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PREVIDENCIÁRIO : LOAS. AUSÊNCIA DE MISERABILIDADE. REQUISITO NÃO DEMONSTRADO. TRF3. 0009810-23.2018.4.03.9999...

Data da publicação: 17/07/2020, 03:36:41

PREVIDENCIÁRIO: LOAS. AUSÊNCIA DE MISERABILIDADE. REQUISITO NÃO DEMONSTRADO. 1 - Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em razão de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas. 2 - O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei 8.742/1993. 3 - O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, atualmente, define o conceito de pessoa com deficiência como aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. 4 - Para se aferir a incapacidade deve-se levar em conta, não só a conclusão da perícia médica, mas também, a faixa etária, o grau de escolaridade, as condições sócio-econômicas e a natureza da atividade para a qual a autora está qualificada. 5 - Quanto à incapacidade, o laudo médico atestou que o autor é portador de sequela de Meningite (F81.9 - Transtorno não especificado do desenvolvimento das habilidades escolares e G40 Epilepsia), cuja condição médica apresentada é geradora de incapacidade laborativa total e permanente. 6 - Restou comprovado o requisito atinente a incapacidade do autor para o exercício profissional. 7 - O estudo social realizado em abril de 2016, demonstra que o autor reside com a mãe RENATA (46 anos), o pai REGINALDO (46 anos); o irmão GABRIEL (21 anos), em um imóvel próprio que possui 01 sala, 01 copa, 02 quartos, 01 cozinha, 02 banheiros, 01 varanda e uma garagem. A casa é ampla e possui ótimo estado de conservação. O piso é frio e o teto é lajotado. A renda mensal familiar é composta pelo salário da mãe, no total de R$ 1.100,00. Os gastos mensais da família totalizam R$ 898,00, com gastos com supermercado, energia elétrica, consumo de água, medicamento, transporte e IPTU. O autor utiliza a rede de saúde pública e o convênio de saúde privado (UNIMED). A família possui 01 TV tela plana, 01 fogão, 01 geladeira, 01 microondas, 01 máquina de lavar roupa, 02 aparelhos celulares e 01 veículo, modelo Spin, marca Chevrolet, ano 2014, placa FOE 7464 (financiado). 8 - De acordo com o CNIS juntado aos autos, a mãe do autor, em abril de 2014, recebia o salário de R$ 1.840,08 (um mil, oitocentos e quarenta reais e oito centavos). O pai recebeu auxílio doença nos períodos de 12/2016 a 04/2017. 9 - A exclusão do cálculo de renda per capita de todos os benefícios de renda mínima, de idosos e incapazes, de natureza previdenciária ou assistencial - funda-se no fato de que nesses casos o benefício percebido busca amparar unicamente seu beneficiário, não sendo suficiente para alcançar os demais membros do grupo familiar. 10 - A pessoa que teve sua renda excluída também não será considerada na composição do grupo familiar, para efeito do cálculo da renda per capita. 11 - Em que pese a comprovação da incapacidade total e permanente do autor, depreende-se do estudo social que o mesmo coabita em residência própria e em boas condições de uso, havendo possibilidade das suas necessidades básicas serem supridas pela família. A família possui TV de tela plana, microoondas, máquina de lavar roupa, aparelhos celulares e veículo de 2014. O autor possui Plano de Saúde (UNIMED). 12 - Pelos elementos trazidos aos autos, conquanto o autor seja incapaz e apresente apertado orçamento familiar, não há comprovação de que vive em situação de vulnerabilidade social. 13 - Invertido o ônus da sucumbência e condenada a parte autora ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% sobre o valor da causa, aplicando as normas dos §§1º a 11º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no artigo 12 da Lei nº 1.060/50 (§ 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015). 14 - Revogada a tutela antecipada. 15 - Recurso do INSS provido. Prejudicado o recurso do autor. (TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2299472 - 0009810-23.2018.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA, julgado em 25/03/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/04/2019 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 05/04/2019
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009810-23.2018.4.03.9999/SP
2018.03.99.009810-4/SP
RELATORA:Desembargadora Federal INÊS VIRGÍNIA
APELANTE:GUILHERME PINHEIRO JUNQUEIRA incapaz
ADVOGADO:SP242202 FERNANDA GOUVEIA SOBREIRA PEREIRA
REPRESENTANTE:RENATA PEDROSO PINHEIRO JUNQUEIRA
ADVOGADO:SP242202 FERNANDA GOUVEIA SOBREIRA PEREIRA
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A):OS MESMOS
APELADO(A):GUILHERME PINHEIRO JUNQUEIRA incapaz
ADVOGADO:SP242202 FERNANDA GOUVEIA SOBREIRA PEREIRA
APELADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
No. ORIG.:00017364320158260288 1 Vr ITUVERAVA/SP

