, o art. 195 da CLT estabelece: A caracterização e a classificação da insalubridade e da periculosidade, segundo as normas do Ministério do Trabalho, far-se-ão através de perícia a cargo do Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho, registrado no Ministério do Trabalho.
A respeito da matéria, a Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sessão de julgamento realizada em 14/05/2014, em sede de recurso representativo da controvérsia (Recurso Especial Repetitivo 1.398.260/PR, Rel. Min. Herman Benjamin), firmou orientação no sentido de que o nível de ruído que caracteriza a insalubridade para contagem de tempo de serviço especial deve ser superior a 80 (oitenta) decibéis até a edição do Decreto nº 2.171/1997, de 05/03/1997, superior a 90 (noventa) decibéis entre a vigência do Decreto nº 2.171/1997 e a edição do Decreto nº 4.882/2003, de 18/11/2003, e após a entrada em vigor do Decreto nº 4.882/2003, ou seja, a partir de 19/11/2003, incide o limite de 85 (oitenta e cinco) decibéis, considerando o princípio tempus regit actum.
Ainda com relação à matéria, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar o ARE 664.335/SC, em 04/12/2014, publicado no DJe de 12/02/2015, da relatoria do Ministro LUIZ FUX, reconheceu a repercussão geral da questão constitucional nele suscitada e, no mérito, fixou o entendimento de que a eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria, quando o segurado estiver exposto ao agente nocivo ruído, bem assim que "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. (...) Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete.".
No presente caso, a parte autora demonstrou haver laborado em atividade especial nos períodos de 08/02/1974 a 22/09/1977, 03/10/1977 a 31/12/1977, 12/04/1978 a 01/03/1980, 02/03/1981 a 16/05/1981, 12/06/1981 a 03/07/1981, 16/07/1981 a 06/10/1981, 30/10/1981 a 23/11/1981, 04/01/1982 a 03/04/1982, 16/05/1983 a 23/05/1984, 07/06/1984 a 26/01/1987, 28/01/1987 a 30/03/1991, 06/03/1997 a 01/03/2010. É o que comprovam as anotações em CTPS, os formulários com informações sobre atividades especiais, laudos técnicos e os Perfis Profissiográficos Previdenciários - PPPs, elaborados nos termos dos arts. 176 a 178, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 20, de 11 de outubro de 2007 (DOU - 11/10/2007) e art. 68, § 2º, do Decreto nº 3.048/99 (fls. 32/50), bem assim o laudo pericial elaborado em juízo (fls. 192/206 e 232/239), trazendo a conclusão de que a parte autora desenvolveu sua atividade profissional, nas funções de vigia, trabalhador rural no corte e plantação de cana-de-açúcar, bem assim com exposição aos agentes agressivos ruído e hidrocarbonetos. Referidas atividades e agentes agressivos são classificados como especial, conforme os códigos 1.1.6, 1.2.11, 2.2.1 e 2.5.7 do Decreto nº 53.831/64 e códigos 1.1.5 e 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79, em razão da habitual e permanente exposição aos agentes ali descritos.
No tocante ao reconhecimento da atividade rural, como de natureza especial, anoto que em regra, não se considera especial a atividade na lavoura, a justificar a contagem diferenciada para fins previdenciários, eis que a atividade rural, por si só, não caracteriza a insalubridade.
Contudo, diversa é a situação dos autos, eis que se trata de trabalhador rural, com registro em carteira profissional, na função de cultivador/cortador de cana-de-açúcar, sendo que os métodos de trabalhos são voltados à produção agrícola em escala industrial com intensa utilização de defensivos e exigência de alta produtividade dos trabalhadores. Há que se dar tratamento isonômico para fins previdenciários, à vista dos demais trabalhadores ocupados na agropecuária, atividade especial, prevista nos decretos previdenciários que regulam matéria.
Neste sentido vem decidindo esta eg. Turma: AC Nº 0014928-19.2014.4.03.9999/SP, Relatoria Desembargador Federal Sérgio Nascimento, j. 24/06/2014, DJ 30/07/2014.
