
| D.E. Publicado em 05/10/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004866-48.2016.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento de natureza previdenciária, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de atividade especial, sobreveio sentença de parcial procedência do pedido, apenas para reconhecer como especial a atividade exercida no período de 22/09/1988 a 04/04/1991, condenando-se a parte autora nas verbas sucumbenciais, observada sua condição de beneficiária da assistência judiciária gratuita.
A r. sentença não foi submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, pugnando pela reforma da sentença, para que seja julgado procedente o pedido, sustentando o cumprimento dos requisitos legais para o reconhecimento da atividade especial em todos os períodos declinados na inicial e a concessão do benefício de aposentadoria especial.
A autarquia previdenciária também recorreu, pugnando pela reforma da sentença, para que seja julgado improcedente o pedido, em razão da ausência do preenchimento dos requisitos legais para o reconhecimento da atividade especial.
Com contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Inicialmente, recebo os recursos de apelação da parte autora e do INSS, haja vista que tempestivos, nos termos do artigo 1.010 do novo Código de Processo Civil.
É firme a jurisprudência no sentido de que a legislação aplicável para a caracterização do denominado trabalho em regime especial é a vigente no período em que a atividade a ser considerada foi efetivamente exercida.
Para a verificação do tempo de serviço em regime especial, no caso, deve ser levada em conta a disciplina estabelecida pelos Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64.
Salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, a exigência de laudo técnico para a comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser obrigatória a partir de 05/03/1997, data da publicação do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou a Lei nº 9.032/95 e a MP 1.523/96, convertida na Lei nº 9.528/97.
Contudo, acompanhando posicionamento adotado nesta 10ª Turma, no sentido de que em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10/12/1997, entendo que a exigência de laudo técnico para a comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser exigência legal a partir de 11/12/1997, nos termos da referida lei, que alterou a redação do § 1º do artigo 58 da Lei nº 8.213/91. Neste sentido, precedentes do Superior Tribunal de Justiça: REsp nº 422616/RS, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 02/03/2004, DJ 24/05/2004, p. 323; REsp nº 421045/SC, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 06/05/2004, DJ 28/06/2004, p. 382.
Todavia, não se exige que a profissão do segurado seja exatamente uma daquelas descritas nos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, sendo suficiente para reconhecimento da atividade especial que o trabalhador esteja sujeito, em sua atividade, aos agentes agressivos descritos em referido anexo, na esteira de entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica dos fragmentos de ementas a seguir transcritos:
O artigo 58, § 1º, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.732, de 11/12/1998, dispõe que a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será efetuada nos termos da legislação trabalhista.
O art. 194 da CLT aduz que o fornecimento de Equipamento de Proteção Individual pelo empregador, aprovado pelo órgão competente do Poder Executivo, seu uso adequado e a consequente eliminação do agente insalubre são circunstâncias que tornam inexigível o pagamento do adicional correspondente. Portanto, retira o direito ao reconhecimento da atividade como especial para fins previdenciários.
Por sua vez, o art. 195 da CLT estabelece: A caracterização e a classificação da insalubridade e da periculosidade, segundo as normas do Ministério do Trabalho, far-se-ão através de perícia a cargo do Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho, registrado no Ministério do Trabalho.
A respeito da matéria, a Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sessão de julgamento realizada em 14/05/2014, em sede de recurso representativo da controvérsia (Recurso Especial Repetitivo 1.398.260/PR, Rel. Min. Herman Benjamin), firmou orientação no sentido de que o nível de ruído que caracteriza a insalubridade para contagem de tempo de serviço especial deve ser superior a 80 (oitenta) decibéis até a edição do Decreto nº 2.171/1997, de 05/03/1997, superior a 90 (noventa) decibéis entre a vigência do Decreto nº 2.171/1997 e a edição do Decreto nº 4.882/2003, de 18/11/2003, e após a entrada em vigor do Decreto nº 4.882/2003, ou seja, a partir de 19/11/2003, incide o limite de 85 (oitenta e cinco) decibéis, considerando o princípio tempus regit actum.
Ainda com relação à matéria, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar o ARE 664.335/SC, em 04/12/2014, publicado no DJe de 12/02/2015, da relatoria do Ministro LUIZ FUX, reconheceu a repercussão geral da questão constitucional nele suscitada e, no mérito, fixou o entendimento de que a eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria, quando o segurado estiver exposto ao agente nocivo ruído, bem assim que "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. (...) Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete.".
No presente caso, a parte autora pleiteia o reconhecimento como especial das atividades desenvolvidas nos períodos de 22/09/1988 a 04/04/1991 e de 29/04/1995 a 10/04/2015, na função de vigilante, bem como do período de 01/09/1986 a 22/07/1987, em que teria exercido a função de operador de máquina.