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO: LOAS. AUSÊNCIA DE MISERABILIDADE. REQUISITO NÃO DEMONSTRADO.
1 - Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em razão de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2 - O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei 8.742/1993.
3 - O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, atualmente, define o conceito de pessoa com deficiência como aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
4 - Para se aferir a incapacidade deve-se levar em conta, não só a conclusão da perícia médica, mas também, a faixa etária, o grau de escolaridade, as condições sócio-econômicas e a natureza da atividade para a qual a autora está qualificada.
5 - Quanto à incapacidade, o laudo médico atestou que o autor é portador de sequela de Meningite (F81.9 - Transtorno não especificado do desenvolvimento das habilidades escolares e G40 Epilepsia), cuja condição médica apresentada é geradora de incapacidade laborativa total e permanente.
6 - Restou comprovado o requisito atinente a incapacidade do autor para o exercício profissional.
7 - O estudo social realizado em abril de 2016, demonstra que o autor reside com a mãe RENATA (46 anos), o pai REGINALDO (46 anos); o irmão GABRIEL (21 anos), em um imóvel próprio que possui 01 sala, 01 copa, 02 quartos, 01 cozinha, 02 banheiros, 01 varanda e uma garagem. A casa é ampla e possui ótimo estado de conservação. O piso é frio e o teto é lajotado. A renda mensal familiar é composta pelo salário da mãe, no total de R$ 1.100,00. Os gastos mensais da família totalizam R$ 898,00, com gastos com supermercado, energia elétrica, consumo de água, medicamento, transporte e IPTU. O autor utiliza a rede de saúde pública e o convênio de saúde privado (UNIMED). A família possui 01 TV tela plana, 01 fogão, 01 geladeira, 01 microondas, 01 máquina de lavar roupa, 02 aparelhos celulares e 01 veículo, modelo Spin, marca Chevrolet, ano 2014, placa FOE 7464 (financiado).
8 - De acordo com o CNIS juntado aos autos, a mãe do autor, em abril de 2014, recebia o salário de R$ 1.840,08 (um mil, oitocentos e quarenta reais e oito centavos). O pai recebeu auxílio doença nos períodos de 12/2016 a 04/2017.
9 - A exclusão do cálculo de renda per capita de todos os benefícios de renda mínima, de idosos e incapazes, de natureza previdenciária ou assistencial - funda-se no fato de que nesses casos o benefício percebido busca amparar unicamente seu beneficiário, não sendo suficiente para alcançar os demais membros do grupo familiar.
10 - A pessoa que teve sua renda excluída também não será considerada na composição do grupo familiar, para efeito do cálculo da renda per capita.
11 - Em que pese a comprovação da incapacidade total e permanente do autor, depreende-se do estudo social que o mesmo coabita em residência própria e em boas condições de uso, havendo possibilidade das suas necessidades básicas serem supridas pela família. A família possui TV de tela plana, microoondas, máquina de lavar roupa, aparelhos celulares e veículo de 2014. O autor possui Plano de Saúde (UNIMED).
12 - Pelos elementos trazidos aos autos, conquanto o autor seja incapaz e apresente apertado orçamento familiar, não há comprovação de que vive em situação de vulnerabilidade social.
13 - Invertido o ônus da sucumbência e condenada a parte autora ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% sobre o valor da causa, aplicando as normas dos §§1º a 11º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no artigo 12 da Lei nº 1.060/50 (§ 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015).
14 - Revogada a tutela antecipada.
15 - Recurso do INSS provido. Prejudicado o recurso do autor.






ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dou provimento ao recurso do INSS para julgar improcedente o pedido, condenando o autor ao pagamento de honorários advocatícios e considerar prejudicado o recurso do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 25 de março de 2019.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): INES VIRGINIA PRADO SOARES:10084
Nº de Série do Certificado: 11DE18032058641B
Data e Hora: 27/03/2019 16:48:25



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009810-23.2018.4.03.9999/SP
2018.03.99.009810-4/SP
RELATORA:Desembargadora Federal INÊS VIRGÍNIA
APELANTE:GUILHERME PINHEIRO JUNQUEIRA incapaz
ADVOGADO:SP242202 FERNANDA GOUVEIA SOBREIRA PEREIRA
REPRESENTANTE:RENATA PEDROSO PINHEIRO JUNQUEIRA
ADVOGADO:SP242202 FERNANDA GOUVEIA SOBREIRA PEREIRA
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A):OS MESMOS
APELADO(A):GUILHERME PINHEIRO JUNQUEIRA incapaz
ADVOGADO:SP242202 FERNANDA GOUVEIA SOBREIRA PEREIRA
APELADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
No. ORIG.:00017364320158260288 1 Vr ITUVERAVA/SP

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Tratam-se de apelações interpostas por GUILHERME PINHEIRO JUNQUEIRA e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em ação objetivando a concessão do benefício assistencial.

A r. sentença julgou PROCEDENTE o pedido, condenando a autarquia a conceder o benefício assistencial ao autor, a partir da data da citação (16/11/2015), antecipando os efeitos da tutela. Sobre as parcelas vencidas devem incidir correção monetária de acordo com o IPCA e juros de mora a contar da citação, nos termos do art. 1º-F da Lei 9494/97, com a redação dada pela Lei 11960/2009. O INSS deve arcar com o pagamento de honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença (art. 85, § 2º do novo CPC). Indevida a condenação em custas, face ao teor do art. 5º, Lei 11608/2003.

No recurso de fls. 109/111, o autor pleiteia a reforma da sentença sob o argumento de que o termo inicial do benefício deve coincidir com a data do indeferimento administrativo (14/11/2001). Pleiteia o prequestionamento da matéria elencada.

Em suas razões recursais, o INSS pugna pela reforma da sentença nos seguintes aspectos: a) ausência de miserabilidade; b) correção monetária de acordo com o artigo 1º-F da Lei 9494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, a partir de sua vigência.

Regularmente processado o feito, com contrarrazões, os autos subiram a este Eg. Tribunal.

Certificado pela Subsecretaria da Sétima Turma, nos termos da Ordem de Serviço nº 13/2016, artigo 8º, que as apelações foram interpostas no prazo legal e que a parte autora é beneficiária da justiça gratuita.

O MPF opinou pelo desprovimento dos recursos.

É o relatório.


VOTO

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: (Relatora): Por primeiro, recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.

O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei 8.742/1993.

O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as demais pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício assistencial, não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja segurado do INSS ou desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a comprovação da hipossuficiência própria e/ou familiar.

O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas com deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.

A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que hospedou em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com previsão de tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.

Concebida dentro de uma perspectiva do Estado Social de Direito, a Constituição valoriza e protege os direitos sociais básicos, estabelece normas pragmáticas, enfim, apresenta conteúdo contrário ao de uma Constituição do Estado Liberal, afastando-se do repouso, do formalismo e do divórcio entre Estado e Sociedade.

A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.

Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas voltadas ao amparo de pessoas em situação de miséria.

A estrutura do Estado brasileiro insculpida no texto constitucional está informada pelos direitos e valores nela declarados, que necessitam de permanente conformação com às demandas sociais. Como destaca Paulo Bonavides, seguindo o norte das constituições democráticas, a Constituição brasileira carrega traços do conflito, dos conteúdos dinâmicos, do pluralismo, da tensão sempre renovada entre igualdade e a liberdade.

É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V da Carta deve ser compreendido.