Para comprovar a atividade de vigilante, trabalho que corresponde ao exercício de atividade de guarda, classificado no código 2.5.7 do Anexo do Decreto nº 53.831/64, foram juntadas aos autos cópias da CTPS com anotação de contrato de trabalho (fl. 35). Tal atividade é de natureza perigosa, porquanto o trabalhador que exerce a profissão de vigia ou vigilante tem sua integridade física colocada em efetivo risco, não sendo poucos os relatos policiais acerca de lesões corporais e morte no exercício de vigilância patrimonial.
Outrossim, acompanhando posicionamento adotado na 10ª Turma desta Corte Regional, entendo que o reconhecimento da natureza especial da atividade de vigia independe da demonstração de que a parte autora utilizava-se de arma de fogo para o desenvolvimento de suas funções. Neste sentido:
Por fim, a manipulação de óleos minerais (hidrocarbonetos) é considerada insalubre em grau máximo, bem assim o emprego de produtos contendo hidrocarbonetos aromáticos com solventes ou em limpeza de peças é considerado insalubre em grau médio, conforme dispõe o Anexo 13, da NR 15, da Portaria 3214/78.
Ressalte-se que deve ser considerado como período de atividade especial aquele em que o autor esteve em gozo de benefício de auxílio-doença, ainda que não decorrente de acidente de trabalho, uma vez que à época do afastamento ele estava exposto aos mesmos agentes nocivos. Nesse sentido, já decidiu o egrégio Superior Tribunal de Justiça:
No mesmo sentido, é o entendimento da Décima Turma desta Corte Regional:
Observo que, quando do requerimento administrativo do benefício, a própria autarquia previdenciária reconheceu como especial a atividade desenvolvida nos períodos de 17/05/1982 a 25/03/1983 e de 01/09/1991 a 05/03/1997, restando portanto incontroversos (fls. 67, verso).
Assim, na data do requerimento administrativo, a parte autora alcançou mais de 25 (vinte e cinco) anos de tempo de serviço especial, sendo, portanto, devida a aposentadoria especial, conforme o artigo 57 da Lei nº 8.213/91.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (01/03/2010), nos termos do artigo 57, §2º c.c artigo 49, inciso II, da Lei n.º 8.213/91.
Os juros de mora e a correção monetária deverão observar o disposto na Lei nº 11.960/09 (STF, Repercussão Geral no Recurso Extraordinário 870.947, 16/04/2015, Rel. Min. Luiz Fux).
Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, § 3º, do Novo Código de Processo Civil/2015.
Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para reconhecer a atividade especial nos períodos de 08/02/1974 a 22/09/1977, 03/10/1977 a 31/12/1977, 12/04/1978 a 01/03/1980, 02/03/1981 a 16/05/1981, 12/06/1981 a 03/07/1981, 16/07/1981 a 06/10/1981, 30/10/1981 a 23/11/1981, 04/01/1982 a 03/04/1982, 16/05/1983 a 23/05/1984, 07/06/1984 a 26/01/1987, 28/01/1987 a 30/03/1991, 06/03/1997 a 01/03/2010 e condenar o INSS a converter o benefício de aposentadoria por tempo de serviço em aposentadoria especial, desde o requerimento administrativo, com correção monetária, juros de mora e verba honorária, nos termos da fundamentação.
Independentemente do trânsito em julgado, determino seja expedido ofício ao INSS, instruído com os documentos de JOSÉ ROBERTO JACOBIS, a fim de que se adotem as providências cabíveis à imediata conversão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço em aposentadoria especial, com data de início - DIB em 01/03/2010, e renda mensal inicial - RMI a ser calculada pelo INSS, nos termos do art. 497 do Código de Processo Civil. O aludido ofício poderá ser substituído por e-mail.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
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| Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
| Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
| Data e Hora: | 19/09/2017 19:42:42 |