Para comprovação da atividade de vigilante, trabalho que corresponde ao exercício de atividade de guarda, classificado no código 2.5.7 do Anexo do Decreto nº 53.831/64, foram juntadas aos autos cópia da CTPS, com anotação de contrato de trabalho na função de vigilante (fls. 45/46), e Perfis Profissiográficos Previdenciários - PPPs, elaborados nos termos dos arts. 176 a 178, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 20, de 11 de outubro de 2007 (DOU - 11/10/2007) e art. 68, § 2º, do Decreto nº 3.048/99 (fls. 58/59 e 62/63). Tal atividade é de natureza perigosa, porquanto o trabalhador que exerce a profissão de vigia ou vigilante tem sua integridade física colocada em efetivo risco, não sendo poucos os relatos policiais acerca de lesões corporais e morte no exercício de vigilância patrimonial.
Acompanhando posicionamento adotado na 10ª Turma desta Corte Regional, entendo que o reconhecimento da natureza especial da atividade de vigia independe da demonstração de que a parte autora utilizava-se de arma de fogo para o desenvolvimento de suas funções. Neste sentido:
Fazendo as vezes do laudo técnico, o Perfil Profissiográfico Previdenciário é documento hábil à comprovação do tempo de serviço sob condições insalubre, pois embora continue a ser elaborado e emitido por profissional habilitado, qual seja, médico ou engenheiro do trabalho, o laudo permanece em poder da empresa que, com base nos dados ambientais ali contidos, emite o referido PPP, que reúne em um só documento tanto o histórico profissional do trabalhador como os agentes nocivos apontados no laudo ambiental, e no qual consta o nome do profissional que efetuou o laudo técnico, sendo assinado pela empresa ou seu preposto.
De outra parte, não há falar em ausência de prévia fonte de custeio para o reconhecimento da atividade especial e sua conversão em tempo de serviço comum, haja vista que a obrigação do desconto e o recolhimento das contribuições no que tange à figura do empregado são de responsabilidade exclusiva de seu empregador, inclusive no tocante ao recolhimento do Seguro de Acidente do Trabalho, cabendo ao INSS fiscalizar e exigir o cumprimento de tal obrigação.
Com relação ao fornecimento de equipamento de proteção individual pelo empregador, aprovado pelo órgão competente do Poder Executivo, seu uso adequado e a consequente eliminação do agente insalubre são circunstâncias que tornam inexigível o pagamento do adicional correspondente e retira o direito ao reconhecimento da atividade como especial para fins previdenciários. E, no caso dos autos o uso de equipamento de proteção individual, por si só, não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que não restou comprovada a eliminação da insalubridade do ambiente de trabalho do segurado. As informações trazidas no PPP não são suficientes para aferir se o uso do equipamento de proteção individual eliminou/neutralizou ou somente reduziu os efeitos do agente insalubre no ambiente de trabalho.
No caso dos autos, não há prova de efetivo fornecimento do equipamento de proteção individual ao trabalhador, ou seja, Ficha de Controle de Entrega do EPI ao trabalhador, com o respectivo certificado de aprovação do EPI, restando insuficiente a informação sobre a eficácia do referido equipamento.
Entretanto, o período de 01/09/1986 a 22/07/1987 não pode ser considerado especial, seja em razão da atividade exercida (ajudante geral), conforme anotação em CTPS (fl. 30), seja em razão de ausência de sujeição a quaisquer agentes agressivos, nos termos da legislação.
Ressalte-se que, quando da análise do requerimento administrativo, a autarquia previdenciária reconheceu o exercício de atividade especial no período de 30/04/1991 a 28/04/1995 (fls. 69/71).
Desta forma, a parte autora alcançou mais de 25 (vinte e cinco) anos de tempo de serviço especial, sendo, portanto, devida a concessão da aposentadoria especial, conforme o artigo 57 da Lei nº 8.213/91.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (23/04/2015 - fl. 16), nos termos do artigo 57, §2º c.c artigo 49, inciso II, da Lei n.º 8.213/91.
Os juros de mora e a correção monetária deverão observar o disposto na Lei nº 11.960/09 (STF, Repercussão Geral no Recurso Extraordinário 870.947, 16/04/2015, Rel. Min. Luiz Fux).
Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, § 3º, do Novo Código de Processo Civil/2015, observada a Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para condenar o INSS a reconhecer também a atividade especial exercida no período de 29/04/1995 a 10/04/2015, e a conceder o benefício de aposentadoria especial, com termo inicial, juros de mora, correção monetária e honorários advocatícios, nos termos da fundamentação.
Independentemente do trânsito em julgado, determino seja expedido ofício ao INSS, instruído com os documentos de JOSÉ AMÉRICO DA SILVA FILHO, a fim de que se adotem as providências cabíveis à imediata implantação do benefício de aposentadoria especial, com data de início - DIB em 23/04/2015, e renda mensal inicial - RMI a ser calculada pelo INSS, com observância, inclusive, das disposições do art. 497 do novo Código de Processo Civil. O aludido ofício poderá ser substituído por e-mail, na forma a ser disciplinada por esta Corte.
É o voto.
Desembargadora Federal
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| Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
| Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
| Data e Hora: | 26/09/2017 19:00:04 |