O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, define pessoa com deficiência como aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei 13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a presença de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei atual ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida independente, eis que devem ser considerados, também, para a perfeita análise da situação de vulnerabilidade do requerente, fatores sociais e o meio em que a pessoa com deficiência vive, isto é, um conjunto de circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele que necessita de proteção social.

Nesse sentido, as avaliações de que trata o §6º do artigo 20, que sujeita a concessão do benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e pessoais a que está sujeito.

Insta salientar, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:


"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada".


No que diz respeito ao requisito socioeconômico, o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, em linhas gerais, considera como hipossuficiente para consecução deste benefício pessoa cuja renda por pessoa do grupo familiar seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.

Andou bem o legislador, ao incluir o § 11 no artigo 20, com a publicação da Lei 13.146/2015, normatizando expressamente que a comprovação da miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade do requerente possam ser comprovadas por outros elementos probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.

Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício, consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de miserabilidade que a renda per capita sugere: Precedentes do C. STJ: AgRg no AREsp 319.888/PR, 1ª Turma, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJE 03/02/2017; AgRg no REsp 1.514.461/SP, 2ª Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE 24/05/2016; REsp 1.025.181/RS, 6ª Turma, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE 29/09/2008).

Para efeito da mensuração da renda per capita, o Regulamento do Benefício de Prestação Continuada, instituído pelo Decreto nº 6.214/2017, definiu Grupo Familiar em seu artigo 4º, assim dispondo:


Art. 4º. Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:

(...)

V- família para cálculo da renda per capita: conjunto de pessoas composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto;

(...)


Mencionado artigo também normatizou, em seu inciso VI e §2º, as rendas que poderão ser excluídas no cômputo da renda familiar, bem como as que devem ser consideradas nesse cálculo, vejamos:


(...)


VI - renda mensal bruta familiar: a soma dos rendimentos brutos auferidos mensalmente pelos membros da família composta por salários, proventos, pensões, pensões alimentícias, benefícios de previdência pública ou privada, seguro-desemprego, comissões, pro-labore, outros rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou autônomo, rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e Benefício de Prestação Continuada, ressalvado o disposto no parágrafo único do artigo 19.

(...)

§ 2º - Para fins do disposto no inciso VI do caput, não serão computados como renda mensal bruta familiar:


I - benefícios e auxílios assistenciais de natureza eventual e temporária;

II - valores oriundos de programas sociais de transferência de renda;

III - bolsas de estágio supervisionado;

IV - pensão especial de natureza indenizatória e benefício de assistência médica, conforme disposto no art. 5º;

V - rendas de natureza eventual ou sazonal, a serem regulamentadas em ato conjunto do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do INSS; e

VI - rendimentos decorrentes de contrato de aprendizagem.

(...)


Por fim, cabe uma última ponderação, que é a consideração feita ao artigo 19, mencionado no inciso VI do artigo supracitado:


Art. 19. O Benefício de Prestação Continuada será devido a mais de um membro da mesma família enquanto atendidos os requisitos exigidos neste Regulamento.

Parágrafo único. O valor do Benefício de Prestação Continuada concedido a idoso não será computado no cálculo da renda mensal bruta familiar a que se refere o inciso VI do art. 4º, para fins de concessão do Benefício de Prestação Continuada a outro idoso da mesma família.


De acordo com esse artigo, se algum dos membros do Grupo Familiar receber igual benefício assistencial, referido benefício deve ser excluído da renda per capita familiar.

O STJ, em sede de Recurso Repetitivo, já sedimentou o entendimento de que a mesma regra deve ser aplicada, por analogia, também para quando houver benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo.

Vejamos:


PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA . IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.

1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.

2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.

3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008. (STJ, REsp nº 1.355.052/SP, Primeira Seção, Ministro Relator BENEDITO GONÇALVES, DJe 05/11/2015).


PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RENDA PER CAPITA FAMILIAR. EXCLUSÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO RECEBIDO POR IDOSO QUE FAÇA PARTE DO NÚCLEO FAMILIAR. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DO ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N. 10.741/03 (ESTATUTO DO IDOSO). ENTENDIMENTO ASSENTADO NO JULGAMENTO DO RESP N. 1.355.052/SP, JULGADO SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC. 1. A Primeira Seção, no julgamento do REsp n. 1.355.052/SP, sob o regime dos recursos repetitivos do artigo 543-C do Código de Processo Civil, firmou o entendimento de que: "Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93". 2. Agravo regimental não provido. ..EMEN:(STJ, AgRg no AResp 332.275/RS, 1ª Turma, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, 07/12/2015).


Nesse sentido, os julgados desta C. Corte Regional (7ª Turma, Ap 2015.03.99.030993-0, Rel. Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 24/10/2016; 7ª Turma, Ap 2014.03.00.013459-1, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, DJ 27/04/2017; 8ª Turma, ApReeNec2013.61.39.001566-7, Rel. Des. Fed. Tania Marangoni, e-DJF3 04/09/2017).


CASO CONCRETO

Quanto à incapacidade, o laudo médico (fls. 27/37) atestou que o autor é portador de sequela de Meningite (F81.9 - Transtorno não especificado do desenvolvimento das habilidades escolares e G40 Epilepsia), cuja condição médica apresentada é geradora de incapacidade laborativa total e permanente.

Assim sendo, restou comprovado o requisito atinente a incapacidade do autor para o exercício profissional.

O estudo social realizado em abril de 2016, demonstra que o autor reside com a mãe RENATA (46 anos), o pai REGINALDO (46 anos); o irmão GABRIEL (21 anos), em um imóvel próprio que possui 01 sala, 01 copa, 02 quartos, 01 cozinha, 02 banheiros, 01 varanda e uma garagem. A casa é ampla e possui ótimo estado de conservação. O piso é frio e o teto é lajotado. A renda mensal familiar é composta pelo salário da mãe, no total de R$ 1.100,00. Os gastos mensais da família totalizam R$ 898,00, com gastos com supermercado, energia elétrica, consumo de água, medicamento, transporte e IPTU. O autor utiliza a rede de saúde pública e o convênio de saúde privado (UNIMED). A família possui 01 TV tela plana, 01 fogão, 01 geladeira, 01 microondas, 01 máquina de lavar roupa, 02 aparelhos celulares e 01 veículo, modelo Spin, marca Chevrolet, ano 2014, placa FOE 7464 (financiado).

De acordo com o CNIS juntado às fls. 131/137, a mãe do autor, em abril de 2014, recebia o salário de R$ 1.840,08 (um mil, oitocentos e quarenta reais e oito centavos). O pai recebeu auxílio doença nos períodos de 12/2016 a 04/2017.

Como é cediço, o valor auferido pelo idoso a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima, ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade, deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita.

Com efeito, a exclusão do cálculo de renda per capita de todos os benefícios de renda mínima, de idosos e incapazes, de natureza previdenciária ou assistencial - funda-se no fato de que nesses casos o benefício percebido busca amparar unicamente seu beneficiário, não sendo suficiente para alcançar os demais membros do grupo familiar.

Importante destacar que a pessoa que teve sua renda excluída também não será considerada na composição do grupo familiar, para efeito do cálculo da renda per capita.

Em que pese a comprovação da incapacidade total e permanente do autor, depreende-se do estudo social que o mesmo coabita em residência própria e em boas condições de uso, havendo possibilidade das suas necessidades básicas serem supridas pela família. A família possui TV de tela plana, microoondas, máquina de lavar roupa, aparelhos celulares e veículo de 2014. O autor possui Plano de Saúde (UNIMED).

Enfim, aparentemente, pelos elementos trazidos aos autos, conquanto o autor seja incapaz e apresente apertado orçamento familiar, não há comprovação de que vive em situação de vulnerabilidade social.

Nada obsta, entretanto, que venha a pleitear o benefício em comento novamente, caso haja alteração de seu estado socioeconômico.

Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado que ora fixo em 10% sobre o valor da causa, aplicando as normas dos §§1º a 11º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no artigo 12 da Lei nº 1.060/50 (§ 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015).

Por conseguinte, revogo a antecipação de tutela anteriormente concedida.

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso do INSS para julgar improcedente o pedido, condenando a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios nos termos acima expendidos e, em consequência, revogo a tutela antecipada. Prejudicado o recurso do autor.

É o voto.



INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal


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